MODELOS URBANÍSTICOS MODERNOS E PARQUES URBANOS: AS RELAÇÕES ENTRE URBANISMO E PAISAGISMO EM SÃO PAULO NA PRIMEIRA METADE DO SÉCULO XX



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Transcrição:

MODELOS URBANÍSTICOS MODERNOS E PARQUES URBANOS: AS RELAÇÕES ENTRE URBANISMO E PAISAGISMO EM SÃO PAULO NA PRIMEIRA METADE DO SÉCULO XX FABIA O LEMES DE OLIVEIRA TESE DE DOUTORADO ORIENTADOR: PROF. DR. JOSEP MARIA MONTANER DOCTORADO EN TEORÍA E HISTORIA DE LA ARQUITECTURA DEPARTAMENTO DE COMPOSICIÓN ARQUITECTÓNICA UNIVERSITAT POLITÈCNICA DE CATALUNYA - UPC Março 2008

Modelos urbanísticos modernos e parques urbanos: as relações entre urbanismo e paisagismo em São Paulo na primeira metade do século XX fig 35 - Maquete de estudo para a remodelação do Parque do Anhangabaú. fig 36 - Parque do Anhangabaú transformado em avenida de fluxo rápido, eixo do Sistema Y. Maia escreve que: O jardim antiquado que separava o Piques da Praça dos Correios foi substituído por amplas alamedas, destinadas a receber o tráfico das Avenidas Anhangabaú, &ove de Julho e Itororó. Essa opção pela relação entre grandes volumes construídos e seu entorno aberto na definição da cidade presentes nas obras de Otto Wagner, Hegemann e tanto disseminado nos Estados Unidos no período como nas visões totalitárias da Europa Continental - é ainda retomada por Maia em seu esforço pela construção de um Paço Municipal e na entrada norte da cidade, na região da Ponte Grande. As criações de centros comunitários e cívicos, bem como o interesse pela monumentalidade, se fizeram em ambos os continentes e perpassaram as discussões da arquitetura em diversas correntes. Importa recordar que é apenas no final da década de 30 que, com a chegada de Gropius em Harvard, em 1937, com as conferências de Giedion, e da ida de Mies van der Rohe a Chicago, em 1938, que se começa a difundir significativamente a arquitetura moderna nos Estados Unidos. Isto posto, se por um lado chega ao Brasil o ideário modernista e se propaga sobretudo com a vinda de Le Corbusier, em 1936, também o ideário da cidade americana, com seus arranha-céus e o gigantismo monumental se difunde como símbolo de modernidade e prosperidade. O próprio Giedion reconheceria, em Space, Time and Architecture, como deveria ser o centro cívico moderno: Habrá de ser instalado em elevados edifícios dispuestos libremente en espacios abertos, circundados y limitados por zonas verdes, reconhecendo no Rockefeller Center, de Nova Iorque, construído entre 1931 e 1939, o exemplo ideal desta tipologia, ainda que não contasse com áreas verdes já que havia sido construído no centro da cidade.56 Neste sentido, a própria realização de um centro cívico monumental a partir destes pressupostos englobava a execução de uma alegoria metropolitana, um símbolo para a nova urbe que se construía e a filiação aos aspectos positivos do progressismo americano. De todas formas, vale destacar que no período não houve uma pura aceitação de um único modelo, C a p. 4 : Pa r q u e e C i d a de n o P e n s a m e n t o U r ba n ís t ic o P a u lis ta n o 309

F a b i a n o L e m e s d e O l i v e i r a mas sim, como estamos discutindo, uma pluralidade de referência; em que ainda destacamos as teorias construtivistas das vanguardas e suas composições com formas puras, tal como se vê nos Architectons, de Malevich, dos anos 20. 57 fig 37 - Croqui de Prestes Maia para a área do Paço Municipal. Fonte: Acervo Prestes Maia /Biblioteca Presidente Kennedy. A construção do Paço Municipal em São Paulo se aventou como elemento representativo do poderio da metrópole e sua implantação inicial seria na conexão do Perímetro de Irradiação com a zona leste, na Praça do Carmo (Clóvis Bevilaqua) recém aberta. Maia publica alguns projetos apresentados para o concurso de 1940, em que se percebe seu interesse pelas referências tratadas, ao final de um eixo perspéctico conferido pelos edifícios em torno à esplanada criada. (fig 37) Da mesma forma como o Rockefeller Center se eximia da imediação de zonas verdes, em São Paulo a sua supressão também é marcante nas propostas. A geometrização da cidade, de sua arquitetura e de suas áreas abertas se vê claramente no próprio projeto de Maia para o edifício, em que compõe o arranha-céu com volumes retangulares e recuos sucessivos em altura, tais como se via nas metrópoles estadunidenses, e a assepsia do espaço envoltório, em que não podemos deixar de ressaltar a poda em cubos da copa das árvores em seu rígido alinhamento. O projeto vencedor, do Escritório Ramos de Azevedo, não se realiza e logo decide-se pela transferência da sua localização para o Vale do anhangabaú e, finalmente, em 1952, Oscar Niemeyer vence um novo concurso, sendo que tampouco seu projeto se construiria. (fig 38-39) 310 C a p. 4 : P a r q u e e C i d a d e n o P e n s a m e n t o U r b a n í s t i c o P a u l i s t a n o

M o d e l o s u r b a n í s t i c o s m o d e r n o s e p a r q u e s u r b a n o s : a s r e l a ç õ e s e n t r e u r b a n i s m o e p a i s a g i s m o e m S ã o P a u l o n a p r i m e i r a m e t a d e d o s é c u l o X X fig 38 - Projeto de Prestes Maia para o Paço Municipal de São Paulo. Chamamos a atenção para os recuos sucessivos típicos dos arranhacéus estadunidenses do período e para a geometrização radical do espaço, refletida ainda na poda cúbica da copa das árvores. fig 39 - Projeto vencedor do concurso para o Paço Municipal de São Paulo. Escritório Ramos de Azevedo, 1940. Em relação aos destinos do rio Tietê e de suas áreas marginais, Maia descreve os trabalhos de canalização e regularização do leito, bem como de terraplanagem para a construção das marginais. Destaca também a manutenção do interesse em transladar as linhas de trem para sua margem direita e de transformar o seu antigo leito em uma faixa de bulevares, o que finalmente não se põe a termino. A nova estação central se implantaria na entrada norte da cidade, em um conjunto monumental que marcaria esta porta de acesso. (fig 40-41-42) Vemos novamente, portanto, que a região da Ponte Grande (fig 43) é tratada com especial acuro. Distinta da proposta do Plano de Avenidas, o caráter mais sóbrio do novo projeto coincide com o seu maior interesse pelas grandes massas da arquitetura racionalista a estadunidense e pelo revival neoclássico da arquitetura realista da Europa Continental, e se restringe ringe ao mínimo a área vegetada nas imediações dos edifícios. Com olhares para a Praça Entrada do Brasil, proposta por Agache para o Rio de Janeiro, em 1929, como espaço representativo do país para os olhares estrangeiros, expressão da modernidade, pujança e desenvolvimento nacional; Maia da mesma forma buscava a criação de uma entrada monumental para São Paulo. Em ambos os casos verifica-se o caráter simbólico destes projetos, que dariam a primeira impressão da cidade ao turista. 58 Esta vontade já se demonstrava anteriormente em São Paulo, como mencionamos, e sempre a partir da conjunção da arquitetura com áreas de parque. Contudo, ainda que Maia comente em 1945 que: na confluência dos rios Tietê e Tamanduateí, está iniciado o ajardinamento de uma grande área, 59 (fig 44) o certo é que da mesma forma como reduziu as áreas verdes na maioria dos outros espaços públicos propostos ou reformados, diminui-se aqui também a área de C a p. 4 : P a r q u e e C i d a d e n o P e n s a m e n t o U r b a n í s t i c o P a u l i s t a n o 311

Fa b ia n o L e m e s d e O l i ve ir a parques no entorno dos clubes náuticos e se nota a ausência de menção do uso do lago criado com as escavações necessárias para a regularização do rio, do lado direito da Avenida Tiradentes. A opção pela monumentalidade requeria a seu ver o uso geométrico e muito controlado de elementos vegetais, que deveriam ser reduzidos ao mínimo. Por outra parte, outro lago se vê criado a partir do alargamento do próprio rio e onde se dispõe de uma ilha, (fig 4546-47) tratada de maneira pitoresca. fig 40 - Praça da Ponte Grande. Vê se a Avenida Tiradentes, no eixo entre as duas torres. (lado sul) fig 41 - Praça da Ponte Grande com Edifício das Estações Unificadas. Lado norte. fig 42 - Praça da Ponte Grande. fig 43 - Ponte Grande. 312 C a p. 4 : Pa r q u e e C i da d e n o Pe ns a m e n t o U r ba ní s ti c o Pa ul is t a n o

M o d e l o s u r b a n í s t i c o s m o d e r n o s e p a r q u e s u r b a n o s : a s r e l a ç õ e s e n t r e u r b a n i s m o e p a i s a g i s m o e m S ã o P a u l o n a p r i m e i r a m e t a d e d o s é c u l o X X fig 44 - Região da Ponte Grande em Mapa de 1943. Fonte: Site da PMSP. fig 45 - Proposta para a o rio Tietê e área entorno à Ponte Grande. Acima à esquerda vê-se o Campo de Marte. Note-se que não há qualquer menção de uso para a área em frente ao Campo de Marte, do outro lado da Avenida Tiradentes. C a p. 4 : P a r q u e e C i d a d e n o P e n s a m e n t o U r b a n í s t i c o P a u l i s t a n o 313

Fa b ia n o L e m e s d e O l i ve ir a fig 46 - Perspectiva apresentando o rio Tietê e imediações da Ponte da Casa Verde. Trata-se da região da próxima ponte imediatamente a oeste da Ponte Grande, entre o Bom Retiro, ao sul, e a Casa Verde, na margem norte do Tietê. Confira planta da proposta para a área na fig 45. fig 47 - Canalização do rio Tietê nas proximidades do Bom Retiro. 314 C a p. 4 : Pa r q u e e C i da d e n o Pe ns a m e n t o U r ba ní s ti c o Pa ul is t a n o

M o d e l o s u r b a n í s t i c o s m o d e r n o s e p a r q u e s u r b a n o s : a s r e l a ç õ e s e n t r e u r b a n i s m o e p a i s a g i s m o e m S ã o P a u l o n a p r i m e i r a m e t a d e d o s é c u l o X X A manutenção ou proposição de traçados pinturescos não se exclui da visão de Maia, como é visível em determinadas áreas verdes ao longo do Tietê e em outras praças, como a Chile, e parques, embora, como referido acima, ausentes dos locais com entorno densamente urbanizado ou quando se busque a criação de conjuntos monumentais. Assim, notamos que do conjunto exuberante de praças, parques e parkways concebidos no sistema gestado em 1926 e proposto no Plano de Avenidas de 1930, pouco se consolidou ou se manteve como idéia. No centro, além do trabalho de remodelação e abertura de praças, houve a transformação do Parque do Anhangabaú em avenida de fluxo rápido e alterações no Parque D. Pedro II. Outras áreas verdes menores se realizaram pelos bairros, como praças e parques infantis. Tratando de espaços para a prática esportiva, menciona estes últimos e a construção do Estádio Municipal. Em relação à criação de parques urbanos se refere, além da área da Ponte Grande, apenas: ao Parque do Ibirapuera; ao Parque da Aclimação; ao da Represa Velha e ao Bosque Público, nos terrenos do Museu Paulista. E, dos parques municipais presentes na proposta de 1930, apenas o Parque do Ibirapuera e o Parque da Aclimação viriam a se concretizar. Muito pouco, considerando-se todo o percurso de constituição da idéia da necessidade de criação de parques urbanos na cidade, as elaborações iniciais de Maia e o acelerado processo de metropolização de São Paulo. Entre teoria e prática, os caminhos tortuosos da transposição do projetado à realidade se desvaneceram em realizações que se por um lado foram importantes para o cenário de debates urbanos e para a vida da cidade, por outro contribuíram de modo muito menos efetivo do que anunciado para a criação de áreas verdes no período. 4.2.3. OUTRAS PROPOSTAS Entre o Plano de Avenidas e a publicação do livro Os Melhoramentos de São Paulo, há feitos importantes em sua trajetória. Dentre eles, destacamos a publicação, em 1933, de Os Melhoramentos do Recife realizada a partir do parecer que emitiu sobre o trabalho de Nestor Ernesto de Figueiredo para a cidade nordestina; o plano geral de remodelação a cidade de Campinas, do ano seguinte; a fundação, em 1935, junto com Anhaia Mello, da Sociedade Amigos da Cidade e a participação no júri sobre a Cidade Universitária. 60 Sobre o Recife destacamos que a cidade havia passado por distintos períodos reformistas e recebido propostas de vários urbanistas brasileiros com renomada projeção. 61 Figueiredo, que havia apresentado sua proposta no IV Congresso Panamericano de Arquitetos (o mesmo que havia premiado o Plano de Avenidas de Prestes Maia), sofre críticas de vários profissionais e o C a p. 4 : P a r q u e e C i d a d e n o P e n s a m e n t o U r b a n í s t i c o P a u l i s t a n o 315

Fa b ia n o L e m e s d e O l i ve ir a debate urbanístico se acirra com a chamada, pela Comissão do Plano Plano da Cidade, de Washington Azevedo, Prestes Maia e, logo, de Attílio Correia Lima para opinar sobre a expansão de Recife. Ulhôa Cintra, em 1943, também desenvolve um estudo (fig 48) em que, retomando o proposto em São Paulo e as orientações de Maia para Recife, Recife, delimita um sistema radial radial-perimetral perimetral e um cinturão verde em torno a ela. ela Este último aparece como uma parkway contornando a área de expansão e conectando dois dois parques situados situados em suas extremidades. extremidades Atento à paisagem, paisagem seu projeto recupera recupera a conexão entre o rio, as áreas verdes e as edificadas, edificadas, usando os dois primeiros como instrumentos instrumentos urbanísticos decisivos na definição da proposta. proposta O rio, coerentemente com o que propôs pro para o Tietê, é tratado de modo pinturesco, sendo o eixo de uma faixa verde vinda do interior. Também na radial à direita do mapa, vê-se vê se como indica o tratamento verde do seu percurso. Assim, a idéia déia de criação de canais verdes desde o entorno não urbanizado até o centro da cidade, difundida por Prestes Maia no Brasil em 1930 a partir de diversas referências internacionais, encontra-se internacionais, encontra se esboçada neste estudo, ainda que de maneira tímida. fig 48 - Plano de Reforma do Recife. Ulhôa Cintra, 1943. Fonte: CINTRA. 1943. fig 49 - Projeto geral de remodelação da cidade de Campinas, Campinas 1934-8. Propõem-se Propõem se praças e áreas verdes menores na área central e cinco grandes parques suburbanos conectados entre si por uma avenida e ao centro pelas radiais. Fonte: BITTENCOUR 2002, p.135. Campos ilustrou como Maia, trabalhando trabalhando em contato com uma comissão para o desenvolvimento do plano de Campinas, de 1934 a 1938, (fig 49) 49 propunha a sua expansão radial perimetral, perimetral, associado ao conceito das unidades de vizinhança vizinhança. 62 Em relação às áreas verdes, novamente se coloca o tema da criação de sistemas, em que no centro, de acordo com as verificações de Hénard, importa mais a quantidade de pequenos espaços que outros de grandes 316 C a p. 4 : Pa r q u e e C i da d e n o Pe ns a m e n t o U r ba ní s ti c o Pa ul is t a n o

M o d e l o s u r b a n í s t i c o s m o d e r n o s e p a r q u e s u r b a n o s : a s r e l a ç õ e s e n t r e u r b a n i s m o e p a i s a g i s m o e m S ã o P a u l o n a p r i m e i r a m e t a d e d o s é c u l o X X dimensões. Estes, por sua vez, são propostos ao redor do núcleo central, na área de expansão, a distâncias equitativas do centro de onde seriam acessíveis através de radiais e estariam enlaçados entre si por uma extensa perimetral, em que se nota a filiação ao sugerido pelo francês para Paris e adotado por Maia no Plano de Avenidas. Pouco ou nada conhecida até o momento é a viagem que faz Prestes Maia aos Estados Unidos em agosto e setembro de 1946, um ano antes de realizar o Plano Regional de Santos. 63 Ao visitar Washington, Nova York e Chicago, teve a possibilidade de verificar pessoalmente os trabalhos realizados pelos profissionais norte-americanos. Em pesquisa no acervo pessoal de Prestes Maia na Biblioteca Presidente Kennedy, em São Paulo, pudemos verificar em seu caderno de viagens alguns contatos institucionais de Maia nesta viagem, especialmente com o Cel Gilmore, do Institute of Inter-American Affairs, 64 situado na capital daquele país e fundado em 1942 como instrumento da política de boa vizinhança de Roosevelt; com o Franklin Institute e com o Rockefeller Center. Seu interesse pelas obras viárias se vislumbra ainda pelas visitas a General Motors, a Ford e a American Road Builders. Vale a pena mencionar ainda o encontro com Paul Lester Wiener e Josep Lluís Sert, no dia 13 de setembro, que haviam iniciado em 1943, com o projeto para a Cidade dos Motores no Estado do Rio de Janeiro, um amplo leque de trabalhos em países latino-americanos. (fig 50-51) Difícil é precisar o impacto destes contatos em sua obra, entretanto destacamos, para os objetivos desta tese, especialmente o encontro com Robert Moses. Este o levou pessoalmente pela cidade de Nova York para mostrar-lhe as obras realizadas, em que provavelmente se atentou para as grandes avenidas expressas, parkways, torres de edifícios, programas de remoção de favelas e parques realizados pelo colega, incluindo ainda uma visita a Jones Beach. Em virtude destes fatos e da análise da obra de Maia no pós-guerra, é certo pontuar que tanto o trabalho deste urbanista estadunidense, como as idéias de eighborhood-units, de criação de núcleos residenciais satélites e de plano regional passam a exercer maior influencia em seus trabalhos, como veremos brevemente a seguir. fig 50-51 - Folhas do caderno de viagem de Prestes Maia aos Estados Unidos. Verifica-se os contatos com o Institute of Inter- American Affairs, através de Cel Gilmore e a programação do jantar com Wiener e Sert. Fonte: Acervo Prestes Maia /Biblioteca Presidente Kennedy. C a p. 4 : P a r q u e e C i d a d e n o P e n s a m e n t o U r b a n í s t i c o P a u l i s t a n o 317