Lúpus eritematoso sistêmico. Autores Emília Inoue Sato 1 Alexandre Wagner Silva de Souza 2 Publicação: Mai-2007

Documentos relacionados
Glomerulonefrites Secundárias

Hemograma, plaquetas, creatinina, uréia. creatinina, uréia. Lúpus induzido por drogas, gestantes, lactantes e crianças devem ser tratados por médicos

Lúpus Eritematoso Sistêmico - sinais e sintomas

Profº André Montillo

Prof. Ms. Alex Miranda Rodrigues

LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO (LES) UMA REVISÃO 1

Dia Nacional de Luta contra o Reumatismo

INTRODUÇÃO LESÃO RENAL AGUDA

GLOMERULOPATIAS. 5º ano médico. André Balbi

PIROXICAM. Anti-Inflamatório, Analgésico e Antipirético. Descrição

Diagnóstico Diferencial das Síndromes Glomerulares. Dra. Roberta M. Lima Sobral

Doença inflamatória da coluna vertebral podendo ou não causar artrite em articulações periféricas e inflamação em outros órgãos como o olho.

Espectro clínico. Figura 1 Espectro clínico chikungunya. Infecção. Casos Assintomáticos. Formas. Típicas. Fase Aguda. Fase Subaguda.

Perfil FAN e AUTO-ANTICORPOS. Qualidade e precisão para diagnóstico e acompanhamento clínico.

Anais do 14º Encontro Científico Cultural Interinstitucional ISSN

Pneumonia intersticial. Ana Paula Sartori

Glomerulopatias Secundárias. Glomerulopatias Secundárias. Glomerulopatias Secundárias. Glomerulopatias Secundárias. Glomerulonefrites Bacterianas

Artrite Psoriásica. 15 Encontro Municipal / 13 Encontro Nacional de Psoríase 10 Encontro de Vitiligo 2017

Insuficiência Renal Aguda no Lúpus Eritematoso Sistêmico. Edna Solange Assis João Paulo Coelho Simone Chinwa Lo

Vai estudar doenças glomerulares? Não se esqueça do elefantinho!

EXAMES LABORATORIAIS PROF. DR. CARLOS CEZAR I. S. OVALLE

Etiologia: Etiologia:

Vasculite sistémica primária juvenil rara

2ª PARTE CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS REUMATOLOGIA

Glomerulonefrite pós infecciosa

SARCOIDOSE. Luiz Alberto Bomjardim Pôrto Médico dermatologista

Revisão de Reumatologia PARTE II LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO. Dr.Aleksander Snioka Prokopowitsch. Dr.Aleksander Snioka Prokopowitsch

Hidroclorotiazida. Diurético - tiazídico.

Cuidados Partilhados Reumatologia / MGF. Alertar para agudizações e complicações graves mais comuns em doenças reumáticas inflamatórias

Lúpus eritematoso sistêmico com acometimento neurológico grave: Relato de Caso

ENFERMAGEM DOENÇAS CRONICAS NÃO TRANMISSIVEIS. Doença Cardiovascular Parte 4. Profª. Tatiane da Silva Campos

MANEJO DOS CASOS SUSPEITOS E CONFIRMADOS DE INFLUENZA NO HIAE E UNIDADES



TROMBOEMBOLISMO PULMONAR EMERGÊNCIAS AÓRTICAS. Leonardo Oliveira Moura

MAGNÉSIO DIMALATO. FÓRMULA MOLECULAR: C4H6Mg2O7. PESO MOLECULAR: 396,35 g/mol

CADA VIDA CONTA. Reconhecido pela: Parceria oficial: Realização:

Síndrome Periódica Associada à Criopirina (CAPS)

- termo utilizado para designar uma Dilatação Permanente de um. - Considerado aneurisma dilatação de mais de 50% num segmento vascular

Consensus Statement on Management of Steroid Sensitive Nephrotic Syndrome

FACULDADE DE CIÊNCIAS MÉDICAS DE CAMPINA GRANDE-FCM CG

Biologia. Transplantes e Doenças Autoimunes. Professor Enrico Blota.

NOME GÊNERO IDADE ENDEREÇO TELEFONE

parte 1 estratégia básica e introdução à patologia... 27

Eduardo Henrique Costa Tibaldi 1) Introdução

Impacto clínico da tripla positividade dos anticorpos antifosfolípides na síndrome antifosfolípide trombótica

Síndromes Coronarianas Agudas. Mariana Pereira Ribeiro

ANEXO II CONTEÚDO PROGRAMÁTICO EDITAL Nº. 17 DE 24 DE AGOSTO DE 2017

APRESENTAÇÃO E-PÔSTER DATA: 18/10/16 LOCAL: SALAS PRÉDIO IV

RELAÇÃO DE PONTOS PARA A PROVA ESCRITA E AULA PÚBLICA

LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO


Helena Ferreira da Silva, Paula Vaz Marques, Fátima Coelho, Carlos Dias. VII Reunión de Internistas Noveis Sur de Galicia

N o 41. Novembro Lúpus Eritematoso Sistêmico (LES) Afinal, o que é lúpus?

COMISSÃO COORDENADORA DO TRATAMENTO DAS DOENÇAS LISOSSOMAIS DE SOBRECARGA

Artrite Idiopática Juvenil

ARTRITE REMATOIDE ASPECTOS GERAIS

Síndrome Periódica Associada à Criopirina (CAPS)

Prevenção da Artrose e Osteoporose. Prof. Avelino Buongermino CREFITO-3/6853-F

Edema OBJECTIVOS. Definir edema. Compreender os principais mecanismos de formação do edema. Compreender a abordagem clínica do edema

COMO CONTROLAR HIPERTENSÃO ARTERIAL?

SOCIEDADE RELATÓRIO PARA MICOFENOLATO DE MOFETILA E MICOFENOLATO DE SÓDIO PARA TRATAMENTO DA NEFRITE LÚPICA

GESF no Transplante. Introdução

Semiologia do aparelho osteoarticular. Professor Ivan da Costa Barros

FISIOTERAPIA PREVENTIVA

Caio Abner. 3 de Junho de 2009

ENFERMAGEM DOENÇAS CRONICAS NÃO TRANMISSIVEIS. Doenças Respiratórias Parte 2. Profª. Tatiane da Silva Campos

DISTÚRBIOS HIPERTENSIVOS NA GRAVIDEZ. Profª Leticia Pedroso

ESCLEROSE SISTÉMICA - CASUÍSTICA SERVIÇO MEDICINA IV

SENADO FEDERAL PROJETO DE LEI DO SENADO Nº 293, DE 2009

Referenciação à Consulta de Reumatologia

Doença de Addison DOENÇA DE ADDISON

DOENÇA ARTERIAL CORONARIANA

SÍFILIS MATERIAL DE APOIO.

CASO CLÍNICO. Medicina-UFC. Everton Rodrigues

Ac. Marina Martinichen Furlaneto 2015

Doença de Crohn. Grupo: Bruno Melo Eduarda Melo Jéssica Roberta Juliana Jordão Luan França Luiz Bonner Pedro Henrique

EM MEDICINA INTERNA. curso de atualização AUDITÓRIO MUNICIPAL DE VILA DO CONDE PROGRAMA 18 A 23 DE NOVEMBRO DE 2019 HEMATOLOGIA CUIDADOS PALIATIVOS


Imagem da Semana: Radiografia, Tomografia Computadorizada, Ressonância Nuclear Magnética

Esclerodermia: Causas Desconhecidas e Ainda sem Tratamento

3/15/2013 HIPERSENSIBILIDADE É UMA RESPOSTA IMUNOLÓGICA EXAGERADA A DETERMINADO ANTÍGENO. O OBJETIVO IMUNOLÓGICO É DESTRUIR O ANTÍGENO.

Manejo de casos suspeitos de Febre Maculosa. Outubro de 2018

Autoimunidade e Doenças Auto-imunes: Bases Moleculares, Imunológicas e Diagnóstico

ENFERMAGEM DOENÇAS INFECCIOSAS E PARASITÁRIAS. ZIKA VIRUS Aula 2. Profª. Tatiane da Silva Campos

ESCLEROSE MÚLTIPLA. Prof. Fernando Ramos Gonçalves

INSTITUIÇÃO: CENTRO UNIVERSITÁRIO DAS FACULDADES METROPOLITANAS UNIDAS AUTOR(ES): ANDRESSA GONÇALO RODRIGUES PIMENTEL, TATIANE CRISTINA LINO DA SILVA

Material e Métodos Relatamos o caso de uma paciente do sexo feminino, 14 anos, internada para investigação de doença reumatológica

densidade óptica está ilustrada na Figura 1. O grupo anti-lpl positivo (anti- LPL+) foi detectado em 25 dos sessenta e seis pacientes com LES (37,8 %)

Doenças pulmonares intersticiais

- Descrito na década de 70, mas com aumento constante na incidência desde os anos 90

Profa. Dra. Larissa Gorayb F Mota

Vai estudar doenças glomerulares? Não se esqueça do elefantinho!

CASO CLÍNICO. Clara Mota Randal Pompeu PET Medicina UFC

COMISSÃO COORDENADORA DO TRATAMENTO DAS DOENÇAS LISOSSOMAIS DE SOBRECARGA

Transcrição:

Lúpus eritematoso sistêmico Autores Emília Inoue Sato 1 Alexandre Wagner Silva de Souza 2 Publicação: Mai-2007 1 - O que é lúpus eritematoso sistêmico ou lúpus? Lúpus eritematoso sistêmico (LES) é uma doença inflamatória crônica, sistêmica, de etiologia multifatorial, que acomete vários órgãos ou sistemas. Caracteriza-se pelo desequilíbrio do sistema imunológico, com presença de auto-anticorpos dirigidos principalmente contra antígenos nucleares, alguns dos quais participam da lesão tecidual imunologicamente mediada. Existe um variado espectro de apresentação clínica, tem evolução crônica, com fases de exacerbações e períodos de remissões. Embora tenha um grande predomínio em mulheres em idade fértil, o LES pode acometer indivíduos de ambos os sexos e de diversas faixas etárias. 2 - Qual a etiologia do lúpus eritematoso sistêmico (LES)? A etiologia do LES é multifatorial e envolve predisposição geneticamente determinada associada a diversos fatores ambientais. Agentes infecciosos (como o Epstein-Barr vírus), algumas drogas (procainamida, hidralazina, hidrazida etc.), radiação ultravioleta (luz solar) e fatores hormonais (aumento da relação estrógeno/andrógeno) são alguns dos fatores reconhecidos como possíveis desencadeantes da doença. 3 - Qual a patogenia do lúpus eritematoso sistêmico (LES)? Quanto à patogenia, decorre principalmente de processo inflamatório desencadeado pela ação de imunocomplexos circulantes, ou que se formam in situ, e envolve sobretudo resposta imunológica humoral. O encontro dos auto-anticorpos com os respectivos antígenos leva a formação de imunocomplexos, que levam à ativação do sistema de complemento e conseqüente processo inflamatório. As citopenias no LES são devidas à ação de auto-anticorpos dirigidos contra antígenos de superfície de membranas celulares, favorecendo sua destruição pelo sistema retículoendotelial, além de possível ação de células imunocompetentes e citotoxicidade, causando lise celular. O paciente com LES apresenta distúrbios imunológicos caracterizados pela produção e falha na depuração de vários auto-anticorpos (auto-ac) patogênicos e imunocomplexos (IC). Déficit na depuração de material de células apoptóticas, propiciando situações em que antígenos próprios possam ser apresentados ao sistema imunológico é um dos mecanismos que possivelmente contribuem para a perda de tolerância imunológica que ocorre nesta doença. Não se conhecem as causas que ocasionam as anormalidades imunológicas, mas admite-se que deve haver uma interação entre múltiplos genes (que conferem susceptibilidade à doença) e fatores ambientais. Os imunocomplexos podem se depositar nos tecidos levando à resposta inflamatória e lesão tecidual, causando as manifestações clínicas que dependem do tecido acometido. Por sua vez, a lesão tecidual liberaria mais auto-antígenos favorecendo a perpetuação da resposta auto-imune. 4 - Quais as evidências da participação genética no lúpus eritematoso sistêmico (LES)? Algumas evidências sugerem a participação genética nesta doença: existe uma maior freqüência de casos de LES em famílias com um caso de lúpus ou de outra doença auto-imune em familiares de primeiro grau, quando comparada à população geral; os estudos em gêmeos mostram concordância para LES em 24% a 58% nos monozigóticos, contra 2% a 5% nos 1 Professora Titular da Disciplina de Reumatologia da Unifesp Escola Paulista de Medicina. 2 Médico assistente da Disciplina de Reumatologia da Unifesp Escola Paulista de Medicina.

dizigóticos; há maior prevalência de anticorpos antinucleares em familiares (mesmo assintomáticos) de pacientes com LES. Estudos de famílias com múltiplos casos de LES sugerem a existência de haplótipos associados a maior suscetibilidade à doença. A associação de LES com outras doenças reconhecidamente genéticas, como a deficiência de componentes do sistema de complemento, como C1q, C2 e C4, é outra evidência que aponta a participação genética. A deficiência genética de C1q é muito rara, entretanto, mais de 90% dos indivíduos com este gene de forma homozigótica desenvolvem LES. Até o momento, não há um único gene de suscetibilidade associado ao LES, mas, os estudos mais recentes mostram que há várias regiões de cromossomos que contêm genes de suscetibilidade ao LES. Parece que a ação aditiva de múltiplos genes confere maior suscetibilidade, mas também é importante a exposição a fatores ambientais. Além disso, há diversas linhagens de camundongos com alterações sugestivas de lúpus humano, entre as quais a mais conhecida e estudada é o cruzamento da linhagem NZB (New Zeland Black) e NZW (New Zeland White). A prole F 1 (NZB X NZW) desenvolve anticorpos antinucleares anti-dna nativo e falecem de insuficiência renal secundária a glomerulonefrite, sobretudo a do sexo feminino. Este modelo experimental de lúpus destaca a importância da genética nesta doença. 5 - O que é lúpus induzido por drogas (LID) e quais as drogas mais freqüentemente implicadas neste tipo de lúpus eritematoso sistêmico (LES)? O lúpus induzido por drogas é um subgrupo de pacientes que desenvolveram lúpus após exposição a um medicamento e cujas manifestações clínicas e laboratoriais desaparecem com a suspensão do mesmo. Nos EUA, estima-se que 10% dos casos de LES sejam induzidos por drogas. Embora muitas dezenas de drogas tenham sido descritas como possíveis indutoras de lúpus, muitas são apenas descrições de associação temporal esporádicas. As drogas mais freqüentemente causam o aparecimento de auto-anticorpos e menos freqüentemente ocasionam sinais e sintomas clínicos. Os principais medicamentos associados ao desenvolvimento de lúpus estão listados na tabela 1. Tabela 1. Drogas associadas ao desenvolvimento de lúpus Alto risco Médio risco Baixo risco Procainamida Quinidina Metildopa Hidralazina Captopril Acetabulol Clorpromazina Isoniazida Minociclina Carbamazepina Propiltiuracil D-penicilamina Sulfasalazina Estima-se que 15% a 20% de pacientes em uso crônico de procainamida e 5% a 10% dos usuários de hidralazina possam desenvolver LID. Pacientes com LID apresentam menor freqüência de comprometimento renal e neurológico e, geralmente, a pesquisa de anticorpos antinucleares mostra padrão homogêneo de fluorescência, com identificação de apenas um tipo de auto-anticorpo, que é dirigido principalmente contra a histona. Mais recentemente, vários casos de LID foram descritos associados ao uso de anti-hipertensivos como os inibidores da enzima conversora da angiotensina (captopril e enalapril), alguns dos quais associados a anticorpos anti-ro/ss-a e lesões cutâneas do tipo lúpus cutâneo subagudo. 6 - Qual a incidência e a prevalência do lúpus eritematoso sistêmico (LES)? A incidência da doença em estudos internacionais realizados nas últimas décadas tem variado de 3,7 a 5,5/100 mil habitantes. No único estudo realizado no Brasil, Vilar e Sato estimaram a incidência em 8,7/100 mil habitantes na cidade de Natal (RN), no ano de 2000. Embora não se

possa excluir influência genética, especula-se sobre a possível participação da radiação ultravioleta para justificar incidência tão alta de LES, pois a cidade de Natal tem um alto índice de exposição a ela. Quanto à prevalência, em estudos epidemiológicos realizados nos Estados Unidos, ela varia de 14,6 a 50,8 casos por 100 mil habitantes. 7 - Em que faixa etária o lúpus eritematoso sistêmico (LES) é mais freqüente? Em estudo multicêntrico realizado com a participação de diversos países latino-americanos, com a inclusão de 1.214 pacientes (Estudo GLADEL), foi encontrada média de idade de início dos primeiros sintomas atribuídos ao LES de 28 anos e média da idade do diagnóstico da doença de 30 anos. Estes dados são similares aos descritos na maioria dos estudos brasileiros com grande casuística. Contudo, em alguns estudos realizados na Europa, a média de idade por ocasião do diagnóstico foi mais alta, variando de 47 a 50 anos. Parece que o LES tem início mais precoce em pacientes de cor não branca. 8 - Quais são as outras características demográficas do lúpus eritematoso sistêmico (LES)? O LES tem distribuição universal. Acometendo indivíduos de ambos os sexos e de qualquer raça ou cor, entretanto, em estudos norte-americanos, sua prevalência é 3 a 4 vezes maior em mulheres negras que brancas. Quanto ao sexo, o LES é, de modo geral, mais prevalente na mulher, acometendo 10 a 12 mulheres para cada homem. O predomínio no sexo feminino ocorre em todas as faixas etárias, mas é menos marcante nas crianças e nos idosos. 9 - Por que o lúpus eritematoso sistêmico (LES) incide preferencialmente em mulheres? As doenças auto-imunes, em geral, acometem mais mulheres do que homens. A análise da incidência do LES nas diferentes faixas etárias em ambos os sexos mostra claramente que a doença incide principalmente nas mulheres em que há maiores níveis de hormônios femininos, entre os 15 e 45-50 anos de idade. Aumento da atividade da doença durante a gravidez e os relatos de casos de LES após uso de pílulas anticoncepcionais à base de estrógenos são algumas das evidências da participação de estrógenos nesta doença. Estudos com dosagens hormonais demonstraram níveis significativamente maiores de 16-hidroxiestrona e estriol em mulheres com LES do que em controles saudáveis. Níveis mais baixos de andrógenos também foram relatados em mulheres com LES, principalmente em fase ativa da doença. Além disso, estudos experimentais em F 1 (NZB X NZW) com castração das fêmeas mostraram que o desenvolvimento da doença auto-imune era postergada e a sobrevida aumentada, demonstrando nítida influência dos hormônios femininos como facilitadores da resposta autoimune neste modelo animal. 10 - Quais as manifestações clínicas mais freqüentes do lúpus eritematoso sistêmico (LES)? O LES é uma doença crônica, que evolui com períodos de atividade e períodos variados em que os pacientes ficam assintomáticos ou pouco sintomáticos. O comprometimento de diversos órgãos ou sistemas pode ocorrer de forma simultânea ou seqüencial. Os comprometimentos mais freqüentemente observados em pacientes com LES são: cutâneo: lesão em vespertílio, fotossensibilidade; lúpus cutâneo subagudo ou lesão discóide; articular: artralgia ou artrite; de serosas: pericardite ou pleurite; hematológico: leucopenia ou linfopenia; alterações do sedimento urinário, que podem ocorrer em mais de 50% dos pacientes, ao longo da evolução da doença. As queixas constitucionais como adinamia, mal-estar, fadiga, perda de peso e/ou febre também são freqüentemente observadas na fase ativa da doença. A febre pode ser baixa e contínua ou alta, em picos, e deve ser diferenciada de infecção intercorrente. A fadiga é uma queixa muito freqüente e inespecífica. A coexistência de fibromialgia deve ser lembrada em pacientes com fadiga e dor difusa, que não apresente outros sinais ou sintomas, nem alterações laboratoriais sugestivos de doença ativa. A perda de peso em pacientes com LES ativo geralmente é leve,

contudo, alguns casos de acentuado emagrecimento foram descritos, denominado caquexia lúpica. 11 - Como se faz o diagnóstico de lúpus eritematoso sistêmico (LES)? Sem manifestação clínica patognomônica ou teste laboratorial sensível e específico, o diagnóstico de LES é dificultado pelo pleiomorfismo de suas manifestações. Deve-se suspeitar deste diagnóstico em pacientes com manifestações características como lesões cutâneas típicas ou que apresentem comprometimento de múltiplos órgãos ou com queixas gerais, sem causa aparente. Mundialmente, utilizam-se os critérios propostos pelo American College of Rheumatology (ACR) para a classificação do LES, modificado em 1982 e 1997. A presença de 4 ou mais desses critérios tem sensibilidade e especificidade de 96% para o diagnóstico. Estes critérios são utilizados principalmente em estudos clínicos e, embora muitas vezes ajudem a fazer o diagnóstico, na prática clínica, algumas vezes, se faz o diagnóstico em pacientes que não preenchem os 4 critérios, desde que apresentem exames subsidiários específicos, na presença de manifestações sugestivas desta doença. De qualquer forma, como esta é uma situação mais rara, habitualmente utilizam-se os critérios de classificação de LES também para o diagnóstico, o que é de ajuda, principalmente se o médico não tiver grande experiência com a doença. Os critérios utilizados pelo ACR são: 1. Lesão discóide: placas eritematosas sobrelevadas, escamosas. Rolha folicular e cicatriz atrófica podem ocorrer em lesão mais antiga. 2. Eritema malar: eritema malar fixo, plano ou sobrelevado. 3. Artrite não-erosiva: evidenciada por dor, edema ou derrame articular em duas ou mais articulações. 4. Fotossensibilidade: erupção cutânea como reação à exposição solar, contada pelo paciente ou observada pelo médico. 5. Úlcera de mucosa oral ou nasal: úlcera em região oral ou nasofaríngea observado por médico. 6. Pericardite ou pleurite: pleurite caracterizada por história convincente de dor pleurítica ou atrito observado pelo médico ou evidência de derrame pleural; pericardite documentada por ECG, atrito ou evidência de derrame pericárdico. 7. Comprometimento neurológico: psicose ou convulsão na ausência de outra causa. 8. Comprometimento renal: proteinúria maior que 0,5 g/24h ou maior que 3+ ou cilindrúria anormal. 9. Comprometimento hematológico: anemia hemolítica, leucopenia (<4.000 células/mm 3 ), linfopenia (<1.500 linfócitos/mm 3 ) e/ou plaquetopenia (<100.000 mm 3 ). A leucopenia e a linfopenia devem ser observadas em mais de duas ocasiões e a plaquetopenia deve ocorrer na ausência de drogas que possam causá-la. 10. Anticorpo antinuclear positivo: qualquer padrão, em título considerado anormal para o método, na ausência de drogas que induzem lúpus. 11. Presença de anticorpo anti-sm ou anti-dna nativo ou anticorpos antifosfolipídeos (anticardiolipina IgG ou IgM, anticoagulante lúpico ou reação falso positiva para sífilis por pelo menos 6 meses). 12 - Quais as características do comprometimento articular no lúpus eritematoso sistêmico (LES)? A atrite de pequenas articulações das mãos, dos punhos e dos joelhos freqüentemente é simétrica, costuma ter caráter intermitente e é relatada em 60-70% dos pacientes ao longo da evolução da doença. Em 10% a 15% dos casos, a artrite pode ter evolução crônica, mas, caracteristicamente, não cursa com erosões ósseas. O comprometimento de tecidos periarticulares pode causar deformidades articulares, que quando reversíveis são denominadas artropatia de Jaccoud. Alguns pacientes desenvolvem artropatia erosiva, com fator reumatóide positivo, sendo classificados como síndrome de superposição entre LES e artrite reumatóide, denominada Rhupus, por alguns autores.

Queixas articulares, principalmente em ombros, quadril e joelhos, também podem ser causadas por necrose óssea avascular, encontrada em cerca de 10% a 22% dos casos e que geralmente ocorre em múltiplos sítios e está associada à atividade da doença e ao uso de corticosteróides em altas doses no ano anterior ao do diagnóstico de osteonecrose. 13 - Que tipo de comprometimento cutâneo o lúpus eritematoso sistêmico (LES) pode causar? Lesões cutâneas ocorrem em cerca de 80% dos pacientes com LES, ao longo da evolução da doença. Lesão em asa de borboleta ou vespertílio (50-60%) é caracterizada por ter início agudo, ser eritematosa, com localização em regiões malares e dorso do nariz. Outras lesões agudas são as lesões eritêmato-maculares, papulares ou maculopapulares, e as lesões bolhosas, também de localização preferencial em áreas expostas ao sol. As lesões do tipo lúpus cutâneo subagudo são pápulas eritematosas ou pequenas placas, de aspecto anular ou policíclico, lembrando eritema anular centrífugo ou as lesões da psoríase. Ocorrem principalmente nas áreas expostas ao sol. As lesões crônicas (discóides) costumam iniciar como pápulas ou placas eritematosas, que evoluem tornando-se espessadas e aderidas, com hipopigmentação central. Com a progressão da lesão, ocorre formação de rolha folicular, com cicatriz e atrofia central, acompanhadas de alterações discrômicas Elas se localizam preferencialmente em áreas expostas ao sol como a face, região do decote, dorso e membros superiores. A fotossensibilidade tem ocorrência variada (40-60%) e é muito freqüente no Brasil. Outras lesões cutâneas podem ocorrer no LES, mas não são específicas da doença, têm menor freqüência e incluem: lesões do tipo bolhosas, urticariformes, lesões pernióticas, lesões de mucosas e vasculíticas. 14 - Quais os tipos histopatológicos da nefrite lúpica? O envolvimento renal é caracterizado, segundo os critérios do American College of Rheumatology, pela presença de proteinúria acima de 0,5 g/24 horas e/ou cilindrúria anormal. Alteração do sedimento urinário e/ou proteinúria ocorre em cerca de 50% dos pacientes, ao longo da evolução da doença. Estima-se que cerca de 10% dos pacientes com glomerulonefrite proliferativa evoluam com insuficiência renal terminal após 5 anos, mesmo com tratamento adequado. Pior prognóstico é observado nas glomerulonefrites com componente proliferativo. A nefrite lúpica é classificada, segundo critérios da Organização Mundial da Saúde de 1982, em: tipo I:normal tipo II: glomerulonefrite mesangial o com depósito mesangial o com hipercelularidade mesangial tipo III: glomerulonefrite proliferativa focal ou segmentar tipo IV: glomerulonefrite proliferativa difusa tipo V: glomerulonefrite membranosa Além do tipo histológico, é importante saber se a lesão renal é ativa, portanto, passível de tratamento, ou crônica e irreversível: Índices de atividade: o hipercelularidade endocapilar o infiltrado leucocitário o necrose fibrinóide/cariorrex o crescentes celulares o depósito hialino subendotelial o infiltrado intersticial Índices de cronicidade o esclerose glomerular o crescente fibrosa o fibrose intersticial

o atrofia tubular Cada variável recebe escore zero (ausente) a 3, sendo que crescente celular e necrose/cariorrex são pontuadas em dobro. Dessa maneira, o escore máximo de atividade é 24 e o máximo de cronicidade é 12. A hipertensão arterial é uma complicação freqüente, sendo encontrada em cerca de 40% dos pacientes. 15 - Quais são os fatores associados a pior prognóstico renal na nefrite lúpica? Os fatores associados a pior prognóstico renal na nefrite lúpica são a presença de síndrome nefrótica, alto índice de cronicidade, hipocomplementemia, classe IV, anemia e hipertensão arterial. Cor negra e idade menor que 20 anos por ocasião do diagnóstico são descritos por alguns autores, mas não há consenso sobre associação deles com pior prognóstico renal. 16 - Quais alterações clínicas ou laboratoriais são indicativas de pior prognóstico em pacientes com nefropatia lúpica? Os trabalhos mostram que pacientes de cor negra, ou mestiços, têm pior prognóstico do que pacientes de cor branca, sugerindo possível influência genética. Entretanto, também foi demonstrado que baixo nível sócio-econômico e de escolaridade estava associado a pior prognóstico da nefrite lúpica, assim como o sexo masculino e idade mais jovem ao início do comprometimento renal. Outros preditores de pior prognóstico em pacientes com nefrite lúpica incluem: Aumento de creatinina Síndrome nefrótica Hipertensão arterial persistente Hematócrito baixo Hipocomplementemia Não remissão do quadro de nefrite após o primeiro ano de tratamento 17 - Quais são as manifestações hematológicas que podem ocorrer em pacientes com lúpus eritematoso sistêmico (LES)? A maioria dos casos de anemia no LES é do tipo normocrômica e normocítica, sendo atribuída à doença crônica e à atividade inflamatória da doença. Em menos de 15% dos casos a anemia é do tipo hemolítica auto-imune, podendo ser mais grave. Leucopenia e linfopenia são referidas em mais de 50% dos casos, ao longo da evolução da doença. Plaquetopenia grave, com menos de 30 mil plaquetas/mm 3 ocorre em menos de 10% dos casos. As plaquetopenias crônicas podem ser decorrentes da presença de anticorpos antifosfolípides e, geralmente, não costumam causar sangramento. Muito raramente, pancitopenia pode ocorrer por aplasia medular devido a mecanismos imunológicos. Devemos lembrar que pancitopenia também pode ser devida aos efeitos colaterais de drogas ou a infecção viral intercorrente. 18 - Quais as possíveis manifestações decorrentes do envolvimento do sistema nervoso central em pacientes com lúpus eritematoso sistêmico (LES)? O envolvimento do sistema nervoso central no lúpus é bastante pleiomórfico e ocorre em 24% a 59% dos casos. A grande variabilidade na porcentagem destas manifestações deve-se a diferentes métodos empregados para sua identificação. Por exemplo, a disfunção cognitiva leve é referida em mais de 70% quando se aplicam questionários mais sensíveis. A cefaléia pode ter diversas etiologias e para ser considerada causada pelo LES deve ser intensa, não responsiva a analgésicos de ação central e melhorar após corticoterapia. O Colégio Americano de Reumatologia classificou o comprometimento do sistema nervoso central devido ao LES em: estado confusional agudo, disfunção cognitiva, psicose, distúrbios do humor, distúrbios da ansiedade, cefaléia, doença cerebrovascular, mielopatia, distúrbios do movimento, síndromes desmielinizantes, convulsões e meningite asséptica.

Para que o envolvimento neurológico, sobretudo do sistema nervoso central, seja atribuído ao LES, deve-se excluir outras causas como o distúrbio metabólico ou hidroeletrolítico, efeito colateral de drogas e infecções.

19 - Que tipo de comprometimento do sistema nervoso periférico o lúpus eritematoso sistêmico (LES) pode causar? O LES pode causar neuropatia cranial, polineuropatia, plexopatia, mononeuropatia simples ou múltipla, polirradiculoneuropatia aguda inflamatória desmielinizante, distúrbio autonômico e miastenia gravis. Dentre estes, a polineuropatia é a manifestação mais freqüente. 20 - Quais as manifestações cardíacas que o lúpus eritematoso sistêmico (LES) pode causar? Pacientes com LES podem apresentar pericardite, miocardite e endocardite. Mais raramente pode haver vasculite de coronárias. Lembramos também que pacientes com LES apresentam aterosclerose mais freqüente e mais precoce do que a população geral. A pericardite é a manifestação mais comum, ocorrendo em cerca de 50% dos casos, ao longo da evolução da doença, mas pode ser assintomática em muitos casos. Muito raramente causa derrame pericárdico e tamponamento (<1%). A miocardite é uma das manifestações mais graves no LES e se apresenta por taquicardia, distúrbios de condução, dispnéia e aumento de área cardíaca, mas pode ser subclínica em muitos casos. Alterações valvares por espessamento de folhetos e a presença de vegetações verrucosas (endocardite de Libman-Sacks) estão associadas à presença de anticorpos antifosfolipídios e, raramente, podem levar à disfunção valvar. Doença arterial coronariana acomete mulheres com LES mais precocemente que mulheres da população geral. O risco de doença arterial coronária chega a ser 50 vezes maior em mulheres com LES, na faixa dos 35 a 44 anos de idade, segundo um estudo norte-americano. 21 - Com relação ao comprometimento pulmonar, o que o lúpus eritematoso sistêmico (LES) pode causar? As manifestações pulmonares do LES podem ser agudas ou crônicas. A pleurite é a mais comum de todas, ocorrendo em 30% a 60% dos casos e pode manifestar-se por dor torácica, atrito pleural e até derrame pleural, que geralmente é de pequeno volume, mas que pode ser muito grande, necessitando drenagem. As manifestações pulmonares agudas mais graves são a pneumonite e a síndrome de hemorragia alveolar. Na pneumonite aguda, o paciente apresenta tosse, dispnéia, febre e, ocasionalmente, hemoptise, além de infiltrado ou condensação pulmonar à radiografia, o que torna difícil o diagnóstico diferencial com pneumonia bacteriana. A síndrome de hemorragia alveolar, secundária a capilarite pulmonar, evolui com hemoptise e dispnéia, até insuficiência respiratória e é geralmente fatal, caso não seja tratada agressiva e precocemente. Felizmente esta última manifestação é bastante rara. A pneumopatia crônica com fibrose pulmonar apresenta evolução indolente e manifesta-se por dispnéia progressiva e tosse. A síndrome do pulmão encolhido é secundária à diminuição de volumes pulmonares, sem alteração de parênquima e geralmente não apresenta sintomas. A embolia pulmonar geralmente está associada à presença de anticorpos antifosfolipídios, mas a hipertensão pulmonar pode ocorrer independente do histórico de embolia pulmonar. 22 - O lúpus eritematoso sistêmico (LES) pode comprometer órgãos abdominais? O comprometimento abdominal pode ocorrer em raros casos, devido a vasculite, causando pancreatite, vasculite mesentérica ou isquemia intestinal. Hepatomegalia é descrita em 10% a 30% e esplenomegalia em 20% dos pacientes com a doença em atividade. Inflamação aguda do peritônio pode causar dor abdominal e ascite asséptica, podendo muito raramente evoluir com peritonite crônica. As queixas de epigastralgia em pacientes com LES são devidas, mais freqüentemente, à gastrite medicamentosa.

23 - O lúpus eritematoso sistêmico (LES) pode causar comprometimento ganglionar? Aumento de linfonodos pode ser encontrado em cerca de 40% dos pacientes com LES em atividade. Geralmente há acometimento de múltiplos gânglios, com linfoadenomegalia discreta, indolor e não-aderente, ocorrendo em região cervical ou axilar. Eventualmente, pode ocorrer adenomegalia importante, podendo cursar com necrose inflamatória central não-caseosa. A biópsia é impositiva nestes casos, para se fazer o diagnóstico diferencial com causas infecciosas como tuberculose ganglionar, com doença linfoproliferativas e com sarcoidose. 24 - Qual comprometimento vascular pode ser encontrado em pacientes com lúpus eritematoso sistêmico (LES)? O fenômeno de Raynaud é referido em 20% a 40% dos casos e geralmente ocorre na fase ativa da doença. Geralmente ocorre em extremidades, sobretudo nas mãos e pés. Processo inflamatório acometendo a parede arterial (vasculite) em pacientes com LES costuma ocorrer em capilares, arteríolas e artérias de pequeno calibre, afetando sobretudo mucosa oral ou nasal e polpas digitais. Vasculite acometendo artérias de médio calibre podem ocorrer mais raramente e ocasionam úlceras isquêmicas, necrose digital ou isquemia visceral. Lembramos que as isquemias cutâneas ou viscerais também podem ser decorrentes de fenômenos tromboembólicos, devidos a anticorpos antifosfolípides, na ausência de inflamação vascular. A vasculite de coronárias é uma ocorrência muito rara. Na maioria dos pacientes com LES e coronariopatia isquêmica, a lesão coronária deve-se à aterosclerose, mesmo em indivíduos jovens. 25 - Quais exames subsidiários devem ser solicitados em paciente com suspeita de lúpus eritematoso sistêmico (LES)? Além dos exames imunológicos, como anticorpo antinuclear, anticorpo antifosfolípides e dosagem de complemento, nos pacientes com suspeita clínica de LES, deve-se solicitar hemograma com contagem de plaquetas e exame de urina, pois os comprometimentos hematológico e renal muitas vezes não causam alteração ao exame clínico, sendo diagnosticados com estes exames. Em avaliação de pacientes com LES em fase ativa da doença, além destes exames, é necessário se fazer avaliação da função renal e hepática. Nos pacientes com proteinúria, é interessante fazer sua quantificação, com a proteinúria de 24 horas e dosagem de albumina sérica. A velocidade de hemossedimentação, geralmente, está elevada em pacientes com processo inflamatório sistêmico, mas, é um exame inespecífico e pode estar normal em pacientes com atividade restrita a determinados órgãos. A proteína C reativa geralmente está pouco elevada ou normal em pacientes com LES em atividade. Quando muito elevada, obriga-nos a procurar infecção intercorrente. Os exames de imagens e testes funcionais como eletrocardiograma, ecocardiograma, radiografia de tórax, tomografia computadorizada, ressonância nuclear magnética cerebral, eletroneuromiografia, exame do líquido cefalorraquidiano, e outros devem ser solicitados na suspeita de comprometimento dos órgãos a serem examinados. 26 - Qual o valor de um exame de anticorpo antinuclear positivo? Anticorpo antinuclear (AAN) pesquisado por imunofluorescência indireta, utilizando células HEp2 como substrato, é positivo em cerca de 95% a 98% dos pacientes com LES em fase ativa da doença. Entretanto, este anticorpo não tem especificidade, podendo ser positivo em diferentes porcentagens em muitas outras doenças reumáticas como a artrite reumatóide, a síndrome de Sjogren, a doença mista do tecido conjuntivo e a esclerose sistêmica progressiva. Além disso, é positivo em diversas outras doenças auto-imunes como na tiroidite de Hashimoto e na hepatite auto-imune e até em indivíduos normais.

Assim, anticorpos antinucleares somente devem ser valorizados na presença de manifestações clínicas compatíveis com LES. Em paciente com suspeita de LES, a negatividade do AAN pode ocorrer por três razões: o exame está errado, a suspeita diagnóstica está errada, portanto outros diagnósticos devem ser procurados, trata-se de um raro caso LES com AAN negativo (menos de 5% dos casos de LES). 27 - Anticorpos antinucleares podem ser positivos em indivíduos assintomáticos? Sim, AAN foram encontrados em indivíduos assintomáticos e aparentemente saudáveis em cerca de 13%. Os padrões de fluorescência mais freqüentemente encontrados nestas situações foram o pontilhado fino denso e o pontilhado fino. Embora a maioria destas pessoas apresentasse títulos de AAN considerados baixos (até 1/80), alguns indivíduos assintomáticos apresentaram títulos bastante elevados de AAN com padrão pontilhado fino denso, mostrando que este padrão de AAN não tem especificidade e nem deve ser valorizado na ausência de manifestações clínicas compatíveis com LES. 28 - Qual a diferença da pesquisa de anticorpo antinuclear por imunofluorescência indireta e por ELISA? Qual método é melhor? Tradicionalmente a pesquisa de AAN é feita por imunofluorescência, mas o exame deve ser feito por examinador afeito à técnica e com experiência. A técnica de ELISA tornou a pesquisa menos dependente do examinador, entretanto, para que se possa valorizar o resultado, é necessário que o substrato utilizado seja puro, livre de contaminações. A técnica de ELISA aumentou muito a sensibilidade, mas o teste perdeu em especificidade. 29 - Quais auto-anticorpos são considerados específicos do lúpus eritematoso sistêmico (LES)? Anticorpos anti-dna nativo Pesquisado por imunofluorescência indireta tendo como substrato a Crithidia luciliae, ou pela técnica de FARR, é considerado específico para LES, entretanto sua sensibilidade é baixa (50% a 60% em doença ativa). O uso de técnica de enzimaimunoensaio (ELISA) tem maior sensibilidade, mas menor especificidade, pois depende do kit utilizado. Anticorpos anti- DNAnativo são considerados um dos parâmetros de atividade do LES. Anticorpos anti-sm Pesquisados por imunodifusão dupla ou hemaglutinação também são considerados específicos do LES, mas sua sensibilidade é de apenas 30%. A técnica de ELISA também aumentou sua sensibilidade, mas diminuiu a especificidade. Anticorpo anti-p ribossomal e anti-pcna Também são considerados específicos do LES, mas sua prevalência é muito baixa (menos de 10%). 30 - O que são anticorpos antinucleossomos e quais os seus valores? Nucleossomo é uma estrutura que faz parte da cromatina do núcleo da célula, sendo composto por um segmento de DNA, envolvido por octâmero de histonas. Anticorpos antinucleossomos têm sensibilidade de 86% e especificidade 95% para LES. Alguns estudos demonstraram que os níveis séricos de anticorpos antinucleossomos flutuam de acordo com a atividade da doença, especialmente em pacientes com nefrite lúpica. Como eles são mais prevalentes que anticorpos anti-dna nativo, têm se tornado um novo marcador imunológico do LES, auxiliando no diagnóstico e também na monitoração de atividade da doença. 31 - Qual o significado da hipocomplementemia em pacientes com lúpus eritematoso sistêmico (LES)? A dosagem do complemento sérico pode auxiliar no monitoramento da atividade do LES. Em fases da atividade da doença, observa-se consumo do complemento e conseqüente diminuição dos níveis de componentes da via clássica (p. ex. C2, C4) e da via alternativa (p. ex. C3), que se normalizam quando a doença entra em remissão. A dosagem do complemento também

auxilia na diferenciação entre atividade renal e pré-eclâmpsia em gestante com LES, pois nesta última os níveis séricos de complemento são normais. Deficiência geneticamente determinada de componentes do complemento é rara, mas é uma das condições associadas a maior predisposição para o desenvolvimento de LES ou de uma síndrome lúpus-símile. As deficiências de complemento mais freqüentemente associadas ao LES são de C1q, de C2 e de C4. Esta condição deve ser suspeitada quando o paciente persistir com níveis baixos de apenas uma das frações do complemento, apesar da doença estar em fase inativa. Embora deficiência de C1q seja muito rara, pacientes com esta deficiência de forma homozigótica têm chance de mais de 90% de desenvolver LES. 32 - Qual o tratamento para o lúpus eritematoso sistêmico (LES), de um modo geral? O tratamento do LES deve abordar orientações gerais que inclui também a educação do paciente sobre a doença e sua evolução. É importante frisar que o tratamento adequado, na grande maioria dos casos, permite uma vida longa, produtiva e com boa qualidade. Um seguimento médico periódico, com boa aderência ao tratamento, é muito importante para a evolução da doença e seu prognóstico. Orientações gerais Proteção solar Evitar exposição solar, usar protetor solar com FPS maior que 15. Mais importante do que utilizar bloqueadores solar com alto fator de proteção é o hábito de repassar o protetor, cuja ação não protege o paciente por mais do que três ou quatro horas. Dieta Balanceada e rica em cálcio, para prevenção de osteoporose, dislipidemia e obesidade. Restrição calórica é importante para pacientes com sobrepeso e principalmente quando em uso de altas doses de corticosteróides. Nestes casos, a diminuição de ingestão de sal pode diminuir a retenção hídrica devido à ação dos corticosteróides. Atividade física Pode ser necessária sua restrição em pacientes na fase muito ativa da doença. Após o controle da fase inflamatória, deve-se estimular atividade física regular, para melhorar o condicionamento cardiovascular, manter o trofismo muscular e prevenir a diminuição da massa óssea e o desenvolvimento de doenças cardiovasculares. Tabagismo Evitar ou eliminar o tabagismo. Tratamento adequado de hipertensão arterial Os inibidores da enzima conversora da angiotensina são os anti-hipertensivos de eleição, desde que não haja contra-indicação para seu uso. Glicemia Controle rigoroso da glicemia nos pacientes com hiperglicemia, para prevenir doença cardiovascular. Tratamento de dislipidemia Se as medidas dietéticas e o exercício não conseguirem controlar a dislipidemia, deve-se adicionar estatinas, mantendo níveis de LDL-c, se possível, abaixo de 100 mg/dl. 33 - Quais as bases do tratamento medicamentoso no lúpus eritematoso sistêmico (LES)? O tratamento medicamentoso deve ser avaliado para cada paciente e dependerá dos órgãos ou sistemas acometidos, assim como da gravidade desses acometimentos. A medicação deverá ser orientada para o tratamento do comprometimento mais grave. É muito importante o diagnóstico diferencial ou de concomitância de processo infeccioso.

Há indicação de antimaláricos a todos os pacientes com diagnóstico de LES, desde que não haja contra-indicação, com a finalidade de reduzir a atividade da doença e a necessidade de corticosteróide (efeito poupador de corticoesteróides). Trabalhos mostram também um efeito adicional benéfico dos antimaláricos no controle da dislipidemia (o uso concomitante de antimalárico diminui a hipercolesterolemia que costuma ocorrer com o uso de corticoesteróides), além da ação antiagregante plaquetária que pode ser mais relevante em pacientes com anticorpos antifosfolípides positivos, que apresentam maior tendência à hipercoagulabilidade. 34 - Qual o tratamento para as lesões cutâneas do lúpus eritematoso sistêmico (LES)? Lesões cutâneas localizadas podem ser tratadas com corticosteroides tópicos associados aos antimaláricos (4 mg/kg/dia de difosfato de cloroquina ou 6 mg/kg/dia de hidroxicloroquina). Deve-se evitar corticosteróides fluorados em face, devido à possibilidade de atrofia cutânea. Como a retinopatia pela hidroxicloroquina é menos freqüente do que com a cloroquina, esta é a medicação preferencial. Entretanto, a cloroquina tem menor custo, razão pela qual continua sendo muito utilizada em nosso meio. Infiltrações com corticosteróides podem ser feitas quando as lesões forem pouco extensas e não disseminadas. Nas lesões muito exuberantes, ou quando não houver resposta aos antimaláricos, utiliza-se prednisona em doses menores que 0,5 mg/kg/dia. Nos pacientes com lesões cutâneas refratárias a essa terapêutica, podem ser utilizados o metotrexato (10 a 15 mg/semana), azatioprina (1-2 mg/kg/dia) ou talidomida (100-200 mg/dia, permitida somente em pacientes sem qualquer risco de gravidez). Outra opção para pacientes que não podem utilizar antimaláricos é a clofazimina na dose de 100 mg/dia. A dapsona (100 mg/dia) pode ser prescrita a pacientes com lesões bolhosas devido ao lúpus. O manejo destas drogas requer o conhecimento dos possíveis efeitos colaterais e deve ser feito por médico habituado ao seu uso. Evitar exposição à luz ultravioleta e a utilização de fotoprotetores são obrigatórios. 35 - Como tratar a artropatia do lúpus? A artrite pode ser tratada com antiinflamatórios não-hormonais (AINH) ou inibidores específicos de COX-2, desde que não haja contra-indicação para seu uso. Evitar o uso desses medicamentos em pacientes com nefrite e hipertensão arterial ou com comprometimento da função renal. Nos casos não-responsivos, pode-se utilizar prednisona em doses baixas (7,5 a 15 mg/dia). Em pacientes com artrite crônica ou artrite recidivante, deve-se utilizar antimaláricos ou metotrexato, para poupar corticosteróides. Nas monoartrites ou oligoartrites crônicas, a infiltração intra-articular com triancinolona hexocetonida tem mostrado bons resultados. É necessário lembrar que o comprometimento articular em pacientes com LES pode ser causado por necrose óssea asséptica ou infecção, situações que necessitam de outras terapêuticas. Embora a artrite do lúpus não cause erosões, o comprometimento de ligamentos e cápsulas pode levar a deformidade e incapacidade importante em alguns pacientes. Frouxidão ligamentar também pode estar associada ao uso de corticosteróides. 36 - Qual o melhor tratamento para a nefrite lúpica? Em pacientes com glomerulonefrite proliferativa lúpica com comprometimento da função renal, o tratamento com ciclofosfamida na forma de pulsoterapia ainda é considerado a melhor opção terapêutica. A imunossupressão deve ser mantida por tempo prolongado (pelo menos 1 ano após controle do processo inflamatório), pois o uso por tempo curto está associado a maior chance de recidiva. Em razão dos efeitos colaterais do uso crônico de ciclofosfamida, na última década há diversos estudos propondo indução de remissão da nefrite com ciclofosfamida e manutenção com drogas imunossupressoras menos agressivas, como a azatioprina ou o micofenolato mofetil.

Pacientes cujo comprometimento renal não seja acompanhado de perda de função renal e com maiores riscos de efeitos colaterais, sobretudo a infertilidade, podem, alternativamente, serem tratados desde o início com micofenolato mofetil na dose de 2 a 3 g/dia. O tratamento destes casos deve ser feito por especialista, habituado ao uso destas drogas e ao tratamento de pacientes com nefrite lúpica, pois mesmo tratados adequadamente 10% a 15% destes pacientes evoluem com perda definitiva da função renal. 37 - Quando se deve encaminhar pacientes com lúpus eritematoso sistêmico para o reumatologista? Pacientes com LES com manifestações mais leves podem ser tratados por clínicos gerais ou por outros especialistas. Pacientes com comprometimento mais grave de determinado órgão ou sistema pode ser tratado pelo especialista da área, mas é recomendável que também seja acompanhado pelo reumatologista, que tem melhor noção das possíveis complicações que podem surgir, assim como dos efeitos colaterais das drogas necessárias para o manejo da doença. O ideal seria que o reumatologista seguisse estes pacientes e contasse com a colaboração de outros especialistas à medida que forem surgindo comprometimentos mais graves e que venha a necessitar de avaliação ou tratamento específico. 38 - Por que a gestação em pacientes com lúpus eritematoso sistêmico (LES) deve ser considerada de alto risco? A gravidez em pacientes com LES deve ser considerada de alto risco pela possibilidade de atividade da doença durante a gestação ou o puerpério, sobretudo se engravidar com a doença em atividade. A gestação de pacientes com LES requer seguimento por profissionais (reumatologistas e obstetras) habituados a tratar esses casos. A gravidez deve ser contra-indicada em pacientes com doença sistêmica ativa, perda da função renal (creatinina > 1,5 mg/dl), hipertensão arterial grave, insuficiência cardíaca ou pulmonar ou comprometimento neurológico grave. Pacientes com comprometimento renal prévio ou com anticorpos antifosfolípides têm risco aumentado de desenvolver doença hipertensiva da gravidez e pacientes com anticorpos anti-ro/ss-a têm maior risco de terem filhos com lúpus neonatal. Pacientes com anticorpos antifosfolípides podem ter abortamentos, retardo do crescimento fetal e óbito intrauterino, devido a menor fluxo sangüíneo para o feto em conseqüência de trombose ou espasmo de vasos placentários. Feto de baixo peso e prematuridade ocorrem na maioria dos casos de gravidez em mulheres com LES, portanto, um adequado atendimento neonatal é fundamental para o bom prognóstico dos recém-nascidos. 39 - Que métodos anticoncepcionais são mais indicados para pacientes com lúpus eritematoso sistêmico (LES)? O método mais indicado é o de barreira, mas este requer colaboração do parceiro. Para evitar o uso de anticoncepcionais à base de estrógenos, recomenda-se os anticoncepcionais à base de progestágenos. O dispositivo intra-uterino está contra-indicado em pacientes com plaquetopenia e em uso de altas doses de corticoesteroides e/ou de imunossupressores, devido ao risco de sangramento e de infecção. 40 - Pacientes com lúpus eritematoso sistêmico (LES) podem fazer reposição hormonal? Recentemente, foi publicado estudo controlado com seguimento de um ano, comparando mulheres com LES com e sem reposição hormonal com estrógeno e progesterona. Neste estudo, não foi encontrada diferença significante no número de atividade grave da doença entre os dois grupos. Entretanto, o número de atividade leve e moderada foi significativamente maior no grupo com terapia de reposição hormonal (TRH). Embora pacientes com anticorpos antifosfolpidies tenham sido excluídos do estudo, foi observado um óbito, um acidente vascular encefálico e 3 episódios trombóticos no grupo com TRH e apenas um caso de tromboembolismo no grupo controle. Em conclusão, a TRH pode ser prescrita para pacientes com LES controlado e que tenha benefício a ela. Não deve ser prescrita para pacientes com anticorpos antifosfolípides.

41 - Quais os efeitos colaterais do uso crônico de corticosteróides em pacientes com lúpus eritematoso sistêmico (LES) e como minimizar estes efeitos? O uso crônico de corticosteróides causa muitos efeitos colaterais, que dependem da dose e da potência da substância utilizada, da existência de co-morbidades e da resposta de cada pacientes. Os principais são: estéticos: aumento de peso, estrias, aumento centrípeto de gordura, fácies em lua cheia, atrofia cutânea e fragilidade capilar; metabólicos: hiperglicemia, dislipidemia, retenção de sódio e perda de potássio e mais raramente hipocalcemia; ósseo: osteopenia e osteoporose, aumento do risco de necrose óssea avascular, aumento da fragilidade ligamentar e capsular; infecção: aumento de risco de infecções; muscular: miopatia por atrofia de fibras do tipo II; neurológico: labilidade emocional, ansiedade, tremor de extremidades e psicose por corticóide; ocular: catarata sub-capsular, aumento da pressão ocular; retenção de líquido e hipertensão arterial; cardíaco: aumento do risco de desenvolver doença aterosclerótica. 42 - Como minimizar os efeitos colaterais do uso crônico de corticosteróides em pacientes com lúpus eritematoso sistêmico (LES)? Para minimizar estes efeitos recomenda-se: Dieta hipossódica, com baixo teor de gordura e hipocalórica, quando indicada. Estimular atividade física regular. Reposição de potássio. Controle da dislipidemia com drogas hipolipemiantes, principalmente as estatinas, quando indicado. Cálcio e vitamina D, desde que não haja contra-indicação para seu uso. Controle rigoroso de todos os fatores de risco tradicionalmente associado às doenças coronárias. Controle oftalmológico periódico. Controle de densitometria óssea, para tratamento com bisfosfonatos, caso seja constatado osteopenia em paciente usuário crônica de prednisona em dose maior ou igual a 7,5 mg ao dia. 43 - Quais os principais efeitos colaterais dos imunossupressores mais freqüentemente usados em pacientes com lúpus eritematoso sistêmico (LES)? Os imunussupressores, de modo geral, aumentam o risco de infecções e a maioria causa toxicidade medular. A ciclosporina é o único imunossupressor que não está associado a toxicidade medular, mas pode causar nefrotoxicidade, com aumento dos níveis de creatinina, aumento de pressão arterial, hipertricose e hipertrofia gengival. A ciclofosfamida está associada a risco aumentado de infertilidade e esterilidade devido à insuficiência gonadal e a risco de desenvolver cistite hemorrágica, câncer de bexiga e doença linfoproliferativa, sobretudo em pacientes com uso por tempo prolongado e em doses altas. Também pode causar queixa gastrintestinal no dia da aplicação e nos dias subseqüentes à aplicação endovenosa. Mais raramente pode ocorrer mucosite e diarréia O risco de insuficiência ovariana está associado à dose e à idade da pacientes por ocasião do uso de ciclofosfamida. Alterações da espermatogênese são independentes da idade do paciente. A azatioprina pode causar mielotoxicidade, freqüentemente evidenciada por leucopenia, intolerância gastrintestinal, reação alérgica, hepatotoxicidade e mais raramente pancreatite em pacientes com LES. O uso concomitante de alopurinol diminui seu metabolismo, aumentando muito a toxicidade da azatioprina.

O uso de imunossupressores deve ser realizado por médicos afeitos ao manejo do mesmo, conhecedor dos possíveis efeitos colaterais e das condutas para reduzir estes riscos. 44 - Qual a conduta em paciente com síndrome antifosfolípide secundário ao lúpus eritematoso sistêmico (LES)? Nos pacientes que apresentam apenas anticorpos antifosfolípides sem histórico de tromboses, orienta-se prevenção primária de eventos trombóticos com ácido acetilsalicílico (100 mg/dia), associado a hidroxicloroquina. Outros fatores de risco para trombose, como fumo, imobilização prolongada, uso de estrógenos, também devem ser evitados ou corrigidos neste grupo de pacientes. Pacientes que apresentaram trombose venosa, arterial e/ou microangiopatia trombótica devem receber anticoagulante oral por tempo prolongado, ajustando o RNI entre 2-3. Exceção feita para pacientes com acidente vascular cerebral isquêmico, mas sem trombose venosa, nos quais indica-se o uso de ácido acetilsalicílico (325 mg/dia) e tratamento de fatores de risco para doença cardiovascular (p. ex. hipertensão arterial, dislipidemia, tabagismo). Pacientes com LES e histórico de abortos de repetição, perda fetal ou parto prematuro por préeclampsia ou eclampsia, com anticorpos antifosfolípides que engravidarem devem receber ácido acetilsalicílico (100 mg/dia) e heparina não-fracionada (5.000 UI 12/12 horas) ou heparina de baixo peso molecular. Todavia, aquelas pacientes que já utilizam anticoagulante oral, devem mudar para heparina não fracionada (10.000 UI de 12/12 horas) ou heparina de baixo peso molecular em doses terapêuticas, assim que o teste de gravidez for positivo, pois anticoagulante oral é teratogênico. 45 - Qual o prognóstico e qual a sobrevida de pacientes com lúpus eritematoso sistêmico (LES)? O prognóstico de pacientes com LES tem melhorado muito nas últimas décadas. Estudos publicados na década de 90 mostram sobrevida variando de 88% a 93% em 5 anos e 76% a 85% em 10 anos nos grandes centros de países desenvolvidos. Em uma grande cidade canadense, a sobrevida de 20 anos chegou a 68%. Entretanto, neste mesmo período, estudos de sobrevida em 5 anos realizados na Índia e em Curaçao mostraram sobrevida estimada em 77% e 56%, respectivamente, mostrando que a sobrevida depende muito da assistência médica oferecida a esses pacientes e/ou de fatores genéticos. No Brasil, devido à heterogeneidade do nível de assistência médica oferecida à população, estima-se que a sobrevida também seja muito variável. As causas de óbito nos primeiros 5 anos de doença continuam sendo: atividade de doença, principalmente a renal e a neurológica, e, sobretudo, as infecções intercorrentes. Mesmo em pacientes que falecem devido à infecção, a atividade da doença pode ser um importante fator contribuinte para o óbito e vice-versa. Em pacientes com mais tempo de doença, a aterosclerose vem se tornando importante causa de mortalidade, principalmente em países desenvolvidos, mostrando a necessidade de controlar fatores tradicionalmente associados a risco de doença coronária, como a hipertensão arterial, diabetes mellitus, obesidade e dislipidemia, sobretudo LDL-c elevado e HDL baixo. Em estudo realizado no estado de São Paulo, analisando atestados de óbitos dos últimos 20 anos, em que constava LES como causa básica de morte, observamos que 83% dos óbitos ocorreram antes dos 50 anos de idade, mostrando que em nosso meio, infelizmente, esta doença continua causando óbito principalmente em mulheres jovens. 46 - Leitura recomendada Treatment of proliferative lupus nephritis--a critical approach. Buhaescu I, Covic A, Deray G. Semin Arthritis Rheum 2007;36:224-237.