Origem: PRT 1ª REGIÃO CABO FRIO/RJ Órgão Oficiante: DR. ALEXANDRE SALGADO DOURADO MARTINS Interessado 1: MAURÍCIO PESSANHA DA SILVA Interessado 2: SERVIÇOS MARÍTIMOS CONTINENTAL S.A; PETRÓLEO BRASILEIRO S/A Assunto: MEIO AMBIENTE DO TRABALHO 01.01.01. 01.01.05 RECURSO: ARQUIVAMENTO DE INQUÉRITO CIVIL. CONTROVÉRSIA A RESPEITO DE ENQUADRAMENTO DE ACIDENTE COMO AUXÍLIO- DOENÇA PREVIDENCIÁRIO COMUM OU ACIDENTÁRIO. MATÉRIA JUDICIALIZADA. INTERESSE INDIVIDUAL ESPECÍFICO. A ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO DEVE SER DIRECIONADA ÀS QUESTÕES DE ORDEM COLETIVA E INDIVIDUAIS INDISPONÍVEIS. SENDO O CASO DE INTERESSE INDIVIDUAL PERSONALÍSSIMO, NÃO HÁ IMPERATIVO PARA A ATUAÇÃO DO ÓRGÃO MINISTERIAL. ADEMAIS, A MATÉRIA DISCUTIDA RESTA JUDICIALIZADA. ARQUIVAMENTO QUE SE HOMOLOGA. I RELATÓRIO Trata-se de recurso administrativo interposto por Maurício Pessanha da Silva, nos autos do IC nº 000115.2010.01.005/9-502, contra a decisão de arquivamento de fls. 718-735. O inquérito civil público a que se discute foi instaurado como consequência de denúncia apresentada pela própria vítima, em 25.12.2009, informando que, na qualidade de mergulhador e empregado da SERVIÇOS MARÍTIMOS 1
CONTINENTAL, sofreu acidente na plataforma P-26, causado por preposto da PETROBRÁS, e que pelo fato ter sido submetido a exames de forma irregular e não ter sido emitida a CAT, continuou trabalhando, o que acarretou a sua incapacidade total para o trabalho. Após a apuração das possíveis irregularidades, o Procurador oficiante determinou o arquivamento do feito, com base no artigo 10, caput, da Resolução nº 69/07 e Precedente 12 do CSMPT. Recebido o recurso administrativo, manteve-se a decisão de arquivamento pelos seus próprios fundamentos, conforme despacho de fls. 882-897. Em seguida, foram apresentadas contrarrazões pelas denunciadas (fls. 872-880). conforme termo de fls. 900. Os autos foram sorteados e distribuídos a este Relator, É o relatório. II ADMISSIBILIDADE Conheço do presente recurso, haja vista a observância do prazo previsto no artigo 10-A da Resolução CSMPT nº 69/2007. III VOTO O presente inquérito civil baseia-se em denúncia encaminhada por e-mail à Procuradoria Regional do Trabalho da 1ª Região, a qual relata: 2
Trata-se de Denúncia encaminhada pelo e-mail da Procuradoria relatando que um mergulhador sofreu acidente causado pela Petrobrás, empresa contratante dos serviços da Serviços Marítimos Continental, e que após o acidente não foram feitos exames de foram feitos exames de forma devida, o que culminou com a não detecção a tempo de problemas decorrentes do acidente e que levaram a incapacidade total do mergulhador. fls. 17 Após a análise de diversos documentos, o procedimento foi arquivado. Inconformado, o denunciante interpôs recurso administrativo; segue-se apreciação de suas razões. O objeto deste procedimento é investigar alegado acidente de trabalho ocorrido com o mergulhador MAURÍCIO PESSANHA DA SILVA, empegado da SERVIÇOS MARÍTIMOS LTDA, em 08.02.07, na plataforma P-26 da PETROBRÁS. Consta nos autos que após acidente, o denunciante obteve auxílio-doença acidentário, sob o número 529.659.443-2, em 22.03.2008, com base em nexo técnico epidemiológico NTEP e não com base em acidente típico. O recorrente veio a ser operado cirurgicamente em 18.05.2008 e, após a cessação do benefício previdenciário n. 529.659.443-2, em 30.09.2009, o denunciante foi considerado inapto para o trabalho pelo médico da empresa inquirida (SERVIÇOS MARÍTIMOS CONTINENTAL S/A). Por sua vez, após a perícia realizada pela Previdência Social, ao deferir o pedido de auxílio-doença, foi concedido a espécie comum (B31) e não a acidentária (B91). 3
Logo, perante o INSS o afastamento com incapacidade para o trabalho do denunciante não decorreu de acidente de trabalho típico. Insatisfeito, o denunciante ajuizou ação em face do INSS na 2ª Vara Cível de Campos dos Goytacazes, sob o n. 0034913-49.2009.8.19.0014, objetivando a concessão do benefício da aposentadoria por invalidez acidentária. O INSS, por sua vez, reformou o seu entendimento e passou a reconhecer que o acidente ocorrido em 08.02.2007 enquadrou-se como de trabalho, permitindo-se, por consequência, a modificação do benefício pelo INSS para acidentário (B91). A empresa denunciada (SERVIÇOS MARÍTIMOS CONTINENTAL S/A) interpôs recurso administrativo no INSS contra tal decisão, ainda pendente de solução. Pois bem. Percebe-se ser deveras controversa e bastante específica a questão do enquadramento do acidente do denunciante, pois somente em 11.09.2013 a autarquia previdenciária caracterizou o auxílio-doença como acidentário (B91). Mesmo porque, no momento do incidente, o denunciante não ficou imobilizado e não apresentou lesões aparentes logo após a abertura da caixa de mar em 08.02.2007, sendo este o motivo para a caracterização do fato como incidente sem lesão e o seu não enquadramento como acidente do trabalho. Além do mais, o vídeo citado pelo denunciante no site www.youtube.com, em anexo (arquivo momento do acidente ), demonstra este diante de caixa de mar, onde são identificadas algumas bolhas, não sendo possível 4
precisar a origem (se decorrentes da respiração do mergulhador ou proveniente da caixa de mar). Por conseguinte, mesmo que na abertura da caixa de mar no dia 08.02.2007 tenha ocorrido pressão diferenciada, esta não ocasionou morte ou lesão aparente ao denunciante logo após o incidente. Também não restou demonstrado que esta pressão diferenciada tenha sido a causa para o agravo do denunciante a partir de 03.2008, quando do início de seu afastamento previdenciário. Por seu turno, o laudo do auditor-fiscal do trabalho concluiu: 1. Incapacidade em grau máximo em caráter não permanente devido, principalmente, à disfunção miccional, sexual, e fecal que segundo o trabalhador foi decorrente do acidente, contudo os laudos médicos apontam ter sido a disfunção miccional, sexual e fecal pós cirúrgica. Cabe destacar que independe da disfunção ser anterior ou posterior à cirurgia, ela decorre de lesão prévia associada à discopatia compatível com o trauma sofrido pelo Sr. Maurício na região tóraco-lombar no momento do acidente... Desse modo, o laudo da auditoria-fiscal do trabalho não foi conclusivo quanto ao nexo causal entre o evento (abertura da caixa de mar) e a lesão de disfunção miccional, sexual e fecal do denunciante. Incontroverso é apenas o fato de que ocorreu o incidente com o denunciante, qual seja, o operador de lastro indevidamente abriu a caixa de mar, durante o seu mergulho, causando-lhe risco de vida e de saúde. 5
Diante de tal contexto fático, percebe-se estar a Justiça do Trabalho mais apta para decidir a questão com base nas provas apresentadas e perícias médicas. Até porque o próprio denunciante já ingressou com reclamação trabalhista (RT n. 0001212-81.2011.5.01.0078), estando a caracterização do acidente como de trabalho judicializada. Ademais, a matéria apresentada possui caráter individual específico, sem repercussão social apta a ensejar a atuação especializada do Ministério Público do Trabalho. Desse modo, liminarmente, já seria hipótese de aplicar-se o entendimento recorrente desta CCR, no sentido de inexistir justificativa para a atuação do parquet quando a matéria restar judicializada, já que o órgão ministerial não detém atribuição revisional de decisões judiciais, salvo em hipóteses de ação rescisória, após o trânsito em julgado. O Ministério Público do Trabalho tem entre suas atribuições a defesa de interesses coletivos e individuais indisponíveis, com vistas à conservação da ordem jurídica trabalhista, não sendo a instituição competente para tratar de interesses personalíssimos, de caráter singular, afetado apenas ao universo subjetivo de determinado indivíduo. Desta feita, a insurgência do denunciante quanto à caracterização do acidente como de trabalho e a indenização pelo acidentado, nitidamente, de cunho individual, deve ser tutelado pela própria vítima. Por outro lado, cabe destacar que em 20.07. 2011 (fls. 396/398) foram apresentados documentos pela PETROBRAS demonstrando a correção voluntária das irregularidades levantadas pelo auditor-fiscal do trabalho que poderiam 6
ter dado causa ao incidente ocasionado pelo operador de lastro, empregado da PETROBRÁS, ao indevidamente abrir a caixa de mar, durante o mergulho do denunciante. Assim, ficou demonstrada a correção das irregularidades quanto à capacitação dos operadores de lastro e da sinalização na sala de operação de lastro, bem como ausência de irregularidade em relação à emissão de CAT. Incidência, portanto, do precedente 12 do CSMPT. Diante de todo o exposto, nego provimento ao recurso, homologando, consequentemente, o arquivamento do feito. IV CONCLUSÃO Pelo exposto, recebo o presente recurso administrativo e negolhe provimento, homologando, por consequência, o arquivamento do IC nº 000115.2010.01.005/9-502. Brasília, 11 de agosto de 2014. OTAVIO BRITO LOPES SUBPROCURADOR-GERAL DO TRABALHO Membro da CCR - Relator 7