Desempenho do setor ferroviário no Brasil, após o Plano Real, e suas perspectivas para os próximos anos¹

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Transcrição:

Desempenho do setor ferroviário no Brasil, após o Plano Real, e suas perspectivas para os próximos anos¹ 1 Reno Schmidt² - schmidt.reno@gmail.com Resumo O transporte ferroviário brasileiro, que tem início ainda no século XIX (1852), acaba não acompanhando os saltos de desenvolvimento dados pelo Brasil ao longo de boa parte do século XX e encontra parcial retomada, somente, no final do século XX, início do século XXI, após a adoção do Plano Real (que estabiliza a economia nacional) e o processo de desestatizações da malha ferroviária. Este artigo tem por objetivo avaliar o desempenho do setor ferroviário, para transporte de cargas, após a consolidação das políticas do Plano Real. O artigo foi estrutura, inicialmente com uma breve apresentação histórica do transporte ferroviário brasileiro, seguida pelos dados que expõem o desenvolvimento deste setor após o Plano Real e encerrasse com uma especulação sobre um possível cenário, futuro, para este setor. 1. Breve Histórico sobre o Setor Ferroviário Brasileiro As questões logísticas, em um Brasil de dimensões continentais, sempre tiveram razoável grau de relevância ao longo da história brasileira. Tendo o transporte ferroviário iniciado no Brasil em 1854, pelas mãos de um investidor privado (Irineu Evangelista de Souza mais conhecido como o Barão de Mauá) com apenas 14,5 km, já em 1922 contava com 29.000 km de extensão. Na década de 1930, o Governo Vargas inicia o processo de saneamento e reorganização das estradas de ferro e promoção de investimento pela encampação de empresas estrangeiras e nacionais, inclusive estaduais, que encontravam-se em má situação financeira. Assim foram incorporadas ao patrimônio da união várias estradas de ferro. No início da década de 1950, o Governo Federal, decidiu pela unificação administrativa das 18 estradas de ferro pertencentes à União, que já totalizavam 37.000 km de extensão. Em 16 de março de 1957 é criada a sociedade anônima Rede Ferroviária Federal S.A. (RFFSA), com a finalidade de administrar, explorar, conservar, reequipar, ampliar e melhorar o tráfego das estradas de ferro da União. Em 1969, as ferrovias que compunham a RFFSA são agrupadas em sistemas regionais. Em 1971, o Governo do Estado de São Paulo decide unificar em uma só empresa as cinco estradas de ferro de sua propriedade, criando assim, a Ferrovia Paulista S.A. (FEPASA). Segundo Marques (1996), o transporte ferroviário brasileiro que, de 1975 a 1980, crescia, em tonelada-quilômetro-útil, à taxa de 7,9% ao ano, foi reduzido para 2,5% entre 1980 e 1992. No quadro econômico-financeiro nacional, do período de 1980 a 1992, em particular de 1980 a 1989, o desequilíbrio financeiro do setor público foi evidenciado na própria ¹ Artigo elaborado em 06 de agosto de 2010 ² Autor deste artigo

trajetória dos dispêndios anuais das estatais federais (onde incluí-se as empresas de transporte ferroviário). Nessas empresas transpareceram os cortes de gastos não-financeiros e o aumento acentuado dos dispêndios financeiros, com queda dos gastos conjuntos investimentos mais custeios e crescimento acentuado dos encargos financeiros mais amortizações. A partir de 1990, decresceram os dispêndios com o serviço da dívida. Mas, mesmo nesse ano, a redução real dos investimentos e do custeio das empresas atingiu o fundo do poço. Esses valores voltaram a se elevar em 1991/1992 para cerca de 75% dos valores de 1989 (Marques, 1996). O setor ferroviário de transporte de cargas federal (RFFSA) foi afetado de forma dramática, com os investimentos feitos em 1989 representando, apenas, 19% do valor que havia sido investido em 1980. No total, naqueles dez anos foram investidos cerca de R$ 4,1 mil milhões (em preços de 1994), enquanto os dispêndios com os serviços da dívida, com pico em 1985, somaram no período R$ 6,3 mil milhões. Nos anos de 1990 a 1993, os investimentos, após o poço inicial, estacionaram em patamar de cerca de 40% da aplicação de 1989 (Marques, 1996); Em 1998 a malha da FEPASA foi incorporada à da RFFSA extinguindo automaticamente a estatal paulista e posteriormente foi concedida a administradores privados. A RFFSA foi extinta em 2007. Atualmente as principais ferrovias nacionais encontram-se sob a gestão de grandes operadores privados, os quais realizam exclusivamente transporte de cargas, enquanto apenas parte residual da malha brasileira encontra-se em poder estatal (Comunicados do Ipea - n 50, 2010). 2 2. Diagnóstico do Setor Ferroviário, após o Plano Real Considerando que o Plano Real foi implementado em 1994, quando efetivamente aconteceu a troca da moeda no que Gremaud, Vasconcellos e Toneto, 1996, convencionaram como a segunda fase do plano permite a economia brasileira conviver com uma maior estabilidade monetária, acompanhada de uma grande redução da inflação. Com esta nova realidade (inflação reduzida), tem-se um estancamento no processo financeiro especulativo dentro das empresas e voltam a valer, com maior vigor, as regras básicas de competitividade do mercado (a busca por menores custos e os ganhos de produtividade). Neste cenário, entre 1996 e 1998, são realizados os leilões de concessões das malhas ferroviárias. Apesar de este processo ter sido iniciado em 1992, pelo Decreto n 473, com a inclusão da RFFSA no Programa Nacional de Desestatização, ainda no Governo Collor.

Na tabela 1 encontram-se as principais concessionárias, vencedoras das concessões, e também os principais produtos que cada uma transporta. 3 TABELA 1 Principais ferrovias de carga do Brasil - 2008 Fonte: Comunicados do Ipea Série eixos do desenvolvimento brasileiro Notas: Milhão de toneladas úteis (MTU) tonelada útil refere-se somente ao peso da carga / Bilhão de toneladaquilômetro-útil (bi TKU) tonelada de carga multiplicada pela distância percorrida. Dentre as controladoras, mostradas na tabela 1, somente a ALL não tem um usuário como controlador. Tal fato é reforçado pelo tipo de produtos que são transportados pelas ferrovias. O gráfico 1 apresenta os dados relativos aos volumes transportados (em toneladaquilômetro-útil TKU) dividindo em dois grupos - minério de ferro e carvão, em um grupo, e carga geral, em outro (Comunicados do Ipea - n 50, 2010).

4 GRÁFICO 1 Evolução dos volumes transportados por tipo de produto (em bilhões de TKU) Fonte: Comunicados do Ipea Série eixos do desenvolvimento brasileiro Fazendo uma análise do gráfico 1, constata-se um crescimento de 79,6% no volume transportado, entre 1999 (138,9 bilhões de tonelada-quilômetro-útil) e 2008 (267,7 bilhões de tonelada-quilômetro-útil). Apesar de o maior crescimento ter ocorrido no grupo minério de ferro e carvão, com 97% (passando de 106,7 bilhões de tonelada-quilômetro-útil em 1999, para 210,4 bilhões de tonelada-quilômetro-útil em 2008), não pode-se desprezar o crescimento de 78% para carga geral (passando de 32,2 bilhões de tonelada-quilômetro-útil em 1999, para 57,3 bilhões de tonelada-quilômetro-útil em 2008). As grandes mineradoras e siderúrgicas nacionais viram na obtenção de concessões das ferrovias uma parte vital da cadeia de valor do produto por elas produzido. A ALL, por sua vez, tem uma visão mais generalista, pois entende que a obtenções das concessões de parte da malha ferroviária nacional é um negócio em si e não, apenas, uma extensão de outro negócio principal. Outro ponto positivo, identificado após o processo de concessões das malhas ferroviárias ter sido encerrado, diz respeito aos investimentos realizados pelas concessionárias, que somaram R$ 14,8 bilhões, a valores constantes de 2008, entre os anos 1999 e 2008. As aplicações de recursos privados e públicos em ferrovias, também, apresentaram crescimento em relação ao Produto Interno Bruto (PIB), passado de 0,05% para 0,10%, entre 1999 e 2008. Segundo Comunicado do Ipea n 50, 2010, os investimentos privados, feitos após a concessão das ferrovias, podem ser divididos em três fases. Uma primeira fase, entre 1996 e 1999, onde o principal foco era a recuperação da malha férrea e do material rodante existente, que devido ao estado de conservação deplorável, já comprometiam a operacionalidade do sistema. Fruto do descaso da administração estatal, anterior. Uma segunda fase, iniciada a partir de 2000, onde os investimentos destinaram-se ao aumento da capacidade e a melhoria dos serviços de logística por meio da ampliação de pátios de manobra, construção de terminais de integração rodoferroviária e aquisição de material

rodante. Uma terceira fase, mais atual, o destaque é para a expansão da malha ferroviária, de modo a superar os gargalos logísticos. A tabela 2 apresenta os investimentos totais em transporte e em transporte ferroviário, feitos pelo Governo Federal e pela iniciativa privada. Os dados de investimento privado em transportes referem-se aos desembolsos anuais totais do BNDES. Os financiamentos do banco em transporte são divididos entre transporte aéreo, aquaviário e terrestre. Em anos recentes os desembolsos do BNDES distanciaram-se muito dos investimentos públicos, refletindo o aumento do setor privado no investimento em infra-estrutura (Comunicados do Ipea - n 50, 2010). 5 TABELA 2 Investimento no setor ferroviário - 2008 Fonte: Comunicados do Ipea Série eixos do desenvolvimento brasileiro Notas: Valores constantes de 2008, deflacionados pelo Índice Geral de Preços de Mercado (IGP-M). Analisando os dados da tabela 2, observa-se que os investimentos públicos pouco se alteraram entre 1999 e 2008, em contrapartida os investimentos das concessionárias apresentaram enorme crescimento neste mesmo período. Olhando para os investimentos totais no período (1999-2008), constata-se que 89,73% foram feitos pela iniciativa privada. Um dos objetivos do processo de privatização era justamente este, reduzir a necessidade de investimento público no setor.

O gráfico 2 foi construído com os dados da tabela 2, para melhor representar a evolução do investimento ferroviário, público e privado, entre 1999 e 2008. 6 GRÁFICO 2 Evolução do investimento ferroviário público e privado 1999 2008 (em bilhões de reais) Fonte: Comunicados do Ipea Série eixos do desenvolvimento brasileiro Avaliando os dados da tabela 2, fica clara a melhora nos níveis de investimento em ferrovias, no Brasil. Fica claro, também, que esta melhora deve-se ao setor privado, que pode investir graças ao processo de privatização. Para Puga et al (2007) a elevação significativa das aplicações, entre 2003 e 2008, formam o maior ciclo de inversões ocorridas no país nos últimos 30 anos. Em ciclos, como que em movimentos combinados, iniciando no Programa Nacional de Desestatização, que dá a partida para que as ferrovias passem a ser operadas pela iniciativa privada, passando pelo Plano Real, que estabilizada a economia brasileira e permite, tem-se, depois de muitos anos, a retomada do setor ferroviário, de forma vigorosa e com boas perspectivas de crescimento.

7 3 Perspectivas para os próximos anos Os contratos de concessão previram tarifas máximas para a prestação do serviço de transporte ferroviário. Estas foram definidas de acordo com o produto transportado e a ferrovia em questão. Adotou-se, também, uma correção monetária com base no Índice Geral de Preços Disponibilidade Interna (IGP-DI), para estas tarifas máximas. Todavia, o ponto principal é que esta tarifa máxima foi definida considerando os custos que a RFFSA tinham antes das privatizações. Com isto, baseado nas calamitosas condições de ineficiências das estatais nacionais, no início da década de 1990, criam-se grandes oportunidades para as controladoras aumentarem seus lucros através dos ganhos de produtividade. Um exemplo de tal ineficiência pode ser encontrado em matéria publicado pela revista Isto É Dinheiro, edição 656, intitulada De volta aos trilhos, que relata a compra da Brasil Ferrovias - antiga estatal paulista que havia passado para a Rede Ferroviária Federal, em 1997, para ser privatizada em seguida, pela ALL. Na época da compra a Brasil Ferrovias tinha uma dívida de R$ 1,5 bilhão e uma operação com 4,5 mil funcionários para operar 5.000 km de estradas de ferro. Hoje a ALL opera 23.000 km com o mesmo número de funcionários. Dos 12 mil vagões da Brasil Ferrovias, 35% estavam fora de operação por falta de manutenção. O número de acidentes do trabalho era 12 vezes maior e o consumo de diesel, 5 vezes maior, na Brasil Ferrovias em comparação com a ALL. É com base nestes cenários que a iniciativa privada começou a trabalhar para buscar os ganhos de produtividade. Visto que no próprio contrato de concessão foram estabelecidas as metas de produção de cada malha concedida, com revisão pela ANTT a cada cinco anos. Tais metas terão que ser revisadas para que as empresas privadas sejam provocadas a buscar mais ganhos de produtividade, nos próximos anos. Buscando uma visão de mais longo prazo, o sistema ferroviário nacional terá que ampliar a capilaridade, bem como aumentar a integração a outros modais (rodoviário, por exemplo). A baixa capilaridade fica evidente quando comparamos o tamanho do Brasil, com 8,5 milhões de quilômetros quadrados, com o tamanho de nossa malha ferroviária, de 28,3 mil quilômetros. Através destes dados, por divisão, temos um indicador de 300,35. Para a China, outro país pertencente ao BRIC, a proporção é mais favorável, com 9,6 milhões de quilômetros quadrados, para 54 mil quilômetros de trilhos, o que resulta em um indicador de 177,78. Para os Estados Unidos este mesmo indicado é de 24,75. Além disto, será necessária a ampliação do volume de carga transportada pela malha ferroviária, visto que os custos ferroviários só conseguem rivalizar com os custos rodoviários para cargas a partir de 350 mil toneladas mensais. Desta forma fica clara a necessidade em existir demanda por transporte de carga considerável para justificar o investimento em novas linhas ferroviárias. Conforme Plano Nacional de Logística e Transporte (PNLT) a malha ferroviária brasileira deve ganhar mais 20.000 km de trilhos novos, até 2025. Caso isto realmente ocorra a Brasil atingirá aproximadamente 50.000 km de malha ferroviária. Neste cenário, segundo Portal Exame, a participação ferroviária no sistema de transporte nacional aumentaria dos atuais 25% para 35%. Quando olhasse para a agenda do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC), encontrasse uma previsão de investimento na malha ferroviária de 7 bilhões de reais, o que garantiria ao Brasil a condição de ter 31.500 km de malha ferroviária em 2015.

8 4. Conclusões Para Gonçalves (2008), o desempenho da produtividade brasileira nas últimas décadas colabora, em muito, para explicar o atraso do desenvolvimento econômico. Para o Brasil crescer, sem despertar a inflação, será preciso destravar os ganhos de produtividade. Segundo Kanitz (1995), aumentar a produtividade de um trabalhador, nem sempre, significa obrigá-lo a trabalhar mais em um período de tempo menor, mas sim associá-lo a equipamentos mais avançados e qualificá-lo. São pautados por estes ganhos de produtividade que as concessionárias da malha ferroviária brasileira, têm trabalho desde os leilões. A iniciativa privada mostra-se mais apta para trabalhar sob esta ótica e parece responder melhor as cobranças impostas pelo mercado. Mostrando fôlego, com o auxílio do BNDES (é bem verdade), para fazer os investimentos necessários, até o momento. Vale lembrar, que tais condições só foram permitidas graças ao Plano Real, que além de trazer estabilidade econômica fez voltar a aflorar a necessidade de se melhorar a produtividade. Com os investimentos planejados para o setor, o cenário que se abre é dos mais promissores nos últimos 30 anos. Frente à necessidade, cada vez maior, de reduzir os custos logísticos dos produtos, o trem tende a apresentar-se como uma excelente opção para um Brasil continental. Por fim, vale ressaltar que o modal ferroviário é apenas um dos vários modais existentes no Brasil e que a integração entre estes modais deve ser tarefa de dedicação permanente do governo (em suas diferentes esferas) e da iniciativa privada. Referências COMUNICADOS DO IPEA. Série eixos do desenvolvimento brasileiro. Número 50. Disponível em: < http://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/pdfs/comunicado/100519_ comunicadoipea50.pdf>. Acesso em: 20 jul. 2010. GREMAUD, Amaury Patrick; VASCONCELLOS, Marco Antonio Sandoval de; TONETO, Rudinei. Economia brasileira contemporânea. 7 ed. São Paulo SP: Atlas, 2009. GONÇALVES, Carlos Eduardo Soares. Produtividade e instituições no Brasil e no mundo: ensinamentos teóricos e empíricos. In: BARROS, Octavio de (org); GIAMBIAGI, Fabio (org). Brasil Globalizado. 1 ed. Rio de Janeiro RJ: Elsevier, 2008. KANITZ, Stephen Charles. O Brasil que dá certo: o novo ciclo de crescimento 1995-2005. 18 ed. São Paulo SP: Makron Books, 1995. MARQUES, Sergio de Azevedo. Privatização do sistema ferroviário brasileiro. In: Instituto de pesquisa econômica aplicada Ipea. 1996. Rio de Janeiro RJ. PUGA, Fernando Pimentel. et al. Por que o PAC vai aumentar o investimento. Brasília: BNDES 12 fev. 2007. Disponível em: < http://www.bndes.gov.br/sitebndes/export/ sites/default/bndes_pt/galerias/arquivos/conhecimento/visao/visao_24.pdf>. Acesso em: 19 jul. 2010. SOBRAL, Eliane. De volta aos trilhos. Isto é dinheiro. 656 ed. Disponível em: < http://www.istoedinheiro.com.br/noticias/21488_de+volta+aos+trilhos>. Acesso em: 03 mai. 2010.