GESTÃO DE RISCOS ASSOCIADOS A MOVIMENTOS DE MASSA

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Transcrição:

REVISTA ORDEM PÚBLICA ISSN 1984-1809 v. 9, n. 1, jan./jun., 2016 e 2237-6380 ACORS http://www.acors.org.br rop.emnuvens.com.br/rop GESTÃO DE RISCOS ASSOCIADOS A MOVIMENTOS DE MASSA RESUMO Gustavo Cardoso 1 Christiano Cardoso 2 Para que se possa fazer a gestão de riscos de forma eficiente, é necessário entender como os fenômenos naturais ocorrem. O presente trabalho fez um estudo sobre conceitos de movimentos de massa e algumas formas de realizar a gestão de riscos associados a esses movimentos. Foram estudados os conceitos mais recentes sobre movimentos de massa, análise e gestão de riscos e ações preventivas e mitigatórias, abrangendo diversas bibliografias em relação ao tema. As ocorrências de movimentos de massa, principalmente os deslizamentos e as quedas de barreiras, estão entre as que mais causam danos humanos. Embora esses fenômenos sejam naturais, a interferência humana pode acelerá-los ou agravá-los. Um dos fatores que aceleram esses processos é a ocupação irregular de áreas de encosta, causada pela urbanização aliada à falta de planejamento adequado. Para diminuir os riscos de desastres associados a movimentos de massa, pode-se realizar diversas obras, mas as ações que causam mudança cultural são mais efetivas no aspecto preventivo. Palavras-chave: Movimento de Massa. Gestão de Riscos. 1 INTRODUÇÃO O Brasil, devido a sua grande extensão territorial, possui uma variedade de climas, acompanhado de uma grande diversidade de fenômenos meteorológicos. Fenômenos naturais, como deslizamentos e inundações, fazem parte da dinâmica terrestre e são 1 Cadete do CEBM Centro de Ensino Bombeiro Militar. 2 Major do CBMSC Corpo de Bombeiros Militar de Santa Catarina. S 261

processos constantes na história do nosso planeta (UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA, 2012). A diferença entre esses fenômenos naturais e um desastre é a presença de pessoas, pois quando ocorrem em áreas habitadas, esses fenômenos podem trazer severos danos materiais e humanos. A Defesa Civil de Santa Catarina adota a definição de desastre como uma séria interrupção no funcionamento de uma comunidade ou sociedade, com impactos sobre pessoas, bens, economia e meio ambiente, que excede a capacidade dos afetados para lidar com situação mediante o uso de seus próprios recursos (SANTA CATARINA, 2013, p. 9). O maior desastre registrado no Brasil foi causado por movimentos de massa que ocorreram na região serrana do Rio de Janeiro, em 2011. Esta foi considerada uma das maiores ocorrências de movimentos de massa generalizados do País. Este evento, oficialmente, causou 947 mortes, com 300 desaparecimentos, deixou mais de 50.000 desabrigados e afetou quase 1.000.000 de pessoas (DOURADO; ARRAES; SILVA, 2012). Em Santa Catarina, no ano de 2008, aconteceu um dos piores desastres da história do Estado. Dos locais atingidos, a região do Morro do Baú, na cidade de Ilhota, estava entre os mais afetados. O local foi duramente flagelado por escorregamentos sucessivos das encostas e inundações bruscas; o desastre desalojou e deslocou 3.500 pessoas, deixou 1.300 desabrigadas, 67 feridas e 26 mortas; 406 residências foram destruídas e/ou soterradas (MATTEDI et al., 2009). Os dados até aqui apresentados justificam a importância de conhecer os aspectos relacionados a ocorrências de movimentos de massa. Para que se possa fazer a gestão de riscos de forma eficiente, é necessário entender como esse tipo de fenômeno ocorre. Compreendendo esses eventos, pode-se evitar que se tornem desastres, pois assim é possível planejar ações adequadas para lidar com esse tipo de ocorrência, seja na prevenção, mitigação, alerta ou preparação. Um bom planejamento urbano é algo que certamente reduzirá o número de afetados e permitirá a convivência com um nível de risco aceitável risco muito pequeno, com consequências limitadas, se comparadas aos benefícios percebidos (CASTRO, 2007). Para Siebert (2012, p. 2), o planejamento urbano precisa incorporar o conhecimento das vulnerabilidades e dos riscos aos quais a população está sujeita para poder propor medidas de mitigação e adaptação [ ] caso contrário, as cidades se transformarão em armadilhas com imenso potencial para o desastre. Os objetivos deste trabalho são: abordar os conceitos relacionados às ocorrências de movimento de massa e formas de evitar que esses eventos naturais se tornem desastres, citando algumas medidas de gerenciamento de risco que podem ser realizadas. 262 s

Para atingir esses objetivos, foi realizada uma pesquisa bibliográfica. Foram estudados os conceitos mais recentes sobre movimentos de massa, análise e gestão de riscos e ações preventivas e mitigatórias, abrangendo diversas bibliografias em relação ao tema (LAKATOS; MARCONI, 2003). 2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 2.1 Conceitos Dos eventos classificados como movimentos de massa, serão abordados a seguir os que são mais comuns e mais relevantes, dentro da perspectiva de desastres e ações de defesa civil. É importante salientar que, na natureza, os escorregamentos tendem a ser mais complexos, podendo ocorrer diversas classes num mesmo movimento, o que dificulta estabelecer limites entre elas (TOMINAGA; SANTORO; AMARAL, 2009). Portanto, as definições que serão apresentadas têm caráter didático, para que se possa compreender as diferenças básicas desses movimentos. Tominaga, Santoro e Amaral (2009, p. 26) definem movimento de massa como o movimento do solo, rocha e/ou vegetação ao longo da vertente sob a ação direta da gravidade. A contribuição de outro meio, como água ou gelo, se dá pela redução da resistência dos materiais de vertente e/ou pela indução do comportamento plástico e fluido dos solos. Existem vários processos que se enquadram no conceito de movimentos de massa. No entanto, diferem-se por alguma característica específica, geralmente pela formação ou pela velocidade do movimento (GUERRA, 2006), gerando assim diversas classificações, como as que seguem: a) Escorregamento de terreno: Descidas de solo ou das massas de rochas decompostas geralmente pelo efeito da gravidade. Nas estruturas inclinadas, os escorregamentos de terreno são mais facilitados (GUERRA, 2006, p. 244). b) Deslizamentos: Deslocamentos de massas de solo sobre um embasamento saturado de água. Os deslizamentos dependem de vários fatores, tais como: inclinação das vertentes, quantidade e frequência das precipitações, presença ou não de vegetação, consolidação do material etc. A ação humana muitas vezes pode acelerar os deslizamentos, através da utilização irracional de áreas acidentadas. (GUERRA, 2006, p. 198) S 263

c) Solifluxão tropical: Diz-se do movimento de descida de grande massa de argila ou de areia granítica, por ocasião das chuvas muito intensas. Este fenômeno é comumente denominado de queda de barreira. Estes movimentos de solo e rochas decompostas são acelerados, isto é, intensificados pelos desflorestamentos realizados pelo homem. (GUERRA, 2006, p. 582) Os conceitos apresentados mostram que os movimentos de massa sofrem diversas influências, sendo mais frequentes em locais com inclinação maior. Se o fenômeno ocorre em consequência da ação gravitacional sobre a decomposição das rochas, é um escorregamento. Havendo saturação de água no solo, o movimento é classificado como deslizamento. Chuvas intensas geralmente tornam o volume de água no solo muito elevado, o que aumenta a velocidade e a massa deslocada; esse deslizamento com maior volume é chamado de solifluxão ou queda de barreira (GUERRA, 2006). Movimentos de massa são processos naturais, atuantes na dinâmica das vertentes, sendo parte da evolução geomorfológica das regiões serranas. Esses processos tornam-se desastres pela falta de planejamento urbano e ocupação irregular de áreas propícias ao acontecimento desses fenômenos, que são consideradas áreas de risco (TOMINAGA; SANTORO; AMARAL, 2009). 2.2 Gastos com prevenção Quando se trata de desastres, a atenção da administração pública no Brasil historicamente esteve mais voltada para a fase de resposta, ou seja, após o evento adverso ter atingido alguma comunidade. Nessa fase, é realizado o atendimento às vítimas e o reestabelecimento dos locais atingidos, o que gera uma grande demanda de recursos financeiros e humanos (SANTA CATARINA, 2013). Uma pesquisa da Confederação Nacional de Municípios (2011) revelou a enorme diferença nos gastos que a administração pública teve com prevenção e resposta. Segundo essa pesquisa, entre 2004 e 2009, os gastos com respostas aos desastres aproximaram-se de 1,9 bilhão de reais, enquanto os gastos com prevenção e preparação foram correspondentes a 145 milhões de reais. Essa imensa diferença entre os valores pagos em prevenção e em resposta mostra claramente o tão pouco que o governo vem gastando para prevenir os prejuízos causados pelos desastres naturais. A falta de investimento na prevenção tem relação direta com o aumento de gastos na resposta aos desastres, que cada vez mais afetam comunidades localizadas em áreas de riscos e cada vez mais causam prejuízos aos municípios. [...] (CONFEDERAÇÃO NACIONAL DE MUNICÍPIOS, 2011) 264 s

Uma das explicações para o grande desequilíbrio nos gastos de prevenção e resposta é que as ações de redução de riscos não oferecem a mesma visibilidade às políticas de organismos oficiais nacionais e internacionais, arrecadadores de fundos, comparadas aos programas de atendimentos emergenciais, os quais normalmente têm grande exposição na mídia (VEYRET, 2007). Muitas pessoas perceberam que viviam em áreas suscetíveis a desastres apenas depois de serem afetadas por algum evento adverso. Por isso, é importante que se desenvolva em nossa sociedade a cultura de percepção de risco, é necessário conhecer as características do local que se habita. Isso pode ser o primeiro passo para se evitar ou prevenir situações que possam acarretar ou potencializar algum desastre (UNIVER- SIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA, 2012). O poder público tem papel fundamental na minimização dos efeitos de eventos adversos sobre comunidades ameaçadas por estes. Para tanto, é essencial que nossos gestores tenham uma visão mais ampla do ciclo de gestão de defesa civil, que os governos vejam além da resposta, que se atue também na prevenção, preparação e mitigação. Trabalhar com o foco na prevenção custa menos para o Estado do que ações de resposta e recuperação (SANTA CATARINA, 2013). 2.3 Gestão de riscos Uma das características negativas do processo de urbanização é o aumento do número de pessoas que vivem em áreas de risco de deslizamentos, enchentes e inundações. Essa situação ocorre com maior frequência em regiões metropolitanas (BRASIL, 2007). De acordo com o Ministério das Cidades, a política habitacional ineficiente para a população de baixa renda, a ineficácia dos sistemas de controle do uso e ocupação do solo, a inexistência de legislação adequada e apoio técnico para a população estão entre os fatores que contribuem para o aumento populacional em áreas de risco (BRASIL, 2007). Kobiyama et al. (2006) destacam que os desastres são geralmente inesperados, possuindo uma gravidade e magnitude capazes de produzir danos e prejuízos diversos, muitas vezes resultando em mortos e feridos. Para que se possa diminuir ou evitar esses danos, faz-se necessária a realização de ações preventivas e restituidoras, visando a uma recuperação que não pode ser alcançada por meio de procedimentos rotineiros. Para que essas ações preventivas sejam possíveis, é necessário realizar uma gestão adequada dos riscos de desastre. O Glossário de Defesa Civil define risco como a relação existente entre a probabilidade de que uma ameaça de evento adverso ou S 265

acidente determinado se concretize e o grau de vulnerabilidade do sistema receptor a seus efeitos (CASTRO, 2007, p. 162). A gestão de riscos consiste em primeiramente realizar uma identificação e avaliação dos riscos existentes, para posteriormente efetuar dois tipos de intervenções: diminuição da probabilidade e intensidade da ameaça e a redução das vulnerabilidades, com o fortalecimento da capacidade de enfrentamento dos riscos (SANTA CA- TARINA, 2013). De acordo com o Ministério das Cidades, na gestão de áreas com risco de deslizamentos, deve-se trabalhar com dois fundamentos principais: a previsão e a prevenção. A previsão é a identificação dos locais em que o evento tenha maior probabilidade de acontecer, estabelecendo também as condições e circunstâncias para a ocorrência dos processos, ou seja, é uma forma de análise de risco. Esta análise é crucial para que se possa adotar as medidas apropriadas à gestão dos riscos encontrados. Um dos métodos mais utilizados para isso é o mapeamento das áreas de risco (BRASIL, 2007). A prevenção é a possibilidade de aplicar medidas que visam impedir a ocorrência dos eventos adversos e a redução de seus impactos, agindo diretamente sobre edificações e/ou a própria população vulnerável. Os resultados obtidos nos estudos de análise de risco permitem a formulação de um planejamento adequado para a aplicação de medidas preventivas nas áreas em que existem riscos consideráveis. Deve-se considerar a relação custo/benefício para as opções que estão à disposição do gestor (BRASIL, 2007). As medidas preventivas são normalmente classificadas em dois tipos: estruturais e não estruturais. As medidas estruturais têm por finalidade aumentar a segurança intrínseca das comunidades, por intermédio de atividades construtivas. Existem várias possibilidades técnicas de engenharia que podem diminuir os riscos geológicos de determinada área. Uma das técnicas que é amplamente utilizada é a construção de obras de contenção de encostas. Dessas obras, as mais comuns são os retaludamentos, aterros e estruturas de arrimo; estas construções reduzem principalmente os riscos de ocorrência de escorregamentos (RODRIGUES, 2002). Uma das medidas estruturais mais importantes para a prevenção de acidentes de deslizamentos e solifluxão é o escoamento das águas superficiais, por meio de obras de drenagem. As obras de drenagem têm por objetivo captar e conduzir as águas superficiais e subterrâneas das encostas, evitando a erosão, a infiltração e o acúmulo de água no solo, responsáveis pela deflagração de deslizamentos (BRASIL, 2007, p. 129). É importante ressaltar que muitas medidas estruturais não têm caráter preventivo, e sim mitigatório. Essas medidas são obras de engenharia, que foram projetadas para suportar certo limite de carga; no entanto, é possível que ocorram eventos que 266 s

superem as previsões realizadas pelos engenheiros, podendo destruir as contenções construídas. As medidas não estruturais envolvem a aplicação de políticas públicas, buscando a mudança cultural e comportamental. Custam muito menos que as medidas estruturais e apresentam bons resultados (BRASIL, 2007). São exemplos de medidas não estruturais: a implementação de normas técnicas e de regulamentos de segurança, a educação e a capacitação, a elaboração de planos de contingência, entre outros. As principais vantagens dos planos preventivos são destacadas por Tominaga, Santoro e Amaral (2009): Os planos preventivos e de contingência são instrumentos eficazes, especialmente em áreas urbanas, uma vez que minimizam os danos humanos, materiais e sociais. São responsáveis pela implantação de uma cultura de caráter preventivo em relação aos desastres. Estes planos têm como consequência principal a redução do número de vítimas fatais. (TOMINAGA; SANTORO; AMARAL, 2009) Havendo amparo na lei e uma fiscalização eficiente, as ações de gerenciamento de áreas de risco e prevenção de desastres tornam-se muito mais eficazes. Pode-se citar como exemplo o Código Florestal (Lei n. 12651/2012), que restringe o uso dos espaços de faixas marginais de curso d água, encostas e topo de morro. Segundo Coutinho et al (2013), essas restrições estão estreitamente relacionadas aos eventos responsáveis pela maioria dos desastres naturais registrados no Brasil: inundações e escorregamentos. Existem muitas maneiras de evitar que pessoas sejam atingidas por ocorrências de movimentos de massa e outros fenômenos naturais, basta realizar um bom planejamento. Investir na redução de risco é algo complexo e exige decisão e vontade política. No entanto, o investimento em prevenção resulta em economia, e é o meio mais eficaz para alavancar o desenvolvimento local, contribuindo na melhoria das condições de vida (SANTA CATARINA, 2013, p. 7). 3 CONCLUSÃO No Brasil, as ocorrências de movimentos de massa, principalmente os deslizamentos e as quedas de barreiras, estão entre as que mais causam danos humanos. Embora esses fenômenos sejam naturais, a interferência humana pode acelerá-los ou agravá-los. Um dos fatores que aceleram esses processos é a ocupação irregular de áreas de encosta, causada pela urbanização aliada à falta de planejamento adequado. Com a magnitude e frequência maior que os desastres estão ocorrendo, é necessário que a população e o Estado estejam preparados para enfrentar essas situações. Por S 267

isso, é essencial que se realize uma eficiente análise de risco, que poderá subsidiar as decisões adequadas para gerenciar de forma efetiva os riscos encontrados. São várias as medidas que podem ser tomadas para diminuir os riscos a que uma comunidade está sujeita. Entre as estruturantes, pode-se realizar obras de drenagem ou de contenção. Mas, embora as medidas estruturantes aumentem a sensação de segurança das comunidades, a percepção de risco dessas pessoas pode diminuir. As ações mais eficientes são as que trazem algum tipo de mudança cultural, pois estas têm um foco preventivo. São exemplos campanhas publicitárias, informativos, proibição de construir em áreas de risco ou retirada de moradores que já residem nessas áreas. Evitar que fenômenos naturais severos ocorram foge da capacidade humana. Entretanto, através da prevenção, pode-se desenvolver medidas que minimizem os impactos causados por eles (KOBIYAMA, et al., 2006, p. 31). REFERÊNCIAS BRASIL. Lei n. 12651, de 25 de maio de 2012. Dispõe sobre a proteção da vegetação nativa e dá outras providências. Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. BRASIL, Ministério das Cidades; Cities Alliance. Prevenção de Riscos de Deslizamentos em Encostas: Guia para Elaboração de Políticas Municipais. Celso Santos Carvalho e Thiago Galvão, organizadores Brasília: Ministério das Cidades; Cities Alliance, 2006. BRASIL, Ministério das Cidades; Instituto de Pesquisas Tecnológicas IPT. Mapeamento de Riscos em Encostas e Margem de Rios. Celso Santos Carvalho, Eduardo Soares de Macedo e Agostinho Tadashi Ogura, organizadores Brasília: Ministério das Cidades; Instituto de Pesquisas Tecnológicas IPT, 2007. CASTRO, Antônio Luiz Coimbra de. Glossário de defesa civil: estudos de riscos e medicina de desastres. Ministério do Planejamento e Orçamento, Departamento de Defesa Civil. Brasília, 2007. CONFEDERAÇÃO NACIONAL DOS MUNICÍPIOS (CNM). Os municípios com a maior incidência de decretos de calamidade pública ou situação de emergência e o fluxo de recursos da política nacional de defesa civil. (Estudo técnico CNM). Brasília: CNM; 2011. COUTINHO, Marcos Pellegrini et al. O Código Florestal Atual (Lei n. 12651/2012) e suas implicações na prevenção de desastres naturais. Sustentabilidade em Debate - Brasília, v. 4, n. 2, p. 237-256, jul/dez 2013. DOURADO, Franciso; ARRAES, Thiago Coutinho; SILVA, Mariana Fernandes. O Megadesastre da região serrana do Rio de Janeiro As causas do evento, os mecanismos dos movimentos de massa e a distribuição espacial dos investimentos de reconstrução no pós-desastre. Anuário 268 s

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most damaging events. Although these are natural events, human interference can accelerate or worsen them. One of the factors that accelerate these processes is the illegal occupation of hillside areas, caused by urbanization coupled with the lack of adequate planning. To reduce the risks of disasters associated with mass movements, it is possible to perform many kinds of structural works; however, actions that cause cultural changing are way more effective in the preventive aspects. Keywords: Mass Movements. Risk Management. Landslides. 270 s