LÍNGUAS DE IMIGRANTES / LÍNGUAS MINORITÁRIAS Myrna Estella Mendes Maciel (UNISEP-PR) myrnaestell@gmail.com As línguas de imigrantes hoje no Brasil, segundo Morello (1999), contemplam um cenário de mais de 30 línguas espalhadas pelo Brasil. E assim, o contexto de imigrantes no Brasil é significativo, pois há um cenário de manifestações linguísticas baseadas em um processo de historicidade em que levou os imigrantes buscarem lugar melhor para viver e constituir família. Essa situação faz com que possamos compreender que somos um país plurilíngue, que passou pelo processo histórico de imigração, em que recebeu imigrantes de todos os países durante um processo de colonização e que infelizmente vive hoje em situação monolíngue. Mas apesar de todo esse cenário, temos outro contexto de políticas públicas em prol da valorização de línguas consideradas minoritárias, esse contexto, incluem línguas de imigrantes como também as línguas indígenas. Com a vinda dos imigrantes, veio com as famílias, a língua, os costumes, a música, a dança entre outros hábitos específicos de cada país. O Brasil abriu as portas para os imigrantes, que aqui, encontraram terras para produzir e consequentemente também substituir a mão de obra escrava (MACIEL 2010). Para Bortoni- Ricardo (2011), esse processo histórico de línguas, encontra-se em todo território nacional e que a autora chama de variedades não padrão altamente estigmatizadas e denominadas também de variedades rurbanas 1, ou seja, variedades faladas por classes baixas, não alfabetizadas ou semianalfabetos que vivem nas cidades, mas que tem antecedentes rurais. A referida autora afirma que há traços graduais no 1 Para Bortoni-Ricardo (2001, p.23), defini variedades rurbanas como: [...] a língua falada em áreas metropolitanas por grupos sociais não alfabetizados de antecedentes rurais, ou em áreas rurais expostas a influências modernizadoras. Não iremos nos deter no conceito de variedades rurbanas, apenas trouxemos a definição para considerar que, segundo a autora, as variedades definidas por ela também sofrem estigmatização das línguas minoritárias, línguas de imigrantes e indígenas. 1
português do Brasil, na fala de todos os grupos sociais em grau variado, independente de seus descendentes rurais ou urbanos. Portanto, as variedades não padrão sofrem forte estigmatização decorrente da norma padrão vigente, caracterizando-as como variedades caipiras, língua não padrão, decorrente de falantes não alfabetizados, como já citamos e também descendentes de imigrantes. Com a Ditadura de Vargas em 1934, o Brasil, entrou em um processo de Nacionalização 2, ou seja os imigrantes não podiam mais falar na língua materna, e sim, a língua oficial do Brasil. Começou o que pode ser chamado de apagamento das línguas minoritárias, classificadas como línguas de não prestígio e designadas de línguas majoritárias chamadas de línguas de maior prestígio. A partir de 1937, com as modificações de ordem ideológica, econômica e jurídica, das quais resulta a forma do poder político de Vargas, a situação se modifica nas regiões de imigração, que passam a ser objeto das campanhas de nacionalização. Com elas se dá a homogeneização/ regulamentação linguística dos imigrantes, através de uma tecnologia cujas minúcias são esclarecedoras dos modos de relação entre língua e nacionalidade naquele momento. (PAYER, 2006, p. 92). A partir desse momento, começou então, a política de nacionalização dos imigrantes. As escolas que geralmente eram construídas nas comunidades de imigrantes foram destruídas, as crianças foram proibidas de falar em outra língua que não fosse a língua portuguesa. E também não puderam mais oferecer professores na língua da comunidade, ou seja, a língua de imigrante. A lei que proibiu as línguas de imigrantes e que colaborou para a destruição das escolas estava no Plano Nacional de Educação, previsto na constituição desde 1934, mas que só começou a vigorar a partir de 1939. A preocupação com o preconceito e o medo de repressão fez com que os falantes das línguas de imigrantes, deixassem de falar a sua língua materna para aprender a língua portuguesa. 2 Segundo Payer (2006), as políticas de integração e de nacionalização eram práticas das campanhas nacionalistas e tinham como primeiro alvo as escolas primárias, afirmando que a nacionalização deve começar pela infância, para garantir, no futuro, as bases econômicas e ideológicas da consciência nacional. 2
O Estado de Santa Catarina, na gestão do governador e depois interventor Nereu Ramos, montou campos de concentração, chamados eufemisticamente de áreas de confinamento, para descendentes de alemães que insistissem em falar sua língua, entre outras razões (Dall Alba, João Leonir. Colonos e mineiros na grande Orleans. Orleans, edição do autor e do Instituto São José, 1986). Um desses campos funcionou dentro do que é hoje o campus da Universidade Federal de Santa Catarina, mais especificamente a Prefeitura Universitária. A lista com os nome dos prisioneiros confinados nesse campo foi publicada por Perazzo, Cristina Ferreira. O perigo alemão e a repressão policial no Estado Novo. São Paulo, Arquivo do Estado, 1999, p. 239-44. (OLIVEIRA, 2003). Portanto, pensar em ações de políticas públicas que, promovam as línguas minoritárias é colaborar para que a construção de um país monolíngue seja desmistificado e consequentemente valorizar os imigrantes que construíram este país. Bortoni Ricardo, (2011,p.84), apresenta uma proposta através de análise de redes. Ou seja: A análise de redes, em sentido amplo, é o estudo das relações existentes num sistema de processo de mudança.ainda a autora apud Guimarães (1970, p.7) define como: análise de redes como: [...] uma estratégia de pesquisa na qual cada indivíduo no sistema é percebido pelo pesquisador e se percebe ou é levado a perceberse como um elemento em um conjunto de relações sociais. Uma das ações importantes para identificar as línguas minoritárias, é então, buscar essa relação de redes em que, o pesquisador analisa a língua falada em comunidades selecionadas, identifica a sua relação com línguas de imigrantes, defineas, em categoria como língua minoritária, ou majoritária e propõe a relação de redes entre outros falantes de línguas de imigrantes. Essa pode ser uma das ações integradas com outros planos de ação em prol de línguas minoritárias no Brasil. A importância de um estudo de redes, é a coleta de dados através da sociolinguística que, busca analisar dados da língua em comunidades de falantes de línguas de imigrantes. Com base nisso que dissemos, podemos afirmar que, na tradição dos estudos da linguagem, a sociolinguística, de modo especial, pesquisa a diversidade linguística. No livro Introdução à Linguística (MUSSALIM, 2004), aborda a relação entre língua, cultura e sociedade mostrando que é através dessa relação que vários autores como Bright, Labov, Hymes, Gumperz, Haugen, Fisher e Rona buscam compreender o que caracteriza uma comunidade de fala. Eles definem alguns aspectos da língua através de 3
aspectos sociais como identidade, contexto social, idade, sexo, entre outros. Consideram que estes últimos determinam a ocorrência de variedades linguísticas em uma comunidade de fala. Ou seja, definem as variedades linguísticas existentes em uma sociedade a partir do contexto social em que o indivíduo está inserido. Porém, não cabe aqui aprofundar tais conceitos da sociolinguística nem definilos. O que interessa é justamente que a sociolinguística não define: a comunidade de fala no sentido político. Compreender a importância de se identificar as variedades em uma comunidade de fala, e identificá-las se quiser, por exemplo, discutir seus processos de normalização. Uma comunidade linguística é valorizada ou silenciada, inscrevendose numa história de conflitos e lutas dos falantes por seus direitos. A compreensão da comunidade de fala, no sentido político implica entender que existe um direcionamento para a língua falada numa comunidade: como a língua é vista como ela é valorizada, se existem ações para assegurar o direito a essa língua, se ela está protegida contra a discriminação. A atenção volta-se, hoje, para os movimentos populares que tentam instaurar ou restaurar uma rede de relações sociais necessárias à existência de uma comunidade e que reagem contra a perda do direito mais fundamental, o direito de um grupo social formular, ele próprio, seu quadros de referência e seus modelos de comportamento indubitavelmente, há nessas referências, em suas representações, nas autoridades que as expressam, uma inércia benéfica na medida em que proíbe ao indivíduo acreditar que seja o único e o prive de suas ambições pessoais acerca do corpo social. (CERTEAU, 2008, p. 39). De acordo com o autor, as relações sociais em uma comunidade fortalece o comportamento entre os grupos sociais e podem criar o seu modo de se expressar e representar a sua língua por exemplo. Em comunidades com intenção de pesquisa, essa relação fica clara quando há o interesse em se manifestar na língua para língua. Os movimentos sociais que envolvam comunidade em eventos festivos, como festa na igreja, festa na comunidade com danças típicas, refletem as relações sociais em movimento que acontecem diante de uma sociedade que gera ações comuns a todos. Em síntese, as narrativas indicam aspectos que, na história dos imigrantes, foram sendo constituído seu modo de estar no país, de se representarem como sujeitos nas novas condições de vida. Ao trazer esses dados é importante indicar o fato de que a língua faz parte deste processo histórico. 4
Portanto, pensar em ações de políticas públicas, é resgatar o direito dos imigrantes já constituídos em território brasileiro, todos natos brasileiros, de trazer da memória a sua língua, como parte de sua história viva, que pode ser falada e difundida entre seus filhos e netos. REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS BORTONI- RICARDO M.S. Do Campo para a Cidade: estudo sociolinguístico de migração e redes sociais. São Paulo: Editora Parábola, 2011. CERTAU M. A Cultura no Plural; Tradução Enid Abreu Dobránzky- Campinas, SP: Papirus, 5ª ed. 2008. MACIEL. M.E.M. Língua de imigrantes: A Língua Polonesa na região Sul do Brasil. (Dissertação de Mestrado do Curso de Ciências da Linguagem p. 98 Universidade do Sul de Santa Catarina (UNISUL), Palhoça- SC, 2010. MORELLO, R. et alii. Línguas brasileiras: A diversidade de um campo e pesquisas. UNESCO, 1999 (inédito). MUSSALIM, F.; BENTES, A.C. (Orgs.) Introdução à lingüística: domínios e fronteiras. São Paulo: Cortez, 2000. Volumes 1. OLIVEIRA, M.G. Declaração Universal dos Direitos Linguísticos: novas perspectivas em política línguística. Campinas (SP): Mercado de Letras, Associação de Leitura do Brasil (ALB) Florianópolis: IPOL, 2003. PAYER, M. O. Memória da língua. imigração e nacionalidade. São Paulo: Escuta, 2006. Recebido Para Publicação em 30 de outubro de 2012. Aprovado Para Publicação em 23 de novembro de 2012. 5