7 Considerações finais

Documentos relacionados
6 Aberturas: seqüências, alinhamentos e enquadres

Adriana Gray da Silva Reis

Gerenciamento de Receita

Administração Mercadológica II

Paradigmas da Engenharia de Software AULA PROF. ABRAHAO LOPES

Nessa concepção Planejamento:

PPP PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO

8 Últimas palavras? Sim, quero a palavra última que também é tão primeira que já se confunde com a parte intangível do real.

1

QUEM SOMOS. Nosso objetivo é desenvolver empresas e levar os consumidores até elas, garantindo a estes condições excelentes de:

Gerência de Dispositivos. Adão de Melo Neto

AULA 1: A DICOTOMIA LÍNGUA FALADA / LÍNGUA ESCRITA

por exemplo, um desempenho mais ou menos satisfatório dos clientes em contato com a empresa que lhes presta serviço. Gumperz (1997), da mesma forma,

Guião orientador Manual de Qualidade da Actividade Formativa

Unidade III. Avaliação de Desempenho. Profª. Ana Paula de Andrade Trubbianelli

Comunicação Efetiva. Treinamentos, Workshops e Palestras Interativas. Formatos FLEXÍVEIS Programas PERSONALIZADOS 2018

8. CONCLUSÃO tipo de ocorrência à forma à função interacional troca de informações perguntas e respostas

Processos de Desenvolvimento de Software. Ricardo Argenton Ramos UNIVASF Engenharia de Software I - Aula 2


Elementos de Gestão para Educação a Distância: um estudo a partir dos Fatores Críticos de Sucesso e da Visão Baseada em Recursos

Implementação da Política de Responsabilidade Socioambiental (PRSA)

O construtivismo e o construcionismo fundamentando a ação docente em ambiente informatizado. Anair Altoé Marisa Morales Penati

REDAÇÃO OFICIAL PLANO DE CURSO

MBA EM CONTROLADORIA PÓS-GRADUAÇÃO DESAFIO PROFISSIONAL Módulo C

Introdução INTRODUÇÃO AO SWEBOK. Origens do corpo de conhecimentos da Engenharia de Software: Introdução a Computação e Engenharia de Software

REDAÇÃO PLANO DE CURSO

Competências e habilidades relativas à Situação de Aprendizagem

As características de um bom plano são (memorizar):

5 As interações da central de reservas X: atendimentos, alinhamentos e enquadres

Orientações para o Trabalho de Conclusão de Curso (TCC)

SISTEMAS DE INFORMAÇÕES GEOGRÁFICAS Aula 1 - Conceitos. SIG- Eng. Cartográfica Prof. Luciene Delazari

Os Jogos de Empresas como Recurso Didático na Formação de Administradores

Processos do Projeto 1

O Tom na fala: estratégias prosódicas

Interatividade. Limitado Reativa Coativa. Alargado Coativa Proativa

Palavras-Chave: Gênero Textual. Atendimento Educacional Especializado. Inclusão.

4 O encontro de serviço

Curso Profissional de Técnico de Vendas Disciplina: Comunicar em Inglês Ano(s): 10º/11º/12º. Testes Peso 3*

Professor: João Augusto

Grupo 1 Análise sob a ótica da Empresa. Quais benefícios contribuem para o desenvolvimento da comunidade que recebe o PVE?

Unidade: Desenvolvimento de cursos, produção de material didático para o ensino virtual. Unidade I:

Como montar uma equipe eficiente de Inteligência Competitiva

Informações de Impressão

INDICE DE PADRÃO LIGADO - IDPL

Normalização de dados

Padrões. Arquitetura de Software Thaís Batista

DEMONSTRAÇÃO DE USO DE UMA SISTEMÁTICA DE PLANEJAMENTO PARA A TRANSFERÊNCIA DE TECNOLOGIA NO PROCESSO DE PROJETO DE PRODUTOS (FASES 1 E 2)

REVISÃO PARA A PROVA

As 10 Áreas da Engenharia de Software, Conforme o SWEBOK Prof. Elias Ferreira

Linguagens Documentárias. Profa. Lillian Alvares Faculdade de Ciência da Informação, Universidade de Brasília

PLANEJAMENTO. Para que Planejar? A finalidade do planejamento é a eficiência; A eficiência é a execução perfeita de uma tarefa que se realiza;

Leituras Adicionais Relevantes e Importantes

sábado, 11 de maio de 13 PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

EDUCAÇÃO FÍSICA NA ESCOLA

RELATÓRIO/TREINAMENTO/TRABALHO EM EQUIPE/ MOTIVAÇÃO

PLANIFICAÇÃO ANUAL DE APLICAÇÕES INFORMÁTICAS B (12º Ano) 2017/2018

Professora: Cira Souza Pitombo. Disciplina: Aplicações de técnicas de análise de dados

Testes Sumativos Peso 3*

ETAPA EVENTO DESCRIÇÃO CONTATO. Orientações sobre materiais, identidade visual, divulgação e apoio da DEaD. Elaborado pelos Interessados(as).

Aula6 MATERIALIDADE LINGUÍSTICA E MATERIALIDADE DISCURSIVA. Eugênio Pacelli Jerônimo Santos Flávia Ferreira da Silva

Lista de exercícios. Gestão por competências. Prof. Carlos Xavier.

Capítulo 6 Seleção de funcionários

Jogos de Empresas MÓDULO I

INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA DO RIO GRANDE DO NORTE CAMPUS JOÃO CÂMARA ENGENHARIA DE SOFTWARE

Conferência Bolonha / e-learning

Processos de software

Prova de equivalência à frequência

Koch, I. V. O texto e a construção dos sentidos. São Paulo: Contexto, 1997, 124 p.

ADMINISTRAÇÃO DOS MATERIAIS

Aula 01 Conceito de Banco de Dados e SGBD

Formação continuada em MATEMÁTICA. Fundação CECIERJ/ Consórcio CEDERJ

COMUNIDADE DE FALA DO IFSUL: RELAÇÕES LINGUÍSTICAS NO PROCESSO ENSINO-APRENDIZAGEM

O ESTÁGIO DE PÓS-ESCRITA NO PROCESSO DE PRODUÇÃO TEXTUAL Sabrine Weber 1 (UFSM) Cristiane Fuzer 2 (UFSM)

2. Revisão de literatura e Referencial teórico

AGRUPAMENTO DE ESCOLAS GENERAL SERPA PINTO - CINFÃES 2014 / 2015 CRITÉRIOS GERAIS DE AVALIAÇÃO 1.º CICLO

2 Pressupostos teóricos

Sejam bem vindos ao nosso Webinar: Comportamento de Compra WEBINAR 28/03/2018. Prof. João E. Ragazzi JR Consultoria e Treinamento Ltda.

Banco de Dados e Aplicações em Negócios: Introdução.

Profª Daniela Cartoni

SISTEMA DE GESTÃO ERP

Estrutura. Estrutura. Estrutura. Exemplo de tecnologia ativa. Elementos Processo (dividido em atividades) Instâncias ou casos Pastas Papéis Documentos

Engenharia de Software II

ENGENHARIA DE USABILIDADE. Unidade IV Avaliação. Luiz Leão

ADMINISTRAÇÃO GERAL. Gestão estratégica. Comportamento Organizacional e Trabalho em Equipe Parte 1. Prof.ª Karen Estefan Dutra

CONTEÚDOS E DIDÁTICA DE MATEMÁTICA

Introdução. Os autores não escrevem livros: não, escrevem textos que outros transformam em objetos impressos. Roger Chartier

3. O Framework é um manual/guia de como elaborar o relato integrado? Justifique.

PLANIFICAÇÃO ANUAL Documentos Orientadores: Programa da disciplina

POLÍTICA DE COMUNICAÇÃO INTERNA DA UNIMED CAMPO GRANDE Núcleo de Comunicação e Marketing agosto de 2016

PCS3413 Engenharia de Software e Banco de Dados

Análise e Projeto de Sistemas

Parece claro que a modernidade vem transformando as formas de comunicação humana, fundando novas comunidades e gêneros discursivos e produzindo novos

Psicologia e Currículo A Análise do Conteúdo

CRITÉRIOS DE AVALIAÇÃO

Escola Básica 2,3 com Ensino Secundário de Alvide

1.1 Os temas e as questões de pesquisa. Introdução

Anotações LIDERANÇA - MÓDULO 2 ESCOLA DAS RELAÇÕES HUMANAS

Transcrição:

7 Considerações finais Neste trabalho, analisamos encontros de serviço realizados na central de reservas por telefone de uma companhia aérea brasileira de grande porte, um contexto interativo de atendimento a clientes complexo e diferente daqueles que, tradicionalmente, comportam atendimentos face-a-face. A análise desses encontros, coletados através do método etnográfico, foi realizada com base nos pressupostos teóricos da Sociolingüística Interacional em relação de interface com os da Análise da Conversa. Focalizou-se a manifestação de diferentes dinâmicas de enquadres e alinhamentos bem como a variação nos padrões de organização seqüencial e construção de turnos de fala. Procurou-se mostrar que esses aspectos (i) estão relacionados a diferentes tipos de atendimento e (ii) refletem uma realidade interacional complexa na central de reservas estudada. Isso, conseqüentemente, dificulta, na realidade da Central de Atendimento Telefônico (CAT) em estudo, o processo de gerenciamento e controle das seqüências de comportamento lingüístico através de scripts rígidos de atendimento a clientes, elaborados previamente. Foram considerados em nossa análise os encontros de serviço realizados em dois setores, a ilha de passageiros e a ilha de agências, envolvidos no serviço de atendimento a clientes de todo o Brasil que se realiza à distância, mediado por tecnologia especializada. A realização dessas atividades ocorre através da linguagem e envolve o relacionamento entre a empresa, um de seus agentes de reservas, um de seus clientes e um ou mais bens intangíveis diferentes tipos de informações e tarefas relacionados ao serviço de transporte aéreo. Temos atividades cooperativas complexas, nas quais atendentes e clientes são co-responsáveis pela realização das operações. Assim como qualquer tipo de interação social, os encontros de serviço em estudo são atividades que requerem dos participantes (i) esforços coordenados; (ii) interpretações negociadas conjuntamente; (iii) julgamentos confirmados ou modificados pelas reações desempenhadas. Esses participantes são interdependentes, pois o comportamento de um influi no comportamento do outro.

166 Os encontros de serviço são formas institucionais de fala-em-interação social, cuja caracterização envolve uma série de aspectos relacionados a diferentes dimensões contextuais. Há, nessas interações, o envolvimento de dois tipos de cliente: o cliente passageiro, que representa o papel de cliente particular, em geral, leigo, com menor experiência em relação ao processo de atendimento; e o cliente agente de viagens, que representa o papel de profissional do ramo de turismo com saber compartilhado ao dos atendentes na maioria dos casos. Temos realidades contextuais diversificadas, representadas por dois tipos de encontros de serviço: os atendimentos a clientes passageiros (PASS) e os atendimentos a clientes agentes de viagem (AGE). Encontram-se nos encontros de serviço em estudo diferentes objetivos, relacionados a uma variedade de informações e tarefas, norteadoras das interações: os objetivos pré-reserva/reserva, relacionados à realização de reservas; os pós-reserva, relacionados a reservas já realizadas; e os não-reserva, não relacionados à reserva. Esses objetivos possibilitam a classificação de três tipos de atendimentos que, conjugados aos atendimentos PASS e AGE, resultam nos seguintes tipos de encontros de serviço: pré-reserva/reserva PASS, préreserva/reserva AGE, pós-reserva PASS, pós-reserva AGE, não-reserva PASS e não-reserva AGE. Nos atendimentos pré-reserva/reserva e pós-reserva, há a ocorrência de diferentes ordenações de fases motivadas pelos diferentes objetivos institucionais em jogo. Nos atendimentos pré-reserva/reserva, manifestam-se as fases de abertura, escolha, reserva, leitura da reserva e fechamento. Nos atendimentos pós-reserva, encontramos as fases de abertura, localização, informação, alteração e fechamento. A ordenação dessas fases pode proceder de forma diversificada, representando uma organização dinâmica e recursiva. Os participantes desses encontros de serviço podem alcançar seus objetivos (i) com a ordenação canônica apresentada ou (ii) com recursividade a fases anteriores. A rigidez na organização das fases não é condição fundamental para que os objetivos institucionais sejam alcançados. Esses diferentes atendimentos e fases presentes na realidade interacional da central de reservas X relacionam-se a multiplicidade, sobreposição e recursividade

167 de enquadres, a diferentes dinâmicas de alinhamento, bem como a variações nos padrões de organização seqüencial e construção de turnos de fala. Analisamos, mais detalhadamente, algumas fases de abertura realizadas nos atendimentos PASS e AGE. A análise das aberturas PASS revela a ocorrência de três formas de organização local. A análise das aberturas AGE, por sua vez, revela a ocorrência de oito formas de organização local. Focalizamos nosso estudo em oito desses casos: 1 PASS, 2 PASS, 3 PASS, 1 AGE, 2 AGE, 4 AGE, 5 AGE, 8 AGE. Nossa análise revela uma variedade de formas de estruturação das aberturas em jogo nos dados coletados. Temos aberturas com estruturas reduzidas, sem a presença de elementos específicos encontrados em aberturas consagradas de conversas casuais cotidianas. Temos aberturas com estruturas compostas de elementos específicos encontrados em aberturas de conversas casuais cotidianas. Constroem-se, nessas diferentes aberturas, variados alinhamentos com maior ou menor distância e, em alguns casos, constrói-se um enquadre pessoal de atendimento a cliente. Ao analisarmos esses diferentes casos de abertura PASS e AGE, verificamos que as aberturas PASS são mais formais do que as AGE, marcadas por uma maior variação. As aberturas PASS apresentam variações sutis na organização seqüencial e construção de turnos, bem como na dinâmica de alinhamentos de clientes. Alguns clientes PASS constroem um alinhamento de menor distância (a) ao cumprimentarem, fazendo escolhas lexicais específicas da conversa pessoal e (b) ao iniciarem uma seqüência de confirmação do nome do atendente. Embora percebamos essa variação sutil no alinhamento dos clientes PASS no que diz respeito a graus de distância, verificamos que as seqüências de abertura nesse tipo de atendimento manifestam-se em um enquadre profissional. Iniciam-se sempre com a enunciação scriptada de abertura. Apresentam-se em uma forma reduzida com uma pequena variedade de seqüências. As aberturas PASS analisadas seguem o comportamento prescrito pela empresa. As aberturas AGE, por sua vez, apresentam uma variação maior na organização seqüencial e construção de turnos, bem como na dinâmica de alinhamentos. Há casos de abertura em que verificamos mudança do enquadre profissional para o pessoal. Alguns clientes AGE constroem um alinhamento de menor distância (a) ao cumprimentarem, fazendo escolhas lexicais específicas da

168 conversa pessoal; (b) ao iniciarem uma seqüência de confirmação do nome do atendente; (c) ao iniciarem a seqüência de auto-identificação; (d) ao iniciarem a seqüência tudo bem ; (e) ao introduzirem uma fala social. Alguns atendentes AGE também estabelecem um alinhamento de menor distância (a) ao reconhecerem a auto-identificação do cliente; (b) ao ratificarem a seqüência tudo bem ; (c) ao ratificarem a seqüência de fala social. A alteração do enquadre profissional para o pessoal pode ocorrer na seqüência de auto-identificação e ocorre na seqüência de fala social. Haja vista a presença da enunciação de abertura prescrita pela empresa em todos os casos de atendimento AGE, percebe-se que os atendentes respondem à chamada do cliente alinhando-se, estritamente, como um participante de uma interação institucional formal, reforçando o caráter burocrático e institucional da interação. No entanto, em diferentes casos de atendimento analisados, embora o atendente ainda responda ao chamado do cliente com um alinhamento de prestador de serviço, em um enquadre profissional, mantendo a distância e impessoalidade, são construídas, no decorrer do atendimento, seqüências com um alinhamento de menor distância. Isso, de acordo com o manual de orientações relativas ao comportamento desempenhado nos atendimentos, não é recomendado. Como vimos, descrevemos uma realidade interacional variável e complexa presente nos encontros de serviço da CAT em estudo. Os agentes de reserva têm uma participação ativa na construção dos atendimentos, gerenciando não só o conteúdo das interações, mas também a forma como esse conteúdo é apresentado. Esses atendentes adaptam seus comportamentos lingüísticos às nuanças contextuais, negociando permanentemente a melhor forma de trabalhar. Constroem-se encontros de serviço mais próximos de uma comunicação autêntica e personalizada, considerando-se as perspectivas do cliente, que não é tratado como um consumidor genérico, uma entidade padronizada, imutável e linear. O trabalho desses atendentes, embora apresente inúmeras regularidades resultantes de uma experiência adquirida com a prática profissional, não é excessivamente mecânico, uniforme e repetitivo, sobretudo nos atendimentos a clientes AGE.

169 Há inconsistências entre o discurso oficial da empresa no que diz respeito ao comportamento lingüístico comum aos agentes de reservas e o trabalho de atendimento a clientes efetivamente realizado na CAT da X. No que diz respeito às fases de atendimento relacionadas aos diferentes objetivos em jogo nos encontros, a empresa, ao apresentar seu script básico 1, contempla parcialmente um tipo de atendimento realizado pelos seus agentes de reserva: o pré-reserva/reserva. Não encontramos referência ao caráter dinâmico e recursivo dessas fases e nem referência à seqüência de fases realizadas nos atendimentos pós-reserva e não-reserva. No que diz respeito à organização das seqüências e construção dos turnos de fala nas fases, a empresa procura exercer certo controle. Quanto à fase de abertura, o controle se manifesta através das indicações de comportamento apresentadas na apostila do curso Telemarketing para Central de Reservas. Quanto à fase de serviço, o controle ocorre com a disponibilização, pelo computador, dos scripts de oferecimento de informação e de execução de tarefas. A empresa, embora tenha dividido os setores de atendimento PASS e AGE, não esclarece a demanda de diversificados comportamentos lingüísticos relacionados aos alinhamentos construídos por esses diferentes clientes. A análise das situações reais de atendimento em contraste com a descrição do desempenho esperado pela empresa, seja na apostila ou na tela do computador, revela, assim, que a forma como o trabalho está de fato organizado é diferente, em alguns aspectos, da forma como o trabalho é planejado e descrito pela organização. Nossa pesquisa fundamenta a afirmação de que os scripts de atendimento a clientes na realidade dessa CAT não devem ser o resultado de decisões prescritivas tomadas sem contato com as situações reais de interação. É necessária uma análise prévia da realidade de atendimento como algo multidimensional, considerando-se atributos tais como heterogeneidade, complexidade e imprevisibilidade. O processo de se realizar o serviço na CAT não é elementar, sendo necessário que se acionem vários esquemas de conhecimento. Um script de atendimento eficaz ao trabalho real dessa CAT, que ajude na qualidade da interação entre atendentes e clientes, é aquele que guia o processo 1 Ver seção 3.1.3

170 interacional, sendo adequado a variáveis situacionais como, por exemplo, tipos de objetivos e clientes em jogo. O pré-planejamento da fala de prestador de serviço é importante, no entanto não deve desconsiderar a natureza dialógica do discurso, as especificidades contextuais e a coerência do texto conversacional. Deve-se considerar que o formato final de cada atendimento só se completa no contato real com o cliente. Com essa visão de script de atendimento flexível e adequado à realidade da interação, é possível promoverem-se melhorias na qualidade do relacionamento entre empresa/atendente e cliente. Adaptar a linguagem ao contexto, com a tentativa de se prestar um atendimento mais personalizado que atenda aos diferentes desejos interacionais do cliente, caracteriza-se como uma vantagem competitiva. Como vimos, a imposição de um script rígido de atendimento com uma postura impessoal pode ser o oposto do que os clientes desejam, sobretudo os clientes AGE. Para o atendimento a clientes na CAT em estudo, é importante dispor-se de scripts variados e flexíveis. É necessário que o atendente tenha habilidade interacional no sentido de compreender melhor o ponto de vista do cliente e prestar-lhe um atendimento claro, objetivo, cortês e, sobretudo, adequado às suas necessidades. Habilidade de interação é, assim, uma característica que deve ser valorizada pela empresa, pois o sucesso na prestação de serviço nessa CAT relaciona-se à capacidade de se compreender essa realidade variável e complexa. Com a análise dessa realidade interacional, presente nos atendimentos a cliente via Call Center, pretendemos, portanto, contribuir para a reflexão sobre a tarefa de elaboração e prescrição de script de atendimento em uma Central de atendimento a clientes por telefone. Através dessa investigação sobre a organização social da conversa nesses eventos interacionais, apresentamos contribuições (i) para os estudos interessados na relação entre a forma como o trabalho está, de fato, organizado e a forma como esse trabalho é planejado pelos órgãos de concepção e (ii) para os estudos voltados ao desenvolvimento da eficácia e da qualidade nos serviços de atendimento a clientes. Conhecer a realidade das interações é importante não só para a formação dos profissionais envolvidos diretamente no atendimento a clientes, mas também

171 para aqueles envolvidos indiretamente, que se ocupam com a elaboração dos instrumentos de garantia da qualidade do trabalho de atendimento. Verificamos que o estudo de encontros de serviços, fundamentado em abordagens teóricas acerca da linguagem em interação no caso a Sociolingüística Interacional e Análise da Conversa - pode oferecer descobertas de valor e sugerir apropriados métodos de análise para se entenderem os serviços, organizá-los e aperfeiçoá-los em diferentes situações. Esse tipo de estudo pode ajudar a prever e explicar por que consumidores acham um encontro de serviço mais satisfatório do que outros.