A PEDAGOGIA DA ALTERNÂNCIA NO PROJOVEM CAMPO EM MINAS GERAIS: DESAFIOS E PERSPECTIVAS

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Transcrição:

A PEDAGOGIA DA ALTERNÂNCIA NO PROJOVEM CAMPO EM MINAS GERAIS: DESAFIOS E PERSPECTIVAS EIXO TEMÁTICO: Pesquisa, Políticas Públicas e Direito à Educação RESUMO Nesse artigo, decorrente do Programa de Estudos Novas Faces da Pedagogia da Alternância na Educação do Campo, nosso propósito é caracterizar o Programa Projovem Campo em Minas Gerais e analisar as representações sociais sobre a Alternância construídas pelos (as) educadores (as) coordenadoras e professores (as) do Programa. Ancorados nos pressupostos teórico-metodológicos da pesquisa qualitativa, para a coleta de dados combinamos a análise documental, o questionário e a entrevista semi-estruturada. As informações obtidas foram analisadas na perspectiva do Método de Análise de Conteúdo. No conjunto, os (as) educadores (as) expressam uma representação comum da alternância como uma proposta pedagógica inovadora orientada para valorização do (a) educando (a) como protagonista do processo de ensino e aprendizagem. Indicam ainda sua dimensão social, tanto pela valorização dos (as) educandos (as) como sujeitos sociais, quanto pela sua contribuição para o desenvolvimento de práticas de geração de renda e de melhoria de seus processos produtivos. Nesse aspecto, os resultados da pesquisa também revelam que a alternância é valorizada por estimular um sentimento de pertença dos (as) educandos (as) em relação aos seus espaços de vida, contribuindo para motivar a permanência do (a) jovem no campo. Palavras- Chave: Educação do Campo. Pedagogia da Alternância. ProJovem Campo- Saberes da Terra. 1 INTRODUÇÃO O ProJovem Campo - Saberes da Terra, Programa Nacional de Educação é um programa destinado a jovens agricultores (as) familiares e foi instituído no ano de 2007 pelo Ministério da Educação, no âmbito da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade, a partir de duas políticas de Estado: a Política Nacional de Juventude e a Política de Educação do Campo. A insuficiência de programas específicos de educação dos povos que vivem e trabalham no campo é reconhecida atualmente pelo Estado como um problema social, consequência do abandono e descuido com que o meio rural tem sido tratado historicamente em nossa sociedade, principalmente no que diz respeito às questões sociais, dentre elas a educação. O reconhecimento dessa dívida social tem mobilizado diversos movimentos sociais e sindicais do campo, na luta e reivindicação de políticas públicas voltadas para essa parcela da população brasileira. Assim, as ações que têm buscado redefinir o contorno de uma educação que atenda as necessidades educacionais da diversidade de sujeitos coletivos do campo

não são simplesmente uma iniciativa dos órgãos públicos; elas são, sobretudo, fruto da ação dos movimentos organizados que lutam pelo direito à educação. Um desses programas é o ProJovem Campo - Saberes da Terra que, como uma política de Educação do Campo, constituiu objeto de nosso estudo. Destinado a jovens agricultores (a) familiares que não concluíram o ensino fundamental, com faixa etária compreendida entre 18 e 29 anos, o Programa tem como objetivo proporcionar a conclusão do ensino fundamental, a inserção social e a qualificação profissional desses (as) jovens. Em sua organização formativa, o ProJovem Campo Saberes da Terra assume a Pedagogia da Alternância como matriz pedagógica de organização dos tempos e espaços para a realização do processo de ensino e aprendizagem. Historicamente a Pedagogia da Alternância encontra-se presente na sociedade Brasileira desde 1968, destinada a formação de jovens no meio rural [...] em duas vertentes organizacionais: as Escolas Família Agrícola (EFAs) e as Casas Familiares Rurais (CFRs) (SILVA, 2003, p. 11). Entretanto, se as origens da alternância nos Centros Familiares de Formação por Alternância são remotas em nossa sociedade, a sua adoção em programas e políticas governamentais é um fenômeno recente no cenário educacional. Surge desse contexto a importância de destacar, na atualidade educacional do campo, o Projovem Campo Saberes da Terra como um dos Programas que tem assumido como matriz pedagógica a Pedagogia da Alternância. Foi no contexto de implantação do ProJovem em Minas Gerais, particularmente no âmbito das ações de formação dos educadores para atuação na Pedagogia da Alternância, que se inscreveu nossa investigação, que teve como objetivo identificar e analisar as representações sociais de alternância construída pelos (as) educadores (as) do Programa. Nosso propósito nesse artigo é caracterizar o Programa Projovem Campo em Minas Gerais e analisar as representações sociais sobre a Alternância construídas pelos (as) educadores (as) coordenadoras e professores (as) no Programa. Para a coleta dos dados da pesquisa, além da pesquisa documental e da realização de contatos com representantes da Secretaria Estadual de Educação de Minas Gerais, participamos de dois Encontros de Formação de Educadores, em Belo Horizonte - MG, nos períodos de 03 a 07 de maio de 2010 e de 18 a 22 de outubro de 2010. No primeiro encontro, em maio de 2010 aplicamos um questionário visando a caracterização do perfil e da trajetória sócio-profissional dos (as) educadores (as). Esse questionário também subsidiou a definição da amostra que, posteriormente, foi composta por 30 educadores (as) atuantes no Programa desde sua implantação.

Do total de 106 educadores (as) que responderam o questionário, nossos dados revelaram que a maioria deles (as) é oriunda da rede pública estadual de ensino, sendo 62% do sexo feminino e 38% do sexo masculino. Do conjunto dos (as) respondentes, 93% informaram não ter nenhuma experiência anterior na Educação do Campo, enquanto 88% deles (as) responderam não ter nenhuma experiência anterior com movimentos sociais, contrariando as orientações do Projeto Base de que o fortalecimento da educação do campo na esfera pública pode ser obtida a partir das experiências concretas dos movimentos sociais (BRASIL, 2009, p. 2). Posteriormente, no encontro de formação dos (as) educadores (as) ocorrido em outubro de 2010 foram entrevistados (as) 30 educadores (as) com objetivo de identificar suas representações sociais sobre a Pedagogia da Alternância, assim como suas avaliações sobre a prática pedagógica do ProJovem Campo em Minas Gerais. As informações obtidas foram analisadas sob orientação do Método de Análise de Conteúdo (BARDIN, 1988). 2 DESENVOLVIMENTO 2.1 O ProJovem Campo Saberes da Terra em Minas Gerais Os princípios do ProJovem Campo Saberes da Terra em Minas Gerais, como em outros estados da federação, foram ancorados no Projeto Base proposto pelo MEC/SECAD (2009). Todavia, por recomendação do próprio Ministério da Educação, o Programa deveria assumir identidade própria, de acordo com a realidade regional e/ou perfil do público atendido. Sob essas orientações, o objetivo do ProJovem Campo em Minas Gerais foi o de promover a valorização da cultura e dos saberes dos povos do campo por meio de projetos educacionais que contemplassem as particularidades de um ensino comprometido com a construção da cidadania e a superação das desigualdades vividas por esses sujeitos sociais (FAE/UFMG, 2009). O estado de Minas Gerais, por intermédio da Secretaria Estadual de Educação (SEE), aderiu ao Programa Saberes da Terra em 2006, com o Projeto Piloto implementado nos seguintes municípios: Rio Pardo, Bocaiúva, Januária, Porteirinha e Montes Claros - todos municípios pertencentes à região Norte de Minas, região que apresenta historicamente um baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). Em 2009, com a ampliação do Programa no estado, 37 novos municípios foram incorporados ao ProJovem Campo Saberes da Terra. A partir da ampliação, o Programa teve como público alvo 3.200 jovens agricultores (as) familiares residentes em 96 municípios, dentre eles os 5 municípios participantes do Projeto Piloto. Das 3.200 vagas ofertadas, 1.344 seriam destinadas

aos municípios integrantes dos Territórios da Cidadania de Serra Geral e do Vale do Mucuri. Entretanto, o ProJovem Campo Saberes da Terra, implantado em agosto de 2009, ficou restrito a apenas 42 municípios. A distribuição geográfica das turmas do Programa, segundo a localização das macro-regiões mineiras, ficou assim representada: 30% no Vale do Jequitinhonha; 20% no Vale do Mucuri; 10% no Médio Rio Doce e na Zona da Mata; 40% no Norte e no Noroeste de Minas. 2.2 O Processo de Implantação do ProJovem Campo em Minas Gerais O Programa Nacional ProJovem Campo Saberes da Terra insere-se no contexto de políticas públicas para a Educação do Campo. Apesar de gestado no âmbito do MEC, foram a articulação e as demandas dos movimentos sociais e sindicais do campo que, em defesa de uma Educação do Campo, estiveram na origem de criação do Programa. Nesse contexto, o ProJovem foi concebido como uma forma de conseguir a interseção de ações entre o governo e os movimentos sociais (OLIVEIRA, 2008, p. 368). O planejamento e a organização do Projeto de Formação Continuada dos (as) Educadores (as) do ProJovem Campo Saberes da Terra teve início no primeiro semestre de 2009 e foi organizado em duas etapas: uma Etapa de Implementação e uma Etapa de Encadeamento, Conteúdos e Dinâmica de Atividades. Na primeira fase, Etapa de Implementação, foram realizadas diversas reuniões de trabalho e gestão para definição dos contornos e especificidades do Programa no estado, com a indicação de um trabalho compartilhado entre os parceiros do ProJovem Campo-Saberes da Terra: representantes da Secretaria Estadual de Educação, da Delegacia Regional do Ministério do Desenvolvimento Agrário, do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra, da Federação dos Trabalhadores da Agricultura de Minas Gerais, da Pastoral da Terra, da Universidade Federal de Viçosa, da Universidade Federal de Minas Gerais, do Centro de Formação Tecnológica de Januária, de grupos gestores dos Territórios Rurais e da Cidadania e da Rede Mineira de Educação do Campo. Nessa ocasião, foram estabelecidos acordos institucionais, planejamento das atividades e socialização das estratégias e dos princípios para a elaboração do Projeto Político-Pedagógico de Formação dos Educadores, ainda que em um clima de tensão e disputa em relação aos interesses dos movimentos sociais e o Estado. A segunda fase, Etapa de Encandeamento, Conteúdos e Dinâmica de Atividades, teve início em maio de 2010, com a formação dos (as) educadores (as) para atuarem no Programa. A proposta de formação foi organizada conjugando

diversas estratégias: Seminários regionais e estaduais, Oficinas de Diagnóstico, Oficinas de Formação Pedagógica e Temática, Visitas de Acompanhamento e Visitas de Formação em Serviço, que totalizavam 360 horas de formação, sendo 120 horas de formação no Tempo Comunidade, alternadas com 240 horas de formação no Tempo Escola. As atividades previstas para serem realizadas no Tempo Escola foram realizadas tanto em Belo Horizonte quanto nas regiões do estado. Por ocasião do Primeiro Seminário Estadual de Formação dos Educadores, particularmente no evento inaugural da Etapa de Encandeamento, Conteúdos e Dinâmica de Atividade, estiveram reunidos todos os parceiros e envolvidos na implantação do Programa em Minas Gerais, com destaque para os representantes de movimentos sociais e sindicais do campo, indicando uma possibilidade de construir o diálogo entre a sociedade civil organizada e o Estado. Todavia, essa presença e parceria ficou restrita aos primeiros encontros para elaboração da proposta pedagógica do Programa e ao evento em questão, não tendo tido continuidade nas atividades posteriores de formação dos (as) educadores (as). Assim, com o distanciamento e ausência de participação dos movimentos sociais e de organizações representativas de interesses da população do campo, o Programa tem sua continuidade, apesar desse limite e, com ele, a negação de um dos princípios fundantes do ProJovem Campo. Essa pode ser considerada uma primeira contradição do Programa em Minas Gerais. Segundo Freire (2009), a representatividade dos movimentos sociais e sindicais do campo no Programa tem na sua origem o compromisso governamental de assegurar a participação da sociedade civil na sua implantação e acompanhamento, constituindo, assim, um dos fundamentos do Projeto Político Pedagógico do ProJovem Campo, que prevê a interação dos sistemas de ensino com experiências acumuladas por entidades e movimentos sociais do campo. Freire também identifica que essa ausência e/ou silenciamento dos movimentos sociais não foi apenas em Minas Gerais, tendo sido identificado em outros espaços e momentos da formação dos educadores (as) do Projovem: [a]s vozes dos movimentos sociais nos Seminários Nacionais de Formação [de Educadores (as)] foram silenciadas como fonte histórica. Não há registros nos documentos que incorpore as contribuições dos movimentos no processo de debates, formulação (2009, p. 214). A autora constata que as ausências desses parceiros, em momentos distintos de implantação do Programa, acarretaram uma perda significativa na essência do ProJovem Campo, que propunha incorporar experiências exitosas de educação, realizadas em diversos territórios rurais. Nesse aspecto, as discussões e debates sobre o perfil dos educadores (as) foi um dos momentos no qual se explicitou, de maneira objetiva, as divergências de

opiniões e de propostas entre os parceiros do Programa. Assim, de um lado, enquanto os representantes de movimentos sociais e sindicais do campo e das instituições de ensino superior defendiam o direito desses (as) educadores (as) serem alunos (as) dos cursos de Licenciatura em Educação do Campo e/ou educadores (as) ligados a movimentos e organizações sociais do campo - e se possível com indicação dos próprios movimentos e organizações -, de outro, a Secretaria Estadual de Educação tinha como proposta que tais educadores (as) fossem oriundos do seu quadro de profissionais, sem nenhuma exigência de vínculo com o campo e/ou com a Educação do Campo. Após intensos debates e discussões em torno desse perfil e processo de contratação dos (as) educadores (as), prevaleceu a determinação da Secretaria de Educação do Estado, na qual os (as) educadores (as) do Programa seriam oriundos da rede pública estadual de ensino, sem a exigência de vínculo com o campo e/ou com movimentos sociais, contrariando orientações do Projeto Base que indicava que o fortalecimento da educação do campo na esfera pública pode ser obtido a partir das experiências concretas dos movimentos sociais (BRASIL, 2009, p. 2). 3 A PEDAGOGIA DA ALTERNÂNCIA NAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DOS (AS) EDUCADORES (AS) DO PROJOVEM CAMPO EM MINAS GERAIS Tendo como pressuposto que as representações sociais nos possibilitam compreender os conhecimentos construídos por um grupo sobre determinado fenômeno e/ou objeto, e que esse conhecimento prático é orientador de condutas (MOSCOVICI, 1978), buscamos, a partir da análise das representações sociais dos educadores do ProJovem Campo, indícios sobre as práticas de alternâncias que têm sido construídas nesse recente programa da educação do campo em nossa sociedade. De uma maneira geral, as representações sociais dos (as) educadores (as) se ancoram em uma ideia de Pedagogia da Alternância como uma proposta inovadora de educação, que tende a contribuir para uma melhoria de vida do (a) jovem agricultor (a) e de sua família. Essa representação se sustenta em duas lógicas articuladas que, de um lado, destaca a dimensão pedagógica da formação; e de outro, destaca uma dimensão social desta proposta pedagógica. Na especificidade da dimensão pedagógica, os (as) educadores (as) revelam uma compreensão da alternância como sendo uma prática educativa que permite a articulação entre teoria e prática, possibilitando aos (às) educandos (as) a realização

de atividades educacionais tanto na escola, quanto fora dela, diferentemente do que é vivenciado por eles (as) em outras experiências educativas. Nessa lógica, a tendência dos (as) educadores (as) é associarem a teoria ao conteúdo abordado na escola e a prática às atividades realizadas pelos (as) educandos (as) fora da escola. Assim, enquanto a teoria é relacionada ao tempo escola, a prática é relacionada ao tempo comunidade. A seguir, apresentamos exemplos dessas compreensões construídas. Para garantir o anonimato dos (as) educadores as), utilizamos nomes fictícios. A Pedagogia da Alternância é uma maneira nova de trabalhar com o jovem, você vai na terra deles, trabalha junto com eles, vê as dificuldades que eles têm, antes eles não tinham esta oportunidade de ir para a escola, estão aprendendo. Tem o Tempo Comunidade que a gente vai lá na fazenda, ajuda eles a limpar a terra, a plantar e a colher (PROFESSOR TEOBALDO). Ainda nessa perspectiva da dimensão pedagógica da alternância, os (as) educadores (as) utilizam lógicas distintas para explicitarem suas compreensões sobre a dinâmica de produção do conhecimento nessas experiências educativas. Assim, de um lado, a lógica de alguns (mas) educadores (as) que representam a Pedagogia da Alternância como uma proposta pedagógica que permite ao (à) educador (a) se aproximar da realidade do (a) educando (a) e de levar para esse espaço de vida e de trabalho, conhecimentos acadêmicos que possam contribuir para uma ressignificação e/ou melhoria da realidade desses (as) jovens agricultores (a). A Pedagogia da Alternância permite a aproximação do professor com a realidade do aluno, isso pode contribuir inclusive para a elaboração do projeto de vida dele [do aluno]. Esse projeto de vida vai ajudar o aluno a pensar em sua comunidade, em uma maneira de promover melhorias para sua vida e para sua comunidade (PROFESSORA MARINALVA). Sob outra lógica, identificamos um grupo de educadores (as) que compreendem a alternância como uma prática pedagógica que possibilita uma interação das vivências e conhecimentos dos (as) educandos (as) com os conhecimentos escolares e acadêmicos. Nessa perspectiva, a Pedagogia da Alternância é compreendida como uma proposta pedagógica que possibilita a valorização do conhecimento não formal, do conhecimento popular, dos saberes dos (as) educandos (as). A Pedagogia da Alternância é a valorização do saber do educando, é aproveitar o que ele sabe, o que foi passado de geração para geração. É aproveitar esse conhecimento, trazer para a escola, valorizar o que ele aprendeu. Lá no campo, no seu trabalho ele tem muita aprendizagem que pode ser aproveitada aqui na escola (PROFESSORA VIVALDINA).

Nessa compreensão dos (as) educadores (as), na medida em que se aproximam dos saberes e experiências dos (as) educandos (as) e de suas realidades, eles (as) passam a conhecer melhor as especificidades de suas vidas e trabalhos, tendo com isto mais oportunidade de intervenção nessas realidades, no sentido de transmitir para o espaço de vivência dos (as) jovens conhecimentos e práticas que possam favorecer uma melhoria de vida. A Pedagogia da Alternância permite a troca de saberes, saberes da vida com o saber da escola, saber produzir, saber dialogar. Não é o saber que está na escola, é o aprender do dia-a-dia. É a valorização do saber do educando, permitindo que ele compreenda que há possibilidades economicamente produtivas no seu meio, é ver a teoria e levar para sua prática de forma que aquilo venha a ajudar na sua vida, no dia-a-dia para melhorar sua vida (COORDENADORA LEIDIANE). Na compreensão da Alternância em sua dimensão social, os (as) educadores (as) destacam o sentido da prática educativa alternada como sendo orientada para a promoção de melhorias e benefícios sociais aos (às) educandos (as). Nessa perspectiva, a Pedagogia da Alternância é associada ao propósito do Programa de promover uma capacitação profissional que possa contribuir para a auto-valorização dos (as) jovens e adultos (as) do campo como sujeitos sociais. Assim, nessa lógica, a alternância é representada como sendo uma prática pedagógica capaz de contribuir para mudanças sócio-econômicas na realidade de vida dos educandos jovens e adultos, na medida em que pode favorecer a inserção destes sujeitos no mundo do trabalho. Além disso, na compreensão desses (as) educadores (as), a Pedagogia da Alternância desenvolve processos educativos que favorecem a valorização dos educandos como sujeitos sociais, motivando-os para as transformações e melhorias de condições de vida no campo, estimulando uma identificação com os espaços de vida e potencializando sentimentos de pertença, em um processo de motivação para que permaneçam no campo. 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS No seu conjunto, as representações sociais construídas pelos (as) educadores (as) do Projovem Campo Saberes da Terra em Minas Gerais nos possibilitam identificar um conjunto de significados e sentidos atribuídos à Pedagogia da Alternância. Entre outros aspectos, para esses sujeitos - sem vínculos anteriores com a educação do campo e com os movimentos sociais, um elemento comum que ancora suas representações é a ideia de alternância como uma proposta pedagógica inovadora, tanto pelas possibilidades de uma educação contextualizada, na qual se

busca uma valorização dos (as) educandos (as) e de seus conhecimentos; quanto pela originalidade das práticas pedagógicas de articulação entre teoria e prática, tempos escolares e tempos da vida, numa busca constante de aproximação do processo escolar com a realidade de vida do (a) educando (a). São representações que revelam, ao lado da valorização da alternância, uma idealização dos (as) educadores (as) dessa proposta pedagógica, quando destacam e enfatizam muito mais as proposições e princípios teóricos da Pedagogia da Alternância que os inúmeros desafios, dificuldades e contradições que têm vivenciado no cotidiano da dinâmica pedagógica do Programa Projovem Campo. Entretanto, a despeito dessas contradições e limites - principalmente no tocante a uma formação teórico-metodológica da Educação do Campo e da Pedagogia da Alternância, são esses (as) educadores (as) que têm efetivamente sustentado a implantação do Programa no estado, integrando uma dinâmica que tende a contribuir para a construção de um novo olhar sobre o campo e os seus sujeitos sociais e, ainda, de novas práticas educativas. Em síntese, são contradições e limites que também revelam os desafios e riscos da construção, via Estado, de uma educação comprometida com as transformações do campo e com o protagonismo de seus sujeitos sociais. Todavia, a despeito das contradições e desafios existentes na implantação do Programa em Minas Gerais, cabe ressaltarmos o empenho dos parceiros, principalmente das universidades envolvidas, na promoção de processos de formação orientados para uma educação comprometida e de qualidade no campo. REFERÊNCIAS BARDIN, L. Análise de Conteúdo. Editora Lisboa 70, 1988. FREIRE, Jacqueline Cunha da Serra. Juventude Camponesa e Políticas Públicas: pertinência social do Programa Saberes da Terra na Amazônia paraense. Tese de Doutorado. Universidade Federal do Pará. Belém, 2009. MOSCOVICI, S. As representações sociais da psicanálise. Rio de Janeiro: Zahar, 1978. OLIVEIRA, M. A. As bases filosóficas e epistemológicas de alguns Projetos de Educação do Campo: do pretendido Marxismo à aproximação ao Ecletismo Pós- Moderno. Tese de Doutorado. Universidade Federal do Paraná. 2008. SILVA, L. H. As experiências de formação de jovens do campo: Alternância ou Alternâncias? Viçosa: UFV, 2003. UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS. FACULDADE DE EUDCAÇÃO. Projeto Político Pedagógico de Formação Continuada de Educadores(as) do ProJovem Campo Saberes da Terra. 2009.