1 SETEMBRO 2014 Osteoporose Como identificar pacientes em risco e o valor da densitometria óssea na previsão de fraturas e no acompanhamento do tratamento Em 10/08/2012, as Sessões Clínicas em Rede abordaram o tema Densitometria Óssea. No documento, foi demonstrada a importância de se considerarem os fatores de risco na indicação desse exame. Os principais fatores de risco são idade avançada, sexo feminino, história prévia de fratura, história materna de fratura, baixo peso (IMC < 19 kg/m²), tabagismo, alcoolismo, algumas doenças como artrite reumatoide e uso de medicamentos, como os glicocorticoides. A densitometria óssea (DO) é um exame que apresenta limitações na predição do risco de fraturas por fragilidade e no acompanhamento dos pacientes em tratamento da osteoporose. As indicações para a sua realização devem levar em conta a idade do paciente e os seus fatores de risco para fratura. De maneira geral, após a data de publicação da Sessão Clínica sobre Densitometria Óssea, a literatura médica não trouxe grandes avanços ou novidades, em relação ao que foi apresentado. A seguir, alguns estudos que podem contribuir para atualizar e complementar a sessão clínica de 2012: 1. Pinheiro MM, Reis Neto ET, Machado FS, Omura F, Szejnfeld J, Szejnfeld VL. Development and validation of a tool for identifying women with low bone mineral density and low-impact fractures: the São Paulo Osteoporosis Risk Index (SAPORI). OsteoporosInt (2012) 23: 1371 79 A Disciplina de Reumatologia da UNIFESP desenvolveu um instrumento simples, útil e válido em nosso meio para identificação de mulheres na pré, peri e pós-menopausa com maior risco de osteoporose e fratura por fragilidade óssea denominado SAPORI São Paulo Osteoporosis Risk Index. Na primeira fase (coorte de desenvolvimento), foram estudadas 4.332 mulheres na pré, peri e pósmenopausa, provenientes da região metropolitana de São Paulo-SP, Brasil, por meio de questionário sobre fatores de risco para osteoporose e fratura, além de densitometria óssea da coluna lombar e fêmur proximal (DPX NT, GE-Lunar). Após a identificação dos principais fatores de risco para osteoporose e fratura, por meio de análise de regressão multivariada e logística, respectivamente, foi desenvolvido o instrumento SAPORI, que, posteriormente, foi validado em uma segunda coorte (coorte de validação), envolvendo mais 1915 mulheres, com as mesmas características da primeira coorte, atendidas na atenção básica em São Paulo. Observou-se que o SAPORI foi capaz de identificar mulheres com baixa densidade óssea (DO) (T-score -2 desvios-padrão) do fêmur, com sensibilidade de 91,4%, especificidade de 52% e área sob a curva (AUC) ROC de 0,831 (p<0,001). O desempenho do
2 instrumento para identificar baixa DO da coluna lombar foi semelhante, com sensibilidade de 81,5%, especificidade de 50% e AUC ROC de 0,724 (p<0,001). Para a identificação de fratura por baixo impacto, a sensibilidade foi de 71%, especificidade de 52% e AUC ROC de 0,689 (p<0,001). O instrumento SAPORI está disponível na página da UNIFESP: http://www.unifesp.br/dmed/ reumato/sapori e pode contribuir para avaliação da necessidade de realização da densitometria óssea. No cálculo, são utilizados os seguintes dados: peso, idade, história pregressa de fratura, raça, terapia de reposição hormonal, hábito de atividade física regular, tabagismo e uso de corticoides. Caso o resultado seja maior ou igual a zero, sugere-se requisitar a densitometria. 2. FRAX Brasil-http://www.shef.ac.uk/FRAX O FRAX é um modelo de informática desenvolvido pela Organização Mundial de Saúde (OMS) para estimar, de maneira individual, o risco absoluto de fratura do colo de fêmur ou qualquer outra fratura por osteoporose nos próximos dez anos. O cálculo leva em conta idade, sexo, peso e altura, além de fatores de risco para fratura e massa óssea do colo do fêmur, medida pela densitometria óssea. Os fatores de risco considerados são fratura prévia, pais com fratura do quadril, tabagismo atual, uso de corticoide, presença de artrite reumatoide, osteoporose secundária e ingestão de três unidades ou mais de bebida alcóolica por dia. Osteoporose secundária compreende doenças fortemente associadas ao risco de osteoporose, que são diabetes tipo I, osteogênese imperfecta em adulto, hipertiroidismo não tratado, hipogonadismo ou menopausa prematura (< 45 anos), má nutrição crônica ou má absorção e doença hepática crônica. Recentemente, o Dr. John Kanis e sua equipe da International Osteoporosis Fundation (IOF) construíram gráficos e tabelas associando dados epidemiológicos de prevalência de fratura de quadril e mortalidade em diferentes áreas do Brasil, com base em quatro estudos clinico-epidemiológicos realizados em nosso país. Apesar de não ter havido um estudo de validação, é possível utilizar o FRAX Brasil no link: http://www.shef.ac.uk/frax. Clicando nesse link, aparecerá na tela FRAX Instrumento de Avaliação do Risco de Fratura da OMS em uma faixa vermelha superior. Nessa tela, clique em instrumento de cálculo logo abaixo. Abrirá uma pequena tela com o nome dos continentes. Clique em América Latina (AL) e aparecerão os países que já constam do FRAX na AL. Clique em Brasil, e surgirá a tela do modelo brasileiro com a bandeira de nosso país. 3. Leslie WD, Morin SN, Lix LM. Rate of Bone Density Change Does Not Enhance Fracture Prediction in Routine Clinical Practice. J ClinEndocrinolMetab 2012; 97:1211 O exame de densitometria óssea é utilizado com vários propósitos na prática clínica, um deles é identificar a perda rápida de massa óssea. Alguns protocolos clínicos sugerem que essa perda seja uma indicação adicional de tratamento. Entretanto, é controverso se a mudança na densidade mineral óssea for um fator de risco independente para fratura osteoporótica. Assim, realizou-se uma coorte retrospectiva com o objetivo de investigar se a taxa de perda de densidade mineral óssea é um fator que contribui para o risco de fratura. Para isso, utilizaram-se os dados das densitometrias realizadas na província de Manitoba no Canadá. Foram incluídas 4.498 mulheres, não tratadas para osteoporose, com 40 anos ou mais na época de realização da segunda densitometria, realizada entre abril de 1996 e março de 2009. Foram excluídas aquelas que receberam tratamento durante o ano anterior ao estudo. O desfecho primário considerado foi a presença de fratura osteoporótica maior (quadril,
3 antebraço, úmero e vertebral sintomática), após a realização da segunda densitometria. Um total de 146 mulheres com fratura osteoporótica maior após a segunda densitometria (mediana de tempo de observação de 2,7 anos) e variáveis relevantes (índice de massa corporal, fraturas prévias, presença de artrite reumatoide, tabagismo, ingestão de álcool, uso prolongado de corticoides) foram identificadas. A porcentagem de mudança anual na densidade mineral óssea no quadril não foi maior nas mulheres que sofreram fratura comparada àquelas que não sofreram (-0,4+/- 1,7 versus 0,5+/- 1,4; p= 0,166). Mesmo após o ajuste para outras covariáveis, a taxa de mudança da densidade mineral óssea não foi capaz de predizer fraturas osteoporóticas maiores (HR:0.95; IC 95%: 0,81-1,10). Resultados similares foram encontrados nas análises considerando-se as mudanças de DMO na coluna lombar e no colo do fêmur. 4. Berry SD, Samelson EJ, Pencina MJ, McLean RR, Cupples A, Broe KE, Kiel DP. Repeat Bone Mineral Density Screening and Prediction of Hip and Major Osteoporotic Fracture.JAMA 2013; 25; 310 (12): 1256-1262 O valor da repetição da densitometria óssea (DEXA) primariamente pedida para triagem da osteoporose não está claro na literatura médica. Não existem dados consistentes que permitam afirmar que mudanças nos valores da densitometria melhoram a predição de fraturas ósseas por fragilidade. Dessa maneira, devido às limitações desse método, a US Preventive Task Force recomenda um intervalo mínimo de dois anos para a obtenção de uma segunda medida de densidade mineral óssea (DMO), mas afirma que podem ser necessários intervalos maiores para se predizer o risco de fratura. Foi realizado um estudo longitudinal com 310 homens e 492 mulheres provenientes do Estudo de Osteoporose de Framinghan, que tinham se submetido a duas medidas de DMO do colo do fêmur entre os anos de 1987 e 1999. O objetivo primário do estudo foi determinar se a mudança na DMO em relação à basal, em exames feitos no contexto de triagem de osteoporose, forneceria informação adicional na predição do risco de fratura do quadril ou fratura osteoporótica maior (quadril, coluna, antebraço, ombro). A mediana de tempo entre as duas medidas de DMO foi de 3,7 anos (variando de 2,4 a 6,0 anos). Após a segunda DEXA, os participantes foram acompanhados até a morte ou até 2009 ou por 12 anos. A mediana de idade no início do estudo foi de 74,8 anos e 52,7% tinham T score entre -1,01 e - 2,49. A média de mudança na DEXA foi de 0,6% ao ano, variando de 5,6%/ano-ganho e de -9,0%/anoperda. A mediana de seguimento, após a segunda densitometria, foi de 9,6 anos. Durante esse seguimento, 113 participantes (14,1%) sofreram uma ou mais fraturas osteoporóticas. Isso ocorreu mais frequentemente nas mulheres, naqueles com história de fratura prévia e nos com menor massa óssea na densitometria basal. A mudança da densidade mineral óssea foi associada com a fratura de quadril e osteoporótica maior (HR 1,33 IC 95%1,06-1,68). Isso pode ser justificado pela idade avançada dessa coorte. No entanto, a mudança na densidade mineral óssea, além da densitometria óssea de base, gerou pouca informação adicional no manejo clínico da osteoporose. A segunda densitometria óssea resultou em uma pequena proporção de indivíduos reclassificados como de alto risco para fratura osteoporótica de quadril ou fratura maior, e não ficou claro se essa reclassificação justifica a prática de se realizar densitometria de triagem a cada dois anos.
5. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Portaria nº 451, de 09 de junho de 2014. Aprova o Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas da Osteoporose. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 10 jun. 2014. p. 45. Recentemente, o Ministério da Saúde aprovou o Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas (PCDT) da Osteoporose por meio da portaria n 224, de 26 de março de 2014. Sobre o exame de densitometria óssea, o protocolo afirma que a possibilidade de rastreamento populacional amplo e aleatório com densitometria óssea (DMO) é afastada em razão de seu baixo poder preditivo e de seu alto custo. Embora a diminuição da massa óssea esteja associada a aumento do risco de fratura, o escore T indica risco relativo, e não risco absoluto para fraturas. Cerca de 80% das fraturas por fragilidade óssea ocorrem em pacientes com escore T superior a -2,5 desvios-padrão. Entretanto, restringindose a realização de DMO à população que apresenta fatores de risco para diminuição de densidade mineral óssea e desenvolvimento de fratura, melhora-se o desempenho no rastreamento de pessoas com maior risco de fraturas. Entre os fatores de risco para o desenvolvimento da osteoporose destacam-se idade, sexo, índice de massa corporal, estilo de vida e história familiar. Quanto ao acompanhamento do tratamento, o protocolo relata que inexistem evidências de bom nível mostrando benefício de DMO seriadas para avaliação de resposta ou definição de conduta após o início do tratamento e que marcadores bioquímicos não devem ser utilizados para monitorização. 4 CONCLUSÕES Há poucos estudos, de boa qualidade, publicados desde a última Sessão Clínica em Rede sobre densitometria óssea em 2012, avaliando a utilidade desse exame no diagnóstico da osteoporose e na predição do risco de fratura óssea. Chama atenção o instrumento desenvolvido pela disciplina de Reumatologia da UNIFESP, denominado SAPORI (São Paulo Osteoporosis Risk Index), que ajuda na decisão para se indicar a densitometria óssea em mulheres. Outra ferramenta útil, agora disponível no Brasil, é o FRAX, que determina o risco absoluto de fratura do colo do fêmur ou de qualquer outra fratura por osteoporose nos próximos anos e ajuda a decidir sobre a necessidade de se iniciar o tratamento para osteoporose. Ambas as ferramentas levam em conta para os seus cálculos os fatores de risco para osteoporose, como peso, idade, história pregressa de fratura, tabagismo e uso de corticoides, entre outros. Os outros dois artigos reafirmam a limitação da densitometria óssea na predição de fratura óssea. Leslie et al mostraram que a rápida perda de massa óssea verificada por meio da densitometria óssea em mulheres não tratadas para osteoporose não é um fator de predição de fraturas osteoporóticas maiores. Já, Berry et al demonstram que a repetição da densitometria (até cerca de 4 anos após a primeira densitometria) em mulheres e homens com média de idade de 74, 8 anos, sem osteoporose densitométrica, não traz informações adicionais ao manejo clínico da osteoporose. Finalmente, o PCDT da osteoporose, aprovado neste ano pelo Ministério da Saúde, concorda com o afirmado na Sessão Clínica de 2012 que a densitometria é um exame limitado, que prediz pouco o risco de fraturas osteoporóticas, não devendo ser pedido fora de um contexto clínico e que também não é útil para acompanhar a resposta ao tratamento.
5 As recomendações da Sessão Clínica em Rede sobre Osteoporose permanecem atuais e foram reforçadas pelas últimas publicações na área: A densitometria não deve ser pedida de maneira indiscriminada para mulheres na pós- menopausa. É um exame com limitações na predição do risco de fraturas e no acompanhamento de paciente com osteoporose. A sua realização deve levar em conta a idade do paciente e os seus fatores de risco para a fratura. A sua repetição regular não contribui para o manejo clínico da maioria dos pacientes. PACIENTES COM INDICAÇÃO PARA AVALIAÇÃO DA DENSIDADE MINERAL ÓSSEA Mulheres com 65 anos ou mais. Mulheres com menos de 65 anos com fatores de risco para fraturas. Qualquer sexo com osteopenia radiográfica. Qualquer sexo - portadores de doenças crônicas associadas à perda óssea. Qualquer sexo com incapacidade de locomoção ou uso de cadeira de rodas por mais de um ano. Transplantados de órgãos sólidos ou de medula óssea. Pacientes em uso de antineoplásicos que aumentam a perda óssea. Pacientes submetidos à cirurgia bariátrica. Homens com manifestação clínica de baixa massa óssea: radiografia mostrando osteopenia, história de fraturas com trauma de baixo impacto, presença de redução da estatura, presença de fatores de risco para fraturas. Homens com falência gonadal há mais de 5 anos. INTERVALO PARA REPETIÇÃO DA DENSITOMETRIA A repetição da densitometria deve ser condicionada a fatores como idade, T- escore inicial e fatores de risco. Nas mulheres idosas (mais de 65 anos) com densitometrias normais ou osteopenia leve, esse intervalo poderá ser superior a dez anos. Pessoas que não estão em tratamento e sem fatores de risco: intervalo mínimo de cinco anos. Pessoas em tratamento de osteoporose: dois anos de intervalo no mínimo. Importante: as alterações na densidade mineral óssea não se correlacionam necessariamente com a resposta ao tratamento e nem com a redução do risco de fratura.
6 REFERÊNCIAS 1- Sessão clínica em rede densitometria UNIMED-BH (http://www.acoesunimedbh.com.br/ sessoesclinicas/2012/08/sessao-clinica-04/) 2- Pinheiro MM, Reis Neto ET, Machado FS, Omura F, Szejnfeld J, Szejnfeld VL. Development and validation of a tool for identifying women with low bone mineral density and low-impact fractures: the São Paulo Osteoporosis Risk Index (SAPORI). OsteoporosInt (2012) 23: 1371 1379 3- FRAX Brasil- http://www.shef.ac.uk/frax 4- Leslie WD, Morin SN, Lix LM. Rate of Bone Density Change Does Not Enhance Fracture Prediction in Routine Clinical Practice. J ClinEndocrinolMetab 2012; 97:1211 5- Berry SD, Samelson EJ, Pencina MJ, McLean RR, Cupples A, Broe KE, Kiel DP. Repeat Bone Mineral Density Screening and Prediction of Hip and Major Osteoporotic Fracture.JAMA 2013; 25; 310 (12): 1256-1262 6- MINISTÉRIO DA SAÚDE. Portaria nº 451, de 09 de junho de 2014. Aprova o Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas da Osteoporose. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 10 jun. 2014. p. 45. Acesse o informativo de Densitometria Óssea no site Sessões Clínicas em Rede: http://www.acoesunimedbh.com.br/ sessoesclinicas/2012/08/sessao-clinica-04/