Conceitos e curiosidades da Natação Problemas de bordo de piscina Susana Maria Soares Ribeiro
1. Partida de bloco A partida de bloco obedece às seguintes vozes : apito mais longo, aos seus lugares, apito mais curto. Após apito longo, subir ao bloco e colocar-se na parte dianteira do mesmo, prendendo os halluces (dedos grandes dos pés; halux, no singular) no bordo anterior, de forma a não escorregar no momento do salto. À voz de aos seus lugares agarrar o bordo anterior do bloco, puxando-o para cima, como se quisesse arrancar o topo. As mãos são colocadas por entre os pés, que devem estar afastados sensivelmente à largura dos ombros. O corpo mantémse completamente imóvel. Ao apito curto de saída, sem largar o bloco, desequilibrar para a frente e, no momento de maior desequilíbrio, largar o bordo anterior e estender ativamente o corpo para a frente, adotando, durante o voo e a entrada, a posição hidrodinâmica, que só se desfaz no momento do início do nado. 2. Enigma dos clones A resolução do enigma dos clones importa a consideração dos três tipos de arrasto ao qual o corpo humano fica submetido quando se desloca em meio aquático: o arrasto de onda, o arrasto de fricção e o arrasto de pressão. O arrasto de fricção é irrelevante nesta situação, porque os corpos são todos iguais e porque não tem expressão com o aumento da profundidade. Quanto ao arrasto de pressão, com a profundidade crescem todas as pressões na mesma proporção, de um lado e de outro de um corpo, ou de uma camada de fluido, desde que este(s) não colapse, o que ocorre apenas nas muito grandes pressões das grandes profundidades. Como tal, não há lugar a diferentes velocidades de escoamento de fluido, nem à criação de gradientes de pressões. Não há formação de esteira e não se produz a força de arrasto de pressão. Neste sentido, o arrasto cai com a profundidade apenas porque cai o arrasto de onda, por formação de ondas gravíticas de superfície. 3. Técnica ou estilo? Técnica. O estilo é a interpretação pessoal que cada nadador faz da técnica. É fácil perceber a diferença por analogia à caminhada. Todos nós caminhamos de igual forma, movendo os membros inferiores alternadamente, em passadas sucessivas. Todos nós seguimos a mesma técnica de caminhada (mais corretamente dito, padrão de marcha). Contudo, quando olhamos um sujeito com um caminhar gingão, um pouco dançado, dizemos: ali vai um tipo cheio de estilo. O estilo é o seu jeito pessoal de caminhar. Também cada nadador nada com o seu estilo pessoal. Quando este estilo de nado se afasta muito do modelo esperado, alterando a sua estrutura fundamental, então aí entramos no domínio do erro técnico, dado que a interpretação pessoal que o nadador faz da técnica passa a afetar fortemente 2
a sua performance de nado. Neste binómio técnica / estilo, por vezes surge uma dúvida relacionada com a técnica de bruços. A técnica de bruços pode ser nadada com o corpo a assumir uma posição mais plana (bruços formal) ou um movimento mais ondulatório (bruços natural, mais ou menos ondulatório, sem e com recuperação aérea dos membros superiores). Neste caso, bruços é a técnica e as diferentes formas de nado, porque estão tipificadas em modelos, são chamadas de variantes de nado. Estilo será, então, a interpretação pessoal que cada nadador faz da variante de nado que utiliza. 4. Viragem aberta A viragem aberta caracteriza-se pela realização de um toque na parede (apenas uma mão, ou as duas em simultâneo, dependendo se a técnica de nado é alternada ou simultânea, respetivamente), emergindo a cabeça para respirar e trazendo os membros inferiores fletidos também ao contacto com a parede. A estas ações segue-se a recuperação aérea de um dos membros superiores (no caso das técnicas alternadas, daquele que tocou na parede, nas técnicas simultâneas, de qualquer dos dois) e subaquática do outro membro superior, que acontecem concomitantemente com um forte impulso na parede, resultante da extensão dos membros inferiores. A ação que caracteriza, de forma mais determinante, a técnica de viragem aberta é a recuperação aérea de um dos membros superiores. 5. Posição hidrodinâmica A posição hidrodinâmica caracteriza-se pela colocação do corpo em total extensão, com os membros superiores em elevação superior, a comprimir lateralmente a cabeça, e com as mãos sobrepostas. É considerada a posição em que o corpo fica sujeito a menor força de arrasto durante o deslocamento aquático. É utilizada nas partidas, viragens e nado. 6. Deslize O deslize acontece após partidas e viragens e é parte constituinte das mesmas. É realizado em posição hidrodinâmica. O corpo só deve romper a superfície depois da marca dos 5m (quando os flutuadores dos separadores de pistas mudam de cor), podendo manter-se o deslize, no máximo, até aos 15 m. Passada esta marca, o nadador infringe o regulamento técnico e é desclassificado. O deslize termina com a primeira ação propulsiva (movimento alternado ou simultâneo dos membros inferiores ou movimento simultâneo dos membros superiores, neste último caso, apenas quando a técnica de nado for bruços). 3
7. Partida e início ou reinício de nado As técnicas de partida são constituídas por quatro ações: ações no bloco, voo, entrada e deslize. As ações no bloco obedecem ao ritual de partida cujas vozes são: sinal sonoro, aos seus lugares, sinal sonoro. O voo e a entrada são realizados estando o corpo do nadador já em posição hidrodinâmica, devendo todo o corpo passar no ponto de entrada das mãos. O deslize é também realizado em posição hidrodinâmica, a uma profundidade que permita usufruir da minimização do arrasto de onda sem implicar o afundamento acentuado do corpo, seguido da sua subida acentuada para alcançar o superfície e dar início ao nado. Este deslize é também parte constituinte das quatro ações de viragem (aproximação, viragem, deslize e reinício de nado). O deslize termina com a primeira ação propulsiva realizada com qualquer segmento corporal, a qual está condicionada pelo regulamento técnico da natação. Após o deslize realizado durante a partida e viragem (aberta ou de rolamento ventral) de crol e de costas, as ações propulsivas permitidas são o movimento alternado ou simultâneo dos membros inferiores, devendo os membros superiores manter a posição hidrodinâmica. O início ou reinício do nado faz-se iniciando a ação propulsiva com um dos membros superiores (o preferido). Nunca se iniciam a ação propulsiva com os dois membros superiores em simultâneo. Após o deslize (primeiro deslize) realizado durante a partida e viragem de Bruços (aberta), realiza-se uma braçada subaquática (também designada, na gíria da natação, de braçada submarina) composta pelo deslocamento dos membros superiores até à coxa, que origina um novo deslize (segundo deslize), seguido da recuperação dos membros superiores até à posição hidrodinâmica e da ação dos membros inferiores, aos quais se segue a primeira ação dos membros superiores (primeira ação de nado), durante a qual é obrigatório que a cabeça rompa a superfície da água. Em nenhum momento, durante as ações de partir, nadar ou virar, é permitido realizar movimentos alternados com os membros inferiores. Um (e não mais!) movimento descendente simultâneo dos membros inferiores é permitido apenas no segundo deslize e no nado, na ação propulsiva final. Após o deslize realizado durante a partida e viragem de mariposa é permitido realizar movimentos simultâneos com os membros inferiores, mantendo-se os superiores em posição hidrodinâmica, até à distância máxima de 15 metros. Em nenhum momento, durante as ações de partir, nadar ou virar, é permitido realizar movimentos alternados com os membros inferiores. 8. Chegada à parede após nado A forma como se toca a parede no términos do nado depende da técnica que se está a utilizar. A chegada nas técnicas alternadas realiza-se com o toque na parede da mão correspondente ao membro superior que realiza a última ação. A chegada nas técnicas simultâneas realiza-se com o toque simultâneo das duas mãos na parede. O toque com apenas uma das mãos origina desclassificação. O regulamento 4
técnico da natação não permite a mudança da posição corporal à chegada. Se a técnica for ventral, a parede tem que ser tocada com o corpo em decúbito ventral. Na técnica de costas, o toque na parede tem que ser realizado com o corpo em posição dorsal. 9. Conceito de Saber nadar Saber nadar é, para o senso comum, a expressão antónima de não se afogar. Para o profissional de Natação, saber nadar é um conceito ilimitado. Talvez possamos dizer que nunca chegamos a saber nadar, na medida em que este conceito expresse a capacidade adaptativa total do indivíduo à água. Saber nadar significa que um sujeito é capaz de resolver, com sucesso, qualquer desfio aquático, seja ele um acidente ou um desafio desportivo. Remetendo este conceito para o contexto do ensino, poderemos dizer que há sempre algo mais a ensinar, há sempre mais uma adaptação a fazer. 10.Natação: o desporto mais completo A noção de desporto mais completo associado à natação foi um pouco introduzida pela medicina: nadar faz bem e não magoa, pelo que será, talvez, o melhor desporto do mundo. Talvez possamos entender esta afirmação à luz da história do desporto, mas hoje, com o aumento drástico do conhecimento na área, há que revê-la seriamente. O desporto mais completo seria aquele que permitiria ao indivíduo desenvolver a totalidade das componentes da aptidão física. Nenhum desporto reúne tais qualidades, pelo que um programa de exercício combina sempre habilidades motoras diversas, oriundas dos mais variados desportos. Nem a natação, nem qualquer dos demais despostos podem ser considerados completos. 10.1.Conceito de aptidão física 10.2.Conceito de condição física 10.3.Conceito de habilidade motora 11.Salto de pé vs. Salto de pés Deve dizer-se salto de pé, não de pés, que significa salto a partir da posição vertical, posição esta que é mantida durante o voo e a entrada na água. O salto de cabeça corresponde ao salto em que o corpo, durante a fase de voo, adquire uma posição mais próxima da horizontal. 5
12.Os óculos de piscina e a adaptação ao meio aquático Os óculos de piscina são inibidores do contacto dos olhos com a água e, como tal, são também inibidores do processo adaptativo. Não devem ser utilizados. Abrir os olhos com a face imersa é fundamental, quer por motivos relacionados com a segurança em ambiente aquático (em situação de acidente, o contacto dos olhos com a água não deve ser causador de aumento da aflição e possível indutor do pânico); quer por motivos relacionados com a orientação (a linha preta, marcada no fundo da piscina e nas paredes testa, bem como a mudança de coloração dos separadores de pista, servem de pontos de referência para que possamos orientarnos durante o nado); quer porque necessitamos ter uma postura correta na água e que é, a maior parte das vezes, o mais horizontal possível (se a cabeça se eleva pela fuga dos olhos ao contacto com a água, há perda da horizontalidade e aumento do arrasto, motivado pelo aumento da sua componente de pressão). 13.Uso de flutuadores na adaptação ao meio aquático O uso de flutuadores deve ser inibido na adaptação ao meio aquático, exceto quando as condições de segurança a isso obriguem. Os flutuadores transmitem uma falsa noção de flutuabilidade e inibem a aquisição da capacidade de flutuar por meios, de equilíbrio e propulsão, próprios. Uma criança pequena que apenas vivencie o meio aquático com flutuadores, principalmente fixos, como as braçadeiras e os cintos de flutuação, vai adquirir a noção de que, quando em água, não se afoga. Dificilmente vai associar a capacidade de não se afogar com o uso do flutuador, se nunca tiver experienciado a incapacidade de flutuar. Ter a noção do possível afogamento é o caminho para a aquisição da flutuabilidade e o garante seguro de que a criança não vai entrar em meio aquático sem os flutuadores, convencida de que flutua. 14.Uso de barbatanas na aprendizagem das técnicas de nado O uso das barbatanas durante a aprendizagem das técnicas deve ser inibido, pelo facto destas modificarem o padrão de coordenação membros superiores - membros inferiores e tornarem a ação dos membros inferiores preguiçosa, isto porque permitem maior propulsão com menor frequência gestual. Este efeito é particularmente notório em alunos que aprendem a nadar mariposa com barbatanas. Uma vez sem elas, estes alunos são incapazes de produzir movimento ondulatório suficiente, pelo facto da ação descendente dos membros inferiores ser pouco forte. 6