EPIDEMIA URBANA DE Tityus serrulatus NO MUNICIPIO DE TRINDADE-GO RESUMO



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EPIDEMIA URBANA DE Tityus serrulatus NO MUNICIPIO DE TRINDADE-GO Hélio Pinheiro de Andrade 1 Antônio Pasqualetto 2 RESUMO Ao estudar espécies sinantrópicas de importância médico-sanitária no município de Trindade-GO, encontrou-se epidemia da espécie de escorpião Tityus serrulatus. Destacaram-se dois setores com maior ocorrência e possíveis focos disseminadores: o cemitério e a ETA-Saneago. Sugerem-se urgentes medidas preventivas e de controle. Palavras-chave: Tityus serrulatus, epidemia ABSTRACT When studying species important sinantrópicas doctor-sanitary in the city Trinity-GO, observated scorpion species epidemic Tityus serrulatus. Highlighted two sectors with larger occurrence and possible focuses circulators: the cemetery and ETA-saneago. Suggest urgent preventive measures and of control. Key-Words: Tityus serrulatus, epidemic 1 Biólogo, Especialista em Educação Ambiental pela Universidade Católica de Goiás. 2 Engenheiro Agrônomo, Doutor, Professor da Universidade Católica de Goiás. pasqualetto@ucg.br 1

1 INTRODUÇÃO O município de Trindade, localizado a 18 Km da capital do Estado de Goiás Goiânia, recebeu sua maioridade no ano de 1920, através da lei 662 do dia 16 de julho, passando de distrito para Município. Entre setores, vilas, bairros, chácaras, jardins e conjuntos, somam se 44 ao total. É uma cidade que possui grande extensão, em relação ao seu tamanho. Trindade possui a tradição religiosa, conhecida como a Festa do Divino Pai Eterno ou Festa de Trindade, que começou no ano de 1840, no qual Trindade era conhecida como Arraial Barro Preto, festa essa, que atrai atualmente para cidade, no mês de junho, um número elevadíssimo de romeiros, uma das hipóteses de transporte do animal conhecido como exótico regionalmente. Entre os romeiros encontra-se um grupo especial, conhecido como Carreiros, onde os quais chegam de diferentes e distantes locais, Santa Bárbara de Goiás, Morrinhos, Anicuns, Damolândia, Itaberai, Palmeiras de Goiás, Goiás Velho, Avelinópolis, Inhumas e outras cidades. Que contribuíram para o transporte de animais dentre os quais os escorpiões. Há muito tempo, Trindade apresenta surto de infestação por escorpiões. Em 2001, registrou-se no município um acidente causado pelo animal, onde a vítima era uma criança, levada a óbito. Em abril de 2002, notou-se que em menos de cinco meses, outras duas crianças tiveram óbito, vitimadas pela picada do animal. A morte por envenenamento escorpiônico ocorre como resultante de falência cardio-respiratória algumas horas após o acidente (este período é variável podendo ocorrer entre 1 a 6 horas em média - mortes tardias também podem ocorrer). A situação é tão grave que tem obrigado o poder público a definir estratégias de controle da epidemia para proteger seus habitantes, inclusive as crianças. Mostrando a situação da cidade, tanto no tamanho físico como o número de habitantes, percebe-se as dimensões do problema, além de registrar a provável chegada do escorpião na região os riscos a multidão durante a festa religiosa, a qual também gera desequilíbrio ambiental, piorando a higiene urbana, propiciando acúmulos de lixos e presença de alimento favoráveis a sua disseminação. Tais fatos nos levam a preocupar, pois de acordo com estudos realizados no município de Aparecida no Estado de São Paulo, por Elieth Floret Spirandeli Cruz, Clóvis R. Winther Yassuda, Jorge Jim e Benedito Barraviera Programa de controle de surto de escorpião Tityus serrulatus, Lutz e Mello 1922, no município de Aparecida, (SP), (Scorpiones, Buthidae) em 1991, os órgãos de Saúde Pública do Vale do Paraíba registraram no município cerca de 15 casos de acidentes. Como a população do município era cerca de 35.000 habitantes, este número equivale a um índice de incidência de 43 casos por 100.000 habitantes. Este índice foi o maior registrado para a microrregião administrativa do Vale do Paraíba, perdendo apenas para o de Belo Horizonte (MG), o maior do país. No Censo de 1996, Trindade possuía 69.838 habitantes, em 2000 aumentou para 82.131 (Tabela 1). 2

Tabela 1: Número de habitantes no município de Trindade: Número de habitantes Homens Mulheres Total Zona urbana 32.048 33.095 65.143 Zona rural 2.538 2.157 4.695 Número total de habitantes 82.131 Fonte: IBGE, 2000. Em junho de 2000, realizou-se uma pesquisa no município de Santa Bárbara de Goiás, onde a população passava pelo mesmo problema que Trindade passa hoje, tal pesquisa mostrou que os hábitos da população influenciaram muito na presença do animal na cidade, alem de notar, que os escorpiões se dispersaram passivamente, ou seja transportados em toras de madeira, dentro de caixas e caixotes, caminhões ou outro meio de transporte. Forma pela qual o animal chegou naquela região e da mesma forma chegou no município de Trindade. A pesquisa trouxe benefícios para ambas partes, o município da diminuição do foco do animal e a equipe pela nova experiência em epidemiologia de escorpiões. Segundo William Henrique Stutz, Médico Veterinário Sanitarista, são raros os profissionais aracnólogos ou não no Brasil envolvidos com nossa linha de trabalho. O que se nota, é uma preocupação em simplesmente exterminar escorpiões através do uso de qualquer veneno que surja no mercado e que, mesmo sem terem sido testados dentro de uma metodologia realmente científica, traga a enganosa sensação de estar "contribuindo para a Saúde Coletiva" (STUTZ, 2000). Justifica-se a atuação no monitoramento a espécie, apresentando alternativas viáveis que possibilitem a tomada de decisões pela população e poder público. Neste sentido, o realizou-se o pesquisa de espécies sinantrópicas de importância médico-sanitária no município de Trindade-GO, destacando-se: a)localização e identificação do escorpião na cidade; b)estudo estatístico da freqüência do animal na região; c) avaliação das condições propícias à infestação na região; d) avaliação das condições sócio-econômicas e educacionais da população sujeita ao escorpionismo e e) Identificação e divulgação de medidas de controle epidemiológico do escorpião no município. 2.1 DESCRIÇÃO 2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA Os escorpionídeos, conhecidos popularmente como escorpiões, pertencem à classe dos aracnídeos. Segundo William Henrique Stutz, não são insetos, basta observar que este animal tem 4 (quatro) pares de patas ao invés de 3 (três), como pensam erradamente algumas pessoas. Juntamente com as aranhas, os carrapatos e os ácaros, que são seus companheiros de classe, os escorpiões pertencem ao filo dos artrópodes, que inclui, além dos aracnídeos, a classe dos insetos, dos crustáceos e outras (STUTZ, 1990). 3

Os escorpiões, internamente possuem sistema nervoso, circulatório, respiratório, reprodutivo e digestivo. Como todos os artrópodes os escorpiões tem o corpo revestido por fino e resistente exoesqueleto de quintina que carrega e protege as estruturas internas. É a base de sustentação também de vários receptores sensitivos, espiráculos (ou opérculos respiratórios) e outras estruturas de comunicação com o meio exterior de grande importância biológica. A obra Biology of Scorpions - Gary A.Polis, uma das primeiras dedicada ou estudo dos escorpiões, ainda é utilizada. Para nível de entendimento de suas estruturas orgânicas externas, esse trabalho utilizará esquemas contidos no livro acima referido. (Figura 1) Figura 1. Desenho original de Biology of Scorpions - Gary A.Polis 4.1.1 Prosoma O corpo é dividido em duas partes principais o prosoma (cefalotórax) e o opistosoma (abdome). Dorsalmente, o prosoma é coberto por uma carapaça. As quelíceras são parcialmente cobertas pela carapaça e projetadas para frente. As quelíceras são órgãos pré-bucais e são usadas para rasgar e triturar alimento, todos os aracnídeos as possuem. 4

Um par de olhos medianos e outros laterais, menores (ao todo cinco pares) estão localizados na carapaça. Os olhos medianos são órgãos muito primitivos, com capacidade de percepção de profundidade e espacial produzindo assim imagens visuais distorcidas. São muito sensíveis a luz. Seu propósito parece ser permitir orientação e para diferenciar luz e escuridão. Os olhos laterais são até três vezes menores do que os olhos medianos e parecem reagir a estímulos mais rapidamente no escuro. Aparentemente são os responsáveis pelo ciclo luz-escuridão e parecem serem reguladores do relógio biológico dos escorpiões. Uma área foto sensível no metasoma foi descoberta recentemente em diferentes escorpiões. Sua função não foi ainda esclarecida (POLIS, 1990). 4.1.2 Opistosoma O opistosoma é composto pelo mesosoma (pré abdome) e metasoma, erroneamente chamado de cauda, (pós abdome). Sete tergítos se combinam para formar a parte dorsal do mesosoma. Os tecido flexíveis que unem as partes rígidas do exoesqueleto são denominadas membranas (pleura) intersegmental. O Metasoma é formado por cinco segmentos arredondados que terminam com um bulbo chamado telson. O telson não é considerado parte do metasoma. O aguilhão ou a parte inoculadora de veneno é chamada de acúleo (ferrão) e em sua porção arrendada estão as glândulas produtoras de veneno. (figura 2) Figura 2. Desenho do Telson do escorpião. Neste desenho pode-se observar o ferrão do escorpião assim como onde se alojam as glândulas que produzem veneno, e a abertura anal do Animal. Os escorpiões usam o ferrão para diversos fins. O mais óbvio é para dominar suas presas, que antes são agarradas firmemente pelas pinças dos palpos. Os escorpiões fazem uso do ferrão quando não conseguem matar a presa por esmagamento com as pinças. 5

Devido ao veneno que inoculam, pequenos escorpiões com pinças fracas conseguem dominar presas até do seu próprio tamanho. Um segundo uso do ferrão é na defesa. Através de um ferrão bem posicionado, os escorpiões podem manter afastados potenciais predadores. Apesar disso, eles são presas fácil para muitos animais, para os quais seu ferrão parece ser inócuo. Um terceiro uso do ferrão é durante o acasalamento. Observam-se freqüentemente machos aguilhoando as fêmeas ou golpeando-as com o telson. Parece provável que alguns escorpiões possuam ferormônios que possam aumentar a receptividade da fêmea ou permitam reconhecimento de espécies durante o ritual de acasalamento (MELLO, 1922). Na ferroada o musculoso metasoma é suspenso e o telson posicionado, para a introdução rápida e certeira do aguilhão no exoesqueleto ou pele do seu alvo. O escorpião deve perceber que foi certeiro, pois se o aguilhão não penetrar adequadamente o animal fará novas tentativas repetidamente até obter sucesso na inoculação do veneno. O metasoma é um órgão musculoso e além de ser usado para ferroar também é usado para cavar, higienização, equilíbrio e sustentação do animal (POLIS, 1945). As cerdas próximas ao ferrão são importantes sensores durante o ataque. Presas relutantes, que se debatem, serão ferroadas seguidamente enquanto estiverem seguras pelas pinças. A quantidade de veneno injetada é controlada pelo escorpião; doses maiores para grandes animais e menos para as presas menores. Algumas vezes o veneno não é injetado apesar da ferroada, este fenômeno é conhecido como "ferroada seca". O ferrão pode se manter introduzido na presa por alguns segundos ou simplesmente ser espetado e retirado imediatamente, retornado a sua posição de ataque. Independentemente da forma como é utilizado o veneno faz do escorpião um predador extraordinário e eficiente, capaz de capturar presas maiores e mais perigosas do que o próprio. Uma pequena protuberância esta presente em algumas espécies e são usadas por taxonomistas como uma característica quando da classificação de espécies. O metasoma não é uma cauda no sentido da palavra, mas uma continuação do abdome. Contém partes do intestino, nervos, artérias, veias e músculos além de sustentar o telson. A abertura anal esta localizada no tecido mole do quinto segmento, onde este se conecta com o telson. 4.1.3 Apêndices Quatro pares de patas articuladas (todas inseridas no cefalotórax) permitem locomoção e também são usadas para escavar o solo. A porção que de cada pata que se 6

conecta com o corpo é denominada coxa, e segue nesta ordem o trocanter, fêmur, patela, tíbia, basitarso, tarso e apotele. Garras laterais e medianas estão ligadas à apotele. Segundo o livro Biology of scorpions, os pedipalpos são análogos ao braço e mãos humanas. Cada pedipalpo possui seis segmentos. Começando a partir do corpo temos: O trocanter, o fêmur, a patela, a tíbia, e o tarso. Os dois últimos segmentos apresentam o formato de pinças (mãos) a tíbia modificada representa a palma e um dedo fixo, e o tarso é o dedo móvel da pinça (POLIS, 1945). Apesar das estruturas anatômicas dos pedipalpos possuírem a mesma nomenclatura daquelas das pernas, os pedipalpos não são pernas. Estes são usados para capturar, conter e esmagar presas, para proteção como uma poderosa arma e escudo e para escavar. Também possuem órgãos sensitivos excepcionais. A superfície interna das pinças possui uma série de granulações dentadas e pontiagudas, que possibilita segurar firmemente e esmagar suas presas. Algumas estruturas dos pedipalpos são presentes apenas nos machos, fornecendo base segura quanto ao dimorfismo sexual (a abertura ou vão encontrado no Tityus bahiensis utilizado para segurar a fêmea quando acasalamento é um bom exemplo) (BÜCHERL, 1979). Escorpiões com pinças maiores e robustas são capazes de esmagar o exoesqueleto de qualquer invertebrado por mais rígido que este seja. 4.1.4 A porção ventral As formas das estruturas da porção ventral entre as pernas (coxoesterno) dos escorpiões são as mais utilizadas para diferenciar famílias. Os dois opéculos genitais (fundidos cobrindo a abertura genital) podem ser observados no centro do dorso imediatamente atrás e posteriormente ao externo. Oito pequenas aberturas (espiráculos) localizadas na parte ventral do mesosoma, transportam ar para os pulmões (orgânulos respiratórios). Uma vez que podem ser "fechados" em momentos de stress, estes espiráculos são extremamente eficientes e minimizam a entrada de partículas de pó no organismo. 4.1.5 Órgãos sensitivos Apesar dos escorpiões possuírem pouca visão eles são dotados de um arsenal de potentes receptores sensitivos. Captando movimentos de ar, vibrações, e tato são capazes de perceber a presença de predadores, presa, água, temperatura e luz, assim como uma gama de outros estímulos. 7

4.1.5.1 Pectíneas As pectíneas são um par de apêndices com aparência de pentes localizados na porção ventral imediatamente após o último par de patas. Apenas os escorpiões as possuem. Estes órgãos sensitivos estão permanentemente em contato com o solo e são capazes de captar vibrações mínimas no mesmo e são ainda utilizados pelos machos para perceber a presença de ferormônios durante o período reprodutivo. 4.1.5.2 Cerdas As cerdas são estruturas com aparência de pelos distribuídas por quase todo o corpo dos escorpiões, nas patas, e nos pedipalpos, dando a algumas espécies a aparência "peluda". Algumas destas cerdas não são visíveis a olho nu. Pelo menos três tipos diferentes de cerdas já foram descritas. As Cerdas captam sensações radiculares, térmicas, químicas e variações de umidade. As mais importantes são as longas e finas tricobótrias encontradas apenas nos pedipalpos. Estas são incrivelmente sensíveis e a movimentos de ar e a vibrações e pode perceber o menor movimento de suas presas, de outros escorpiões e situações de perigo. A quantidade, localização e disposição das tricobótrias são importantes na identificação de espécies. As cerdas do tarso captam vibrações do substrato e muitas ainda percebem variações e presença de água e umidade além de mudanças químicas no ambiente. Tufos de cerdas localizados no tarso e basitarso aumentam a área de contato com o solo facilitando a locomoção de terrenos arenosos e macios. Apesar de muito importantes para se determinar o habitat de espécies de escorpiões, estes tufos de cerdas não são facilmente observados sem a utilização de instrumentos ópticos (lupa entomológica). 4.1.5.3 Outros receptores Outros sensores microscópios chamados de filetes sensitivos são encontrados nos pés e no metasoma. Quando algum tipo de pressão é feito sobre o exoesqueleto estes "filetes" se abrem rapidamente. Dependendo da duração e da intensidade desta pressão os escorpiões fazem ajustes nos movimentos e na postura de seu corpo. Outros "filetes" sensitivos localizados no basitarso em todas as oito patas parecem perceber vibrações no terreno, como aqueles produzidos por movimentos de insetos. Os escorpiões se utilizam das sensações recebidas por patas opostas para se aproximar de suas presas e determinar a localização e distância da mesma (STUTZ, 1990). 8

4.1.6 Produção de sons Aproximadamente 150 espécies de escorpiões são capazes de produzir sons ou esfregando partes do corpo uma contra a outra ou vibrando estruturas anatômicas. Alguns Opistotamus esfregam suas quelíceras e o cefalotorax e produzem um som sibilante. Algumas espécies friccionam o telson no metasoma, pectíneas ao externo, e os pedipalpos ao primeiro par de patas. Em laboratório temos a rara oportunidade de observar um Tityus brazilae que a qualquer toque em seu terráreo, o mesmo vibra suas pectíneas produzindo um som que em muito lembrava o de uma cascavel. Outros escorpiões literalmente batem o telson no solo. Estes sons produzidos parecem ter a função de intimidar agressores (STUTZ, 1990). 4.2 REPRODUÇÃO Os escorpiões se destacam entre os aracnídeos por terem uma duração de vida que vai além de uma estação. Chegam à maturidade em 1-3 anos, e atingem normalmente um período de vida de 2-6 anos. O maior tempo de vida registrado para um escorpião chega até 8 anos. Aparentemente as espécies menores têm um período de vida mais curto, entre 3 ou 4 anos. Existem relatos de grandes escorpiões cujo período de vida poderia ser de 20 anos ou mais. Os escorpiões não põem ovos. São vivíparos e seus filhotes nascem por meio de parto, após uma gestação longa. Em Tityus bahiensis e Tityus serrulatus a gestação dura de 2 meses e meio a 3 meses. Algumas espécies, inclusive Tityus Bahiensis, podem gerar mais de uma ninhada a partir do mesmo acasalamento, decorrendo vários meses entre dois partos consecutivos. Entre estes escorpiões, cada ninhada pode ter mais de 20 filhotes, mas outras espécies podem produzir até 90 ou mais filhotes (MATTHIESEN, 1962). Tityus serrulatus se reproduz de maneira peculiar através de um complexo processo denominado partenogênese, isto é, os óvulos desenvolvem-se no organismo materno sem a fertilização pelo macho, o qual inexiste na natureza. As fêmeas sozinhas gestam e parem durante todo o ano, ninhadas de até 24 filhotes. (Figuras 3 e 4) 9

Figura 3. Tityus serrulatus com filhotes 2 dias após nascimento Figura 4. Tityus serrulatus com filhotes 13 dias após nascimento Fotos: Thogo Lemos dos Santos Enquanto se verifica o crescimento e até atingir a maturidade sexual, os escorpiões sofrem ecdises, ou seja, trocam periodicamente de cutícula. Ao chegar a ocasião da ecdise, a cutícula antiga parte-se horizontalmente acima das quelíceras. Pela fenda aberta, sai o corpo do escorpião, revestido pela nova e ainda tenra cutícula. A cutícula velha costuma sair inteira, conservando a forma do escorpião. Segundo observação de Matthiesen, espécimens de Tityus serrulatus em cativeiro atingiram a maturidade sexual após um ano de idade, tendo passado por 5 ecdises (MATTHIESEN, 1962). 10

Figura 5. Tityus serrulatus efetuando muda. Foto: Thogo Lemos dos Santos 4.3 EVOLUÇÃO Como linhagem, os escorpiões provêm de eras remotas. Seus mais antigos fósseis ocorrem em rochas formadas no Período Siluriano, cerca de 420 milhões de anos atrás. Ou seja, cerca de 200 milhões de anos antes que os dinossauros aparecessem. A linhagem à qual os escorpiões modernos pertencem surgiu no Período Carbonífero mais recente, há cerca de 300 milhões de anos. De lá para cá, os escorpiões pouco mudaram. sobrevivendo a todos os grandes cataclismos que destruíram milhares de espécies vivas. Portanto o escorpião foi um observador privilegiado tanto do fim dos dinossauros assim como do surgimento do homem na face da terra. Apesar da existência de poucos exemplares, evidências fósseis indicam que os primeiros escorpiões eram de vida aquática possuindo guelras e patas, e se pareciam em muito com os escorpiões atuais. Além do mais os escorpiões são considerados os aracnídeos mais antigos encontrados até o momento (KJELLESVIG, 1986). 4.4 HABITAT E ADAPTAÇÃO Sua notória capacidade evolutiva e de adaptação permitiu que sobrevivessem na superfície da terra por aproximadamente 300 a 350 milhões de anos após saíram do ambiente aquático. Alguns dos primeiros escorpiões a viverem a maior parte do tempo em terra firme eram muitos pequenos, mas pelo menos uma espécie - Praearcturus Gigas - assumia maiores proporções chegando a medir 1 metro de comprimento sendo pois um notório predador (SCHULTZ, 1990). Os escorpiões modernos se adaptaram aos mais variados tipos de habitat, dos desertos às florestas tropicais e do nível do mar a grandes altitudes em montanhas. Uma espécie foi encontrada vivendo a 4.200 metros de altitude nos Andes. 11

São encontrados nos mais variados habitats tais como florestas tropicais, cerrados, campos, e em áreas intermediarias às descritas. A grande maioria destes aracnídeos tem preferência por climas tropicais e subtropicais. Todavia algumas espécies de adaptaram a regiões pouco comuns, algumas surpreendentes (STUTZ, 1990). Em várias regiões do planeta algumas espécies de pequenos escorpiões (menos de 1 mm), vivem em zonas intermediárias. Conhecidos como escorpiões do litoral, se alimentam de minúsculos invertebrados marinhos trazidos pelas marés. Algumas espécies vivem em altitudes acima de 4.200 metros no Himalaia asiático, uma em particular - Orobothriurus altola - vive a 4.400 metros de altitude na cordilheira dos Andes aqui na América do sul. gelo. Estes muito pequenos, passam meses sob pedras e em abrigos cobertos por neve e Experimentos já demonstraram que muitos escorpiões podem resistir a temperaturas abaixo do ponto de congelamento. A influência de microclimas específicos, assim como composição de solo, tipos de rochas, sazonalidade de temperaturas extremas e disponibilidade alimento são fatores limitantes na distribuição destes animais (SPIRANDELI, 1994). Atualmente as pesquisas nos mostram o sucesso nos criadouros para estudos do Tityus serrulatus. (figura 6) Figura 6. Criadouro coletivo de Tityus serrulatus. Os escorpiões das areias (psammophiles) possuem numerosas cerdas, que aumentam a área de superfície de contato com o solo, as patas são adaptadas para melhor locomoção na areia fofa. Os escorpiões de regiões rochosas (lithophiles) são mais achatados e alongados com cerdas mais espessas e pontudas mas patas o que facilita se 12

mover livremente sobre o terreno e em seus abrigos. Seus metasomas são longos e finos e mais elevados em relação à maioria das espécies (SPIRANDELI, 1994). Um corpo desenvolvido, robusto com patas curtas e pedipalpos grandes e poderosos, caracteriza os escorpiões que constroem abrigos (fossorial). Alguns escorpiões (troglobites) vivem em cavernas profundas. Como não há nenhuma necessidade enxergar na escuridão, a maioria deles são cegos e em alguns a ausência total de olhos é observada. Geralmente seus corpos, patas, e pedipalpos são extremamente delgados, incolores - todas estas adaptações foram desenvolvidas para viver em fendas, sob a rocha, e nas profundezas das cavernas. Escorpiões adaptados às proximidades das entradas das cavernas são conhecidos como troglophiles, não perderam os olhos e não adquiriram outras características dos troglobites. Os escorpiões arbóreos são pequenos, leves, ágeis em escaladas. Alguns sobem em árvores, vivendo dentro dos buracos e das rachaduras dos troncos, outros preferem as parte basal de bromélias. Uma vez que as pesquisas para explorar as copas das árvores das florestas tropicais estão em estágio inicial, acredita-se que muitas espécies novas de escorpiões ainda serão descobertas e descritas (STUTZ, 1990). Cada uma destas variações físicas, são acompanhadas de inconvenientes, algumas espécies são tão especificas de certo ecossistema que encontram sérias dificultadas em se adaptar a outros com características diferentes, mesmo que estas variações sejam mínimas. Esta é uma consideração importante quando avaliamos a necessidade de se manter estes animais em cativeiro, seja para fins médicos-sanitários seja para estudo de comportamento. Algumas espécies simplesmente não são passíveis de se manter em laboratório (BÜCHERL, 1953). Além da sustentação, o exoesqueleto rígido do escorpião age como um revestimento rígido, protetor cuja coloração geralmente condiz com o seu habitat. Isto fornece ao escorpião a capacidade de se camuflar. A forma achatada dos escorpiões os permite esgueirar por entre locais muito pequenos e apertados. Sua capacidade de inocular veneno e seus fortes pedipalpos combinados com sua velocidade de reação a estímulos fazem do escorpião um predador formidável e perigoso. Os escorpiões do deserto são os artrópodes mais especializados em conservação de água. O revestimento de seu exoesqueleto os torna impermeáveis evitando perda de líquido corpóreo. A necessidade de água da maioria dos escorpiões do deserto é adquirida através de suas presas ou seja, através de seu alimento. Seus dejetos são extremamente secos devido ao elevado teor de nitrogênio e uma porção mínima de água. Respirar através de espiráculos minimiza substancialmente a perda de água através da respiração. Algumas espécies possuem membranas que cobrem as entradas dos 13

espiráculos podendo fecha-las voluntariamente diminuindo ainda mais quaisquer perda de líquido (POLIS, 1990). Ao se refugiarem dentro de tocas, sob as pedras ou se enterrando no solo os escorpiões do deserto evitam os períodos mais quentes do dia este procedimento também minimiza a perda de umidade. Todos os escorpiões captam calor de fontes externas e são incapazes de gerar seu próprio calor. Em ambientes muito quentes eles possuem hábitos noturnos. Alguma espécie de regiões temperada e de florestas tropical, tem atividade durante parte do dia, uma vez que a vegetação densa impede que o calor excessivo do sol atinja o solo. A espécie de escorpião encontrada em Trindade é o Tityus serrulatus, Lutz e Mello, 1922. Esta espécie embora primitivamente habitante de cerrado e campos abertos, tornouse bem adaptada à vida domiciliar urbana, possivelmente em decorrência da rápida e desenfreada colonização pelo homem das regiões sul e sudeste, originalmente ocupadas pelo artrópode. Além disso, esses animais adaptaram-se facilmente às condições oferecidas pelas moradias humanas, tais como grande número de abrigos (lixo, entulho, pilhas de tijolos e telhas, etc.), e alimentação farta (baratas). Na década de 40 não havia registros da presença do animal em demais regiões alem das citadas acima, hoje encontramos registros de focos do Tityus serrulatus em todo território brasileiro. Sucesso tal, devido ser um grande predador e possuir uma grande capacidade de se adaptar em diferentes regiões. 4.5 PECULIARIDADES Uma das peculiaridades do escorpião e a capacidade de ser fluorescente no escuro à luz dos raios ultravioleta e refletir o azul. (Figura 7) Figura 7. Fluorescência do escorpião Fonte: Globo Ciência/Abril 1992. Fotos de Gamma/Sigla 14

4.6 SISTEMÁTICA Infelizmente são pouquíssimos os pesquisadores trabalhando com escorpiões no mundo, no Brasil não seria possível enumerar uma dezena mesmo sabendo que no passado contávamos com os maiores expoentes da arcnologia mundial tais como Lutz, Wolfgang Burchel, Campos Mello, além do "pai" da terapia anti-escorpiônica Vital Brasil. O resultado deste desinteresse é a lentidão do processo evolutivo da sistemática atual (STUTZ, 1990). Muitas delas são divididas em sub-famílias, que por sua vez se dividem em gênero, espécies, e em alguns casos subespécies. Existe muita discordância entre os pesquisadores sobre a validade ou não das subespécies; alguns afirmam que a classificação atual de muitas subespécies esta pouco definida e muito subjetiva. Uma vez que as características físicas utilizadas para tal definição são muito pequenas e só podem ser observadas através de dissecação microscópica. A separação de gênero em espécie deve ser motivo de investigações cuidadosas que requerem muita paciência e determinação. É sabido que a coloração e o tamanho de indivíduos de uma mesma espécie podem variar de acordo com os seus respectivos micro habitats e estas peculiaridades deve ser cuidadosamente avaliadas quando da classificação das espécies. Uma diferença única e isolada não é suficiente para elevar um certo tipo de escorpião à condição de espécie. Se houver aumento de interesse por parte de pesquisadores e principalmente fontes de financiamento para pesquisa, seguramente novas espécies de escorpiões serão descritas. A biologia molecular através do uso de PCR, ou análise de DNA tornou-se uma ferramenta de suma importância nesta tarefa. 4.7 ALIMENTAÇÃO Apesar de pequenos em tamanho, escorpiões exercem papel fundamental na cadeia alimentar. Não é incomum encontrarmos três ou quatro espécies diferentes convivendo no mesmo habitat, ou em grupos numerosos. Eles são animais carnívoros, predando grande quantidade de invertebrados e ocasionalmente pequenos vertebrados contribuindo sobre maneira para o equilíbrio ecológico (STUTZ, 1990). O Tityus serrulatus como os de mais escorpiões se alimentam principalmente de insetos, portanto um ambiente livre destes dificulta a sua presença. Os escorpiões fazem parte de uma parte significativa da cadeia alimentar. Além do canibalismo interespecies, seus predadores incluem centipedes, aranhas, formigas, lagartos, serpentes, rãs e sapos, pássaros e alguns mamíferos de grande porte. 15

Os escorpiões possuem uma das taxas metabólicas mais baixas do reino animal. Podem permanecer longos períodos sem se alimentar, pois ao final de uma única refeição (na qual ingeriu grande quantidade de alimento), conservam ao máximo, energia evitando ao extremo se locomoverem, poupando assim energia para sua anutenção (SPIRANDELI, 1994). Ingerindo o alimento lentamente, trituram fragmentos de alimento, umedecendo-os na boca (o que propicia já a digestão), sugando-os depois e eliminando os restos, como pequenas bolas de detritos. "Um escorpião da espécie Tityus bahiensis, mantido em cativeiro, demorou 20 horas para comer uma barata comum (MATTHIESEN, 1962). 4.8 TOXICOLOGIA Todas as espécies de escorpião são venenosas. Para os insetos, que são alimento potencial de escorpiões, todos os escorpiões são mortalmente venenosos. Entretanto, entre as cerca de 1500 espécies conhecidas, apenas um pequeno número é perigoso para os seres humanos. A maioria produz uma reação semelhante à da ferroada da abelha, que é muito dolorosa, embora geralmente não ofereça perigo de morte (STUTZ, 1990). Estudos mais recentes procuram descobrir se os escorpiões seriam sensíveis às suas próprias toxinas. 4.8.1 Veneno e envenenamento O veneno é uma mistura química complexa (peptídeos de baixo peso molecular) que destroem as células quando as penetram. Mais 100 destes peptídeos já foram isolados em veneno de escorpiões. A função básica do veneno é de capturar e imobilizar presas: sua função defensiva é secundária. O veneno dos escorpiões tem sido largamente estudado, particularmente em como é sua ação no corpo humano. A toxicidade dos venenos varia de gênero para gênero e de espécie para espécie, e muitas vezes dentro de uma mesma espécie a ação do veneno pode variar. Também, por razões ainda desconhecidas, parece ter variações de acordo com regiões. Talvez em função da variação dos componentes químicos de cada tipo de veneno, aliados a variações genéticas, condições ambientais, tipo de alimentação disponível, ou simplesmente variações fisiológicas entre espécies podem ser a causa destas diferenças (BÜCHERL, 1979). Os escorpiões do gênero Tityus são os causadores de acidentes de interesse médico. As principais espécies são o Tytius bahiensis (escorpião marrom) e Tytius serrulatus (escorpião amarelo). Este último é atualmente o causador do maior número de mortes, principalmente quando acomete crianças abaixo de 7 anos de idade. O quadro 1 resume a classificação e o tratamento do escorpionismo. 16

Tabela 2. Classificação e tratamento do acidente com escorpiões. Classificação do escorpionismo Manifestações clínicas Geral Tratamento Específico Leve Somente presentes as manifestações locais, dor em 100% dos casos. Ocasionalmente vômitos, taquicardia e agitação de pequena intensidade. Combate à dor: analgésicos e/ou anestésicos locais (Lidocaína à 2%). Observação em ambiente hospitalar durante pelo menos 6 a 12 horas, especialmente crianças abaixo de 7 anos. Moderado Manifestações locais e alguma sintomalogia sistêmica como agitação, sonolência, sudorese, náuseas, alguns vômitos, hipertensão arterial, taquicardia e taquipnéia Combate à dor com Lidocaína a 2%. Observação clínica em ambiente hospitalar durante pelo menos 24 horas. Em crianças abaixo de 7 anos está indicado o soro antiescorpiônico 2 a 4 ampolas pela via intravenosa. Grave Manifestações sistêmicas: vômitos, náuseas, sudorese, agitação, taquicardia, hipertensão arterial, alterações do ECG, tremores, espasmos, edema agudo de pulmão, choque, coma e morte. Fonte: Instituto Butantan, 1997. Combate à dor com Lidocaína a 2%. Internação hospitalar. Cuidados intensivos, monitorização das funções vitais. Cuidados em Unidade de Terapia Intensiva. Utilizar soro antiescorpiônico na dose de 5 a 10 ampolas pela via intravenosa tanto para adultos quanto crianças 4.8.2 Sintomatologia Dor (especialidade do veneno dos escorpiões) A maior parte dos sintomas que surgem na pessoa picada por um escorpião, é decorrente da liberação de mediadores químicos na corrente circulatória da vítima,como: 4.8.2.1 Acetilcolina Causa aumento das secreções lacrimal, nasal, salivar, brônquica, sudorípara e gástrica, tremores, espasmos musculares, mioses e diminuição de rítmo cardíaco. 4.8.2.2 Adrenalina e noradrenalina Aumento da pressão arterial, arritmias cardíacas, vasoconstrição periférica e eventualmente insuficiência cardíaca, edema agudo do pulmão e choque. 17

A toxidade do veneno do escorpião está relacionada com a espécie envolvida no acidente, sendo os casos mais graves no Brasil, ocasionados pelo escorpião amarelo Tityus serrulatus. Há casos onde o escorpião pode picar pessoas e não incolar veneno, gerando os acidentes assintomáticos (INSTITUTO BUTANTAN, 1997). 4.8.2.3 O veneno Segundo relatos clínicos, parece existirem diversos fatores que modulam a toxicidade do veneno do escorpião para humanos. Os principais fatores são: 1) a toxidez do veneno do tipo de escorpião envolvido; 2) a quantidade de veneno injetada pelo escorpião; 3) o tamanho do corpo da vítima; 4) a condição médica geral da vítima. Devido a seu pequeno tamanho, as crianças sofrem maior risco de envenenamento grave do que os adultos. A maior parte das mortes resultantes de picadas de escorpião ocorre em crianças pequenas. Tal fato revela os casos ocorridos no município em questão. Algumas pessoas são alérgicas ao veneno dos escorpiões, da mesma forma que outras podem ser ao veneno das abelhas. Nestes casos, conseqüências muito graves, inclusive a morte, podem ocorrer rapidamente, mas não têm relação à toxicidade do veneno. Mortes ocorridas por envenenamento causado por espécies de escorpião sem importância médica resultam de choque anafilático induzido por alergia. O veneno do escorpião compreende uma variedade de substâncias, nem todas completamente investigadas. O veneno de um único escorpião pode incluir diversas neurotoxinas, histimina, seratonina, enzimas, inibidores de enzimas, e outros compostos não identificados. O veneno pode conter, ainda, sais diversos, muco, peptídeos, nucleotídeos e aminoácidos. Foram as neurotoxinas que receberam a maior atenção dos pesquisadores. As numerosas toxinas do veneno do escorpião são geralmente consideradas como sendo específicas. Cada uma visa atingir a célula nervosa de uma determinada espécie animal. Algumas neurotoxinas podem ter sua maior atividade contra insetos, outras pode ser mais letal para moluscos, e outras, ainda, podem ser dirigidas contra células nervosas de mamíferos. Além disso, toxinas diferentes podem visar locais diferentes na célula nervosa. Segundo a divisão de venenos e antivenenos do instituto Vital Brazil, o veneno de escorpiões, tipo o Tityus serrulatus, age sobre o sistema nervoso periférico. Causa dor muito intensa, com pontadas intermitentes, provoca abaixamento de temperatura do corpo e acelera a pulsação. Comumente a vítima fica prostada. O sinal da picada às vezes não se percebe, porém a dor forte e imediata que ela provoca faz com que a vítima possa ver o animal causador. É importante saber se a picada foi produzida por escorpião ou aranha, uma vez que os sintomas das picadas de escorpião são semelhantes aos das picadas de aranhas com veneno neurotóxico. O escorpião Tityus serrulatus é mais importante sob o ponto de vista médico que o Tityus bahiensis, por provocar mais ocorrências graves. O veneno do Tityus serrulatus 18

pode não ser mais tóxico, mas este escorpião injeta, em cada picada, praticamente o dobro de peçonha injetada pelo Tityus bahiensis. O tratamento na maioria dos casos consiste na infiltração local de 2 a 4 ml de anestésico do tipo lidocaína a 2% sem vasoconstritor. Repetir este procedimento mais duas vezes se necessário, com intervalo de uma hora. Caso a dor persista, está indicada a soroterapia específica com soro antiescorpiônico ou antiaracnídico, na doses de 2 a 4 ampolas para os casos moderados e 5 a 10 ampolas para os casos graves. A soroterapia está sempre indicada em crianças menores de sete anos e em adultos com dor persistente (INSTITUTO VITAL BRAZIL, 1995). Nos períodos de 1988 a 1998 no Estado de São Paulo, houve um grande aumento dos casos de acidentes com picadas de escorpiões, onde vários desses casos tiveram como resultados óbitos. (Tabela 3) Tabela 3. Incidência por 100.000 habitantes de acidentes por escorpiões nos períodos de 1988 a 1998 no Estado de São Paulo. Ano Nº de casos Coeficiente de incidência óbitos Letalidade % 1988 738 2,50 5 0,68 1989 790 2,62 1 0,13 1990 806 2,62 1 0,12 1991 1078 3,43 3 0,28 1992 1417 4,43 5 0,35 1993 1608 4,94 2 0,12 1994 1569 4,75 2 0,13 1995 1954 5,82 3 0,15 1996 1688 4,95 3 0,18 1997 1630 4,71 5 0,31 1998 1979 5,63 1 0,05 TOTAL 15257 31 0,20 Fonte: São Paulo, 1998. 4.9 ASPECTOS EPIDEMIOLÓGICOS Quando usa-se neste trabalho o termo epidemia, estamos nos referindo a um animal que é endêmico na região sudeste, ou seja, a presença do Tityus serrulatus na região Centro-Oeste, em grande escala, classifica-o como um animal invasor. 19

São acidentes menos notificados que os ofídicos. Sua gravidade está relacionada à proporção entre quantidade de veneno injetado e massa corporal do indivíduo picado. Entre os agentes causais estão as espécies do gênero Tityus responsáveis por acidentes. (Tabela 4) O Tityus serrulatus, espécie partenogenética, em expansão nas regiões Centro- Oeste, Sudeste e Sul. Responsável pelos acidentes de maior gravidade registrados no país, incluindo óbitos. Segundo o Ministério de Saúde, são notificados anualmente, cerca de 8.000 acidentes, com uma letalidade variando em torno de 0,51%. Os acidentes por escorpiões são mais freqüentes no período de setembro a dezembro. Ocorre uma discreta predominância no sexo masculino e a faixa etária de 25 a 49 anos é a mais acometida. A maioria das picadas atinge os membros, havendo predominância do membro superior (mãos e dedos) (CENEPI, 1990). Tabela 4. Agentes causadores de acidentes e distribuição geográfica. Nome científico Nomes populares Distribuição geográfica T. bahiensis escorpião marrom MG, SP, PR, SC, RS, GO, MS T. cambridgei escorpião preto AP, PA T. costatus Escorpião MG, ES, RJ, SP, PR, SC, RS T. fasciolatus Escorpião GO, DF T. metuendus Escorpião AC, AM, PA, RO T. serrulatus escorpião amarelo BA, MG, ES, RJ, SP, DF, GO, PR T. silvestris Escorpião AC, AM, AP, PA T. stigmurus Escorpião BA, SE, AL, PE, PB, RN, CE, PI Fonte: CENEPI - Ministério da Saúde 4.10 CRENDICES Ao contrário do que as pessoas acreditam o escorpião não suicida quando preso entre o fogo, ele desidrata e na agonia da morte dá a imprensão que se ferroa ( Matthiesen, 1971). 20