PSICOLOGIA ORGANIZACIONAL E DO TRABALHO: CONCEITOS INTRODUTÓRIOS



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PSICOLOGIA ORGANIZACIONAL E DO TRABALHO: CONCEITOS INTRODUTÓRIOS 2011 Paola Lucena dos Santos Bolsista de Iniciação Científica, CNPq Acadêmica de Psicologia pela PUC/RS, Brasil Laura Traub Acadêmica de Psicologia pela PUC/RS, Brasil Candice Tieze Acadêmica de Psicologia pela PUC/RS, Brasil E-mail: paolabc2.lucena@gmail.com RESUMO O presente artigo, baseado em uma breve revisão de literatura e em entrevista com profissional com ampla experiência na área de psicologia organizacional e do trabalho, visa aprimorar conhecimentos relativos à evolução histórica da psicologia do trabalho; formação do psicólogo para atuação nas organizações; cultura organizacional; desenvolvimento de competências organizacionais e individuais; e caracterização dos psicólogos organizacionais, aliando a teoria com a experiência e visão prática da consultora entrevistada. Palavras-chave: Psicologia do trabalho, cultura das organizações, desenvolvimento de competências, formação do psicólogo Tendo em vista que a maior parte da vida produtiva do ser humano se passa no trabalho, considera-se fundamental aprimorar conhecimentos, enquanto profissionais da saúde, acerca da Psicologia Organizacional e do Trabalho. Poucos são os trabalhos teórico-práticos, com relatos de experiência profissional de psicólogos que trabalham nas organizações, que foram publicados na literatura científica dos últimos anos. Dessa forma, o presente trabalho visa fazer uma breve revisão da literatura a respeito de conceitos básicos sobre a Psicologia Organizacional e do Trabalho, integrando-os com o relato de experiência de uma consultora que atua na área. Este Paola Lucena dos Santos, Laura Traub, Candice Tieze 1

trabalho poderá servir como um auxílio para o embasamento teórico e raciocínio críticoreflexivo, de estudantes e profissionais que atuam ou desejam atuar nesta área. MÉTODO Para efetivação do presente trabalho, foi realizada uma entrevista, com duração aproximada de uma hora, com uma psicóloga que atua na área de consultoria organizacional. Além disso, uma breve revisão de conceitos básicos da área foi efetivada. EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA PSICOLOGIA DO TRABALHO Segundo Sampaio (1995), a Psicologia do Trabalho apresenta respectivamente três faces: (1) a Psicologia Industrial; (2) a Psicologia Organizacional e (3) a Psicologia do Trabalho propriamente dita. (1) A prática da Psicologia da Industria resumia-se à seleção de pessoal e colocação profissional, e à medida que novos estudos foram realizados, estes foram acolhidos como forma de reduzir os efeitos da organização mecanicista através da melhora no relacionamento com os empregados. No pós-guerra já haviam temas consagrados à área da Psicologia Industrial: seleção (baseada na psicometria), classificação de pessoal, avaliação de desempenho, condições de trabalho, treinamento, liderança e engenharia psicológica. A psicologia industrial e do trabalho foi uma das primeiras áreas onde a psicologia passou a ser aplicada no Brasil e, na década de 80, ainda eram poucos os psicólogos que ocupavam cargos de assessoramento ou de gerência de recursos humanos (GIL, 1985). (2) A Psicologia Organizacional, segunda face da Psicologia do Trabalho, foi surgindo à medida que os psicólogos deixaram de estudar apenas os postos de trabalho para contribuir também na discussão das estruturas da organização. Dessa forma, houve uma ampliação do objeto de estudo, apesar dos psicólogos continuarem presos ao problema da produtividade das empresas. Dentro da Psicologia Organizacional existe a idéia de desenvolvimento gerencial (DG), que procura atingir uma flexibilidade nas relações de trabalho com a finalidade de reduzir e evitar conflitos. (3) A terceira face da Psicologia do Trabalho surgiu no início dos anos 70, quando a Administração consolidou uma escola contigencialista onde procuravam estudar os efeitos do ambiente e da tecnologia no contexto da organização do trabalho. Apesar do contingencialismo ter gerado a escola de administração estratégica, foi a partir de seus estudos que se observaram convergências entre a Sociologia do Trabalho, a Administração e a Psicologia do Trabalho. A Paola Lucena dos Santos, Laura Traub, Candice Tieze 2

Psicologia do Trabalho tem como ponto central o estudo e a compreensão do trabalho humano em todos os seus significados. A grande diferença entre a Psicologia do Trabalho e suas antecessoras é que na primeira há lugar para ver o homem como sujeito do seu desejo e seus esforços se voltam para a saúde e o bem-estar humano, independente do aumento ou da não lucratividade e produtividade das organizações. Esta face se ocupa, antes de mais nada, da compreensão do trabalho humano. No entanto, ao longo dos anos, a preocupação dominante das organizações tem se centrado na eficácia e eficiência dos trabalhadores, que não condiz com a preocupação dominante desta terceira face da psicologia do trabalho, situando suas investigações dentro do paradigma funcionalista que embasa as teorias dominantes de gestão organizacional (CUNHA et al, 2001). CARACTERIZAÇÃO DOS PSICÓLOGOS ORGANIZACIONAIS Em um trabalho feito por Zanelli (2008), acerca da caracterização geral do psicólogo organizacional, encontrou-se que mais da metade da amostra possuía rendimentos tanto de salário fixo, como de autônomo, o que é explicado pela possibilidade dos psicólogos atuarem tanto como empregados formais de uma empresa, quanto como consultores externos de outra(s). Além disso, dos 554 psicólogos que constituíam a amostra, quase a metade (46%) trabalhava na área apenas há 5 anos e do total da amostra, somente 16% eram mestres e doutores. A consultora entrevistada no presente trabalho, estaria entre esta minoria, pois possui a seguinte formação: Especialização em Recursos Humanos, Mestrado em Psicologia Social e da Personalidade e Doutorado em Psicologia. Seus enfoques de atuação são em excelência humana, alto desempenho, sucesso profissional e educação, possuindo experiências em Psicologia Organizacional e do Trabalho, docência, avaliação psicológica e acompanhamentos. DESENVOLVIMENTO DE COMPETÊNCIAS ORGANIZACIONAIS E INDIVIDUAIS A maior conquista obtida na experiência da consultora entrevistada foi o fato de, após a implantação da gestão por competências numa empresa, o número de reclamações trabalhistas ter sido reduzido a zero, índice que permaneceu em zero por três anos. Uma competência essencial é um conjunto de habilidades e tecnologias que permite a uma empresa oferecer um determinado benefício aos clientes (HAMEL e PRAHALAD, 1995). Os sistemas de RH voltados para as competências, têm que estar relacionados aos cargos/trabalhos e devem refletir competências essenciais, capacidades, valores e prioridades. As competências Paola Lucena dos Santos, Laura Traub, Candice Tieze 3

organizacionais são desenvolvidas coletivamente dentro das organizações, com a premissa do desenvolvimento de competências individuais (GREEN, 1999). Segundo Boog (1991), a gerência realiza equilibradamente o potencial de resultados, de pessoas e de inovações da organização. O gerente faz a ligação entre a empresa e as pessoas que nela trabalham, sendo responsável pela composição de forças e interesses. Um perfil gerencial pode compreeder várias competências gerenciais, que são conceitos teóricos relacionados ao desempenho do gestor (RUAS, 2005). Ruas (2005) afirma que a competência nao se reduz ao saber, nem ao saber-fazer, mas sim à sua capacidade de mobilizar e aplicar esses conhecimentos e capacidades numa condição particular, onde se colocam recursos e restrições próprias à situação específica. A competência, não se coloca no âmbito dos recursos mas na mobilização desses recursos, não podendo ser separada das condições de aplicação. A competência gerencial é a capacidade de mobilizar, integrar e colocar em ação conhecimentos, habilidades e formas de atuar a fim de atingir e superar desempenhos configurados na missão da empresa e da área. CULTURA ORGANIZACIONAL A cultura organizacional pode ser considerada como o modelo de pressupostos básicos utilizado no processo de aprendizagem para lidar com problemas de adaptação externa e integração interna. Quando estes pressupostos funcionam bem o suficiente, são ensinados aos demais membros da organização como a maneira certa de perceber, pensar e sentir em relação aos problemas (FREITAS, 1991). A cultura organizacional apresenta elementos, que a constituem e a descrevem. Esses elementos fornecem uma interpretação para os membros da organização onde a passagem dos significados se dá como uma coisa aceita. Isto sugere a presença de um componente hipnótico através do qual as mensagens e comportamentos convenientes são objeto de aplauso e adesão, levando à transmissão espontânea aos demais membros. Os elementos mais freqüentes da cultura organizacional são: valores, crenças, ritos, estórias, tabus, heróis, normas e processos de comunicação. O papel da administração de recursos humanos, é tido como o verdadeiro guardião da cultura, pois exerce funções estratégicas que promovem a aceitação, consolidação, manutenção e mudanças culturais. Um exemplo disso é que, muitas vezes, a definição de perfis compatíveis com os valores da organização, orientam o processo de recrutamento e seleção (FREITAS, 1991). Levando isto em consideração, a consultora entrevistada, afirma que a atitude do psicólogo na POT, sua forma de inserção e autonomia em uma organização, são relativas, pois vão depender das características de cada organização e seus gestores. Pelo fato de ser consultora, a Paola Lucena dos Santos, Laura Traub, Candice Tieze 4

profissional entrevistada não se encontra vinculada a nenhuma instituição específica, com cultura e modo de funcionamento próprio. Porém, relata que prefere trabalhar para instituições que gostam de pessoas e cuidam delas, sem paternalismos, respeitando as individualidades e abrindo espaço para que se manifestem. Dentro deste contexto, o seu principal desafio é aceitar que nem todos os trabalhos são para seres humanos, mas eles o executam. FORMAÇÃO DO PSICÓLOGO PARA ATUAÇÃO NAS ORGANIZAÇÕES A Psicologia Organizacional está entre a segunda área de escolha de exercício profissional entre os graduandos e psicólogos, apesar disso, os cursos de Psicologia ainda não contemplam o caráter dinâmico e complexo da área e falham em oferecer uma visão panorâmica das oportunidades e desafios que cercam a atuação do profissional nas organizações (BASTOS et al, 2005). Os avanços tecnológicos e novos modelos de gestão presentes no cenário atual do mundo do trabalho requerem que o psicólogo se transforme e busque constantemente novas competências que o habilitem a agir de maneira eficaz dentro deste contexto dinâmico e complexo no qual se encontra inserido. A consultora entrevistada, por exemplo, nas empresas para as quais trabalha e/ou já trabalhou, já desenvolveu atividades de: recrutamento, seleção, avaliação de potencial, avaliação de desempenho, construção plano de cargos e salários, treinamentos (de muitos tipos), orientação de carreira, planejamento estratégico de RH, coaching, aulas, entre outras. A consultora relata que o psicólogo disputa espaço com duas outras ciências sociais aplicadas: a administração e a pedagogia empresarial e pensa que em algumas empresas perde espaço de modo crescente para as mesmas. Ao se interrogar Por que isso acontece?, responde que o psicólogo tem formação basicamente clínica e esse aprendizado, por si só, não serve para as organizações. A profissional afirma que historicamente as faculdades brasileiras têm feito isso, apesar de tentativas de mudanças já terem sido feitas em algumas universidades brasileiras (UFSC, UFRN, UnB), de ter sido criada a Sociedade Brasileira de POT (atual ABPOT) e o periódico de artigos científicos específico de POT. O que esta profissional tem percebido é que os resultados ainda são frágeis, apesar das inovações. Também destaca o fato de que os psicólogos que querem atuar nesta área precisam estudar administração e entender a psicologia social e de aprendizagem, caso contrário, vai ter quem faça melhor o trabalho que ele se propõe a fazer. E repete: apenas o entendimento clínico do ser humano individual, pouco irá ajudar no entendimento da complexidade que é uma organização do trabalho. Zanelli (1994), confirmando o pensamento da profissional, destaca que ao longo do processo de formação dos psicólogos durante a graduação, há um direcionamento para a Paola Lucena dos Santos, Laura Traub, Candice Tieze 5

psicologia clínica, o que faz com que os profissionais da área do trabalho tendam a patologizar os fenômenos, o que ainda se observa na atualidade. Salienta-se a pouca atenção que é dada, ao longo do curso de graduação, para a área da pesquisa, para o aprender a se atualizar, pensar e conhecer, que são aptidões essenciais de um bom profissional. Através do raciocínio científico, o psicólogo se torna capaz de escolher os métodos mais eficazes para alterar ou otimizar as situações com que se depara em seu ambiente de trabalho. Em uma pesquisa feita por Borges-Andrade (2008), que investigava a orientação teórica de psicólogos da área organizacional, encontrou-se que a maioria utilizava o referencial teórico psicanalítico ou cognitivo comportamental, além disso, verificou-se que mais da metade da amostra (60%), utilizava duas ou três referenciais diferentes para embasar sua prática, o que pode ser explicado, segundo o autor, tanto pela complexidade do objeto de intervenção, quanto pela imaturidade teórica do psicólogo da área, tendo em vista que abordagens distintas são usadas de maneira concomitante. Corroborando o pensamento, Zanelli, já na década de 90 (1994), falava que o psicólogo deve estar preparado para defender e discutir acerca do referencial científico que embasa a sua prática, bem como os valores que a sustentam. Quanto aos conhecimentos teóricos que sustentam sua prática profissional, a consultora entrevistada responde que aposta nos conhecimentos advindos da teoria cognitivista e pensa que os psicólogos precisam entender como ocorre o processamento das informações nas pessoas, sua associação com o contexto de trabalho e história pessoal. Corroborando com tal pensamento, Garcia-Santos e colaboradores (2010), afirmam que quando o sujeito domina os conteúdos com os quais trabalha, ou já os tem automatizados, há uma maior facilidade de resolução de problemas, habilidade esta tão requerida na contemporaneidade dos profissionais das mais diversas áreas e com a qual o psicólogo organizacional deve lidar, conhecendo seu funcionamento. Ou seja, requer-se que o psicólogo do trabalho tenha o mínimo de conhecimento sobre o funcionamento cognitivo do ser humano, com os quais trabalha. Os autores destacam ainda que o profissional especialista em determinada área, não só possui maior quantidade de informações em sua memória de longo prazo, como as tem armazenadas de maneira mais organizada, o que permite um acesso mais fácil as mesmas. A consultora acredita que para que o psicólogo tenha sucesso na área de POT é preciso estudar o tempo todo, ler artigos, ir aos congressos na área, participar de grupos de discussão, fazer supervisão e observar o que acontece em outros países. Compartilha que, nos Estados Unidos, por exemplo, um psicólogo só pode atuar em organizações depois de ter feito um curso específico para esse fim e receber um certificado da associação de psicologia organizacional americana. Na conclusão da entrevista, quando interrogada sobre qual conselho ela daria a quem deseja atuar em Psicologia do Trabalho, ela responde: não pare de estudar. Paola Lucena dos Santos, Laura Traub, Candice Tieze 6

REFERÊNCIAS Bastos, A. V. B., Morais, J. H. M., Santos, M. V. et al. (2005). A imagem da psicologia organizacional e do trabalho entre estudantes de psicologia: o impacto de uma experiência acadêmica. Psicol. cienc. prof. [online], 25 (3), 352-369. BOOG, G. G. (1991). O desafio da competência. São Paulo: Best Seller. Borges-Andrade, J. (2008). O que fazem e como trabalham os psicólogos organizacionais brasileiros. III Congresso Nacional de Psicologia Organizacional e do Trabalho [on line]. Florianópolis: Anais do Congresso. Acesso em: 19.05.2010. Disponível em: http://www.sbpot.org.br/iiicbpot/programacao/mr19.html Cunha, M. P., Cunha, J. V. & LEAL, I. P. (2001). Gênero e teoria organizacional: A contribuição feminista. Revista Psicologia, 15 (1), 28-42. Freitas, M. E. (1991). Cultura Organizacional Grandes Temas em Debate. Revista de Administração de Empresas, São Paulo, 74-79. Garcia-Santos, S. C., Almeida, L.S., Werlang, B. S. G & Veloso, A. L. M. (2010). Processamento da informação em gestores de alto desempenho. Revista Motricidade FTCD/CIDESD, 6 (1), 85-102. Gil, A. C. (1985). O psicólogo e sua ideologia. Psicol. cienc. prof., 5 (1), 12-17. Hamel, G. & Prahalad, C. K. (1995). Competindo pelo futuro. Rio de Janeiro: Campus. Ruas, R. L. (2005). Os novos horizontes da gestão: aprendizagem organizacional e competências. São Paulo: Bookman. Sampaio, J. R. (1995). As Três faces da Psicologia do Trabalho. Psique, Belo Horizonte, 5(1), 60-66. Zanelli, J. C. (1994). O psicólogo e as organizações de trabalho: formação e atividades profissionais. Florianópolis: Paralelo. Zanelli, J. C. (2008). Caracterização geral dos psicólogos da área de psicologia organizacional e do trabalho no Brasil. III Congresso Nacional de Psicologia Organizacional e do Trabalho [on line]. Florianópolis: Anais do Congresso. Acesso em: 19.05.2010. Disponível em: http://www.sbpot.org.br/iiicbpot/programacao/mr19.html Paola Lucena dos Santos, Laura Traub, Candice Tieze 7