FACULDADE DE DIREITO MILTON CAMPOS Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito LUCIANO COMPER DE SOUZA



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Transcrição:

FACULDADE DE DIREITO MILTON CAMPOS Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito LUCIANO COMPER DE SOUZA A RECUSA DE VENDA A CONSUMIDOR SOB JURISDIÇÃO BRASILEIRA NO COMÉRCIO ELETRÔNICO INTERNACIONAL Nova Lima 2012

LUCIANO COMPER DE SOUZA A RECUSA DE VENDA A CONSUMIDOR SOB JURISDIÇÃO BRASILEIRA NO COMÉRCIO ELETRÔNICO INTERNACIONAL Dissertação apresentada ao Programa de Pós- Graduação Stricto Sensu em Direito da Faculdade de Direito Milton Campos, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Direito Empresarial. Orientadora: Prof. Dra. Míriam de Abreu Machado e Campos Nova Lima 2012

LUCIANO COMPER DE SOUZA A RECUSA DE VENDA A CONSUMIDOR SOB JURISDIÇÃO BRASILEIRA NO COMÉRCIO ELETRÔNICO INTERNACIONAL Dissertação apresentada ao Programa de Pós- Graduação Stricto Sensu em Direito da Faculdade de Direito Milton Campos, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Direito Empresarial. Dra. Míriam de Abreu Machado e Campos (Orientadora) FDMC Dr. Carlos Alberto Rorhmann FDMC Nova Lima (MG), 31 de maio de 2012.

RESUMO Esta dissertação buscou, mediante o uso da pesquisa qualitativa, demonstrar as práticas comuns de recusa de venda a consumidor sob jurisdição brasileira no comércio eletrônico internacional. O objetivo foi investigar as possibilidades que fundamentam a recusa da venda e demonstrar que, mesmo havendo impedimento legislativo, será em muitos casos mais benéfico para o consumidor deparar-se com a mesma, visando proteger não só a si mas as gerações futuras e a coletividade. Foi realizado um estudo de casos práticos e bibliográfico, trabalhando com a legislação correlata para, dentro de uma coexistência das normas, obter o entendimento conclusivo. Os resultados demonstraram que impedimentos legais, logísticos, normativos e principalmente de normalização fazem com que o fornecedor deixe de vender a consumidor de outro país, pois aquele terá que, fatalmente, suportar um elevado custo de conformidade, notadamente para satisfazer a legislação local e cumprir com as obrigações advindas do pós-consumo. No Brasil, hoje, tramita um projeto de Lei no Congresso Nacional que poderá abranger o tema aqui trabalhado, de modo a preencher as lacunas existentes que mantêm o consumidor sem proteção efetivamente positivada. Palavras-chave: Direito do consumidor. Comércio eletrônico. Comércio internacional. Recusa de venda.

ABSTRACT This dissertation sought through the use of qualitative research, demonstrate the common practices of refusal to sell to consumers under Brazilian jurisdiction in international commerce. The aim was to investigate the possibilities underlying the refusal to sell and demonstrate that, even with legislative impediment, in many cases be more beneficial to the consumer faced with the same, to protect not only themselves but the community and future generations. We conducted a study of practical cases and literature, working with legislation related to within a coexistence rules, for more conclusive understanding. The results showed that legal obstacles, logistical, regulatory, standardization and especially make sure the vendor to sell the consumer in another country, for he will have, inevitably, bear a high cost of compliance, particularly to meet local regulations and meet with the obligations arising from post-consumer. In Brazil today is processing a bill in Congress that may cover the topic explored here, to fill the gaps, to fill the gaps that keep consumers without effective protection. Keywords: Consumer law. E-commerce. International trade. Refusal to sell.

SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO... 19 2 BREVE HISTÓRICO DO DESENVOLVIMENTO DO COMÉRCIO INTERNACIONAL...21 2.1 A ANTIGUIDADE... 21 2.2 O PERÍODO MEDIEVAL... 21 2.3 AS GRANDES NAVEGAÇÕES... 23 2.4 O COMÉRCIO FOMENTADO PELA BURGUESIA EUROPÉIA E PELO IDEÁRIO LIBERAL... 23 2.5 O LUCRO COMO FATOR PREPONDERANTE NO DESENVOLVIMENTO DO COMÉRCIO... 26 2.6 O LIVRE COMÉRCIO... 27 2.7 O LIVRE COMÉRCIO VERSUS AUTO SUFICIENCIA PROTECIONISTA... 29 3 O COMÉRCIO INTERNACIONAL... 31 3.1 EXPORTAÇÃO... 31 3.1.1 Exportação direta... 31 3.1.2 Exportação indireta... 31 3.2 IMPORTAÇÃO... 32 3.2.1 Importação por conta própria... 32 3.2.2 Importação por conta e ordem de terceiros... 33 3.2.3 Importação por encomenda... 36 3.3 OS CONTRATOS COMERCIAIS INTERNACIONAIS... 36 3.3.1 As modalidades contratuais... 37 3.3.1.1 Grupo E... 37 3.3.1.2 Grupo F... 38 3.3.1.3 Grupo C... 38 4 O COMÉRCIO ELETRÔNICO (E COMMERCE)... 40 4.1 BREVE HISTÓRICO DO COMÉRCIO ELETRÔNICO... 40 4.2 ASPECTOS TÉCNICOS BÁSICOS DO COMÉRCIO ELETRÔNICO... 43 4.2.1 A rede mundial de computadores (WWW)... 43 4.2.2 Os sítios comerciais (SITE)... 45 4.2.3 O sistema do nome de domínio (DNS)... 45 4.2.3.1 Marcas e nomes de domínios... 47 4.3 O PONTO DE COMÉRCIO ELETRÔNICO... 49 4.4 A RELAÇÃO CONTRATUAL NO COMÉRCIO ELETRÔNICO... 52 4.4.1 A formação contratual... 54 4.4.1.1 Dos requisitos... 56 4.4.1.2 O domicílio das partes de acordo com o direito brasileiro... 57 4.4.2 A formação contratual através do ponto de comércio eletrônico... 58 4.4.2.1 As teorias da agnição e da cognição... 59 4.4.2.2 A proposta no comércio eletrônico... 62 4.4.2.3 O lugar da formação do contrato no comércio eletrônico... 64 4.4.2.4 A formação do contrato de adesão no comércio eletrônico... 66 4.4.3 A liberdade contratual no comércio eletrônico... 68 4.4.3.1 O princípio da autonomia privada... 69

4.4.4 Modalidades de contratos no comércio eletrônico... 72 4.4.4.1 O contrato comercial (B2B)... 72 4.4.4.2 O contrato de consumo (B2C)... 73 4.4.5 A extinção do contrato eletrônico... 73 4.4.5.1 A extinção da relação obrigacional simples... 74 4.4.5.2 A extinção da relação obrigacional complexa... 75 5 O COMÉRCIO ELETRÔNICO INTERNACIONAL... 77 5.1 A GLOBALIZAÇÃO E O COMÉRCIO ELETRÔNICO... 77 5.2 INSTITUIÇÕES, REGULAMENTOS E TRATADOS INTERNACIONAIS... 80 5.2.1 Instituições internacionais e o comércio eletrônico internacional... 80 5.2.1.1 Organização das Nações Unidas (ONU)... 81 5.2.1.2 Organização Mundial do Comércio (OMC)... 83 5.2.1.3 Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI)... 85 5.2.1.4 Internet Corporation for Assigned Names and Numbers (ICANN)... 86 5.2.2 Regulamentos e tratados internacionais em matéria de comércio eletrônico... 87 5.2.2.1 Conferência de Doha de 2001... 87 5.2.2.2 Tratados sobre a internet da OMPI... 88 6 O CONSUMIDOR E O COMÉRCIO ELETRÔNICO... 91 6.1 A RELAÇÃO DE CONSUMO... 91 6.1.1 O conceito de consumidor... 92 6.1.1.1 Consumidor no direito comparado... 98 6.1.2 O conceito de fornecedor... 100 6.2 A PROTEÇÃO DO CONSUMIDOR NO COMERCIO ELETRÔNICO... 101 6.2.1 O princípio da autonomia privada e o contrato de consumo... 104 6.2.2 O foro competente para dirimir as questões emanadas da relação consumerista... 105 6.2.3 A linguagem e informações claras e suficientes ao consumidor para o negócio jurídico... 106 6.2.4 Informações precisas sobre o processo de compra e venda, encomenda e da entrega e o pós-venda... 106 6.2.5 Prazo máximo de entrega... 107 6.2.6 A proteção do consumidor nas relações internacionais de consumo... 108 6.2.7 A proteção do consumidor sob jurisdição brasileira no comércio eletrônico internacional... 109 7 A RECUSA DE VENDA A CONSUMIDOR NO COMÉRCIO ELETRÔNICO INTERNACIONAL... 112 7.1 CASOS PRÁTICOS... 112 7.1.1 Caso APPLE... 112 7.1.2 Caso AMAZON.COM... 114 7.2 OS FUNDAMENTOS DA RECUSA OU IMPEDIMENTO... 118 7.2.1 Barreiras públicas Brasileiras legais, normativas, tarifarias e não tarifárias... 118 7.2.1.1 Do estatuto da criança e do adolescente... 121 7.2.1.2 Da vigilância sanitária... 121 7.2.1.3 Do controle de metrologia, normalização e qualidade industrial... 123 7.2.1.4 O controle dos serviços e produtos de telecomunicações... 126

7.2.1.5 Proteção do meio ambiente e dos recursos naturais renováveis... 128 7.2.1.6 Agricultura, pecuária e abastecimento... 129 7.2.1.7 Substâncias químicas... 130 7.2.1.8 Derivados de petróleo... 131 7.2.1.9 Segurança nacional... 131 7.2.1.10 Produção cinematográfica... 132 7.2.1.11 Produtos minerais, aguas e energia... 133 7.2.1.12 Substâncias nucleares... 134 7.2.1.13 Cotas tarifárias e não tarifárias, similar nacional e material usado... 134 7.2.2 Impedimentos e restrições impostas pelo transportador... 136 7.2.3 Restrições advindas do direito da propriedade intelectual e da distribuição exclusiva... 137 7.2.3.1 O comércio internacional e a propriedade intelectual... 138 7.2.3.1.1 A singularização dos produtos e a marca... 138 7.2.3.1.2 O acordo TRIP s... 139 7.2.3.1.3 A distribuição exclusiva e a importação paralela... 140 7.2.3.1.4 O conceito... 140 7.2.3.1.5 Princípio da exaustão... 142 7.2.3.1.6 Princípio da Territorialidade... 144 7.2.3.1.7 A importação paralela e o comércio eletrônico... 144 7.2.4 A livre concorrência, a propriedade intelectual e o direito do consumidor... 146 7.3 O DEVER OU NÃO DE VENDER A CONSUMIDOR SOB JURISDIÇÃO BRASILEIRA... 150 7.3.1 Da Possibilidade de recusar a venda... 152 7.3.1.1 Recusa por existência de barreiras legais ou normativas... 153 7.3.1.2 Casos de impedimentos e restrições impostas pelo transportador... 154 7.3.1.3 Restrição vertical... 154 7.3.1.4 A recusa da venda por ausência de assessoria e assistência técnica no local de entrega: deveres e efeitos advindos da relação obrigacional complexa... 155 8 CONCLUSÃO... 158 REFERENCIAS... 160

A meu amado filho, João Pedro. A minha esposa, pelo incentivo e carinho. A meus pais, pela oportunidade.

AGRADECIMENTOS A todos que contribuíram para a realização deste sonho, dedico aqui minha gratidão, e, em especial: À Professora Dra. Míriam, pela orientação e aprendizado necessário ao desenvolvimento do trabalho e, principalmente, pessoal. Aos meus colegas de classe, principalmente à turma do ano de 2004-2008 e ao colega de viagens, Eduardo Bitti. À Miralda e Rosely, pelo incentivo, apoio e belo trabalho desempenhado nesta Instituição de Ensino. Aos atendentes desta Faculdade. A todos que, de alguma forma, contribuíram para este trabalho.

19 1 INTRODUÇÃO Stentor apud Globerman, Roehl e Standif 1 comparou a internet a acontecimentos como o advento da ferrovia e a introdução e crescimento do sistema de telefonia, emergindo como uma força importante na reformulação da natureza do comércio em geral. Neste contexto, pode-se afirmar que o comércio eletrônico diminui ou extingue as fronteiras entre as pessoas e organizações, de modo a permitir que um grande número de potenciais negociantes conduza a uma maior integração entre mercados, os quais, a princípio, demandariam maior custo em razão da distância física (Globerman, Roehl e Standif, 1995). Wei, após coletar dados principalmente do Computer Industry Almanac Inc., Global Reach, e U.S. Census Bureau, analisou as taxas de penetração global da Internet e seu impacto sobre o comércio eletrônico, fornecendo informações sobre os usuários da Internet, comportamentos e tendências do e-commerce. Os resultados foram os seguintes: a) expressivo uso da internet nos países analisados, com crescimento exponencial desde o ano de 1999 até a data de seus estudos; b) a pulverização da internet na população, atingindo percentuais cada vez maiores, ultrapassando 70% em países como Japão e Coréia do Sul já no ano de 2003; e, um crescimento de usuários do comércio eletrônico, perfazendo vendas da ordem de 5,1 mil dólares / usuário no final de 2003, muito acima do montante de U$ 1,6 mil / usuário apontado no final do ano de 1999 2. A internet aproximou demasiadamente o contato entre as pessoas, assim, o negócio jurídico da compra e venda realizado eletronicamente, pode efetivar-se dentro do próprio país como entre contraentes de países diversos. A importação e exportação de mercadorias são, deveras, fomentadas pela facilidade hodierna gerada pela rede mundial de computadores. A venda de livros, perfumes, artigos de vestuário, pedras preciosas e semipreciosas, eletroeletrônicos, calçados, dentre outros objetos de menor porte, 1 Globerman, S., Roehl, T. W., & Standif, S. (4th Qtr. de 2001). Globalization and Electronic Commerce: Inferences from Retail Brokering. Journal of International Business Studies, Vol. 32, pp. 749-768. 2 Wei, June. (2005). Internet Penetration Analysis: The Impact on Global E-Commerce. Journal of Global Competitiveness, Vol. 13 Issue 1/2, pp. p9-24, 16p.

20 tornou-se facilitada entre os países, desenvolvendo, sobretudo pela Internet, um intenso e crescente comércio internacional de mercadorias. Os sítios eletrônicos, comumente denominados sites ou websites são pontos acessíveis na rede mundial de computadores identificados por nomes (DNS), que os concebem um título, através do qual o identifica e o acessa com objetivo de colher informações ou transacionar, por onde pessoas compram ou vendem serviços e produtos. Nessa esteira, as pessoas relacionam-se juridicamente e virtualmente ou eletronicamente, tendo sido cunhada a expressão B2B ou business-to-business, traduzida livremente para negócios, adaptada ao português brasileiro para contrato comercial, ou seja, contrato entre pessoas que exercem atividades econômicas, desde que não se tenha na parte compradora a figura do consumidor final; e, a expressão B2C ou business-to-consumer, traduzida livremente para contrato de consumo. Também é uma expressão de linguística muito utilizada no comércio eletrônico, em que denuncia a relação jurídica de um fornecedor e um consumidor final, seguindo, portanto, regras e princípios do direito civil e consumista. Com o ingresso da figura do consumidor neste cenário atiçou-se muitas questões jurídicas a serem dirimidas, dentre as quais a legalidade da recusa de venda ou o dever do distribuidor no comércio eletrônico de não vender ao consumidor por impedimento contratual e legal (direito da propriedade intelectual, dentre os quais a distribuição exclusiva) ou geográfico (limites geográficos, impossibilidade de prover garantias ordinárias). A recusa de venda a consumidor é tema que toca o direito constitucional e infraconstitucional, tratando-se do direito à livre concorrência, direito da propriedade intelectual, direito do consumidor. Destarte, quando a recusa de venda a consumidor se der através do comércio eletrônico internacional, envolver-se-á regras do direito comercial, direito alfandegário, principalmente do direito internacional. Oportunamente, insta entrelaçar os seguintes pontos a serem debatidos e estudados para resolver a legalidade na recusa da venda ao consumidor no comércio eletrônico internacional, a saber: a) direito do consumidor em consumir (adquirir) produto à venda ao público; b) o direito da propriedade intelectual, principalmente o direito à distribuição exclusiva e as limitações geográficas; c) ponto de comércio eletrônico e sua localidade geográfica; d) contratos entre ausentes ou presentes; e, d) o direito à livre concorrência.

21 2 BREVE HISTÓRICO DO DESENVOLVIMENTO DO COMÉRCIO INTERNACIONAL As transações de bens iniciaram com as trocas ou escambos entre pessoas e povos que, com uma parte excedente por conta da abundância adquiria uma outra parte faltante cujo destino era suprir as necessidades básicas da subsistência ou necessidade momentânea. Com influência direta da escrita e o aparecimento das expressões numéricas, o intercâmbio de mercadorias foi moldando-se ao conceito de comércio, pois passou a ter observância dos predicados espaciais e quantitativos, referentes respectivamente ao tamanho e a quantidade. 2.1 A ANTIGUIDADE As mercadorias eram limitadas em variedades, visto que, conforme dados históricos, o escambo iniciou nos vales da Mesopotâmia e do Egito com tecidos, tintas e artigos de metal (SOUZA, 2003, p. 19). Essas mercadorias em negociação eram direcionadas às necessidades básicas, como vestimentas e utensílios. Uma grande transição foi a inserção da moeda pelos Gregos no século VII A.C., cuja reação imediata gerou uma revolução nas práticas comerciais. A moeda simplificou a circulação de bens e, assim, passou a valorar as mercadorias de acordo com suas especificidades. Neste período, o comércio exterior se resume no intercâmbio de mercadorias entre povos de diferentes raças e locais aproximados, dada à homogeneidade da época. 2.2 O PERÍODO MEDIEVAL A partir da concretização e aceitação do instituto da propriedade privada e, principalmente, com o surgimento da moeda por volta do século VII a.c. na Ásia Menor, cita-se a Grécia, onde as pessoas passaram a ter facilidade no intercâmbio de mercadorias, desenvolvendo-o com maior rapidez.

22 O uso da moeda nas relações comerciais foi consensualmente inserido na prática mercantil, entre mercadores, dada a naturalidade profissional desses e a origem daquelas serem diversificadas. A corriqueira utilização de moedas oriundas de vários povos fez surgir as operações de câmbio manual, ou seja, um cambista (corretor) localizado nesses centros comerciais realizava a troca entre as diversas espécies de moedas. Mesmo facilitando a atividade comercial, havia necessidade de agilizar esse intercâmbio de mercadorias, pois as transações passaram a ser realizadas em maiores distâncias sem, contudo, distanciar-se das feiras na região litorânea da Itália. Para suprir a necessidade de se obter uma circulação mais rápida das riquezas entre as cidades-estados europeias surgiu, no direito romano, o crédito, palavra que etimologicamente vem do latim creditum, credere, na língua portuguesa traz a acepção de confiar, ter fé; e, cuja tradução jurídica ampliou para direito do credor de receber do devedor prestação oriunda de uma obrigação com voto de confiança entre os contraentes. No mesmo período histórico, e com a evolução do crédito, data-se o surgimento do banqueiro. A atividade do banqueiro era receber (a título de depósito) a moeda na cidade do depositante e, em outra cidade-estado, o mesmo obrigava-se a entregar à pessoa do depositante a soma depositada, mas em moeda local. Fato altamente relevante para o comércio internacional de mercadorias, visto que, não só naquela época, mas nos dias atuais, longe de ser a acepção em Aristóteles (no aristotelismo, que se encontra em ato, adquiriu a forma final, plena, acabada; e que manifestou todas as suas potencialidades), possui uma similaridade com as modalidades do pagamento das mercadorias importadas, dentre as quais, cita-se a carta de crédito ou crédito documentário. Entende-se por Carta de Crédito ou Crédito Documentário a obrigação assumida por um Banco (Emissor), que agindo a pedido e em conformidade com instruções do importador, através da Fatura Pro Forma e do Contrato de Abertura de Crédito Documentário se compromete a efetuar o pagamento a um terceiro, exportador ou Banco Negociador (Reclamante), contra a entrega de documentos estipulados no crédito que demonstrem o cumprimento dos termos e condições, conforme os dizeres da Publicação nº 500 Artigo 2º, Item III da Câmara de Comércio Internacional. (VIEIRA, 2004, p. 159).

23 A moeda, o crédito e o surgimento da figura do banqueiro fizeram com que o comércio interno e externo daquela época progredisse tanto em quantidade de produtos negociados quanto em mercados conquistados. Data, também, deste período, as importações de matérias primas pelos artesãos italianos, cujo traspasse seria a exportação de produtos manufaturados ao Oriente (SOUZA, 2003, p. 22). Importar produtos primários e especiarias para manufaturá-las e exportá-las é forma de obter divisas com vendas de maior valor agregado, obtendo riquezas indiretas. 2.3 AS GRANDES NAVEGAÇOES Os Reinos de Portugal e Espanha foram precursores e deveras beneficiados pelo comércio marítimo nos séculos XV e XVI, caracterizando um expansionismo comercial e o enriquecimento destes. As grandes navegações realizadas naqueles períodos transformaram os mares deste planeta em um campo de batalha comercial, notadamente entre Inglaterra e Holanda que, no século XVI juntaram-se aos reinos de Portugal e Espanha na busca dos metais preciosos e especiarias das Índias e das Américas, bem como na busca de mercados para suas mercadorias manufaturadas (tecidos). Essas navegações fizeram surgir e consolidar o comércio internacional entre os continentes, sem dizer no desenvolvimento da logística dos portos e mares. Com a grande empreitada realizada nas Américas, Portugal e Espanha acumularam uma enorme quantidade de metais preciosos, principalmente o ouro. Entretanto, a acumulação de capital deu-se de forma diferenciada, pois, transferiu-se a riqueza da nobreza para as mãos da burguesia (SOARES, 2004, p. 23). 2.4 O COMÉRCIO FOMENTADO PELA BURGUESIA EUROPÉIA E PELO IDEÁRIO LIBERAL Na Europa, concomitantemente ao surgimento do comércio, surgiu a classe burguesa que, na prática daquelas atividades, passou a escrever um novo momento na historia mundial.

24 Ao conquistar diversos direitos, mesmo durante a governança absolutista e déspota daquela época, a classe burguesa, para manter seus ideais, pregava, dentre outros, a defesa dos direitos individuais, da propriedade privada e do Estado liberal de direito. David Hume, filósofo escocês que viveu entre 1711 e 1776, com propriedade sapiencial, opinou que, num governo absoluto os títulos e a posição na classe social traziam mais honrarias que a indústria e a riqueza. E, por isso, grandes mercadores prefeririam largar seus comércios para obter um emprego privilegiado junto à nobreza ou ao clero. Portanto, em minha opinião, o comércio poderá decair sob os governos absolutos, mas não devido a ser menos seguro, e sim devido a ser menos honroso. A monarquia não pode subsistir sem uma subordinação de classes. O nascimento, os títulos e a posição devem ser honrados acima da indústria e da riqueza. E, enquanto esta for a opinião dominante, todos os mercadores importantes estarão sujeitos à tentação de abandonar seu comércio, a fim de adquirir qualquer um desses empregos que trazem privilégios e honrarias. (HUME, 2004, p. 245). Hume (2004) também expôs que, comparando a atualidade à sua época, o comércio passou a ser observado de perto pelos governantes, podendo ser considerado uma questão de Estado, tal sua opulência. Até o século passado, o comércio não era considerado uma questão de Estado, e é raro encontrar qualquer autor político antigo que lhe tenha feito referência. Até os autores italianos observaram o mais profundo silêncio com relação a esse aspecto, apesar de que, atualmente o comércio atrai a maior atenção tanto dos ministros de Estado como dos pensadores. Parece ter sido a grandeza, a opulência e as proezas militares das duas potências marítimas que despertaram a humanidade para a importância de que um amplo comércio pode reverter-se. (HUME, 2004, p. 242). Percebe-se que a política e o comércio liberal passam a coexistir pacificamente por conta da conveniência e por gerar o desenvolvimento daquele. No exercício da atividade comercial há o contato direto entre a burguesia e o proletariado e, desses, surgiriam políticos e pensadores que, não raramente, colocariam o Estado vis-à-vis ao comércio ou vice-versa. Após o século XVII, notadamente no século XVIII, iniciou-se o período do chamado direito moderno, no qual despontaram nomes como Hobbes, Locke, Kant e Rousseau, cujos pensamentos e obras ratificavam alguns ideais burgueses, fazendo

25 surgir a noção de sujeito de direito, ou seja, o homem passou a ser encarado isolado da comunidade, nascendo o individualismo jurídico. (SILVA FILHO, 2000). O Estado é visto por Hobbes como garantidor da segurança, e por Locke como garantidor das liberdades. O período é de transição entre o Estado Monárquico e o Liberal. (SILVA FILHO, 2000, 1 CD ROM). Locke e Rousseau são precursores da teoria mecânica, pela qual afirmavam que a base da sociedade será o consentimento e não o princípio da autoridade, pois a vontade livre e autônoma do indivíduo constitui um valor que a sociedade deve legitimar (CARVALHO, 1997. p. 31), Interrompendo a hegemonia da realeza e da aristocracia, acusada de ser este o maior obstáculo do desenvolvimento e expansão do Estado, a burguesia avançava com seu ideário liberal contrapondo-se ao absolutismo estatal pregado por aqueles. O liberalismo, conquanto fazendo da liberdade abstrata sua pedra angular, e trazendo o germe da secularização da educação e a laicização do Estado, representava substancial progresso para a época (BOMFIM, 2000. 1 CD ROM). Os interesses e ideais burgueses foram fortemente influenciados pelas revoluções norte-americana (1776) e francesa (1791). Com o surgimento do Código Napoleônico em 1804, a França deparou-se com a nova visão subjetivista e individualista, que assegurava as recentes conquistas da burguesia pela derrubada do sistema feudal (SILVA FILHO, 2000, 1 CD ROM). Os direitos políticos e individuais, bem como a igualdade destes entre as pessoas, a autonomia na contratação, dentre outros, foram precursores e incentivadores do livre comércio, pois elidia a interferência arbitrária do Estado e a mão contrária dos antigos opressores donos do poder. O poder público estava limitado à administração do Estado nos limites impostos pelas Constituições, e à fiscalização por este, do cumprimento dos direitos positivados, o chamado Direito Público. O liberalismo constitucional, que atingiu seu auge no século XIX, erigiu em dogma e autonomia da vontade, o princípio de que todos são iguais em direitos, consagrou a livre contratação, a liberdade individual, institucionalizou a livre iniciativa, a economia de mercado, minimizando ou procurando abolir a ingerência do Estado nas atividades particulares, nas relações interindividuais. (BOMFIM, 2000, 1 CD ROM).

26 A atividade mercantil financiaria a estrutura estatal por meio do pagamento de tributos, entretanto os mercadores passaram a beneficiar-se de uma certa liberdade contratual. Na Inglaterra, no mesmo período, a neo-pirâmide social era formada pelas classes burguesa, proletária e os remanescentes da realeza, sendo que, estes últimos, não mais gozavam dos poderes outrora existentes. As indústrias inglesas, comandadas pela classe burguesa, estavam em franco crescimento produtivo, empurradas pelos trabalhadores (proletários), pelos investimentos e pela demanda interna deste e de outros países. Tendo em vista que a Inglaterra não produzia a grande maioria das matérias-primas necessitadas pela indústria, esses produtos tinham que ser importados dos países produtores. Como dito diversas vezes, a interdependência dos países demonstra a existência de um comércio externo um tanto necessário, mesmo nesta época histórica. As indústrias inglesas necessitavam das matérias-primas e dos metais preciosos (ouro) de outros Estados, entretanto, os metais preciosos só viriam com a venda de mercadorias que, para serem produzidas, necessitavam dos produtos primários. Não podia ser diferente com a França, Itália e demais Estados Europeus. Pode-se dizer que o enriquecimento industrial desses Estados Europeus deuse através do caminho indireto para a riqueza (ROBERTS, 1996, p. 130), cuja acepção casual é a aquisição de produtos de outros Estados para suprir a demanda interna e para exportá-los na forma manufaturada. O comércio internacional era inerente à atividade industrial daquela época, sendo as importações de mercadorias o combustível das fábricas europeias. 2.5 O LUCRO COMO FATOR PREPONDERANTE NO DESENVOLVIMENTO DO COMÉRCIO O lucro, abominado pela Igreja Católica, foi praticado dia a dia pela burguesia que viu no mesmo uma forma de ascensão na pirâmide social a atingir o poder. Por sua contribuição para o desenvolvimento do comércio, o lucro, anos mais tarde, foi objeto de estudo de diversos pensadores, dentre eles, Karl Heinrich Marx (1865).

27 A mais-valia, ou seja, aquela parte do valor total da mercadoria em que se incorpora o subtrabalho, ou trabalho não remunerado, eu chamo lucro. (MARX, 1982, p. 169). Sobre a venda das mercadorias, Marx doutrinou que, o lucro, é inato à mesma, pois é obtido pelo seu real valor e, não vendendo por um valor superior à sua avaliação. Logo, quando o capitalista vende a mercadoria pelo seu valor, isto é, como cristalização da quantidade total de trabalho nela investido, o capitalista deve forçosamente vendê-la com lucro. Vende não só com o que lhe custou um equivalente, como também o que não lhe custou nada, embora haja custado o trabalho do seu operário. O custo da mercadoria para o capitalista e o custo real da mercadoria são coisas inteiramente distintas. Repito, pois, que lucros normais e médios se obtêm vendendo as mercadorias não acima do que valem, e sim pelo seu verdadeiro valor. (MARX, 1982, p. 167). O lucro passa a ser o grande estímulo da atividade mercantil, pois, na obtenção do mesmo, enriquecia-se e se aplicava ainda mais no negócio que se empreendera. Os ganhos materiais, advindo da atividade lucrativa exercida, incentivavam a produção e a busca de novas regiões consumidoras. Produzia-se cada vez mais nas indústrias europeias daquela época, lembrando que, para se produzir, necessitava-se das matérias-primas adquiridas ou no próprio país ou importadas de outros locais. Percebe-se que o lucro das atividades comerciais só surge com o trânsito dessas, entre vendedor e comprador e, este trânsito não acontece apenas nacionalmente, mas também internacionalmente, inclusive se disser que as matérias-primas empregadas na manufatura de tais produtos sejam importadas. Então, o lucro está contido tanto na atividade mercantil nacional como na internacional, pois faz parte da mercadoria ou produto transacionado, sem o qual não haveria tanta vantagem em produzir pela iniciativa privada. 2.6 O LIVRE COMÉRCIO Entre os séculos XV e XVI alguns Estados possuíam suas fábricas rudimentares direcionadas a certas mercadorias e, também, ao cultivo de alguns produtos.

28 Naquele período histórico não havia explicitamente barreiras comerciais com propósito de proteção da balança comercial, pois havia uma singularidade nas produções, ou seja, o que uns produziam, outros compradores nem sequer pensavam em produzir. A partir do século XVII até os dias atuais, todos os países passaram a possuir capacidade e tecnologia à disposição para produzirem o que quiserem, no entanto, deparou-se com as limitações físicas de seus territórios e limitações na qualidade e valor final dos mesmos. Esses fatores limitativos fizeram com que os países passassem a proteger suas economias com as tais barreiras comerciais, concedendo subsídios aos seus produtos ou instituindo políticas de preços para os produtos importados, preservando o mercado interno. Entretanto, as diferenças nas políticas econômicas desencadearam desavenças entre os países. Em tempo oportuno, estudiosos favoráveis ao livre comércio passaram a demonstrar os diversos caminhos para a harmonia do comércio internacional. Dentre esses propósitos, está a especialização de cada Estado. A essência do comércio é a especialização (ROBERTS, 1996. p. 108), e por especialização tem-se a capacidade produtora desenvolvida e/ou sua possibilidade de produção por conta de agentes externos ou internos. As regiões produtoras e/ou manufatoras não possuem condições técnicas de se especializarem em todos os produtos, visto que, evitando contradições, o número de áreas e de pessoas não seriam suficientes produtoras, ocasionando um natural aumento do preço para a venda por conta da diminuição da oferta e aumento da procura. Com isso, se tornou prudente direcionar a briga para o campo da lealdade e não da liberdade de se comerciar, gerando a discussão: comércio leal versus livre comércio (ROBERTS, 1996, p. 107). Num sistema comercial perfeitamente livre, cada país, por princípio, dedica seu capital e seu trabalho à atividade que lhe seja mais benéfica. Essa busca de vantagem individual está admiravelmente associada ao bem universal do conjunto dos países. Estimulando a dedicação ao trabalho, recompensando a engenhosidade e propiciando o uso mais eficaz das potencialidades proporcionadas pela natureza, distribui-se o trabalho de modo mais eficiente e mais econômico, enquanto, pelo aumento geral do volume de produtos difunde-se o beneficio de modo geral e une-se a