A RESPONSABILIDADE CIVIL PELO DANO AO MEIO AMBIENTE 1

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Transcrição:

1 A RESPONSABILIDADE CIVIL PELO DANO AO MEIO AMBIENTE 1 Francine Cordeiro 2 RESUMO A monografia trata da responsabilidade civil pelos danos causados ao meio ambiente. O cerne do estudo versa sobre as espécies de dano existentes e como esses danos podem vir a ser reparados civilmente. Aborda-se a sistemática da reparação, iniciando pelos princípios que regem a responsabilidade civil. Em um segundo momento analisa-se as dimensões do dano e suas demais classificações, passando-se, posteriormente, ao estudo das funções da responsabilidade civil, bem como dos pressupostos necessários para a sua configuração, das excludentes de responsabilidade a luz das teorias do risco criado e da teoria do risco integral, e, ainda, das formas de reparação. Conclui-se que a responsabilização no âmbito civil é de suma importância, pois além do caráter punitivo que detém, há o caráter pedagógico, prezando pela não repetição do dano em razão da sanção aplicada. Palavras-chave: Responsabilidade civil. Dano. Meio ambiente. Dimensões do dano. Funções da responsabilidade civil. Excludentes. Teoria do risco integral. Teoria do risco criado. Formas de reparação. INTRODUÇÃO Tendo em vista que, a cada dia que passa, mais a natureza é afetada pelos ataques daqueles que não se preocupam com o que será das gerações futuras em termos de qualidade de vida proporcionada pelos recursos ambientais, a presente dissertação versa sobre a responsabilidade no âmbito civil pelos danos causado ao 1 Artigo extraído do Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais da Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Aprovação com grau máximo pela banca examinadora, composta pelas professoras Fernanda Luiza Fontoura de Medeiros (orientadora), Liane Tabarelli Zavascki e Márcia Regina L. Caddore Weber, em 22 de novembro de 2011. 2 Acadêmica de Ciências Jurídicas e Sociais da Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. E-mail: francinec@tj.rs.gov.br.

2 meio ambiente, analisando como estes agentes poluidores podem ser punidos, eficazmente, pelo mal que causam ao meio ambiente. No primeiro capítulo, fez-se uma análise dos princípios orientadores da responsabilidade civil ambiental, quais sejam, os princípios da prevenção, da precaução e do poluidor-pagador, pois é com base no que eles pregam que se desencadeia o sistema de responsabilização pelas lesões ambientais. No segundo capítulo, em um estudo aprofundado acerca das dimensões e espécies de dano, buscou-se verificar todas as formas existentes de lesão e as conseqüências que elas podem acarretar tanto ao ecossistema quanto ao indivíduo, ou ainda, quanto à coletividade, seja no âmbito material ou até mesmo no âmbito moral. Esse estudo se deve ao fato de que somente a partir do conhecimento do dano e da sua extensão, bem como da relação entre a atividade poluidora e a lesão ocasionada é que podemos passar para a próxima e principal fase dessa sistemática, que são as formas de reparação. Por fim, no terceiro capítulo abordamos a três formas de reparar as lesões ambientais, que são a restauração da lesão, sempre que possível, a compensação ecológica, e a indenização. As formas de reparação se baseiam no princípio do poluidor-pagador, segundo o qual o poluidor tem o dever de arcar com as despesas da reparação da poluição, visando à recomposição da qualidade ambiental. 1 OS PRINCÍPIOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL AMBIENTAL 1.1 PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO O princípio da precaução ganhou espaço com a Declaração Ministerial de Bremen de 1984, na Conferência Internacional sobre a Proteção do Mar do Norte. Em 1987 foi mencionado de modo específico na Declaração Ministerial de Londres na II Conferência sobre o Mar do Norte, tendo como escopo a existência do

3 potencial de risco de uma atividade. 3 Acerca do princípio da precaução, a Declaração do Rio de Janeiro, de 1992, em seu Princípio 15, referiu que: De modo a proteger o meio ambiente, o princípio da precaução deve ser amplamente observado pelos Estados, de acordo com suas capacidades. Quando houver a ameaça de danos sérios ou irreversíveis, a ausência de absoluta certeza científica não deve ser utilizada como razão para postergar medidas eficazes e economicamente viáveis para prevenir a degradação ambiental. Em termos práticos, o princípio da precaução visa o impedimento de ações lesivas ao meio ambiente diante de perigos desconhecidos, mas prováveis. 4 O principal instrumento precaucional no direito brasileiro é o Estudo Prévio de Impacto Ambiental (EIA), previsto no art. 9º, III, da Lei 6.938/81 5, no art. 225, 1º 6, da Constituição Federal e na Resolução nº 01/86 7 do Conselho Nacional do Meio Ambiente CONAMA. 8 Ademais, o princípio da precaução funcionada como uma espécie de in dubio pro ambiente, pois havendo incerteza 9 acerca do perigo de determinada atividade, a decisão deve ser sempre em favor do ambiente e contra o poluidor. Significa dizer 3 SOUZA, Júpter Palagi de, e SETZER, Joana. Princípio da Precaução. In MILARÉ, Édis e MACHADO, Paulo Afonso Leme. (Orgs). Direito Ambiental: fundamentos do direito ambiental. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2011, Coleção doutrinas essenciais, v.1, p. 458-459. 4 STEIGLEDER, Annelise Monteiro. Responsabilidade civil ambiental: as dimensões do dano ambiental no direito brasileiro. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2011, p. 164. 5 Art. 9º - São Instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente: III - a avaliação de impactos ambientais 6 Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações. 1º - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade 7 Artigo 3º - Dependerá de elaboração de estudo de impacto ambiental e respectivo RIMA, a serem submetidos à aprovação do IBAMA, o licenciamento de atividades que, por lei, seja de competência federal. 8 STEIGLEDER, Annelise Monteiro. Responsabilidade civil ambiental: as dimensões do dano ambiental no direito brasileiro. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2011, p. 164. 9 José Joaquim Gomes Canotilho e José Rubens Morato Leite citam alguns exemplos acerca da dúvida sobre a perigosidade de uma determinada ação. Dizem que ela pode existir em várias circunstâncias: ou quando ainda não se verificaram quaisquer danos decorrentes de uma determinada atividade, mas se receia, apesar da falta de provas científicas, que possam vir a ocorrer; ou então quando, havendo já danos provocados ao ambiente, não há provas científicas sobre qual a causa que está na origem dos danos, ou sobre o nexo de causalidade entre uma determinada causa possível e os danos verificados.

4 que a dúvida acerca da existência ou não de uma lesão deve sempre ter tomada em prol das pessoas e do seu ambiente. 10 A precaução visa a prevenir uma suspeita de perigo, ou ainda garantir segurança, ou seja, o trabalho da precaução é anterior à manifestação de perigo. José Joaquim Gomes Canotilho e José Rubens Morato Leite afirmam que as medidas podem ser das mais variadas, tais como proibições, recusas de licenciamento, embargos, notificações, monitorações, obrigações de registro, financiamento de ações de investigação, ou informação ao público. 11 Outrossim, é importante que a aplicação do princípio da precaução seja realizada de forma justa e adequada. Podemos dizer que para que esse princípio seja aplicado da forma mais correta possível, se faz necessária a análise de alguns instrumentos. Inicialmente, fundamental é a avaliação das possibilidades a partir de dados científicos capazes de quantificar os riscos e vislumbrar os seus efeitos potencialmente perigosos. 12 Com efeito, o princípio da prevenção deve sempre respeitar o princípio da proporcionalidade, eis que deve haver um limite quanto ao risco que justificou a invocação da precaução e quanto à medida adotada com base na precaução. Em outras palavras, as medidas devem ser proporcionais ao nível de proteção escolhido. Vale dizer que é uma espécie de custo-benefício, já que as medidas utilizadas devem sempre ser capazes de superar os inconvenientes que ela possa vir a causar. 13 Também deve ser precária, pois devem ser revistas periodicamente à luz da evolução científica 14, tendo em vista o caráter efêmero das medidas. Além 10 CANOTILHO, José Joaquim Gomes e LEITE, José Rubens Morato. Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. São Paulo: Ed. Saraiva, 2007, p. 41. 11 CANOTILHO, José Joaquim Gomes e LEITE, José Rubens Morato. Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. São Paulo: Ed. Saraiva, 2007, p. 42. 12 SETZER, Joana e GOUVEIA, Nelson da Cruz. In MILARÉ, Édis e MACHADO, Paulo Afonso Leme. (Orgs). Direito Ambiental: fundamentos do direito ambiental. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2011, Coleção doutrinas essenciais, v.1, p. 448. 13 SETZER, Joana e GOUVEIA, Nelson da Cruz. In MILARÉ, Édis e MACHADO, Paulo Afonso Leme. (Orgs). Direito Ambiental: fundamentos do direito ambiental. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2011, Coleção doutrinas essenciais, v.1, p. 449. 14 CANOTILHO, José Joaquim Gomes e LEITE, José Rubens Morato. Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. São Paulo: Ed. Saraiva, 2007, p. 42.

5 disso, a medida adotada deve ser equivalente, pois deve ser coerente com medidas semelhantes já adotadas. 15 Assim, ainda que a dimensão do impacto não esteja clara e definida, deve-se agir com cautela, pois não se pode utilizar a incerteza como pretexto para agir com imprudência, negligência ou imperícia. A incerteza dever ser considerada como um motivo para cuidados extras, não devendo ser descartada, mas avaliada e pesquisada. 16 Vale lembrar também que, o ônus da prova é do poluidor 17, que deve demonstrar que adotou todas as medidas de precaução cabíveis. 18 1.2 PRINCÍPIO DA PREVENÇÃO O princípio da prevenção é de suma importância no Direito Ambiental, jamais podendo vir a ser esquecido. Esse princípio é considerado por alguns autores como a essência do direito ambiental 19. Ganhou guarida na Declaração de Estocolmo que, em seu Princípio 6, aduz que: O despejo de substâncias tóxicas ou de outras substâncias e de liberação de calor em quantidades ou concentrações que excedam a capacidade do meio ambiente de absorvê-las sem dano, deve ser 15 SETZER, Joana e GOUVEIA, Nelson da Cruz. In MILARÉ, Édis e MACHADO, Paulo Afonso Leme. (Orgs). Direito Ambiental: fundamentos do direito ambiental. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2011, Coleção doutrinas essenciais, v.1, p. 449. 16 SOUZA, Júpter Palagi de, e SETZER, Joana. Princípio da Precaução. In MILARÉ, Édis e MACHADO, Paulo Afonso Leme. (Orgs). Direito Ambiental: fundamentos do direito ambiental. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2011, Coleção doutrinas essenciais, v.1, p. 461 e 462. 17 Nesse sentido é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça. Vide ementa: PROCESSUAL CIVIL COMPETÊNCIA PARA JULGAMENTO DE EXECUÇÃO FISCAL DE MULTA POR DANO AMBIENTAL INEXISTÊNCIA DE INTERESSE DA UNIÃO - COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL - PRESTAÇÃO JURISDICIONAL - OMISSÃO - NÃO-OCORRÊNCIA - PERÍCIA - DANO AMBIENTAL - DIREITO DO SUPOSTO POLUIDOR - PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO - INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. (...) 3. O princípio da precaução pressupõe a inversão do ônus probatório, competindo a quem supostamente promoveu o dano ambiental comprovar que não o causou ou que a substância lançada ao meio ambiente não lhe é potencialmente lesiva. (...) 6. Recurso especial provido para determinar a devolução dos autos à origem com a anulação de todos os atos decisórios a partir do indeferimento da prova pericial. (REsp 1060753/SP, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 01/12/2009, DJe 14/12/2009) 18 CANOTILHO, José Joaquim Gomes e LEITE, José Rubens Morato. Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. São Paulo: Ed. Saraiva, 2007, p. 41. 19 DERANI, Cristiane. Direito ambiental econômico. São Paulo: Editora Max Limonad, 1997, p. 165.

6 interrompido com vistas a impedir prejuízo sério e irreversível aos ecossistemas. Como podemos observar, o princípio da prevenção se fundamenta no risco concreto. Annelise Monteiro Steigleder afirma que o princípio da prevenção supõe riscos conhecidos, seja porque previamente identificados no EIA, seja porque os danos já ocorreram anteriormente (...), ou seja, o perigo abstrato foi conhecido, transformando-se em perigo concreto. 20 Em um de seus votos, o julgador Jorge Antonio Maurique, da Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, manifestou-se sabiamente acerca do princípio da prevenção, dizendo que Em matéria ambiental, prevenir é mais importante que reconstituir e obter futura indenização por dano já ocorrido. Os prejuízos ao meio ambiente nem sempre são mensurados. A rigor, muitas vezes as lesões ao meio ambiente, conforme o recurso atingido, são irreversíveis, a despeito da possibilidade de condenação do agressor ao ressarcimento do dano causado. Por isso, afigura-se imprescindível a prevenção, como medida que se antecipe às agressões potenciais à natureza. A prevenção, no âmbito na proteção ao meio ambiente, de acordo com os ensinamentos de José Joaquim Gomes Canotilho e José Rubens Morato Leite 21, corresponde ao seguinte ditado popular: mais vale prevenir do que remediar. Isso se deve ao fato de que mais vale prevenir o dano do que posteriormente repará-lo já que muitas vezes essa reparação verifica-se quase impossível. É o caso da poluição, por exemplo. Igualmente, mais vale prevenir do que determinar uma reconstituição in natura, haja vista que nem sempre essa será a forma mais ponderada de punir o poluidor. A propósito, o princípio da prevenção não pode ser confundido com o princípio da precaução. Enquanto a precaução trabalha em cima do perigo abstrato, a prevenção é dirigida ao perigo concreto. O princípio da precaução exige uma proteção antecipada do ambiente, exigindo que os impactos danosos ao ambiente 20 STEIGLEDER, Annelise Monteiro. Responsabilidade civil ambiental: as dimensões do dano ambiental no direito brasileiro. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2011, p. 165. 21 CANOTILHO, José Joaquim Gomes e LEITE, José Rubens Morato. Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. São Paulo: Ed. Saraiva, 2007, p. 44.

7 sejam eliminados antes mesmo da ocorrência do nexo causal. Já o da prevenção determina e eliminação dos perigos comprovados. 22 O princípio da prevenção busca a adoção de medidas anteriormente á ocorrência do dano previamente conhecido a fim de evitar a sua ocorrência ou, ao menos, minorar significativamente os seus efeitos. 1.3 PRINCÍPIO DO POLUIDOR-PAGADOR O princípio do poluidor-pagador originou-se, oficialmente, no ano de 1972, onde foi incorporado pela OCDE (Organização para Cooperação de Desenvolvimento Econômico), através da Recomendação C(72), 128, de 26 de Maio de 1972 23, que mencionava que O PPP significa que o poluidor deve suportar os custos do desenvolvimento das medidas de controle da poluição decididas pelas autoridades públicas para garantir que o ambiente esteja num estado aceitável, ou, noutras palavras, que os custos de tais medidas sejam refletidos nos preços dos bens ou serviços que causam poluição na sua produção ou/e consumo. 24 Posteriormente, no ano de 1973, o princípio foi assumido pela Corte Européia como princípio base das ações comunitárias em matéria ambiental, fazendo parte até hoje dos ordenamentos de todos os países comunitários. 25 A Declaração do Rio, de 1992, igualmente agasalhou o princípio do poluidorpagador, em seu Princípio 16, mencionando que: As autoridades nacionais devem procurar promover a internalização dos custos ambientais e o uso de instrumentos econômicos, tendo em vista a abordagem segundo a qual o poluidor deve, em princípio, arcar com os 22 CANOTILHO, José Joaquim Gomes e LEITE, José Rubens Morato. Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. São Paulo: Ed. Saraiva, 2007, p. 42. 23 BENJAMIN, Antonio Herman V. O princípio poluidor-pagador e a reparação do dano ambiental. In BENJAMIN, Antonio Herman V. (Org) Dano ambiental: prevenção, reparação e repressão. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1993, p. 227. 24 SILVA, Isabel Marques. O Princípio do Poluidor Pagador. In ROCHA, Mário de Melo (Coord.) Estudos de direito do ambiente. BRAGA: Ed. Publicações Universidade Católica, 2003, p. 103. 25 BENJAMIN, Antonio Herman V. O princípio poluidor-pagador e a reparação do dano ambiental. In BENJAMIN, Antonio Herman V. (Org) Dano ambiental: prevenção, reparação e repressão. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1993, p. 227.

8 custos da poluição, com a devida atenção ao interesse público e sem provocar distorções no comércio e nos investimentos internacionais. No ordenamento jurídico brasileiro o princípio em comento é abarcado pelo art. 4º, VII, da Lei 6.938/81, segundo o qual a Política Nacional do Meio Ambiente visará à imposição, ao poluidor e ao predador, da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados, e ao usuário, de contribuição pela utilização de recursos ambientais com fins econômicos. O art. 3º do mesmo dispositivo legal, por sua vez, nos proporciona o conceito de poluidor 26, dizendo que poluidor é a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental. De acordo com Antônio Herman Benjamin, o princípio do poluidor-pagador é aquele que impõe ao poluidor o dever de arcar com as despesas de prevenção, reparação e repressão da poluição. Ou seja, estabelece que o causador da poluição e da degradação dos recursos naturais deve ser o responsável principal pelas conseqüências de sua ação ou omissão. 27 O Superior Tribunal de Justiça possui entendimento pacífico acerca da aplicação do princípio do poluidor-pagador. Em sede de recurso especial 28, o Ministro Herman Benjamin, salientou que Pacífica a jurisprudência do STJ de que, nos termos do art. 14, 1, da Lei 6.938/1981, o degradador, em decorrência do princípio do poluidorpagador, previsto no art. 4, VII (primeira parte), do mesmo estatuto, é obrigado, independentemente da existência de culpa, a reparar - por óbvio que às suas expensas - todos os danos que cause ao meio ambiente e a terceiros afetados por sua atividade, sendo prescindível perquirir acerca do elemento subjetivo, o que, conseqüentemente, torna irrelevante eventual boa ou má-fé para fins de acertamento da natureza, conteúdo e extensão dos deveres de restauração do status quo ante ecológico e de indenização. Assim, podemos perceber que o princípio do poluidor-pagador tem uma função de reparação indireta dos danos, na medida em que não visa permitir que 26 Art. 3º, IV, Lei 6.938/81. 27 BENJAMIN, Antonio Herman V. O princípio poluidor-pagador e a reparação do dano ambiental. In BENJAMIN, Antonio Herman V. (Org) Dano ambiental: prevenção, reparação e repressão. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1993, p. 228. 28 REsp 769.753/SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 08/09/2009, DJe 10/06/2011

9 haja poluição mediante um preço, mas sim que esse preço seja dado para que o poluidor financie todas as medidas necessárias para repor a qualidade ambiental. Além dessa, não podemos olvidar do caráter de prevenção do princípio do poluidor-pagador, pois a partir do momento em que o poluidor não tenha mais alternativa, senão parar de poluir ou ter que arcar com um custo econômico em favor do Estado, ele terá de fazer um balanço do que lhe será menos oneroso, devendo optar pela forma mais vantajosa, qual seja, a de tomar todas as medidas necessárias para evitar a poluição. 29 Em suma, vale dizer que impor ao poluidor um custo, não significa dizer que a lesão restará eliminada. O objetivo é exigir uma reflexão por parte daquele que praticou o dano, bem como por parte daqueles que poderiam vir a praticar, a fim de que todos ponderem a relação do custo benefício antes de praticar a atividade poluidora, elegendo formas que não venham a prejudicar o meio ambiente. 2 O DANO AMBIENTAL A Ecologia tem grande participação na sistemática formada pelo dano causado ao meio ambiente e sua reparação. A sua primeira grande característica é a capacidade de autorregulação 30, ou seja, o poder que ela tem de manter e regular as suas funções básicas a partir da ação das plantas e dos animais, bem como dos ciclos de vida por eles constituídos. A capacidade de autorregeneração 31 se resume na tendência que os sistemas têm de, mediante uma ação de intervenção, retornar ao seu estado anterior, buscando manter o equilíbrio. Além disso, não podemos esquecer-nos da capacidade funcional da ecologia, que trata das funções e da importância dos bens naturais no nosso ecossistema. A capacidade de uso desses bens pelo ser humano, última característica da ecologia, se configura pela possibilidade que a natureza tem de suprir as necessidades das pessoas, tais como alimentação, embelezamento, recreação, etc. Assim, a partir de todas essas idéias, 29 CANOTILHO, José Joaquim Gomes e LEITE, José Rubens Morato. Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. São Paulo: Ed. Saraiva, 2007, p. 48. 30 STEIGLEDER, Annelise Monteiro. Responsabilidade civil ambiental: as dimensões do dano ambiental no direito brasileiro. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2011, p. 18.

10 podemos dizer que quando uma dessas características é violada, há o dano ao meio ambiente, que nem sempre será passível de reparação. É nesse contexto que Ecologia e Direito se unem a fim de apurar os danos causados ao meio ambiente a seus meios de reparação. A Ecologia, com seus instrumentos, possibilita a constatação do real prejuízo causado, enquanto que o Direito define as punições ao causador do dano, e os moldes em que a reparação deverá ocorrer. Ocorre que nem sempre a apuração do dano poder ser mensurada de forma imediata, eis que determinadas conseqüências, como a contaminação dos lençóis freáticos, somente serão perceptíveis a longo prazo. A problemática surge a partir do momento em que os juristas, operadores do Direito, exigem a minuciosa análise do dano, uma vez que necessitam de dados concretos e exatos, bem como uma prova determinante do dano, já que não se verifica suficiente apontar apenas as probabilidades no momento da reparação, ainda que inspiradas em um juízo de verossimilhança. Além disso, não se pode olvidar que o nexo de causalidade, requisito fundamental na seara da reparação, por vezes também não é de fácil constatação, pois, como referido anteriormente, nem sempre o resultado do dano causado poderá ser verificado de forma imediata. 32 Vale lembrar que não se pode confundir dano ambiental com impacto ambiental. Conforme o art. 225, 1º, IV 33, da Constituição Federal, o impacto ambiental caracteriza-se por ser uma degradação significativa do meio ambiente, 31 STEIGLEDER, Annelise Monteiro. Responsabilidade civil ambiental: as dimensões do dano ambiental no direito brasileiro. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2011, p. 18. 32 STEIGLEDER, Annelise Monteiro. Responsabilidade civil ambiental: as dimensões do dano ambiental no direito brasileiro. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2011, p. 19. 33 Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações. 1º - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade

11 que cause grave alteração em termos de intensidade e extensão, não podendo configurar impacto qualquer lesão ambiental. 34 Em razão da dificuldade de apurar o dano causado ao meio ambiente, adotaremos a classificação de José Rubens Morato Leite, segundo o qual classificamos o dano de acordo com a sua extensão, quanto à amplitude do bem protegido, quanto à reparabilidade e os interesses jurídicos envolvidos e quanto ao interesse objetivado. 35 No que tange à sua extensão, o dano possui duas dimensões: uma patrimonial e outra extrapatrimonial (ou moral). A primeira consiste na perda das características fundamentais do sistema ecológico afetado e também nos prejuízos sofridos pelo indivíduo em função dessa afetação. Refere-se relativamente à restituição, recuperação, ou indenização do bem ambiental lesado. A segunda refere-se tanto ao interesse difuso, quanto ao interesse individual, em razão do meio ambiente individual e privado. 36 Analisa-se neste ponto tudo que diz respeito à sensação da dor experimentada, ou seja, a todo prejuízo não-patrimonial ocasionado à sociedade ou ao indivíduo em virtude da lesão do meio ambiente. 37 No atinente à amplitude do bem protegido, verificamos três possibilidades: o dano ecológico puro é a primeira delas, e caracteriza-se pelas alterações causadas estritamente aos componentes naturais do ecossistema, que atingem bens próprios da natureza. A segunda pode ser identificada pelas alterações causadas em detrimento dos interesses da coletividade, inclusive do patrimônio cultural. A terceira, mas não menos importante, configura-se pelo dano ambiental reflexo, isto é, o alcance que o dano tem sobre a esfera individual dos cidadãos. Tem como fim a tutela dos interesses próprios do lesado, pois a partir do momento que se protege a 34 MIRRA, Álvaro Luiz Valery. Ação civil pública e a reparação do dano ao meio ambiente. São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 2002, p.90. 35 LEITE, José Rubens Morato. Dano ambiental: do coletivo ao extrapatrimonial. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 95. 36 SILVA, Danny Monteiro da. Dano ambiental e sua reparação. Curitiba: Juruá, 2007, p. 119. 37 LEITE, José Rubens Morato. Dano ambiental: do coletivo ao extrapatrimonial. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 97.

12 esfera individual, automaticamente o bem ambiental encontra-se parcialmente e limitadamente protegido. 38 No tocante à reparabilidade e ao interesse coletivo, classificamos o dano quanto à sua reparabilidade direta e quanto a sua reparabilidade indireta. A direta ocorre quando se trata de interesses individuais. Dessa forma, aquele que sofre a lesão será diretamente indenizado. A reparabilidade indireta ocorre quando o interesse atingido é de cunho difuso ou coletivo, sendo o bem de interesse coletivo reparado de forma indireta. 39 Já no que se refere aos interesses objetivados, de um lado teremos o interesse da coletividade, de outro os interesses dos indivíduos e, ainda, num terceiro momento, teremos o interesse do indivíduo em proteger os interesses da coletividade. 40 Assim, para melhor entendimento das dimensões do dano ambiental, analisemos o quadro 41 abaixo que mostra claramente as classificações existentes acerca dos prejuízos causados ao meio ambiente: Quadro Sinóptico Espécies de dano ambiental Levando em conta: Significação: Espécie de dano: 1) A extensão do dano 1) Considerando a lesividade verificada no bem ambiental. a) dano ambiental patrimonial; b) dano ambiental extraptrimonial 2) A amplitude do bem 2) Conceitos restrito, a) dano ecológico puro 38 LEITE, José Rubens Morato. Dano ambiental: do coletivo ao extrapatrimonial. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 95 39 LEITE, José Rubens Morato. Dano ambiental: do coletivo ao extrapatrimonial. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 96. 40 LEITE, José Rubens Morato. Dano ambiental: do coletivo ao extrapatrimonial. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 96. 41 Quadro sinóptico sobre a classificação do dano ambiental. Disponível em: LEITE, José Rubens Morato. Dano ambiental: do coletivo ao extrapatrimonial. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 100.

13 protegido 3) A reparabilidade e o interesse envolvido amplo e parcial do bemestrito); ambiental b) dano ambiental mplo); c)dano ambiental dividual ou reflexo (parcial) 3) Obrigação de reparar a) dano de diretamente ao parabilidade direta; interessado ou b) dano de indiretamente ao bem parabilidade indireta. ambiental protegido. Relativamente ao interesse do proprietário (microbem), ou concernente ao interesse difuso da coletividade na proteção do bem ambiental (macrobem). 4) Os interesses 4) Considerando os a) dano ambiental de objetivados interesses objetivados na eresse da coletividade; tutela jurisdicional b) ano ambiental de pretendida eresse subjetivo ndamental; c) dano ambiental de eresse individual. Fonte: LEITE, José Rubens Morato. Dano ambiental: do coletivo ao extrapatrimonial. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003. 2.1 AS DIMENSÕES DO DANO 2.1.1 A dimensão material do dano A dimensão material do dano trata da existência material e dos pressupostos fáticos para o reconhecimento do dano. Dano material é aquele que atinge não só o patrimônio ambiental, mas que também acarreta indiretamente prejuízos ao patrimônio e à integridade física das pessoas. Para o seu conhecimento é necessário obter a certeza da ocorrência do dano, que seja relevante e que não atinja uma vítima concreta, ou seja, que haja impessoalidade. Dano certo é aquele sobre o qual não pode haver qualquer dúvida quanto à existência, inversamente ao que ocorre com o dano eventual. Além de certo, o prejuízo ambiental deve ser relevante. Essa relevância é determinada pela ruptura do equilíbrio ecológico, já que a Constituição Federal de 1988 garante ao cidadão o

14 ambiente ecologicamente equilibrado. O abalo desse equilíbrio ecológico é definido pela gravidade, anormalidade e periodicidade do dano, requisitos básicos para a sua configuração. O dano ainda deve ser impessoal, ou seja, as vítimas do prejuízo não são pessoas individualmente consideradas, ao contrário, ele atinge a todos, eis que difuso e coletivo. 42 Ocorre aqui uma ampliação do objeto material do dano. Em se tratando do tempo do dano, vale dizer que esse tempo é o período em que ocorrem as modificações ecológicas causadas pela alteração do equilíbrio ambiental. 2.1.2 A dimensão extrapatrimonial do dano A dimensão extrapatrimonial do dano diz respeito a todo o prejuízo nãopatrimonial ocasionado à sociedade ou ao indivíduo em virtude da lesão ao meio ambiente. Aqui o dano se caracteriza pelo impacto negativo ao bem-estar da coletividade em razão da degradação dos bens ambientais. A reparação ocorre em função do tempo de privação do equilíbrio ecológico e da qualidade de vida proporcionada pelo recurso ambiental. 43 No âmbito constitucional, encontramos a reparabilidade do dano extrapatrimonial no art. 5º, segundo o qual um dos direitos fundamentais do cidadão é a indenização por dano material, moral ou à imagem. Além disso, vale dizer que há um dano extrapatrimonial coletivo. Nesse ínterim, José Rubens Moratto Leite manifesta-se dizendo que se pode haver a reparação do dano causado ao cidadão individualmente considerado, da mesma forma pode haver a reparação no tocante à coletividade. Ele coloca que não sendo possível o ressarcimento no âmbito individual, a reparação à coletividade vem como alternativa de imposição da sanção civil ao agente causador da lesão ambiental 44. Atualmente, podemos notar que a concessão de danos extrapatrimoniais no contexto ambiental vem crescendo. A Desembargadora Marilene Bonzanini, da Nona 42 MIRRA, Álvaro Luiz Valery. Ação civil pública e a reparação do dano ao meio ambiente. São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 2002, p.99. 43 MARCHESAN, Ana Maria Moreira; Steigleder, Annelise Monteiro e Cappeli, Sílvia. Direito Ambiental. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2006, p.150.

15 Câmara Cível, do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, determinou o pagamento de indenização por danos morais em razão do mal cheiro e da proliferação de mosquitos em função da falha na prestação de serviço decorrente da instalação da Estação de Tratamento de Esgoto. A indenização foi fixada no valor de R$ 5.450,00 com o escopo de reparar e reprimir a conduta da Estação de Tratamento. 45 O Desembargador Carreira Machado, da segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, no mesmo sentido prolatou seu voto acerca dos danos extrapatrimoniais mencionando que: O dano extrapatrimonial não surge apenas em conseqüência da dor, em seu sentido moral de mágoa, mas também do desrespeito a valores que afetam negativamente a coletividade. A dor, em sua acepção coletiva, é ligada a um valor equiparado ao sentimento moral individual e a um bem ambiental indivisível, de interesse comum, solidário, e relativo a um direito fundamental da coletividade. O dano extrapatrimonial ambiental ofende o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, assegurado pelo artigo 225 da Constituição Federal, bem como o princípio da dignidade humana, assegurado pelo art. 1º da Constituição Feral. Mais ainda, afrontam os direitos da personalidade, eis que atingem a qualidade de vida dos seres humanos. 2.2 CLASSIFICAÇÕES DO DANO 2.2.1 O dano ecológico puro O dano ecológico puro é aquele que atinge, de forma intensa, os próprios bens na natureza, em sentido estrito. Caracteriza-se pelas alterações causadas aos componentes naturais do ecossistema. 46 44 LEITE, José Rubens Morato. Dano ambiental: do coletivo ao extrapatrimonial. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 288. 45 Apelação Cível Nº 70043920412, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marilene Bonzanini Bernardi, Julgado em 24/08/2011. 46 LEITE, José Rubens Morato. Dano ambiental: do coletivo ao extrapatrimonial. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 95.

16 É necessário que seja feita a diferenciação entre dano ambiental puro e dano e dano reflexo ou de ricochete. Enquanto o segundo caracteriza-se pelo caráter pessoal, patrimonial ou econômico, o primeiro verifica-se a partir da análise de dois critérios, quais sejam, o critério naturalístico e o critério da delimitação negativa do dano ecológico 47. Importante salientar que, nos casos de dano ao patrimônio humano, podendo ser exemplo o patrimônio construído, o que se protege é a qualidade de vida e o bem-estar do ser humano. Já no caso dos danos ao patrimônio natural dano ambiental puro -, a ofensa recai diretamente sobre tudo aquilo que compõe a natureza e o meio ambiente, e a proteção se dá em razão da manutenção da capacidade funcional ecológica do meio ambiente. 2.2.2 O dano ambiental amplo De acordo com a classificação de José Rubens Moratto Leite, temos o dano ambiental lato sensu, que é aquele que abrange todos os componentes do meio ambiente, inclusive o patrimônio cultural 48. Também chamado de dano ecológico, ele engloba todos os aspectos naturais, culturais e artificiais que permitem e condicionam a vida, visto como bem unitário imaterial coletivo indivisível, e dos bens ambientais e seus elementos corpóreos e incorpóreos específicos que o compõem 49. 2.2.3 O dano ambiental individual ou reflexo O dano ambiental individual ou reflexo é aquele em que o prejuízo ao particular se dá em razão de alguma agressão causada ao meio natural. Aqui é visado o interesse próprio do indivíduo, pois o dano individual é aquele que recai sobre o microbem ambiental de interesse privado, mas sem deixar de afetar o 47 SILVA, Danny Monteiro da. Dano ambiental e sua reparação. Curitiba: Juruá, 2007, p. 104. 48 LEITE, José Rubens Morato. Dano ambiental: do coletivo ao extrapatrimonial. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 96. 49 MIRRA, Álvaro Luiz Valery. Ação civil pública e a reparação do dano ao meio ambiente. São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 2002, p.89.

17 macrobem ambiental de interesse público 50. Dessa forma, o objetivo aqui não é proteger os interesses ambientais, mas sim os interesses do próprio lesado. O dano individual pode ser classificado de três formas: a primeira é a material. Essa se caracteriza pela destruição ou alteração de bens particulares, ou seja, a deterioração ou corrosão de bens, ou ainda no âmbito econômico pelos lucros cessantes 51 ou danos emergentes 52, decorrente, por exemplo, pela contaminação de uma plantação por águas poluídas ou por pesticidas. A segunda é a moral, que decorre da perda de algum animal ou até mesmo de alguma árvore pelos quais o seu dono tinha muita afeição, ou ainda pelas alterações causadas na imagem da cidade em que reside em razão de alguma alteração causada pelo meio ambiente. A terceira é a corporal, que se dá em virtude de agressões que podem vir a ocorrer à integridade física das pessoas, como uma doença respiratória em razão da poluição atmosférica 53. Em suma, o dano individual ou reflexo não é necessariamente um dano ecológico 54, mas sim um prejuízo ás pessoas físicas ou jurídicas proprietárias dos bens atingidos pelas atividades degradadoras da qualidade ambiental. Outro ponto importante é a relação existente entre o dano, em seu caráter individual, e o direito de vizinhança. Existem vários incômodos de vizinhança que podem ser intoleráveis, principalmente em se tratando de lesões de conotação 50 SILVA, Danny Monteiro da. Dano ambiental e sua reparação. Curitiba: Juruá, 2007, p.115. 51 O lucro cessante consiste na frustração do crescimento patrimonial alheio, ou seja, o ganho patrimonial que a vítima poderia auferir, mas não o fez graças à lesão sofrida. (STJ Recurso Especial nº 979.118 - MT (2007/0195659-7), Relatora Ministra Nancy Andrighi, julgado em 23 de setembro de 2008). 52 O dano emergente é tudo aquilo que se perdeu, importando "efetiva e imediata diminuição no patrimônio da vítima", devendo a indenização "ser suficiente para a restituição integral" (Cavalieri F.º, 2005, p. 97). Ele não será composto necessariamente somente pelos prejuízos sofridos diretamente com a ação danosa, mas incluirá também tudo aquilo que a vítima despendeu com vistas a evitar a lesão ou o seu agravamento, bem como outras eventuais despesas relacionadas ao dano sofrido. Disponível em: http://jus.com.br/revista/texto/11365/o-dano-na-responsabilidade-civil 53 Classificação adotada por Álvaro Luiz Valery Mirra em: MIRRA, Álvaro Luiz Valery. Ação civil pública e a reparação do dano ao meio ambiente. São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 2002, p.70. 54 MIRRA, Álvaro Luiz Valery. Ação civil pública e a reparação do dano ao meio ambiente. São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 2002, p.73

18 ambiental. É o caso, por exemplo, da emissão de gases poluentes por indústrias, ou da poluição sonora gerada por um estabelecimento comercial 55. Entretanto, imperioso se faz lembrar que é fundamental que haja um equilíbrio que repousa na obrigação que todos têm de não causar prejuízos ao vizinho e, de outro lado, na obrigação de suportar certos incômodos. Assim, não é qualquer incômodo que configurará dano, mas sim aquele considerado anormal, intolerável ou grave, ou seja, aquele que é contínuo e periódico, e não uma simples agressão banal ou passageira. 2.2.4 O dano de reparabilidade direta e indireta A reparabilidade direta se dá quando se trata de interesses individuais e reflexos. O interessado que sofreu a lesão será diretamente indenizado. Essa indenização é uma forma de reparação específica em que é estabelecida uma compensação financeira à vítima do dano 56. É aquele que viola interesses pessoais e reflete apenas ao meio ambiente considerado como um microbem. A lei 6.938/81, ao tratar da reparação, diz em seu art. 14, 1º que sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade (...). A reparabilidade indireta, por sua vez, diz respeito aos interesses difusos e coletivos e a tutela se dá em razão do macrobem ambiental, considerado como patrimônio da coletividade. Nesse âmbito a reparabilidade é feita indiretamente e preferencialmente ao bem ambiental 57. De acordo com Marcos Detefenni 58, há duas formas de reparação: a reparação específica e a compensação A reparação 55 LEITE, José Rubens Morato. Dano ambiental: do coletivo ao extrapatrimonial. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 142. 56 DESTEFENNI, Marcos. A Responsabilidade civil ambiental e as formas de reparação do dano ambiental: aspectos teóricos e práticos. Campinas: 2005, p. 197. 57 LEITE, José Rubens Morato. Dano ambiental: do coletivo ao extrapatrimonial. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, pg. 96. 58 DESTEFENNI, Marcos. A Responsabilidade civil ambiental e as formas de reparação do dano ambiental: aspectos teóricos e práticos. Campinas: 2005, p. 199.

19 específica consiste em restituir o meio ambiente ao estado anterior à conduta danosa. Não havendo a possibilidade de restituição, então iremos falar em compensação, que se caracteriza por ser uma alternativa à reparação específica, e consiste na adoção de medida de equivalente importância ecológica, dentro do mesmo ecossistema onde ocorreu o dano. 2.2.5 O dano ambiental de interesse coletivo e individual No que se refere aos interesses objetivados, teremos o dano de interesse da coletividade, e, conseqüentemente, no interesse na preservação do macrobem ambiental. O macrobem ambiental é o meio ambiente como um todo, em seu conceito mais profundo e adequado, o meio ambiente em sua máxima complexidade, em sua máxima extensão; todas as formas de vida interagindo entre si e com todas suas manifestações e criações 59,ou seja, é basicamente uma universalidade de bens composta por bens ambientais. Esse tipo de dano atinge um número indeterminado de pessoas. 60 De outro lado encontramos a proteção dos interesses particulares individuais próprios, relativos aos prejuízos causados aos bens individuais de cada pessoa. Aqui entramos na seara do microbem ambiental, isto é, todo e qualquer elemento constituinte e integrante do meio ambiente. Os microbens, ao interagirem, é que formam o meio ambiente e, conseqüentemente, o macrobem ambiental. 61 É o caso, por exemplo, dos danos ambientas individuais ou reflexos, como referido alhures. 3 A RESPONSABILIDADE CIVIL PELO DANO AMBIENTAL 59 O Objeto do Direito Ambiental, disponível em: http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=5927. Acesso em: 25/08/2011. 60 O Objeto do Direito Ambiental, disponível em: http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=5927. Acesso em: 25/08/2011. 61 O Objeto do Direito Ambiental, disponível em: http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=5927. Acesso em: 25/08/2011.

20 A responsabilidade civil pelos danos causados ao meio ambiente encontra guarida no art. 14, 1º, da Lei Política Nacional do Meio Ambiente (Lei nº 6.938/81), estabelecendo que Sem obstar a aplicação das penalidades previstas nesse artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União, dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente. Vale lembrar que, de acordo com o que dispõe o art. 225, 3º 62 da Constituição Federal, juntamente com o refere o art. 14 1º da Lei 6.938/81, a responsabilidade pelo dano ambiental é objetiva, pois independe de culpa 63. Indispensável para a aplicação do instituto da responsabilidade civil é a existência de um dano (estudado no capítulo anterior) a um bem ou interesse juridicamente tutelado, podendo esse dano ser patrimonial ou não. Na seara ambiental, havendo prejuízo em razão desse dano, nasce a obrigação de reparação por parte do poluidor. 3.1 AS FUNÇÕES DA REPONSABILIDADE CIVIL AMBIENTAL A primeira e grande função da responsabilidade civil é a de reparação. Essa função trás a idéia de restituição ao status quo anterior à lesão, ou seja, visa proporcionar ao lesado situação igual àquela que possuía antes dos prejuízos causados, como se dano não houvesse 64. Essa função tem embasamento, fundamentalmente, na chamada teoria da reparação integral 65, adotada pelo Brasil, segundo a qual qualquer lesão causada ao meio ambiente deve ser recuperada em 62 Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações. 3º - As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados. 63 CARVALHO, Francisco José. Curso de Direito Ambiental. Curitiba: Juruá, 2010. p. 243. 64 BETIOL, Luciana Stocco. Responsabilidade e proteção ao meio ambiente. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 119. 65 A teoria da reparação integral tem respaldo, no nosso ordenamento jurídico, no Código Civil Brasileiro, que em seu art. 944, refere que: A indenização mede-se pela extensão do dano.

21 sua integridade. Por isso, mesmo quando não houver a possibilidade de reparação, ainda será devida indenização pecuniária nos termos da Lei 7.347/85 66 67. A outra função é a chamada função preventiva, que tem como escopo identificar as atividades potencialmente poluidoras, a fim de prevenir a sua realização, bem como a necessidade de uma posterior reparação. 68 Enquanto a função reparadora cuida daqueles danos já ocorridos, a função preventiva lida apenas com o risco do dano, eis que baseada na teoria do risco 69. A última, mas não menos importante é a função punitiva que, por sua vez, está vinculada ao ressarcimento. Munida de cunho pedagógico, ela visa penalizar economicamente o poluidor, a fim de que este não queira reincidir na sanção, e, ao mesmo tempo, dê exemplo aos demais componentes da sociedade 70. Além do mais, uma vez que eficaz o instrumento punitivo, este acaba por estimular a função considerada como a mais importante para o meio ambiente, que é a função preventiva 71. 3.2 OS PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL AMBIENTAL 3.2.1 O evento danoso O evento danoso, como visto, é o resultado de uma atividade que, de forma direta ou indireta, cause degradação ao meio ambiente, ou seja, modificações 66 A lei dispõe sobre a ação civil pública de responsabilidade por danos causados ao meio-ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico. 67 MILARÉ, Édis. Direito do ambiente: doutrina, jurisprudência, glossário. 4º ed., rev., atual. e amp. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005. p. 830. 68 MILARÉ, Édis. Direito do ambiente: doutrina, jurisprudência, glossário. 4º ed., rev., atual. e amp. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005. p. 830. 69 A teoria do risco será tratada mais tarde. 70 BETIOL, Luciana Stocco. Responsabilidade e proteção ao meio ambiente. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 134. 71 Suzane Carval (1995, p. 21-22), citada por Luciana Stocco Betiol, afirma que o se tem visto é uma interpenetração entre as funções reparadora e punitiva no seio tanto da responsabilidade civil quanto do direito penal, uma não desdenhando de realizar tarefa tradicionalmente devida à outra. O direito penal, além de estar preocupado com o castigo ao ofensor, também trata da reparação, tanto aquela oferecida a toda a coletividade como a que é oferecida à vítima em que, além de assegurar a reparação ou compensação pelos danos sofridos, não negligencia a função de repressão de comportamento por meio de instrumentos que lhe são próprios. (BETIOL, Luciana Stocco. Responsabilidade e proteção ao meio ambiente. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 124).

22 adversas nas suas características e, conseqüentemente, alteração no equilíbrio ecológico. 3.2.2 O nexo de causalidade O nexo de causalidade é relação entre a atividade e o dano dela advindo. É considerado pela doutrina 72 como o pressuposto mais importante da responsabilidade civil pelos danos ao meio ambiente, pois somente restará caracterizada a responsabilidade a partir do momento em que identificada a ligação entre a ação/omissão e o dano causado. O nexo de causalidade ainda permite analisar a extensão do evento danoso e a quem o resultado deste evento deve ser atribuído. A grande problemática do nexo de causalidade na seara ambiental é que na grade maioria das vezes o dano ambiental pode ser o resultado de inúmeras causas, e não de apenas uma, o que dificulta a análise da relação atividade e evento danoso. Antonio Herman Benjamin trás importante contribuição para o entendimento do tema, reproduzindo que 1. As dificuldades da determinação da fonte poluidora entre as tantas possíveis fontes de poluição da mesma substância. Aqui cuida-se da comprovação da relação causal entre fonte e dano (=identificação, entre os vários possíveis agentes, daquele cuja ação ou omissão está em conexão com o dano). O fato de muitas dessas substâncias não serem sequer visíveis ou perceptíveis pelos sentidos comuns, o caráter sorrateiro e inconsciente da exposição e o longo período de latência, tudo contribui para que a identificação do autor seja um objeto remoto, nem sempre podendo o autor afirmar, com certeza, onde e quando a exposição ocorreu. 2. Dificuldade de determinação da origem do dano ambiental ou dos males que a vítima apresenta. Raramente só um agente tóxico é a única fonte de um determinado dano ambiental ou doença. Neste segundo estágio, o que se quer saber é se aquela substância ou atividade particular, previamente identificada, foi mesmo a causa efetiva do prejuízo: é a verificação do nexo causal entre a substância perigosa ou tóxica e dano (=identificação do modus operandi da causação do dano pela conduta do agente). 73 Assim, tendo em vista a dificuldade de determinar o nexo de causalidade, já que muitas vezes esses danos percorrem um caminho latente, impedindo a certeza 72 STEIGLEDER, Annelise Monteiro. Responsabilidade civil ambiental: as dimensões do dano ambiental no direito brasileiro. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2011, p. 171. 73 BENJAMIN, Antonio Herman, Dano Ambiental: prevenção, reparação e prevenção. 1993, p. 456.