ÁLGEBRA: PENSAR? CALCULAR? COMUNICAR?

Documentos relacionados
A PROPORCIONALIDADE E O PENSAMENTO ALGÉBRICO

ÁLGEBRA É MAIS DO QUE ALGEBRISMO

Proporcionalidade e Pensamento Algébrico Como e Por que Integrar?

DISCIPLINA DE MATEMÁTICA 7.º Ano

EVIDENCIANDO INDICADORES DE DESENVOLVIMENTO DO PENSAMENTO ALGÉBRICO: Equações Algébricas de Primeiro Grau

PROBLEMAS PARA ENSINAR EQUAÇÕES OU EQUAÇÕES PARA RESOLVER PROBLEMAS?

PLANO DE ENSINO Disciplina: Matemática 8 a série Professor: Fábio Girão. Competências e Habilidades Gerais da Disciplina

Novo Programa de Matemática - 2.º Ciclo Matemática 6ºANO

UM ESTUDO ANALÍTICO ACERCA DA SOLUÇÃO DE PROBLEMAS ALGÉBRICOS ENVOLVENDO PROFESSORES E ESTUDANTES. Regina Lucia da Silva SEE/SP UFABC

Ensino e aprendizagem de números e álgebra

Predisposição para procurar e explorar padrões geométricos e o gosto por investigar propriedades e relações geométricas.

A PROVA BRASIL/2011: IDENTIFICANDO DIFICULDADES RELACIONADAS ÀS CONCEPÇÕES DE ÁLGEBRA POR MEIO DOS DESCRITORES

Eduardo. Competência Objeto de aprendizagem Habilidade

M A T E M Á T I C A Desenho Curricular por Área

ANEXO I UNIVERSIDADE DA REGIÃO DE JOINVILLE UNIVILLE COLÉGIO DA UNIVILLE PLANEJAMENTO DE ENSINO E APRENDIZAGEM

AS ORIENTAÇÕES CURRICULARES OFICIAIS PARA O ENSINO DA ÁLGEBRA NOS ANOS FINAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL

Formação PNAIC 2017/2018. Formadores Regionais 1º ao 3º ano

QUE CONCEPÇÕES DE ÁLGEBRA SURGEM NAS QUESTÕES DE MACROAVALIAÇOES: o caso do ENEM 2011.

2ª Ana e Eduardo. Competência Objeto de aprendizagem Habilidade

Novo Programa de Matemática - 2.º Ciclo. Matemática 5ºANO

A ÁLGEBRA DA EDUCAÇÃO BÁSICA VISTA POR ALUNOS CONCLUINTES DO ENSINO MÉDIO. Maria de Fátima Costa Sbrana

BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR 2ª versão A ÁREA DE MATEMÁTICA NO ENSINO FUNDAMENTAL

Agrupamento de Escolas António Correia de Oliveira PLANIFICAÇÃO ANUAL DE MATEMÁTICA 7.º ANO ANO LETIVO 2018/19

Planejamento Anual. Componente Curricular: Matemática Ano: 7º ano Ano Letivo: Professor(s): Eni e Patrícia

FORMAÇÃO CONTINUADA PARA PROFESSORES DE MATEMÁTICA FUNDAÇÃO CECIERJ / SEEDUC-RJ

PLANO DE ENSINO Disciplina: Matemática 8 a série Professor: Fábio Girão. Competências Habilidades Conteúdos. I Etapa

MATRIZ DE REFERÊNCIA SAEB

ENSINO MÉDIO: INOVAÇÃO E MATERIALIDADE PEDAGÓGICA EM SALA DE AULA 1. Palavras-Chave: Ensino Médio. Inovação Pedagógica. Pensamento docente.

PLANIFICAÇÃO ANUAL ANO LETIVO PRÁTICAS ESSENCIAIS DE APRENDIZAGEM

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS - INEP DIRETORIA DE AVALIAÇÃO PARA CERTIFICAÇÃO DE COMPETÊNCIAS

Aprendizagens: Conhecimentos/ Capacidades e atitudes O aluno deve ficar capaz de:

Critérios de Avaliação de Matemática 7.ºano de escolaridade 2018/2019. Domínio cognitivo/ procedimental 80% Descritores de Desempenho

MATRIZ DE REFERÊNCIA PARA AVALIAÇÃO DO SARESP MATEMÁTICA 4ª SÉRIE DO ENSINO FUNDAMENTAL (EM FORMATO DE LISTA)

Matriz de Referência - Língua Portuguesa 4ª série do ensino fundamental

MATEMÁTICA 3º ANO. Novo programa de matemática Objetivos específicos. Currículo Paulo VI. Números naturais. Relações numéricas Múltiplos e divisores

Ensino Técnico Integrado ao Médio

Perfil de Aprendizagens Específicas Matemática - 5º ano

SISTEMA ANGLO DE ENSINO G A B A R I T O

Matriz de Referência da área de Matemática Ensino Fundamental

1º Período Total tempos previstos: 49

Curso de Educação e Formação Empregado de Restaurante/Bar 1º Ano. Planificação Anual de Matemática

O CONHECIMENTO ALGÉBRICO DOS ALUNOS DA EDUCAÇÃO BÁSICA Ronaldo Vieira Cabral FACNORTE/IBEA

EDUCAÇÃO ALGÉBRICA NO ENSINO FUNDAMENTAL II: A EXTENSÃO GERADA PELA PESQUISA

E.E. SENADOR LUIZ NOGUEIRA MARTINS ATPC 11 DE AGOSTO 2017 PC: ANA LUCIA FAZANO PARTE 2

Agrupamento de Escolas de Águeda Escola Básica Fernando Caldeira

G6 - Ensino e Aprendizagem de Matemática nos anos finais do Ensino Fundamental e na EJA

ANÁLISE DOS PARÂMETROS DA FUNÇÃO AFIM: UMA VIVÊNCIA COMO BOLSISTA DE INICIAÇÃO À DOCÊNCIA A PARTIR DO USO DO GEOGEBRA

Zaqueu Vieira Oliveira Sala 128 do bloco A

Curso Semipresencial Promove Reflexão Sobre a Prática no Ensino de Álgebra

Metas Curriculares Conteúdos Aulas Previstas. - Números primos; - Crivo de Eratóstenes;

O ENSINO-APRENDIZAGEM DA PRÉ-ÁLGEBRA NA VISÃO DE PIAGET E VYGOTSKY.

AGRUPAMENTO DE ESCOLAS DR. VIEIRA DE CARVALHO

Planejamento Anual OBJETIVO GERAL

Plano de Trabalho Docente Ensino Médio. Habilitação Profissional: Técnico em informática para Internet Integrado ao Ensino Médio

Plano de Trabalho Docente Ensino Médio

Plano de Trabalho Docente Ensino Médio

Plano de Trabalho Docente Ensino Médio

APROXIMAÇÕES ENTRE O PISA E SAEB

01. B 07. A 13. D 19. B 02. D 08. C 14. D 20. D 03. A 09. A 15. C 21. C 04. B 10. D 16. B 22. B 05. C 11. A 17. A B 12. B 18.

Planificação Anual. Matemática Dinâmica 7º ano Luísa Faria; Luís Guerreiro Porto Editora. 1 Números inteiros. 10 Sequências e Regularidades

PLANO DE ENSINO Disciplina: Matemática 8º ano Professor(a): Gracivane Pessoa

FLEXIBILIZAÇÃO CURRICULAR. Planificação Anual 7ºano Disciplina/Área disciplinar: MATEMÁTICA

Plano de Trabalho Docente Ensino Médio

Programa de Matemática 4º ano

PLANIFICAÇÃO ESPECÍFICA DE MATEMÁTICA ANO LETIVO 2018/2019 7º ANO

PLANO DE ESTUDOS DE MATEMÁTICA - 6.º ANO PERFIL DO ALUNO 1.º PERÍODO. DOMÍNIOS SUBDOMÍNIOS/CONTEÚDOS OBJETIVOS n.º de aulas

PLANO DE ESTUDOS DE MATEMÁTICA 6.º ANO

ATIVIDADES ESTRATÉGIAS. Ler e representar números até ao milhão.

MATRIZ DE REFERÊNCIA SAEB FONTE:INEP/MEC

AGRUPAMENTO DE ESCOLAS DR. VIEIRA DE CARVALHO

3ª Eduardo e Ana. Competência Objeto de aprendizagem Habilidade

Planificação de Matemática 9º ano. Ano letivo: 2014/15

Sarah Raphaele de Andrade Pereira; Lúcia Cristina Silveira Monteiro. Universidade Federal de Alagoas; Universidade Federal de Alagoas

PLANIFICAÇÃO MATEMÁTICA - 5º ANO AGRUPAMENTO DE ESCOLAS DE VILA D ESTE OPERACIONALIDADE DAS APRENDIZAGENS ESSENCIAIS ANO LETIVO

MAT 1514 A Matemática na Educação Básica. Profa. Daniela Mariz Sala 108 Bloco A

3ª Gustavo Lopes. Competência Objeto de aprendizagem Habilidade

G A B A R I T O G A B A R I T O

Plano de Trabalho Docente Ensino Médio. Professor: Bruno Santos Nascimento

ESCOLA SECUNDÁRIA DE AMORA PLANIFICAÇÃO A LONGO/MÉDIO PRAZO

PASSOS INICIAIS NOS CAMINHOS DA ÁLGEBRA

GRUPO DE MATEMÁTICA NO ENSINO FUNDAMENTAL. Projeto Fundão no Festival

COMPREENSÃO MATEMÁTICA COM REGISTROS DE REPRESENTAÇÃO

AGRUPAMENTO DE ESCOLAS DR. VIEIRA DE CARVALHO DEPARTAMENTO DE MATEMÁTICA E CIÊNCIAS EXPERIMENTAIS MATEMÁTICA PLANIFICAÇÃO ANUAL 7.

Eixo temático 1: Pesquisa em Pós-Graduação em Educação e Práticas Pedagógicas.

Matriz de Referência da área de Matemática Ensino Médio

araribá matemática Quadro de conteúdos e objetivos Quadro de conteúdos e objetivos Unidade 1 Números inteiros adição e subtração

Desenvolvendo o Pensamento Matemático em Diversos Espaços Educativos ALGEPLAN UMA PROPOSTA DINÂMICA PARA O ENSINO DA ÁLGEBRA ESCOLAR

Ano Letivo 2018/2019 TEMAS/DOMÍNIOS CONTEÚDOS APRENDIZAGENS ESSENCIAIS Nº DE AULAS AVALIAÇÃO

Metas/Objetivos/Domínios Conteúdos/Competências/Conceitos Número de Aulas

Plano Curricular de Matemática 6ºAno - 2º Ciclo

ESCOLA SECUNDÁRIA DE AMORA. PLANIFICAÇÃO A LONGO/MÉDIO PRAZO - Ano Letivo 2014 / 2015 CURSOS DE EDUCAÇÃO E FORMAÇÃO TIPO 2 2.º ANO

Anais do XI Encontro Nacional de Educação Matemática ISSN X Página 1

5. Objetivo geral (prever a contribuição da disciplina em termos de conhecimento, habilidades e atitudes para a formação do aluno)

CONCEPÇÕES DE ALGEBRA DAS QUESTÕES DO SISTEMA NACIONAL DE AVALIAÇÃO DA EDUCAÇÃO BÁSICA SAEB

Plano de Trabalho Docente Ensino Médio

Nº de aulas de 45 minutos previstas 66. 1º Período. 1- Isometrias Nº de aulas de 45 minutos previstas 18

Ensino Técnico Integrado ao Médio

ÁLGEBRA E GEOMETRIA: INTERAGINDO POR MEIO DE PADRÕES

PLANO DE TRABALHO I GOVERNO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO SECRECTARIA ESTADUAL DE EDUCAÇÃO METROPOLITANA I

ENCULTURAÇÃO MATEMÁTICA EPENSAMENTO ALGÉBRICO NA INTRODUÇÃO AO ESTUDO DE FUNÇÃO EM DOIS LIVROS DIDÁTICOS

Transcrição:

ÁLGEBRA: PENSAR? CALCULAR? COMUNICAR? Lucia Tinoco - ltinoco@skydome.com.br Maria Palmira Costa Silva - mariapalmira@globo.com João Rodrigo Esteves Statzner - pfundao@im.ufrj.br Ana Lucia Bordeaux Rego Gilda Maria Portela Marcos Antônio Correia de Souza Kelly Regina de P. Motta Projeto Fundão Instituto de Matemática Universidade Federal do Rio de Janeiro - BRASIL No Instituto de Matemática da Universidade Federal do Rio de Janeiro, no Brasil, a equipe do Projeto Fundão realiza atividades de pesquisa, ensino e extensão em Educação Matemática, há 25 anos. Nesta equipe, trabalham em conjunto professores da Universidade, professores da escola básica e futuros professores, alunos do Instituto de Matemática. O presente trabalho foi realizado a partir da preocupação dos professores da escola básica da equipe, com o baixo nível de aprendizagem e de interesse dos seus alunos em relação à Álgebra, que contrasta com o longo tempo despendido com o ensino desse tópico nos 12 anos de escola básica no Brasil. Os motivos de tal preocupação vêm sendo confirmados em avaliações institucionais, como o SAEB, no Brasil, bem como em pesquisas sobre o assunto (Souza, E. R. e Diniz, M. I., 1994; Fiorentini, D., Miorim, A. e Miguel, A., 1993; Coxford, A. e Shulte, A., 1994, Arcavi, A., 1995) e podem levar alunos e professores a questionar a validade desse ensino. Começamos então, com um grupo do Projeto Fundão, uma pesquisa sobre o desenvolvimento do pensamento e da linguagem algébrica no ensino básico. Os objetivos gerais dessa pesquisa foram: identificar as funções da Educação Algébrica no ensino básico;

propiciar a reflexão dos professores deste nível escolar sobre os prejuízos de um ensino mecanizado da Álgebra e fornecer subsídios a esses professores para realizar um ensino significativo desse tópico. Na tentativa de responder às perguntas acima, analisamos artigos dos pesquisadores mencionados e outros, que apontam os mesmos problemas detectados na nossa experiência, mas salientam, por outro lado, a riqueza da Educação Algébrica no currículo do ensino fundamental, explicitando suas diversas funções,: generalizadora da Aritmética, estudo de processos para resolução de problemas, expressão da variação de grandezas e estudo de estruturas matemáticas. Essas funções foram incorporadas há dez anos nos Parâmetros Curriculares Nacionais do Brasil (Brasil, 1998). Os autores citados destacam ainda que o ensino de Álgebra que contempla e integra tais funções poderá contribuir para o desenvolvimento da criatividade, da concentração, do raciocínio lógico e do abstrato, das habilidades de generalizar e de comunicar idéias. Conscientes da importância do ensino de Álgebra na escola básica, passamos a perseguir os dois últimos objetivos propostos, de certa forma, simultaneamente. Partimos da hipótese de que, ao procurar entender as dificuldades dos alunos em Álgebra e explicitar lacunas na formação dos mesmos, a busca de propostas de caminhos para a sua superação torna- se um movimento natural. Isto também porque o trabalho do Projeto Fundão tem sempre como objetivo principal fornecer subsídios para a melhoria do processo ensino- aprendizagem de matemática. Na primeira fase da pesquisa, duas professoras do grupo aplicaram um teste por meio de entrevista com alunos do Ensino Fundamental: três do 9º ano, um do 8º ano e três do 7º ano. Nessa entrevista, o objetivo foi o de detectar indícios de lacunas na formação algébrica dos alunos envolvidos, o que poderia servir de base para a conscientização dos professores sobre a necessidade de mudança. Especificamente, pretendeu - se observar se esses alunos reconhecem a noção de variável em diversos contextos e, no caso afirmativo, como a usam.

Ou seja, como eles usam letras para generalizar um fenômeno ou para expressar o resultado de uma medição ou de uma operação; se admitem a possibilidade de usar letra ou expressão algébrica para representar um dado numérico; se escrevem expressões algébricas e se resolvem equações simples, escritas na forma padrão ou não. Ao analisar as entrevistas, o grupo resolveu aplicar o mesmo teste, por escrito, sem intervenção do professor, a 100 alunos de 5 turmas de 1º ano do ensino médio, com o objetivo de observar o desempenho de alunos, supostamente, mais maduros do que os entrevistados. A amostra incluiu alunos com experiência matemática e níveis de desempenho em matemática bem variados. As respostas ao teste escrito e às entrevistas se complementaram. A diferença de nível escolar não afetou o tipo de respostas e/ou as dificuldades, que coincidem também com as apontadas nos estudos analisados pelo grupo. Em geral, os alunos não parecem admitir que o resultado de uma contagem, de uma operação ou de uma medição possa ser dado por uma expressão algébrica, principalmente se esta expressão tiver mais de um termo. Daí a freqüência de respostas nas quais a variável é substituída por um valor numérico, pelos mais diversos critérios. Há respostas sugestivas de que seus autores estão na fase de transição entre os estágios retórico e simbólico do desenvolvimento da linguagem algébrica (Struick, 1989), o que é natural, mas exige atenção especial para que esta transição se complete. Mesmo entre os alunos que escrevem expressões algébricas, foram detectadas dificuldades como: pensar que toda expressão tem de ser igualada a um número ou pelo menos a uma letra (em geral, x); transformar erroneamente uma expressão, tentando simplificá- la; usar sinais de pontuação (parêntesis) inadequadamente; igualar indevidamente uma expressão a 0, obtendo uma equação; interpretar precariamente informações codificadas, por exemplo, por legenda; realizar procedimentos aparentemente aleatórios ao resolver equações. Uma minoria desses alunos reconhece a relação de proporcionalidade em

situação dada e/ou usa o conceito de divisão para resolver equação apresentada sob forma não padronizada. Considerando então o relevante papel da Álgebra no currículo, suas várias dimensões e a não compreensão pelos estudantes dos conceitos e procedimentos mais ligados a esse tópico da Matemática, pode- se por em dúvida o estudo do tecnicismo algébrico no seu ensino. Este tecnicismo está estreitamente ligado à Álgebra, como estudo de estruturas, mas sua importância, num currículo do Ensino Fundamental, está em ser ferramenta para a exploração das demais funções da Álgebra: generalizar a Aritmética, resolver problemas e relacionar grandezas variáveis. Um aluno compreenderá tanto mais essa importância, na medida em que utiliza essa ferramenta em tarefas significativas, nas quais se faz necessário aprimorar esses procedimentos. Tendo como base a necessidade de um tratamento integrado das funções da Álgebra e visando a fornecer subsídios a professores interessados em realizar um ensino de Álgebra com essa orientação, a equipe desenvolveu então um trabalho de procura, adaptação, elaboração e aplicação de atividades para alunos do ensino fundamental e médio do Rio de Janeiro. A análise dos resultados dessas aplicações permitiu a explicitação de aspectos que podem ser considerados eixos orientadores dos caminhos e estratégias para um ensino significativo de Álgebra. Abordaremos brevemente neste texto dois deles: o conceito de variável e o simbolismo algébrico, particularmente, nas equações, salientando que a divisão feita aqui teve apenas motivos didáticos. O conceito de variável Ao tratar de ensino de Álgebra com compreensão e de integração entre os diversos papéis deste ramo da matemática, vale salientar a relação da Álgebra com os vários campos da Matemática, especialmente com as funções, uma vez que entre as suas principais dimensões está a de usar as variáveis para descrever fenômenos de variação. E é neste aspecto que destacamos o conceito de variável como central e, ao mesmo tempo, um dos mais complexos da matemática (Caraça, 1984, Tinoco, 1996). De fato, a experiência dos alunos com

a Álgebra é muito restrita para que esse conceito seja construído por eles. Consideram, em geral, que uma letra em matemática é sempre uma incógnita cujo valor deve ser determinado. No estudo introdutório das noções de variável e de função devemos considerar a importância do conceito de proporcionalidade. As experiências dos autores do presente trabalho e a dos grupos do Projeto Fundão que desenvolveram estudos sobre Proporcionalidade (Tinoco, 1993) e Funções (Tinoco, 1996) confirmam as idéias expostas por Post, T. R., Beher, M. J. e Lesh, R (1994), que resumimos a seguir. O pensamento proporcional pode contribuir para o desenvolvimento da Álgebra, se levarmos em conta que muitas situações do cotidiano e da escola elementar são regidas pelas regras de proporcionalidade. A vivência de tais situações pelos alunos torna bastante natural a sistematização dessas regras e do conceito. O raciocínio com proporções envolve: senso de co- variação, comparações múltiplas, predição e inferência, que utilizam métodos de pensamento qualitativo e quantitativo. Observe- se que o raciocínio qualitativo não depende de valores específicos, além de ser importante meio para se esboçar caminhos e respostas, bem como para verificar a adequação destes ao problema. No presente trabalho, merecem destaque especial a observação e a generalização de regularidades, bem como o estabelecimento de relações em geral, que incluem, mas não se limitam a situações envolvendo proporcionalidade. O simbolismo algébrico Começar a usar a linguagem algébrica representa de fato, para os alunos, uma ruptura no modo de pensar e agir em matemática. Até mesmo estudantes que executam as técnicas algébricas com êxito, muitas vezes, não compreendem tais técnicas e pouco conseguem concluir a partir de e/ou comunicar por meio das expressões simbólicas (Arcavi, 1995). Por exemplo, ao ser solicitado a explicar por que a soma de três números naturais consecutivos é sempre um múltiplo de 3, muito raramente, um aluno toma a iniciativa de

representar algebricamente esses números e, mesmo sendo conduzido a fazer essa representação e efetuar as manipulações necessárias, tem muita dificuldade em concluir a explicação pedida a partir da expressão simbólica. O uso da linguagem e das técnicas algébricas para argumentar matematicamente é muito pouco explorado. Observamos também que, em geral, os alunos são pouco solicitados a escrever expressões algébricas; as expressões lhes são apresenta das para que resolvam, fatorem, simplifiquem, etc. Neste sentido, exploramos situações em contextos variados para discutir o manuseio de técnicas da Álgebra, mostrando a necessidade e a importância do uso da linguagem simbólica com compreensão. Para tal insistimos na valorização de experiências de escrita e de interpretação de textos em matemática pelos alunos, com ênfase na passagem da linguagem corrente para a simbólica, e vice- versa, como também na reflexão sobre atividades que explorem o papel das equações e das incógnitas. Esta estratégia está em sintonia com o que foi dito sobre a construção do conceito de variável, e é neste sentido que consideramos indissociáveis os dois aspectos. Uma função da Álgebra bastante explorada no nível do ensino básico é a da resolução de problemas por meio das equações. Merece reflexão, no entanto, o fato de que esta função é reduzida quase sempre ao simples estudo de procedimentos mecanizados para resolver equações. Ao contrário, deve- se considerar que resolver uma equação não requer, somente, manipulações padronizadas para fornecer o resultado desejado. A leitura de uma equação, antes de efetuar procedimentos - padrão é fundamental; ler significativamente as relações estabelecidas numa equação consiste também em observar e questionar o como e o porquê do valor encontrado para a incógnita. As vantagens da manipulação algébrica portanto devem ser encaradas com cuidado, uma vez que considerar apenas as técnicas a executar pode prejudicar o desenvolvimento do que Arcavi (1995) chama de sentido do símbolo. Segundo este pesquisador: Indivíduos que sabem como executar as manipulações algébricas, mas não consideram a possível relevância dos símbolos para revelar a

estrutura do problema que despertou sua curiosidade, não desenvolveram integralmente seu sentido de símbolo. (p.43). Nosso desejo é de que estudantes e professores se dediquem mais à analise e à interpretação dos problemas e suas soluções, onde são utilizados diversos tipos de símbolos. Neste sentido, destaca- se a importância das justificativas, por parte dos estudantes e do professor, permitindo a discussão dos significados produzidos por eles na realização de procedimentos algébricos, o que poderá minimizar as dificuldades de aprendizagem apontadas inicialmente. Referências Bibliográficas ARCAVI, A. O Sentido do Símbolo Atribuindo um Sentido Informal à Matemática Formal, em Álgebra, História, Representação; Série Reflexão em Educação Matemática, vol 2, p. 38-72, Rio de Janeiro, 1995. CARAÇA, B. J. - Conceitos Fundamentais da Matemática, Ed. Sá da Costa, Lisboa, 1984. COXFORD, A. F. e SHULTE, A. P. (org.) - As Idéias da Álgebra - Atual Ed., São Paulo, 1994. FIORENTINI, D., MIORIM, Â. e MIGUEL, A. - Contribuição para um Repensar... a Educação Algébrica Elementar, em Pro- posições, Vol. 4 n 1, p.78-90, Campinas,1993. BRASIL, SEF/MEC Parâmetros Curriculares Nacionais Matemática, 5ª a 8ª séries, SEF/MEC, Brasília, 1998. TINOCO, L. A. A.(coord.). - Razões e proporções, Projeto Fundão, IM/UFRJ, Rio de Janeiro, 1993. TINOCO, L. A. A. (coord.) - Construindo o Conceito de Função - Projeto Fundão, Instituto de Matemática, UFRJ, Rio de Janeiro, 1996. SOUZA, E. R. de e DINIZ, M. I. S. V. - Álgebra: das Variáveis às Equações e Funções. 2º ed. IME / USP, São Paulo, 1996. STRUIK, J. D. - História Concisa das Matemáticas, Ed. Gradiva, Lisboa, Portugal, 1989.