XV ENCONTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS DO NORTE E NORDESTE e PRÉ- ALAS BRASIL. 04 a 07 de setembro de 2012, UFPI, Teresina-PI.

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Transcrição:

XV ENCONTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS DO NORTE E NORDESTE e PRÉ- ALAS BRASIL. 04 a 07 de setembro de 2012, UFPI, Teresina-PI. Grupo de Trabalho: GT22 - Socioantropologia marítima e pesqueira no norte e nordeste 2ª Sessão: Conflitos Socioambientais na Pesca Ramadas e Territórios de Pesca Potiguares Iacira Schier Oceânica Pesquisa, Educação e Conservação iacira.schier@pontadepirangi.org.br Fabrício Gandini Caldeira Instituto Maramar para a Gestão Responsável dos Ambientes Costeiros e Marinhos fabricio@maramar.org.br Guilherme Perri Oceânica Pesquisa, Educação e Conservação guilherme.pierri@pontadepirangi.org.br

Ramadas e Territórios de Pesca Potiguares Resumo O reconhecimento de territórios de pesca no litoral norte do Rio Grande do Norte tem sido um desafio por parte dos pescadores artesanais potiguares. O presente trabalho investigou os usos e conflitos de uso relacionados à pesca artesanal, na região compreendida entre Ponta Negra e Pium, logo ao sul da cidade de Natal (RN). Aplicando metodologias participativas e reconhecendo a história e importância das ramadas (ranchos de apoio a pesca localizado em praias), o presente trabalho busca registrar a importância da pesca em regiões de forte fluxo turístico e sobretudo reconhecer o direito fundiário e territorial desses pescadores sobre águas e espaços costeiros na costa potiguar. O trabalho apresenta os resultados dos levantamentos dos usos e conflitos e do trabalho de apoio à infra-estrutura e organização social dos pescadores e pescadoras da região. Palavras-chave: pesca artesanal; territórios de pesca; ramadas, potiguar 1. Introdução A pesca artesanal no litoral norte do Rio Grande do Norte tem sido alvo de poucas pesquisas no que tange a reconhecimento da atividade enquanto territórios de pesca. Do material registrado em literatura, podemos encontrar boletins de estatística pesqueira (IBAMA/CEPENE) e diagnósticos e levantamentos realizados em comunidades pesqueiras atestando a precariedade do setor, falta de infra-estrutura, baixa escolaridade. No que diz respeito à moradia dos pescadores, em geral, fixavam residência nos chamados terrenos de marinha e da Santa, de propriedade da Igreja Católica. Com a exploração imobiliária, os pescadores passaram a residirem mais afastados da praia, distante do seu local de trabalho.surgiu assim, a necessidade de organizarem-se em órgãos de classe, como as Colônias e Associações de Pescadores. (Coelho et al., 1996)

No que diz respeito à moradia dos pescadores 76,7% possui casa própria, 17,7% mora em casa de parentes e apenas 1,9% em casa alugada. Levando em consideração informações do Anuário Estatístico do Rio Grande do Norte (1996), o índice de moradia própria para todo o estado é de 72,7%, indicando, portanto, que a população que vive diretamente da pesca possui melhores condições de moradia. Este fato se deve, em grande parte, à disponibilidade dos pescadores ocuparem os terrenos de marinha para construção de caiçaras (Diagnóstico da Pesca/RN, 1997). Provavelmente este índice vem sofrendo decréscimo, devido à exploração imobiliária, bem como ao desenvolvimento da atividade turística. (Vasconcelos et al, 2003) O presente trabalho demonstra através de trabalho participativo e de educação popular que o reconhecimento das atividades pesqueiras artesanais em áreas de praia (comumente chamados de terrenos de marinha ) e na zona marinha, é imperativo caso estejamos dispostos a considerar a produção de baixa escala e a riqueza cultural potiguar, importantes ferramentas para a governança pesqueira, buscando a conquista legítima de territórios de pesca tendo em vista a conservação da biodiversidade e dos estoques de pesca. 2. A abordagem participativa junto aos pescadores artesanais Ao longo do ano de 2011, foram realizadas uma série de reuniões participativas com pescadores artesanais desde a Prainha do Cotovelo (município de Nísia Floresta) até a Ponta de Tabatinga (Parnamirim). O trabalho foi realizado no âmbito do projeto Ponta de Pirangi 1 e buscou compreender os principais desafios enfrentados pela pesca artesanal na região. Trabalhando com uma abordagem metodológica direta e com encontros presenciais em locais recomendados pelos pescadores (as) consultados, foi 1 Projeto financiado pela Petrobras através do Programa Petrobras Ambiental (Edital 2008) cujo objetivo é propor a criação de uma Unidade de Conservação Marinhas no litoral ao sul da cidade de Natal (RN).

possível compreender a realidade pesqueira artesanal das praias de Canto do Cotovelo, Pirangi do Sul, Pirangi do Norte e Ponta de Tabatinga. Prainha do Cotovelo Pirangi do Norte Barra de Tabatinga Pirangi do Sul Mapa 1. Mapa do litoral logo ao sul de Natal (RN) abrangendo as praias de Prainha do Cotovelo, Pirangi do Norte, Pirangi do Sul e Barra de Tabatinga incluindo toda a área dos parrachos 2 do Projeto Ponta de Pirangi. 2 Parrachos é uma terminologia local potiguar que identifica as formações de recifes areníticos que cobrem grande parte da costa do Rio Grande do Norte.

Exemplo de mapas participativos de pesca levantado durante as reuniões presenciais. A estratégia metodológica de abordagem foi feita de modo a buscar informações de caráter geral que possibilitasse caracterizar as pescarias do ponto de vista de número de pessoas envolvidas, esforço empregado e área de trabalho. Tais informações possibilita construir subliminarmente o conceito de Territórios de Pesca, alvo e objetivo maior do presente trabalho. Para cada tipo de pescaria (tresmalho, rede de superfície, rede de fundo, pesca de lagosta) eram dirigidas de maneira clara e direta as seguintes perguntas feita para o coletivo de pescadores, que em consenso chegavam a informação por se tratar de resposta objetiva, como:

Quantas pessoas são necessárias para esse tipo de pescaria? Quantos barcos existem para esse tipo de pesca? Qual a área de pesca utilizada? Até quanto de profundidade? Vão muito ao norte ou ao sul? Quanto tempo dura cada pescaria? Que tipo de pescado é capturado ao longo do ano? As perguntas simples e objetivas permitiram com que os pescadores respondessem de maneira espontânea e complementar. É consenso entre eles questões relativas a áreas de pesca, dimensão das artes de pesca, pescados capturados, horários de pesca, forma de captura, número de barcos e pescadores por pescaria. No entanto, tais informações nada mais são do que o arroz e feijão do conhecimento local. O que importa é o que está por trás dessas informações. Que dificuldades eles enfrentam? Quais são os conflitos de uso? O que nós pesquisadores-atores 3 poderíamos colaborar? Além das dificuldades apontadas na pescaria, na atividade em mar, ficou evidente a necessidade dos pescadores em terra, no que tange a garantia de área costeira para infraestrutura, energia, sanitário e segurança do material de pesca. As atividades de pesca artesanal e tradicional têm ficado, via de regra, à margem do processo de desenvolvimento da pesca incentivado pelo estado brasileiro. É lugar comum, reconhecer que atividades pesqueiras prósperas e lucrativas são aquelas realizadas pelas indústrias de pesca através de barcos com pescadores embarcados buscando grandes produções. O resultado dessa visão é que em pouco mais que 40 anos, desde a primeira política de incentivo a atividade pesqueira (Decreto lei 221/67), o governo brasileiro não tem obtido sucesso na gestão dessa atividade comprovada de maneira inequívoca por meio de estudos e diagnósticos que atestam que ao menos 80% da pesca 3 O conceito de ator aqui é abordado no sentido em que Augusto Boal, teatrólogo, explica. Ser ator no processo e não mero expectator dos acontecimentos, agindo e se comprometendo mutuamente como tão bem ensinou igualmente o educador Paulo Freire.

extrativa marinha encontra-se sobreexplorada ou em risco de sobre exploração 4. Assim como na agricultura familiar quando comparado ao agronegócio, a pesca artesanal é a mais diversa do ponto de vista da biodiversidade, representa folgadamente mais de 50% da produção de pescado marinho e ampara pelo menos 2 milhões de pessoas ao longo da costa brasileira 5 contribuindo de maneira única e insubstituível para a edificação do patrimônio imaterial cultural reproduzido e exemplificado em muito do que identificamos como patrimônio cultural brasileiro. Com este propósito, de valorizar a pesca artesanal, apontamos abaixo uma atividade que poderiam agregar valor a imagem ou mesmo contribuir para a valorização da atividade pesqueiras e dos territórios pesqueiros potiguares. Os ranchos de praia para uso coletivo de pescadores é uma prática tradicional de organização e centralização de materiais de pesca em diversos pontos do país. Na área compreendida dentro dos limites geográfico do Ponta de Pirangi localizamos cerca de 05 ranchos de pesca cuja existência é condição fundamental e estrutural para diversas atividades e práticas pesqueiras. Reunião realizada com pescadores na sede da colônia de pescadores em Pirangi do Norte (RN). 4 Levantamentos feitos pelo primeiro programa brasileiro de levantamento do potencial dos recursos vivos da Zona Econômica Exclusiva Programa REVIZEE. Governo Federal. 5 Mais recente e completo levantamento bibliográfico financiado pela FAO/ONU junto com pesquisadores brasileiros.

Reunião realizada com pescadores na sede da colônia de pescadores em Pirangi do Sul (RN). Reunião realizada com pescadores na Prainha do Cotovelo (RN). Reunião realizada com pescadores na Barra de Tabatinga (RN). Esses espaços de interesse coletivo são localizados em áreas de praia (ou próxima dela), no denominado terrenos de marinha, ou seja, áreas de domínio territorial da União e que por força constitucional não podem ser privatizados, constituindo-se em áreas genuinamente de bem de uso comum do povo. Paralela à sua importância enquanto infra-estrutura de apoio a pescadores artesanais, os ranchos de praia constituem-se em espaços pitorescos e que chamam a atenção pela sua particularidade e função, podendo inclusive ter apelo turístico para visitação.

Uma grande oportunidade do Ponta de Pirangi seria investir em melhoria desses espaços, aprimorando sua capacidade de armazenamento de material, de instalação elétrica e mesmo de aparência estética, uma vez que qualquer melhoria nesse espaço acarretaria em melhoria do grupo de pescadores que dele dependem. A garantia desse espaço físico territorial se mostra como condição sine qua non para manutenção da atividades pesqueira artesanal diretamente dependente. Os ranchos de praia são espaços localizados em áreas de praia utilizados para apoio a pescadores artesanais em contribuem para o reconhecimento de territórios potiguares de pesca.

As margens do Rio Pirangi oferece alguns espaços disponíveis para instalações de infra estrutura de apoio a pesca e merecem especial atenção por parte das organizações locais e entidade parceiras. 3. O processo de reconhecimento das ramadas de pesca como estratégia de conquista legítima de territórios de pesca Em ocasião da oportunidade estratégica de se trabalhar com as ramadas de pescadores ao longo do projeto, optou-se por fortalecer esses locais, como locus pesqueiro e ponto geográfico fundamental para a conquista de territórios de pesca potiguares. Foi iniciado o processo de regularização dos territórios de pesca em área da união através do trabalhos de articulação junto ao IBAMA, Secretaria do Patrimônio da União (SPU), Prefeituras, Colônias de pesca. Em reunião com SPU, foram dadas as orientações para que fosse iniciado o processo de reconhecimento desses territórios de pesca, porém o maior desafio seria a articulação com os diferentes grupos de pescadores em prol de um benefício coletivo.

O processo de regularização consistiu em quatro etapas, sendo a primeira e a última de responsabilidade dos pescadores e as demais dos órgãos envolvidos. - Levantamento das necessidades básicas; - Localização geo-referenciada das áreas; - Caracterização ambiental das áreas - Projeto arquitetônico e urbanístico; Realizada a vistoria com os órgãos competentes aos locais de interesse, foi realizado um cadastramento dos pescadores que utilizam o espaço bem como o tipo de embarcação, utensílios de pesca utilizados e desejos e anseios para melhoria das condições de trabalho. Para o melhor andamento do processo, buscou-se colaborar para a criação de um sentimento de grupo e de coletividade, tendo em vista a conquista de um benefício coletivo para os pescadores artesanais potiguares, grupo desacreditado de promessas e projetos inacabados. Como metodologia para despertar o sentimento de grupo e envolvimento e integração entre as ramadas foi realizada a I Regata da Pedra do Forno. Com sucesso absoluto alcançamos muito mais que o objetivo proposto, envolvemos alem dos grupos, famílias e amigos que vieram torcer e prestigiar o evento. Encontros e reencontros foram proporcionados para a comunidade e para todas as idades. Desde a inscrição, a confecção dos panos da vela, da pintura das velas e embarcações ao dia do evento e dias após em todas as ramadas o comentário era, e ainda é, sobre a regata. A organização do evento proporcionou uma confiança e uma intimidade muito maior entre os pescadores e nós pesquisadores-atores-educadoresaprendizes. Este fato deixa claro que o comprometimento apenas com o processo em si, é pouco, é necessário o envolvimento mais do que profissional, um envolvimento pessoal com cada integrante.

Como recordação deste momento, foram reveladas fotos e entregues a cada pescador que participou de alguma forma ou de outras das atividades do projeto Ponta de Pirangi. Como metodologia de comunicação, tanto para avisos de reuniões, e recados, foram fixados cartazes em cada ramada e em pontos estratégicos, isso possibilitou a eliminação de comentários: Ahh, mas eu não fui porque eu não sabia ninguém me avisou oportunizando a quem quiser que fosse a participação no processo, não havendo exclusões. Pescadores tem uma forma de comunicação também peculiar, a qual foi transmitida nos cartazes bem como na articulação com os órgãos envolvidos. Em todos os momentos em que os órgãos (SPU, IBAMA, IDEMA, Prefeituras, Colônias) estiveram presentes pelo menos um representante de cada ramada, o qual ficava responsável por (re)transmitir as informações para os demais do grupo, envolvendo assim todos no processo com a mesma linguagem. Para os pré-projetos arquitetônicos foram realizadas visitas in locu que captou as necessidades e a forma peculiar de organização de cada grupo, e com base nestas informações elaborou um projeto arquitetônico para as ramadas. Após estes projetos, foram confeccionados maquetes para uma melhor visualização e validação coletiva das benfeitorias pleiteadas. Em contato com as Prefeituras confirmamos que os órgãos competentes estão realizando seus trabalhos referente a parte burocrática do processo. Uma forma utilizada para que todos os órgãos estejam envolvidos e comprometidos, foi copiar, sempre, a todos os e-mails trocados. Simples gesto importantes resultados. No decorrer deste processo algumas denuncias foram realizadas pelos próprios pescadores em relação a utilização particular das áreas pleiteadas junto ao SPU e as mesmas foram direcionadas aos órgãos competentes que prontamente atenderam as denuncias tomando as medidas necessárias. Estes fatos reforçaram as relações de confiança no processo.

A maior dificuldade encontrada no momento são as constantes substituições das pessoas dos órgãos competentes, porém a mesma foi estrategicamente solucionada entregando um histórico do processo desde seu inicio até a ultima atividade desenvolvida, com ata de reuniões, fotos, etc... para cada órgão bem como para cada grupo de pescadores envolvidos em cada ramada. No momento aguardamos a cessão das áreas para uso coletivo da pesca artesanal para as Prefeituras e enquanto isso nos preocupamos com os projetos arquitetônicos e urbanísticos que deverão ser apresentados imediatamente após a cessão das mesmas, agilizando assim o processo para que o mesmo não se torne tão lento quanto tantos outros que acabaram no esquecimento. No documento de cessão da área emitido pelo SPU em favor da Prefeitura estará um artigo com a especificação que a área é destinada ao uso coletivo da pesca artesanal, caso contrario volta a ser da União. Isso para garantir o uso coletivo para a pesca tanto em relação a prefeitura (que pode mudar de idéia) quanto para os pescadores (caso eles utilizem de outra forma). Tão logo, em 21 de abril de 2013, estaremos realizando a II Regata da Pedra do Forno e, com sorte, comemorando a cessão das áreas e o início das benfeitorias nas ramadas. Um processo que teve seu inicio, mas que só terá seu fim quando o ultimo pescador deixar de ir para a maré. Reunião com os representantes das ramadas, Colônia de Pescadores Z-10, Z56 e SPU.

Barra de Tabatinga e Pirangi do Sul (RN). Processo de reconhecimento de ramadas ou ranchos de pescadores com a presença de técnicos da ONG Oceânica, Prefeituras e SPU. Barra de Tabatinga e Pirangi do Sul (RN). Processo de reconhecimento de ramadas ou ranchos de pescadores com a presença de técnicos da ONG Oceânica, Prefeituras e SPU.

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