O QUE SÃO PARCERIAS PÚBLICO-PRIVADAS (PPP)?



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Transcrição:

O QUE SÃO PARCERIAS PÚBLICO-PRIVADAS (PPP)? Marcos Mendes 1 (09/04/2012) A literatura internacional define uma PPP como sendo um contrato de longo prazo entre um governo (federal, estadual ou municipal) e uma entidade privada, no qual essa entidade se compromete a oferecer serviços de infraestrutura. Há diferentes tipos de contrato, em que o setor público e o parceiro privado dividem entre si as responsabilidades referentes ao financiamento, projeto, construção, operação e manutenção da infraestrutura. A empresa privada pode ser remunerada tanto pela cobrança de tarifas diretamente aos usuários (pedágio, por exemplo), quanto por pagamentos feitos a ela diretamente pelo governo (Banco Mundial, 2012). A definição acima difere do conceito de PPP estipulado pela legislação brasileira, que é bem mais restrito. Neste artigo apresenta-se primeiro a definição internacional e, em seguida, mostra-se como a definição brasileira é um subconjunto daquela definição mais ampla. No conceito internacional, mais amplo, podemos citar como exemplo de PPP um contrato para que uma empresa passe a cuidar da manutenção de uma estrada, cobrando pedágio dos usuários. Também temos uma PPP quando uma empresa constrói uma prisão e opera os serviços de limpeza, alimentação, manutenção predial, entre outros, enquanto o governo se encarrega da atividade-fim do presídio, que é o serviço de controle e escolta de presidiários. Outro exemplo de PPP seria a construção e operação de uma linha de metrô por uma empresa privada, em que a remuneração do parceiro privado vem de duas fontes: a tarifa cobrada dos usuários e um pagamento mensal feito pelo governo. Na definição apresentada no primeiro parágrafo, dois termos estão grifados: longo-prazo e serviços de infraestrutura. Esses são aspectos importantes da caracterização de uma PPP. O termo serviços de infraestrutura indica que o parceiro privado não vai simplesmente construir uma estrada, uma ferrovia, um hospital ou um aeroporto e entregá-lo para ser administrado pelo governo ou empresa estatal. Ele vai construir e operar uma parte ou todos os serviços oferecidos por aquela infraestrutura. Ou então ele vai simplesmente operar (sem construir ou apenas reformar) os serviços de uma infraestrutura já existente, de propriedade do governo. Ou seja, para caracterizar uma PPP é importante que o parceiro privado atue na provisão do serviço público associado à infraestrutura que lhe foi confiada. Os contratos são de longo-prazo porque, em primeiro lugar, estão relacionados a serviços públicos que exigem investimentos de grande vulto, seja na construção, seja na 1 Doutor em economia pela USP. Editor de Brasil, Economia e Governo

manutenção: estradas, portos, aeroportos, ferrovias, prédios públicos com características especiais (hospitais, prisões) ou construídos em grande quantidade (escolas), etc. Portanto, nos casos em que o parceiro privado investe seu capital, ele precisa que o contrato tenha um prazo dilatado, para dar tempo de pagar o investimento. Mesmo quando não há uma elevada imobilização de capital pelo parceiro privado (por exemplo, contratos para operar infraestrutura já existente), pode ser interessante estabelecer um contrato de longo-prazo, pois seria ineficiente trocar o administrador da infraestrutura diversas vezes em prazos curtos, tendo em vista o custo de licitação e o custo de aprendizagem, associado ao período em que o novo concessionário está ajustando a oferta do novo serviço, quando usualmente há quebras na qualidade dos serviços. Note que não se encaixam na definição de PPP os contratos mais simples, como os que preveem a prestação de serviços de limpeza e vigilância de prédios públicos, fornecimento de alimentação, conservação de jardins, assistência técnica em informática, etc. Esses são contratos de curto-prazo, normalmente conhecidos como terceirização. Enquanto os contratos de PPP normalmente têm prazos que superam vinte anos, os contratos de terceirização de serviços duram por volta de cinco anos (sobre contratos de terceirização no Brasil e seus problemas ver, neste site, Por que o governo gasta tanto com terceirização?) Um ponto central para o sucesso de uma PPP está na divisão de riscos entre o setor público e o parceiro privado. A construção e operação de uma rodovia, por exemplo, implica diversos riscos financeiros: a obra pode custar mais que o projetado (risco de construção), o volume de tráfego (e, portanto, a receita de pedágio) pode ser menor que o esperado (risco de demanda), a eleição de um novo governante pode colocar em risco o cumprimento do contrato (risco político), etc. Não é trivial, portanto, a redação de um contrato de PPP, que deve ser o mais detalhado possível no que diz respeito a qual das partes deve assumir que tipos de riscos. Essa é uma condição necessária, mas não suficiente. É preciso, também, que haja um Poder Judiciário com capacidade para impor o cumprimento dos contratos. Em países em que o Judiciário é influenciado pelo Poder Executivo, o risco político incorrido pelos parceiros privados é alto. Os contratos de PPP em geral associam a revisão dos pagamentos feitos aos parceiros privados, ao longo da vida do contrato, com base no cumprimento de metas de qualidade e quantidade do serviço oferecido. Por exemplo, em um contrato de PPP de um aeroporto, o parceiro privado terá direito a um maior reajuste da tarifa se conseguir fazer todos os investimentos de expansão do aeroporto que estavam previstos no contrato inicial. Ou, alternativamente, será punido com um reajuste menor se os índices de qualidade dos serviços prestados estiverem abaixo das metas contratuais (tempo de espera no check-in, atraso nos voos de responsabilidade do aeroporto, etc.).

Essa característica dos contratos pressupõe a existência de uma agência reguladora com suficiente capacidade e independência técnica para dar pleno cumprimento à verificação das metas contratuais e efetivamente punir ou premiar o parceiro privado. Agências reguladoras sem autonomia em relação ao governo, ou cujos cargos de comando sejam distribuídos ao sabor de negociações partidárias, acabam aproximando perigosamente a necessidade de recursos dos partidos políticos (para financiamento de campanha) do poder institucional de conferir ganhos financeiros não merecidos a parceiros privados que não cumprem contratos. E qual seria a grande vantagem de um contrato de PPP em relação ao modelo tradicional, em que o governo contrata a construção de uma infraestrutura junto a empresas privadas e depois opera, ele próprio, o serviço oferecido por essa infraestrutura? A vantagem é que, ao se contratar uma mesma empresa para construir (ou reformar/ampliar) uma infraestrutura e, em seguida, passar a operá-la, essa empresa terá incentivos para fazer uma construção (reforma/ampliação) de boa qualidade. Isso porque uma infraestrutura bem construída vai reduzir os custos de manutenção e reparo ao longo do contrato de operação, bem como vai permitir a prestação de um serviço de maior qualidade (viabilizando ganhos financeiros quando a tarifa estiver atrelada à qualidade do serviço prestado). Em um contrato comum de simples construção e entrega da infraestrutura ao governo, as empresas têm incentivos para construir rapidamente e economizar nos custos, colocando em segundo plano a qualidade final do trabalho. O governo, por sua vez, não tem informação suficiente sobre o andamento das obras e seus detalhes para exigir maior qualidade. Outra vantagem das PPP é que elas trazem capital privado para investimentos em que antes só havia dinheiro público. Como os orçamentos públicos estão cada vez mais restritos frente à necessidade de manter o equilíbrio fiscal, a entrada de capital privado é um bem-vindo reforço ao financiamento das obras de infraestrutura. Há dois conceitos relevantes acerca de rentabilidade de projetos que devem ser analisados quando se fala em PPP: a viabilidade financeira e a viabilidade econômica. Um projeto tem viabilidade financeira quando, estimados todos os seus custos e receitas, o resultado é um lucro que seja suficiente para atrair uma empresa privada para operar o negócio. Trata-se, pois, de um conceito de rentabilidade privada. A viabilidade econômica leva em conta, além das receitas e custos financeiros, os benefícios e custos sociais decorrentes do projeto. Por exemplo, uma nova rodovia pode gerar como benefícios sociais a economia de tempo de deslocamento dos usuários, o aumento da produtividade das empresas, que podem entregar seus produtos com mais rapidez, etc; por outro lado, essa mesma rodovia pode gerar custos sociais, como o aumento da poluição em cidades que fiquem à beira da rodovia ou um custo de pedágio que seja incompatível com o nível de renda da população local.

Quando um projeto tem viabilidade financeira e econômica (benefícios maiores que os custos nos dois conceitos), então é interessante para o país que ele seja desenvolvido. E sendo sustentável do ponto de vista financeiro, o governo pode fazer uma licitação para que um parceiro privado cuide sozinho do negócio, sendo remunerado mediante tarifas pagas pelo usuário. Quando um projeto tem viabilidade econômica, mas não financeira, temos uma situação em que vale a pena para a sociedade implementar o projeto, mas não haverá nenhum parceiro privado disposto a se responsabilizar sozinho por ele, pois se trata de um negócio que não dá lucro. Nesses casos, o governo pode fazer uma PPP na qual se comprometa a pagar um subsídio ao parceiro privado, elevando a sua rentabilidade até um ponto em que valha a pena investir no negócio. Por exemplo, pode ser importante para o desenvolvimento econômico de uma região do país a construção de uma nova estrada. Porém, o fluxo previsto de veículos nos primeiros anos pode ser baixo, e há um risco considerável de esse fluxo não aumentar nos anos seguintes em decorrência de eventual insucesso do plano de desenvolvimento. Eventuais tarifas cobradas, portanto, seriam insuficientes para remunerar o setor privado, tanto pelo capital investido, como pelo risco incorrido. Nesse caso, o governo pode arcar com parte dos custos do negócio. Seriam várias as opções: pagar parte do custo de construção, pagar um valor mensal ao parceiro privado durante a operação da estrada, conceder ao parceiro privado um financiamento subsidiado para custear a construção, etc. Com esse subsídio, a construção de uma infraestrutura que gere mais benefícios que custos para a sociedade passa a ser viável. A legislação brasileira considera como sendo PPP apenas os casos em que os projetos têm viabilidade econômica, mas não têm viabilidade financeira. Ou seja, os projetos que, como no exemplo acima, requerem algum tipo de subsídio governamental. Os projetos financeiramente viáveis são conceituados como concessões comuns, enquanto os projetos que requerem algum tipo de complementação financeira estatal são conceituados como PPP e divididos em dois grupos distintos: as PPP patrocinadas (em que o parceiro privado obtém sua remuneração mediante cobrança de tarifas e subsídios estatais) e as PPP administrativas (nas quais a remuneração do parceiro privado é paga integralmente pelo governo). As concessões comuns estão reguladas pelas Leis nº 8.987 e nº 9.074, ambas de 1995, enquanto às PPP se aplicam os dispositivos daquelas leis e, adicionalmente, a Lei nº 11.079, de 2004. Note-se que esta é uma distinção apenas no campo legal e semântico. Do ponto de vista da análise econômica, as considerações feitas acima valem tanto para as concessões comuns quanto para as PPP no conceito brasileiro. Ambas requerem agências reguladoras e instituições judiciais capazes de impor o cumprimento do contrato, geram potenciais benefícios quanto à eficiência dos projetos desenvolvidos, atraem capital privado para o investimento em infraestrutura, requerem contratos que dividam claramente os riscos entre as partes, etc.

Uma constatação que se faz ao observar o caso brasileiro é que as PPP no conceito local (concessões patrocinadas e administrativas) têm enfrentado grandes dificuldades para serem postas em prática, ao passo que as concessões comuns têm sido feitas com mais frequência. Até hoje o governo federal não concretizou uma única PPP. A que está mais avançada refere-se à construção de um datacenter pelo Banco do Brasil e Caixa Econômica, no qual um parceiro privado irá construir, equipar e gerir o banco de dados. Há, ainda, um projeto de irrigação e Petrolina-PE, a instalação de um sistema nacional de TV digital pública e a construção, lançamento e operação de um satélite geoestacionário. Todas as iniciativas, a exceção do datacenter, ainda estão nos passos iniciais. Os governos estaduais andaram um pouco mais rápido e já colocaram em prática alguns projetos, tais como: construção e gestão de estádio de futebol, conjuntos habitacionais de baixa renda, centros de atendimento ao cidadão, emissão submarina de esgotos, hospitais. O Estado de São Paulo é o que tem mais se destacado na implantação das concessões patrocinadas e administrativas, com projetos de maior vulto nas áreas de de transportes (linhas de metrô, trem e sistema metropolitano de ônibus), esgotamento sanitário e abastecimento de água. São vários os fatores que têm emperrado as PPP brasileiras (concessões patrocinadas e administrativas). Em primeiro lugar, elas necessitam de contratos mais complexos que os das concessões comuns; pois além de toda a partilha de risco entre as partes, é preciso que se estime qual será o subsídio público pago ao parceiro privado. Isso implica não só dificuldade no desenho dessa relação financeira de longo prazo, como também embute risco de corrupção, de acusações políticas de beneficiamento de empresas, etc. Em segundo lugar, o Tesouro Nacional e os tesouros estaduais têm sido bastante cautelosos em relação ao risco fiscal que existem no fato de o governo assumir o compromisso de fazer pagamentos ao longo de muitos anos a uma empresa privada. Existe a possibilidade de que agentes governamentais passem a usar esse mecanismo para driblar as regras da Lei de Responsabilidade Fiscal relativas a limite máximo de endividamento dos entes públicos, e a fazer gastos públicos sem registrá-los no orçamento. O resultado é o estabelecimento de inúmeras instâncias burocráticas para autorização das concessões administrativas ou patrocinadas, que emperram o processo. As concessões comuns, por sua vez, em vez de criar obrigações financeiras para o governo, muitas vezes geram receitas imediatas, nos casos em que os seus editais preveem o pagamento de um valor de outorga pela empresa vencedora. No leilão de concessão de três aeroportos federais (Guarulhos, Brasília e Campinas), realizado em fevereiro de 2012, por exemplo, as empresas vencedoras comprometeram-se a pagar outorgas que somaram R$ 24,5 bilhões. Politicamente é mais interessante mostrar ao eleitorado que se está fazendo grandes obras e, ao mesmo tempo, obtendo receita para o governo.

Surge, com isso, o incentivo ao governo de modelar as parcerias com o setor privado sob a forma de concessão simples, com vistas a obter ganhos fiscais. Isso é um problema, pois projetos com benefício social positivo, que poderiam ser objeto de concessão patrocinada ou administrativa, são colocados em segundo plano. O terceiro problema está na baixa capacidade do setor público brasileiro para prospectar e formular projetos de infraestrutura. Ao lidar com esses projetos, as agências públicas acabam, muitas vezes, não sendo capazes de avaliar e distinguir corretamente a viabilidade financeira e a viabilidade econômica. Em consequência, acaba-se dando preferência para os projetos mais rentáveis, que são implementados por meio de concessões comuns. O quarto problema está no fato de que a Lei nº 11.079, de 2004, em seu art. 7º,, ao contrário do que ocorre em outros países, não admite que sejam pagos subsídios aos parceiros privados durante a fase de construção (reforma/ampliação) da infraestrutura. Tal pagamento só pode ser feito quando tiver sido iniciada a operação dos serviços. Isso inviabiliza as concessões patrocinadas e administrativas que requerem um grande investimento inicial e um longo tempo de atividades pré-operacionais. O quinto problema é o baixo grau de autonomia política e financeira das nossas agências reguladoras, que reduzem o grau de segurança do investidor privado (que teme ser pressionado por questões políticas) e da população (que vê a possibilidade de corrupção nas relações com os parceiros privados). Igualmente problemática é a dificuldade do sistema judiciário brasileiro para impor o cumprimento de contratos com rapidez e com procedimentos claros e previsíveis. Tendo em vista a baixa disponibilidade orçamentária do setor público brasileiro e a grande carência de infraestrutura que vivemos, parece ser prioritário o aperfeiçoamento da legislação e das instituições (em especial das agências reguladoras) que viabilizem a expansão das PPP em sentido amplo, sejam elas concessões simples, sejam concessões administrativas ou patrocinadas. Para ler mais sobre o tema: Banco Mundial (2012) Best practices in public-private partnerships financing in Latin- America: the role of subsidy mechanisms. Washington DC. Paiva, S. e Rocha, C. (2004) A parceria público-privada: o papel do Senado Federal na discussão e aprovação da Lei nº 11.079, de 2004. Núcleo de Estudos e Pesquisas do Senado Federal. Texto para Discussão nº 25. UNESCAP (2007) Public-private partnership in infrastructure development: an introduction to issue from different perspectives. Transport and Tourism Division UNESCAP. Bangkok, Thailand.

Consulte também o site www.pppbrasil.com.br para diversos artigos e comentários sobre as PPP no Brasil.