Pionefrose associada a nefrólitos em um cão - relato de caso

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Relato de Caso Pionefrose associada a nefrólitos em um cão - relato de caso Pyonephrosis associated to nephroliths in a dog - case report Leandro Fadel - Médico Veterinário autônomo, Mestre em Ciências pela Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia de São Paulo & Pós-graduando em Medicina Veterinária Intensiva pelo Centro de Treinamento em Anatomia e Cirurgia Veterinária (CETAC) - SP. Karen Bluwol - Médica Veterinária autônoma, Especializada em Endocrinologia de Pequenos Animais pela Associação Nacional de Clínicos Veterinários de Pequenos Animais SP. Danielly Ribeiro da Silva - Médica Veterinária, Pós-graduanda em Medicina Veterinária Intensiva pelo Centro de Treinamento em Anatomia e Cirurgia Veterinária (CETAC) - SP & Clínica Veterinária 24h Vila São Francisco. Rua Professor Celso Quirino dos Santos, 250, Apt Holanda 84, Vila São Francisco, São Paulo-SP. E-mail: daniellyribeiro@gmail.com Fadel L, Bluwol K, da Silva DR. e Animais de Estimação; 2014; 12(40); 176-180. Resumo A pionefrose pode ser definida como uma infecção renal hidronefrótica que surge a partir da pielonefrite e acúmulo de exsudato na pelve renal dilatada e hidronefrose seguida por infecção ascendente. Dentre as causas, pode-se citar a obstrução da pelve renal por nefrólitos. A rápida identificação e tratamento adequado são fundamentais para evitar a perda irreversível da função renal e evolução para sepse. O tratamento consiste em antibioticoterapia precoce e drenagem da pelve infectada. A nefrectomia é indicada em casos avançados. Neste relato optou-se pela nefrectomia como tratamento de escolha devido ao avançado grau de destruição do parênquima renal, sendo esta uma técnica preconizada pela literatura. Palavras-chave: pionefrose, nefrólitos, cão Abstract The pyonephrosis can be defined as a hydronephrotic kidney infection that arises from the accumulation of exudate pyelonephritis and dilated renal pelvis followed by ascending infection. Among the causes, we can mention the obstruction of the renal pelvis by nephroliths. Early identification and treatment are essential to prevent irreversible loss of kidney function and progression to sepsis.treatment consists of early antibiotic therapy and drainage of infected pelvis. Nephrectomy is indicated in advanced cases. In this report we opted for nephrectomy as the main treatment due to the advanced degree of destruction of the renal parenchyma, which is a technique recommended by the literature. Keywords: pyonephrosis, nephroliths, dog Introdução e Revisão de Literatura As doenças renais em cães são causadas por desordens de etiologia variada que induzem a alterações estruturais e funcionais dos rins, diagnosticadas por meio do quadro clínico, exames de imagem e histopatologia (1). Muitas destas doenças resultam do impedi- 176

mento do fluxo normal de urina do rim para a bexiga, sendo a obstrução uma das condições mais comuns em urologia. A obstrução pode ocorrer em qualquer ponto do sistema, desde a junção uretero-piélica até a uretra, e pode ser devido à compressão extrínseca ou secundária a processo intra-luminal. A obstrução pode ser aguda ou crônica quanto à sua duração, uni ou bilateral e parcial ou total na sua intensidade, geralmente causando dilatação do sistema à montante do ponto obstruído, facilitando a estase urinária e propiciando infecções (2). Paralelamente às alterações anatômicas, a obstrução do fluxo urinário pode determinar lesões do parênquima renal tal como ocorre nos casos de hidronefrose (3). A hidronefrose é caracterizada pela dilatação da pelve renal devido à obliteração do fluxo urinário, já a pionefrose é uma infecção renal hidronefrótica que surge a partir da pielonefrite e acúmulo de exsudato na pelve renal dilatada e hidronefrose seguida por infecção ascendente (3,4). Como causa tem-se obstrução da pelve renal por nefrólitos, ureterólitos, neoplasias, ligadura acidental do ureter durante ovariosalpingohisterectomia e ureter ectópico (5). O diagnóstico presuntivo de infecção do trato urinário pode ser feito baseado nos sinais clínicos juntamente com a urinálise, urocultura e o teste de sensibilidade é indicado para o diagnóstico definitivo assim como para a escolha antimicrobiana apropriada (6). O exame hematológico pode demonstrar leucocitose com neutrofilia regenerativa. A análise bioquímica sérica pode estar normal ou revelar perda da capacidade de concentração urinária, azotemia e acidose metabólica. No exame radiográfico encontram-se rins normais, renomegalia, aumento de volume radiopaco ou urólitos (5). A urografia excretora mostra hidronefrose em rins não-funcionantes ou com função bastante comprometida (7). A ultrassonografia é o melhor exame diagnóstico (7). A aparência ultrassonográfica do parênquima renal e o grau de dilatação da pelve variam com o tempo de obstrução e o fato de ser completa ou parcial. A obstrução completa crônica ocasiona atrofia do parênquima renal e em estágios avançados, o rim evolui para uma bolsa, delimitada por parede de espessura variável preenchida por conteúdo anecogênico na hidronefrose e hiperecogênico na pionefrose (4). Nesta última Silva et al (7) afirmam que podem ser observadas imagens ecogênicas na porção inferior do sistema coletor, níveis líquidos e ecos fracos através de um sistema coletor dilatado. O exame histopatológico é essencial para o diagnóstico definitivo das patologias renais. Conhecendo a morfologia e a fisiologia do órgão, pode-se somar tal conhecimento com as informações obtidas pelo ultrassom para definir o diagnóstico, que será confirmado por meio histopatológico (8). Na pionefrose o exame histopatológico evidencia destruição supurativa do parênquima renal e distensão da pelve e cálices renais. A obstrução do trato urinário impede a drenagem de secreção purulenta, que se acumula no tecido renal, levando à sua destruição (7). A rápida identificação e instituição de tratamento adequado são essenciais para evitar a perda irreversível da função renal e a evolução para sepse. O tratamento consiste em uma combinação de drenagem da pelve e rápida instituição de antibióticos de amplo espectro (7,9). A nefrostomia percutânea guiada por ultrassom é uma técnica de derivação do trato urinário superior indicada para pacientes com obstrução ureteral bilateral, ou unilateral e consequente uremia pós-renal. Tem como objetivo principal a descompressão renal e a preservação de sua função, podendo ser temporária ou definitiva (10). A técnica permite desviar a urina para o meio externo através da instalação de uma sonda no interior da pelve renal, por meio de laparotomia ou através de uma incisão abdominal, localizada próxima ao rim (11). A redução da pressão intra-renal produzida pela nefrostomia percutânea melhora o acesso dos antibióticos ao parênquima renal e a filtração glomerular (12). Os autores afirmam em seu trabalho com pacientes portadores de infecção importante do trato urinário superior que em todos os casos, apesar da instalação prévia de antibioticoterapia endovenosa, antes da execução das nefrostomias, as culturas de urina aspiradas através de punções renais, raramente foram estéreis. Admite-se que, talvez o material purulento, e sob pressão do sistema coletor antes da realização da nefrostomia, pode significativamente impedir o acesso de antibióticos sistêmicos ao parênquima renal. 177

Alguns autores sugerem nefrectomia como tratamento de escolha (7). A nefrectomia é indicada nos casos avançados, quando o rim se apresenta como uma saculação repleta de líquido ou frente às afecções renais e ureterais que desafiem o reparo cirúrgico (11). O objetivo deste trabalho é relatar o caso clínico de um animal que desenvolveu um quadro de pionefrose associado à nefrolitíase, abordando o diagnóstico e opções de tratamento disponíveis. Relato de Caso Um cão, fêmea, da raça Poodle, com 14 anos de idade, não castrada, foi atendido apresentando como principais queixas crises dispneicas acompanhadas de cianose e alteração na locomoção com claudicação de membros torácicos. O animal já havia sido submetido a exame radiográfico de tórax que revelou apenas espondiloses em coluna torácica, sem qualquer alteração cardíaca ou de parênquima pulmonar. Exames recentes revelaram leve leucocitose. Ao exame físico constatou-se presença de neoformação mamária, sopro cardíaco e dor à palpação de todos os seguimentos de coluna. Uma amostra de urina foi coletada e sua análise demonstrou odor fétido, presença de bactérias, e grande quantidade de fosfato-amônio-magnésio e urato amorfo. O paciente foi submetido ao exame ultrassonográfico abdominal, revelando perda de definição córtico-medular, dilatação de pelve e cálculos em rim direito. O animal foi internado para suporte terapêutico, sendo tratado com fluido Ringer Lactato, Amoxicilina 20mg/kg, Metronidazol 30mg/kg, Cloridrato de ranitidina 2mg/kg, Escopolamina 25mg/kg e cloridrato de tramadol 2mg/kg. Após 24 horas o animal foi liberado com manutenção das medicações por via oral. Após sete dias o paciente retornou apresentando piora do quadro. Exames hematológicos revelaram leucocitose com desvio à esquerda regenerativo, e os bioquímicos evidenciaram piora da função renal, com creatinina de 5,24 e ureia de 296. O animal foi internado novamente e o exame ultrassonográfico foi repetido, demonstrando a mesma alteração renal descrita anteriormente. A cultura de urina foi positiva para Proteus mirabilis. Nesta ocasião o animal foi encaminhado para o bloco cirúrgico para realização de nefrectomia de rim direito. Durante o procedimento, observou- -se que o rim estava aderido ao pedículo ovariano, veia cava e diafragma (figura 1 e 2). O animal teve complicações relacionadas à hipotensão, não sendo responsivo à terapia vasopressora e veio a óbito no trans-operatório. Houve consentimento do responsável para uso de imagens e autorização para relatar o caso. Macroscopicamente, o rim direito apresentava vários cálculos e coleção purulenta em seu interior (figura 3 e 4). O órgão removido foi encaminhado para análise histopatológica, que revelou nefrite tubuloinstersticial piogranulomatosa. RD PO Figura 1 - Visualização do rim direito (RD) aderido ao pedículo ovariano (PO). Figura 2 - Aderência entre rim direito, pedículo ovariano, veia cava e diafragma (seta). 178

Figura 3 - Coleção purulenta no interior do rim direito, observada após incisão da cápsula e parênquima renal. Figura 4 - Aspecto do rim direito após sua incisão. Observam-se nefrólitos (seta) em seu interior. Resultados e Discussão A obstrução do fluxo urinário leva à estase de urina, favorecendo a proliferação bacteriana e aumentando o risco de infecções renais através de bactérias por via hematógena ou ascendente e tem sido associada a maior ocorrência de pielonefrite (13,7). A litíase renal é uma importante causa de obstrução do trato urinário (7). Rins com infecção bacteriana e uropatia obstrutiva são susceptíveis a perda de parênquima renal progressiva e irreversível, e à ocorrência de pionefrose (13,4). Neste relato de caso a leucocitose com desvio à esquerda regenerativo pode ser justificado pela infecção renal. O grau de lesão renal depende da integridade e tempo de obstrução (3). Na obstrução unilateral, o grau de hidronefrose pode atingir tais proporções, que o parênquima renal transforma-se apenas numa película (2,3), assim como observado neste relato durante a laparotomia. A análise bioquímica sérica do paciente evidenciou comprometimento renal, corroborando os achados de Faria et al (5) os quais afirmam que frequentemente as afecções obstrutivas convergem para um quadro de uremia e azotemia. A urinálise demonstrou infecção do trato urinário. O exame ultrassonográfico na pionefrose evidencia material ecogênico em um sistema pielocalicial dilatado, algumas vezes com níveis de debris. Muitas vezes o achado é sugestivo apenas de hidronefrose ou nefrite (7,5). No paciente em estudo, as imagens ultrassonográficas do rim direito demonstraram perda de definição córtico-medular, dilatação de pelve associada a cálculos e aumento de ecogenicidade ao redor da cápsula, corroborando os achados da literatura de infecções renais associadas à nefrólitos. A presença de infecção e obstrução do trato urinário, prejuízo da função renal e urosepse têm indicação absoluta de intervenção urgente. A decisão de qual intervenção deve ser realizada é discutível (9). A pionefrose é uma emergência urológica que requer rápida intervenção. Na medicina veterinária a nefrostomia é indicada para alívio da pressão intra-renal, quando sua função é evidenciada na urografia excretora (11). Silva et al, (7) afirmam que, na medicina humana, o manejo do paciente deve ser feito com exploração cirúrgica, incisão, drenagem e nefrectomia. Os autores citam um trabalho realizado com 97 pacientes que apresentavam pionefrose e relataram uma maior ocorrência de complicações naqueles tratados com nefrostomia e drenagem percutânea, em comparação aos casos nos quais foi realizada nefrectomia. Portanto um tratamento mais conservador envolvendo a nefrectomia pode ser primordial para uma evolução favorável do paciente. Neste relato o procedimento foi essencial para o diagnóstico definitivo de pionefrose. Várias complicações têm sido relatadas em casos de pionefrose, e incluem choque séptico, peritonite por ruptura espontânea do rim afetado, abscesso esplênico e fístula renocólica (7). Portanto há a necessidade de instituição de tratamento rapidamente. 179

Conclusão Baseado na revisão de literatura, conclui-se que pacientes com comprometimento da função renal e infecção urinária associada a exames de imagens sugestivos de processo obstrutivo do trato urinário devem ser melhor investigados em busca de infecções do trato urinário superior, no intuito de ser obtido o diagnóstico definitivo precoce. Portanto, relatar a ocorrência deste caso torna-se importante para inclusão da pionefrose na lista de diagnósticos diferenciais de afecções com características semelhantes às observadas neste relato. Referências 10. Tobias-Machado M, Sacarpa MB, Machado LR, Silva MNR, Wroclawski ER. Nefrostomia percutânea guiada por ultrassom: opção minimamente invasiva de acesso ao rim. Arquivos Brasileiros de Ciências da Saúde 2011; 36(2):79-84. 11. Santarosa IAM, Godoy CLB, Pippi NL, Antunes PSP, Rappeti JCS, Krolikowski G et al. Nefrostomia percutânea ecoguiada em cães.ciência Rural 2007; 37(3):762-768. 12. Watson RA, Esposito M, Richter F, Irwin Jr RJ, Lang EK. Nefrostomia percutânea como auxiliar no manuseio de infecção importante do tracto urinário superior. Brazilian Journal of Urology 2000; 26(1):102-111. 13. Apparício M, Vicente WRR, Farias A, Covizzi GJ, Ribeiro APC, Gadelha CRF. Pyonephrosis following ovariohysterectomy in a bitch: case report. ARS Veterinária 2007; 23(1):19-22. Recebido para publicação em: 11/01/2013. Enviado para análise em: 18/01/2013. Aceito para publicação em: 07/07/2014. 1. Camargo B, Moraes JRE, Carvalho MB, Ferraro GC, Borges P. Alterações morfológicas e funcionais dos rins de cães com insuficiência renal crônica. Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinária e Zootecnia 2006; 58(5):781-787. 2. Tucci Jr S, Cologna AJ, Suaid HJ, Martins SLBP, Mazzetto SA, Martins ACP. Implante uretro-vesical em ratos. Acta Cirurgica Brasileira 2000; 15(2):43-46. 3. Rodrigues MF, Wilhelm G, Pereira IC, Mueller EM, Fernandes MAG, Guim TN et al. Hidronefrose Unilateral em um Canino Relato de Caso. In: 16º Congresso de Iniciação Cientifica; 2007nov. 27-29; Pelotas. Anais. Rio Grande do Sul: Congresso de Iniciação Científica; 2007. 4. Assis AR,Cantodori DT, Paiva FD, Rockenbach L.Aspectos ultrassonográficos comparativos de hidronefrose e pionefrose crônica em cadelas: relato de casos.in:simpósio Internacional de Diagnóstico por Imagem; 2011 dez; 5(4Suppl1):163-166. 5. Faria LG, Sampaio GR, Campos IO, Lacreta Jr ACC, Varaschin MS, Kawamoto YK et al. Pionefrose decorrente de obstrução ureteral crônica em cão relato de caso. In: 38º Congresso Brasileiro de Medicina Veterinária; 2011 abr 01-04;Florianópolis. Anais. Santa Catarina: 38º Congresso Brasileiro de Medicina Veterinária; 2011. 6. Varges R, Penna B, Lilenbaum W. Urinary tract infection caused by Coryne bacteriumurealyticum in a male dog. Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinária e Zootecnia 2009; 61(2):520-522. 7. Silva SL, Silva-Júnior GB, Gomes JS, Campos HH, Daher EF. Pionefrose em Paciente com Cálculo Ureteral Infectado sem Comprometimento do Estado Geral. Jornal Brasileiro de 2006; 28(4):213-217. 8. Carvalho APM, Salavessa CM, Silveira LS. Ultrassonografia e histopatologia renal em cães. Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinária e Zootecnia 2010; 62(4):1015-1017. 9. Talal AQ, Abdullatif AT. A 42 year old female with pyonephrosis and multiple subcapsular abscesses: saving a threatened kidney. Clinical and Experimental Medical Sciences 2012; 1(2):83-96. 180