Polímeros: Ciência e Tecnologia ISSN: Associação Brasileira de Polímeros Brasil

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Polímeros: Ciência e Tecnologia ISSN: 0104-1428 abpol@abpol.org.br Associação Brasileira de Polímeros Brasil Campana Fº, Sérgio P.; Signini, Roberta Efeito de Aditivos na Desacetilação de Quitina Polímeros: Ciência e Tecnologia, vol. 11, núm. 4, 2001, pp. 169-173 Associação Brasileira de Polímeros São Paulo, Brasil Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=47013628006 Como citar este artigo Número completo Mais artigos Home da revista no Redalyc Sistema de Informação Científica Rede de Revistas Científicas da América Latina, Caribe, Espanha e Portugal Projeto acadêmico sem fins lucrativos desenvolvido no âmbito da iniciativa Acesso Aberto

Efeito de Aditivos na Desacetilação de Quitina Sérgio P. Campana Fº, Roberta Signini Instituto de Química de São Carlos, USP Resumo: Reações de desacetilação de quitina comercial em suspensão aquosa de hidróxido de sódio foram realizadas em etapa única de 6 horas a 115 C. Os efeitos de aditivos (boro hidreto de sódio ou antraquinona) e de borbulhamento de gases inertes (nitrogênio ou argônio) sobre as características das amostras desacetiladas foram avaliados. A espectroscopia de ressonância magnética nuclear de hidrogênio e viscosimetria capilar foram empregadas para determinações de graus médios de acetilação e de viscosidades intrínsecas de quitosanas, respectivamente. A difração de raiosx foi empregada para comparar as amostras quanto à cristalinidade e os espectros no infravermelho foram comparados para avaliar modificações estruturais decorrentes da reação de desacetilação. As quitosanas mais cristalinas foram obtidas quando um dos gases inertes foi borbulhado no meio durante a reação de desacetilação. Amostras ligeiramente mais desacetiladas foram obtidas na ausência de qualquer aditivo, mas severa despolimerização ocorreu nesses casos. A adição de boro hidreto de sódio ao meio reacional reduziu significativamente a despolimerização, mas a presença de antraquinona e o borbulhamento de nitrogênio, ou de argônio, não surtiu qualquer efeito, sugerindo que a presença de oxigênio não é um pré-requisito para a ocorrência de despolimerização. Palavras-chave: Quitina, desacetilação, quitosana, boro hidreto de sódio, antraquinona. Effects from Additives on Deacetylation of Chitin Abstract: Deacetylation reactions of commercial chitin were carried out in aqueous sodium hydroxide solution at 115 C for 6 hours. The effect from additives (sodium borohydride or anthraquinone) and of bubbling inert gas (nitrogen or argon) on the characteristics of deacetylated samples were evaluated. Average degrees of acetylation and intrinsic viscosity were determined by 1 H NMR spectroscopy and capillary viscometry, respectively. X-ray diffraction was employed to evaluate changes in crystallinity and infrared spectroscopy was used to monitor structural changes due to deacetylation. The bubbling of inert gas during the deacetylation reaction resulted in more crystalline samples of chitosan. Deacetylations carried out without any additive produced slightly more deacetylated chitosans but they were severely depolymerized. The depolymerization process was much less important when sodium borohydride was added to the reaction medium but the addition of anthraquinone and the bubbling of nitrogen, or argon, did not have any effect, this suggests that oxygen is not required for depolymerization. Keywords: Chitin, deacetylation, chitosan, sodium borohydride, anthraquinone. Introdução Quitina e quitosana são polímeros atóxicos, biodegradáveis, biocompatíveis e produzidos por fontes naturais renováveis, cujas propriedades vêm sendo exploradas em aplicações industriais e tecnológicas há quase setenta anos [1,2]. Ambas estruturas são constituídas por unidades de 2-acetamido-2-deoxi-Dglicopiranose e 2-amino-2-deoxi-D-glicopiranose unidas por ligações glicosídicas β(1 4), entretanto os polímeros diferem quanto à proporção relativa dessas unidades e quanto à solubilidade. Na estrutura da quitina, que é insolúvel na maioria dos solventes testados, predominam unidades de 2-acetamido-2- Autor para correspondência: Sérgio P. Campana Filho, Instituto de Química de São Carlos, USP, Av. Trabalhador Sancarlense 400, CEP: 13560-970, São Carlos, SP. E-mail: scampana@iqsc.sc.usp.br C O M U N I C A Ç Ã O Polímeros: Ciência e Tecnologia, vol. 11, nº 4, p. 169-173, 2001 169

deoxi-d-glicopiranose enquanto que quitosana, que é predominantemente formada por unidades de 2-amino-2-deoxi-D-glicopiranose, é solúvel em soluções aquosas diluídas de ácidos orgânicos e inorgânicos [1-3]. A quitosana, que ocorre naturalmente em alguns fungos, é geralmente obtida pela desacetilação da quitina, polissacarídeo encontrado abundantemente na natureza e que constitui os exoesqueletos de insetos e crustáceos [1,3]. A princípio, a hidrólise dos grupos acetamida da quitina pode ser alcançada em meio ácido ou alcalino, mas a primeira condição não é empregada devido à susceptibilidade das ligações glicosídicas à hidrólise ácida [4]. De fato, mesmo quando realizada em meio alcalino, a desacetilação da quitina raramente é completa, pois quitosanas são obtidas quando a extensão da reação atinge cerca de 60% (ou mais) e o prolongamento da reação, que gera produtos mais completamente desacetilados, também provoca severa degradação das cadeias poliméricas. Assim, condições muito severas de reação, tais como as empregadas na desacetilação da quitina por fusão alcalina, e o emprego de soluções alcalinas concentradas, por tempos prolongados e a temperaturas elevadas, são evitadas quando o objetivo é a obtenção de quitosana de massa molar elevada [1]. A prática industrial mais comum, e que também é bastante empregada em laboratórios de pesquisa, é aquela na qual a desacetilação da quitina é realizada em suspensão de solução aquosa de hidróxido de sódio, sendo que a concentração dessa solução, o excesso de álcali, o tempo e a temperatura da reação são variáveis, conforme o procedimento adotado. Assim, não se pode definir uma condição padronizada para a realização dessa reação. Entretanto, é reconhecido que os principais fatores que afetam a eficiência da desacetilação e as características das quitosanas obtidas são [1,5] : a) temperatura e tempo de reação; b) concentração da solução de álcali e adição de diluente (álcoois de cadeia curta e cetonas são empregados); c) razão quitina/álcali; d) tamanho das partículas de quitina; e) atmosfera da reação e presença de agentes que evitem a despolimerização. Os efeitos devidos à presença de aditivos (boro hidreto de sódio e antraquinona) e ao borbulhamento de gases inertes (nitrogênio e argônio) sobre a desacetilação de quitina comercial e sobre as características das quitosanas obtidas são investigados neste trabalho. Experimental Desacetilação de quitina e caracterização das quitosanas obtidas Quitina comercial (Fluka/BioChemika), identificada como amostra F, foi submetida à reação de desacetilação, conforme o procedimento descrito a seguir: cerca de 4,6 g da amostra F, previamente triturada em liquidificador doméstico por 2 minutos, foram suspensos em 220 ml de solução aquosa de hidróxido de sódio (40%) a 115 ± 2 C e a suspensão foi mantida sob agitação mecânica constante (350 rpm) durante 6 horas em reator de vidro encamisado e conectado com banho termostático de circulação. Após este período a suspensão foi filtrada e o sólido lavado com água até a neutralidade das águas de lavagem; em seguida foi lavado com metanol e então seco à temperatura ambiente. Todas as reações de desacetilação foram realizadas com o mesmo material, que é constituído por partículas de quitina com granulometria conhecida [6], de maneira a excluir os efeitos devidos à variação desse fator. Da mesma maneira, outros fatores e condições que afetam a reação e as características das quitosanas obtidas foram mantidos invariáveis em todos os experimentos. Entretanto, as condições empregadas nas reações de desacetilação foram variadas com relação à presença de aditivos (0,1 g de NaBH 4 /1 g de quitina ou 0,003 g de antraquinona/1 g de quitina) e quanto ao emprego de fluxo de gás inerte (nitrogênio ou argônio), visando minimizar a ocorrência simultânea de despolimerização. As quitosanas obtidas foram purificadas na forma neutra após dissolução em ácido acético diluído, filtração e precipitação por adição de hidróxido de amônio [6]. Seus graus médios de acetilação (GA) e viscosidades intrínsecas ([η]) foram determinados por espectroscopia de ressonância magnética nuclear de próton ( 1 H RMN) e viscosimetria capilar, respectivamente, conforme procedimentos descritos anteriormente [7,8]. Medidas de difração de raios-x foram realizadas empregando difratômetro de raios-x RIGAKU (USP- IFSC) com tubo de cobre (λ = 1,54 Å); a voltagem e a corrente utilizadas foram de 40kV e 40mA, respectivamente. Essas medidas foram realizadas no intervalo de 3-50 com velocidade de varredura de 1 /minuto em etapas de 0,02. 170 Polímeros: Ciência e Tecnologia, vol. 11, nº 4, p. 169-173, 2001

Espectros de infravermelho foram obtidos a partir de pastilhas amostra/kbr (1:100 m/m), empregando espectrômetro BOMEM modelo MB-102 com transformada de Fourier. Resultados e Discussão Independentemente da presença de aditivos e do emprego de fluxo de gás inerte, as reações de desacetilação de quitina foram experimentos reprodutíveis que propiciaram, em todos os casos, a recuperação de 50-60% da massa do material inicial na forma de quitina desacetilada ( GA <12%). Após a purificação, as quitosanas foram caracterizadas através de determinações de graus médios de acetilação e de viscosidades intrínsecas (Tabela 1), por espectroscopia no infravermelho (Figura 1) e difração de raios-x (Figura 2). Embora os espectros no infravermelho de quitina e de quitosana apresentem semelhanças (Figura 1), podem ser observadas diferenças, que são atribuídas a diferentes conteúdos de grupos acetamida, principalmente nas regiões correspondentes aos seguintes intervalos de número de onda: 3700 cm -1 3000 cm -1, 3000 cm -1 2800 cm -1 e 1800 cm -1-1500 cm -1. De fato, embora ocorra uma banda muito larga e intensa na região definida pelo primeiro intervalo citado acima, atribuída à deformação axial de grupos O H e N H, podem ser observados mais detalhes no espectro de quitina do que naqueles de quitosanas. Entretanto, essas diferenças não devem ser atribuídas somente às diferentes estruturas primárias de quitina e quitosanas com respeito ao teor de grupos acetamida, mas também à ocorrência de um empacotamento mais ordenado em quitina. Assim, o pequeno ombro em torno de 3480 cm -1 no espectro de quitina, e que não é observado nos espectros de quitosanas, pode ser atribuído às ligações hidrogênio intramoleculares envolvendo o grupo O H ligado ao carbono da posição 6 do anel de glicopiranose e o grupo C=O das acetamidas [10]. Também, as bandas em torno de 3260 cm -1 e 3100 cm -1 no espectro de quitina, e que não são observadas nos espectros de quitosanas, podem ser atribuídas aos grupos N H da acetamida em ligações intermoleculares de hidrogênio. Na região de deformação axial de C H, correspondente ao intervalo 3000 cm -1-2800 cm -1, o espectro de quitina apresenta bandas mais intensas, e em maior número do que observado nos espectros de quitosanas, devido ao elevado teor de acetamidas do primeiro polímero. No intervalo 1800 cm -1-1500 cm -1, no qual são observadas as bandas denominadas de amida I e de amida II, os espectros de quitina e de quitosanas são muito diferentes. No espectro de quitina, podem ser observados dois sinais de intensidades semelhantes, próximos de 1660 cm -1 e de 1625 cm -1, correspondentes à banda de amida I. O desdobramento da banda de amida I, como observado no espectro de quitina, é associado Tabela 1. Graus médios de acetilação (GA), viscosidades intrínsecas ([η]), massas molares médias viscosimétricas ( M v ), índices de cristalinidade (I CR ) e diâmetros médios de cristalitos de quitinas desacetiladas (a). Amostra F 0 F B F At F N F Ar F BN A ditivos/gás (%) G A [η](ml/g) M v 10 Figura 1. Espectros no infravermelho das amostras de quitina e de quitosanas obtidas por desacetilações realizadas em diferentes condições. - 4 ( b) x I C R %) ( D p (Å a ) nenhum 9,5 ± 1, 3 514 ± 23 11,1 ± 0, 6 64 18, 5 NaBH4 11,6 ± 1, 5 827 ± 65 20,5 ± 2, 1 67 17, 6 Antraquinona 10,7± 1, 7 481 ± 7 10, 0 67 14, 2 Nitrogênio 11,2 ± 2, 0 490 ± 20 10,3 ± 0, 6 70 20, 0 Argônio 10,5± 0, 7 497 ± 50 10, 5 74 20, 5 NaBH / Nitrogênio 11,3 ± 1, 8 883 ± 42 22,3 ± 1, 5 67 14, 2 4 (a)as reações foram realizadas em duplicatas, com exceção das que resultaram nas amostras F 0 e F N que correspondem a triplicatas. (b)valores calculados a partir de [η] utilizando os parâmetros apropriados [9]. Polímeros: Ciência e Tecnologia, vol. 11, nº 4, p. 169-173, 2001 171

Figura 2. Difratogramas das amostras de quitina e de quitosanas obtidas por desacetilações realizadas em diferentes condições. com interações intermoleculares e a primeira banda é atribuída às ligações hidrogênio de grupos C=O e grupos N H, enquanto que a banda centrada em 1625 cm -1 é atribuída às ligações hidrogênio envolvendo grupos C=O, N H e O H ligado ao carbono da posição 6 do anel de glicopiranose [10]. A banda de amida I é menos intensa nos espectros de quitosanas e o seu desdobramento não é observado nesses casos. Além disso, a banda de amida II, centrada em 1560 cm -1, é menos intensa nos espectros de quitosanas, como conseqüência do acentuado processo de hidrólise dos grupos acetamida de quitina. O emprego de difração de raios-x também permite distinguir claramente a quitina de partida de seus derivados desacetilados. De fato, o difratograma de quitina apresenta sinais mais resolvidos e em maior número do que observado nos difratogramas de quitosanas (Figura 2), o que é atribuído à existência de domínios cristalinos, maiores e em maior número no caso de quitina [1]. Os índices de cristalinidade (I CR ) [11] e o diâmetro médio aparente dos cristalitos (D ap ) [12] podem ser determinados com o emprego das Equações 1 e 2, respectivamente. IC I A % I CR = x100 (1) IC sendo: I c e I A as intensidades dos sinais das regiões cristalinas (2θ 20 ) e amorfas (2θ 12 ), respectivamente. Kλ D ap = (2) cos( θ ) β 0 sendo: K uma constante; λ (Å) o comprimento de onda da radiação empregada; θ o ângulo (rad) do sinal devido às regiões cristalinas; β 0 (rad) a largura do sinal devido às regiões cristalinas no ponto em que sua intensidade é a metade da intensidade máxima. A quitina comercial empregada neste trabalho tem I CR 85% e D ap 35Å, valores muito superiores aos de seus derivados desacetilados (Tabela 1), o que é coerente com as modificações observadas por espectroscopia de infravermelho. As quitosanas mais cristalinas, e que possuem cristalitos maiores, foram obtidas quando o meio reacional empregado na desacetilação de quitina foi borbulhado com gases inertes. As diferenças entre as quitosanas, no que diz respeito a essas características (I CR e D ap ), não parecem, entretanto, ter uma relação simples com seus graus médios de acetilação e massas molares médias viscosimétricas. Os valores de graus médios de acetilação das amostras (Tabela 1) estão inseridos em um intervalo restrito (de 9,5% a 11,6%) e são, em todos os casos, muito próximos daqueles mencionados na literatura para desacetilações de quitina realizadas em uma etapa [1]. Esses resultados mostram que a eficiência da desacetilação independe da presença de aditivos e do emprego de fluxo de gás inerte, mas a extensão do processo de despolimerização é fortemente influenciada pela presença de boro hidreto de sódio no meio reacional. De fato, é constatado que a adição de NaBH 4 ao meio, isoladamente ou simultaneamente ao emprego de fluxo de nitrogênio, levou à obtenção das quitosanas que apresentaram os maiores valores de viscosidade intrínseca e, consequentemente, de massas molares médias viscosimétricas mais elevadas. Assim, a comparação entre as quitosanas obtidas na presença e na ausência de NaBH 4 mostra que os valores de viscosidade intrínseca das primeiras (amostras F B e F BN ) são, em média, cerca de 40% maiores. Por outro lado, é constatado que a adição de antraquinona e o borbulhamento de nitrogênio, ou argônio, não impedem a despolimerização, reforçando a idéia que a presença de oxigênio não é uma précondição para a sua ocorrência [6]. Conclusões A adição de NaBH 4, um agente redutor, ao meio reacional minimiza a ocorrência de despolimerização 172 Polímeros: Ciência e Tecnologia, vol. 11, nº 4, p. 169-173, 2001

durante a reação de desacetilação de quitina em meio aquoso alcalino. A adição de antraquinona e o borbulhamento de nitrogênio (ou argônio), que retiram oxigênio do meio reacional, não impedem a despolimerização, sugerindo que a presença de oxigênio não é uma pré-condição para a sua ocorrência. Agradecimentos Os autores agradecem à FAPESP e ao CNPq pelos recursos que viabilizaram a execução deste trabalho. Referências Bibliográficas 1. Roberts, G. A. F. - Chitin Chemistry, The Macmillan Press, London (1992). 2. Goosen, M. E. A Applications of chitin and chitosan, Technomic Publishing Company, Lancaster (1996). 3. Mathur, N. K. & Narang, C. K. J. Chem. Educ., 67 (11), p.938 (1990). 4. Solomons, T. W. G. Carbohydrates, in: Organic Chemistry, cap. 22, John Wiley & Sons, New York (1996). 5. No, H. K. & Meyers, S. P. Preparation of Chitin and Chitosan, in: Chitin Handbook, R. A A. Muzzarelli & M. G. Peters (eds.), European Chitin Society, p.475 (1997). 6. Signini, R. & Campana Filho, S. P.; Effects of additives and inert gas bubbling on the deacetylation of chitin and chitosan, in: Proceedings of the Third International Symposium on Natural Polymers and Composites, p. 131, São Pedro SP, maio (2000). 7. Signini, R. & Campana Filho, S. P. - Polímeros: Ciência e Tecnologia, 4, p.63 (1998). 8. Signini, R. & Campana Filho, S. P. Polym. Bull., 42, p. 159 (1999). 9. Rinaudo, M.; Milas, M.; Dung, P. L. Int. J. Biol. Macromol., 15, p. 281 (1993). 10. Focher, B.; Naggi, A.; Torri, G.; Cosani, A.; Terbojevich, M. Carbohydr. Polym., v.18, p. 43 (1992). 11. Li, J.; Revol, J.-F.; Marchessault, R. H.; - J. Appl. Polym. Sci., 65, p. 373 (1997). 12. Alexander, L. E.; X-ray diffraction methods in polymer science, John Wiley & Sons Inc., New York (1985). Recebido: 22/03/01 Aprovado: 15/11/01 Polímeros: Ciência e Tecnologia, vol. 11, nº 4, p. 169-173, 2001 173