Ocorrência de micotoxinas e características físico-químicas em farinhas comerciais 1

Documentos relacionados
Características físico-químicas e presenças de aflatoxinas nas farinhas de trigo comerciais da cidade de Cascavel, PR

OCORRÊNCIA DE MICOTOXINAS EM MASSAS ALIMENTÍCIAS

Incidência de Aflatoxinas, Desoxinivalenol e Zearalenona em produtos comercializados em cidades do estado de Minas Gerais no período de

Área: Tecnologia de Alimentos USO DO TESTE DE PELSHENKE PARA PREDIZER A QUALIDADE TECNOLÓGICA DO TRIGO

ANÁLISE MICROBIOLÓGICA DE BISCOITOS TIPO COOKIE SABOR CHOCOLATE COM DIFERENTES TEORES DE FARINHA DE UVA

UMIDADE DE COLHEITA E TEMPERATURA DO AR NA SECAGEM INTERMITENTE SOBRE A QUALIDADE TECNOLÓGICA DE TRIG0 1. Resumo

Caracterização química e rendimento de extração de amido de arroz com diferentes teores de amilose

42º Congresso Bras. de Medicina Veterinária e 1º Congresso Sul-Brasileiro da ANCLIVEPA - 31/10 a 02/11 de Curitiba - PR 1

INTENÇÃO DE COMPRA DE BISCOITOS TIPO COOKIE SABOR CHOCOLATE COM DIFERENTES TEORES DE FARINHA DE UVA

CEREAIS E DERIVADOS Cereais:

Palavras-chave: feijão, qualidade dos grãos, contaminação, micotoxinas.

Especificação Técnica Fecomix 425 Integral Farinha de Milho Inteiro

Especificação Técnica Sabmix Sabugo Moído

Efeitos da Temperatura de Secagem e do Tempo de Armazenamento na Composição Química de Sorgo Granífero

XI Jornada Científica XI Semana de Ciência e Tecnologia IFMG Campus Bambuí

Determinação de Micotoxina Desoxinivalenol (Don) em Pães Brancos eintegrais Comercializados ea Cidade de Ponta Grossa Pr RESUMO

SEMINÁRIO ARMAZENAMENTO E PREPARO DE GRÃOS PALESTRA: MICOTOXINAS

DISCIPLINA MICOTOXICOLOGIA DEPARTAMENTO DE MICROBIOLOGIA E IMUNOLOGIA VETERINÁRIA

Programa Analítico de Disciplina TAL437 Processamento de Cereais, Raízes e Tubérculos

Micotoxinas no Armazenamento de Grãos. Profa Giniani Dors

Qualidade de grãos de duas cultivares de arroz de terras altas produzidas em Minas Gerais

PALAVRAS-CHAVES. Aflatoxinas; Amendoim; Produtos de Amendoim, ocorrência.

EFEITOS DA HERMETICIDADE NO ARMAZENAMENTO DE SOJA SOBRE RENDIMENTO E QUALIDADE DE GRÃOS E DO ÓLEO PARA BIODIESEL

Composição química do café submetido ao processo de descafeinação.

AVALIAÇÃO DE RÓTULOS DE CREMES DE LEITE COMERCIALIZADOS NO MUNICÍPIO DE GARANUNS - PE. Apresentação: Pôster

DETERMINAÇÃO DOS TEORES DE UMIDADE E CINZAS DE PEIXE SALGADO-SECO COMERCIALIZADO NA ZONA OESTE DO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO RJ

Ocorrência de Aflatoxinas em amendoim e produtos de amendoim comercializados na região de Marília SP, Brasil no período de

ELABORAÇÃO DE TALHARIM A BASE DE FARINHA DE FEIJÃO COMO FONTE ALTERNATIVA DE FERRO

ESCOPO DA ACREDITAÇÃO ABNT NBR ISO/IEC ENSAIO

Programa Analítico de Disciplina ZOO448 Fundamentos de Análise de Alimentos para Animais

AVALIAÇÃO REOLÓGICA E DE PANIFICAÇÃO DE FARINHAS DE TRIGO INTEGRAIS COMERCIAIS

Ministério da Saúde - MS Agência Nacional de Vigilância Sanitária - ANVISA. (Publicada em DOU nº 40-E, de 25 de fevereiro de 2000)

AVALIAÇÃO DO PROCESSO DE LIMPEZA E POLIMENTO DOS GRÃOS DE TRIGO PARA ELIMINAÇÃO DE MICOTOXINA DESOXINIVALENOL

PREFEITURA MUNICIPAL DE VENDA NOVA DO IMIGRANTE

Tecnologia da Soja 22/2/2012. Disciplina: T. e P. de Grãos e Cereais Série: 2ª Turmas: L/N/M/O Curso: Técnico em Agroindústria

AVALIAÇÃO DO TEMPO DE COZIMENTO DA MASSA DE QUEIJO SOBRE A UMIDADE DE QUEIJO PRATO DURANTE A MATURAÇÃO

COMPOSIÇÃO CENTESIMAL DE FRUTOS DE JUAZEIRO NO ESTÁDIO DE MATURAÇÃO MADURO CENTESIMAL COMPOSITION OF JUAZEIRO FRUIT AT MATURE MATURATION STAGE

RESOLUÇÃO Nº 7, DE 18 DE FEVEREIRO DE 2011(*) Dispõe sobre limites máximos tolerados (LMT) para micotoxinas em alimentos.

AVALIAÇÃO DA QUALIDADE FÍSICO-QUÍMICA E MICROBIOLÓGICA DO LEITE CRU E DO LEITE PASTEURIZADO COMERCIALIZADOS NO OESTE DE SANTA CATARINA

QUANTIFICAÇÃO DE GIBERELA NA PRÉ-COLHEITA E EM ETAPAS DO BENEFICIAMENTO DE SEMENTES DE TRIGO

APLICAÇÃO DE ÓLEOS E GORDURAS DE RELEVÂNCIA NUTRICIONAL EM PRODUTOS DE PANIFICAÇÃO. da Silva e Elisa Makiyama Kim FEA-UNICAMP

AVALIAÇÃO DA COMPOSIÇÃO FÍSICO-QUÍMICA DE BOLINHOS SEM GLÚTEN DO TIPO CUPCAKE ELABORADOS COM FARINHA DE AMARANTO E DE ARROZ

COMPOSIÇÃO QUIMICA DE FARINHAS DE DIFERENTES ESPÉCIES DE INSETOS COMO INGREDIENTE PARA RAÇÃO ANIMAL

Segurança alimentar e alimentos seguros

AVALIAÇÃO DA FRAÇÃO LIPÍDICA EM GRÃOS DE ARROZ VIA CROMATOGRAFIA GASOSA 1. INTRODUÇÃO

EFEITO DA EMBALAGEM NA QUALIDADE DE FARINHAS DE MANDIOCA TEMPERADAS DURANTE O ARMAZENAMENTO

ANÁLISE DE AFLOTOXINA EM FARELO DE MILHO. PAIVA, Maria. Victória.¹; PEREIRA, Camila. Mello.²

EFEITO DOS TRATAMENTOS TÉRMICOS SECO E ÚMIDO NOS NÍVEIS DE AFLATOXINA B 1 E OCRATOXINA A PRESENTES EM FARELO E FARINHAS CEREAIS

ADUBAÇÃO DO TRIGO VIII EXPERIÊNCIAS COM N, P, K E S EM SOLOS DE VÁRZEA DO VALE DO PARAÍBA ( 1,2 )

Ministério da Saúde - MS Agência Nacional de Vigilância Sanitária - ANVISA. (Publicada em DOU nº 37, de 22 de fevereiro de 2011)

2.1. Temperatura da massa dos grãos durante o resfriamento e o armazenamento

PROPOSTA DE PROCEDIMENTO DE SECAGEM DE BAGAÇO DE MAÇÃ PARA A PRODUÇÃO DE FARINHA

CINÉTICA DE SECAGEM DE MASSA ALIMENTÍCIA INTEGRAL. Rebeca de L. Dantas 1, Ana Paula T. Rocha 2, Gilmar Trindade 3, Gabriela dos Santos Silva 4

o objetivo deste trabalho foi calcular o nível e dano econômico

COMPOSIÇÃO FÍSICO-QUÍMICA DE SEMENTES DE CULTIVARES E LINHAGENS DE ALGODÃO HERBÁCEO.

, aflatoxinas B 1. , ocratoxina A e zearalenona em produtos de milho 1

MINISTÉRIO DA AGRICULTURA PECUÁRIA E ABASTECIMENTO INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 8, DE 2 DE JUNHO DE 2005.

Profa. Juliana Schmidt Galera

Prêmio Jovem Cientista

Ministério da Saúde - MS Agência Nacional de Vigilância Sanitária - ANVISA. (Publicada no DOU nº 37, de 22 de fevereiro de 2011)

Identificação de aflatoxinas em paçocas de amendoim comercializadas na cidade de Lavras-MG

RESOLUÇÃO Nº 7, DE 18 DE FEVEREIRO DE 2011(*) Dispõe sobre limites máximos tolerados (LMT) para micotoxinas em alimentos.

III BENEFÍCIOS DO RESFRIAMENTO EM GRÃOS DE MILHO

BIOQUÍMICA DO PESCADO

Análise bromatológica da cana-de-açúcar armazenada e hidrolisada com óxido de cálcio

ELABORAÇÃO E CARACTERIZAÇÃO DE BARRAS DE CEREAIS ELABORADAS COM RESÍDUO SÓLIDO DE CERVEJARIA

OTIMIZAÇÃO DE UMA FORMULAÇÃO ALIMENTÍCIA UTILIZANDO PROGRAMAÇÃO LINEAR VISANDO DIMINUIÇÃO DE CUSTO

3FEAGRI/UNICAMP, Campinas, SP. 4DCA/UFLA, Lavras, MG.

INFORMAÇÃO NUTRICIONAL DE BEBIDA À BASE DE EXTRATOS DE ARROZ E DE SOJA INFORMAÇÃO NUTRICIONAL DE BEBIDA À BASE DE EXTRATOS DE ARROZ E DE SOJA

DETERMINAÇÃO DE AFLATOXINAS EM SEMENTES DE AMENDOIM, ARMAZENADAS EM CONDIÇÕES AMBIENTE E EM CÂMARA FRIA 1, 2

Área de Atividade/Produto Classe de Ensaio/Descrição do Ensaio Norma e/ou Procedimento

ANÁLISE DA CONCENTRAÇÃO DE AFLATOXINA EM PASTAS DE AMENDOIM NAKANO, G. B. 1 ; TOLEDO, E. A. 2

ADIÇÃO DE FIBRA DE CÔCO MACAÚBA (Acrocomia aculeata (Jacq.) Lodd) NA PRODUÇÃO DE RICOTA

PROGRAMA DE DISCIPLINA

2. Resultados de pesquisa em grãos de canola

APOIO TÉCNICO E TECNOLÓGICO À PRODUÇÃO QUEIJEIRA ARTESANAL: PRODUTOR DE CARAMBEÍ PARANÁ.

PROPRIEDADES TECNOLÓGICAS DE PÃES PREPARADOS COM FARINHA DE ARROZ DE BAIXA AMILOSE E TRANSGLUTAMINASE

CARACTERIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO DE VARIEDADES DE SOJA (Glycine max (L.) Merril) EM PRODUTOS DE PANIFICAÇÃO

CURSO TÉCNICO DE NÍVEL MÉDIO EM AGROINDÚSTRIA. Forma Subsequente

Relação entre características de moagem de genótipos de trigo com qualidade tecnológica

DETERMINAÇÃO DE ZEARALENONA EM MILHO ARMAZENADO EM PROPRIEDADES FAMILIARES DA REGIÃO CENTRAL DE MINAS GERAIS

PROPRIEDADES FÍSICAS DOS FRUTOS DE MAMONA DURANTE A SECAGEM

AVALIAÇÃO FÍSICO-QUÍMICA DE BISCOITO ELABORADO COM RESÍDUO DE POLPA DE AMORA-PRETA (Rubus spp.) 1. INTRODUÇÃO

Relação Entre Índice De Elasticidade (Ie) E Força Da Farinha (W)

QUALIDADE DA FARINHA DE MANDIOCA COMERCIALIZADA NO MUNICÍPIO DE RIO BRANCO ACRE S. da S. Torres 2, M. T. Furtado 1,

AVALIAÇÁO BROMATOLÓGICA DE RESÍDUOS DE MANDIOCA PARA ALIMENTAÇÃO ANIMAL

Conselho da União Europeia Bruxelas, 6 de novembro de 2015 (OR. en)

QUEIJO TIPO MINAS FRESCAL COM COLÁGENO HIDROLISADO E ORÉGANO: TECNOLOGIA DE FABRICAÇÃO E AVALIAÇÃO SENSORIAL

EFFECTS OF PACKAGING AND STORAGE ON THE CASSAVA FLOUR QUALITY

DETERMINAÇÃO DE AFLATOXINAS EM AMOSTRAS DE LEITE E AMENDOIM CONSUMIDAS NA CIDADE DE BELÉM-PARÁ 1.

Avaliação da composição centesimal e dos teores de isoflavonas de cultivares de soja (Glycine max (L.) Merrill) especiais para alimentação humana

DETERMINAÇÃO DE VIDA DE PRATELEIRA DA FARINHA OBTIDA A PARTIR DAS CASCAS DE ABACAXI (Ananas comosus L. Merril)

PARÂMETROS DE QUALIDADE DA POLPA DE LARANJA

Propriedades Físicas de Grãos de Feijão Carioca (Phaseolus vulgaris)

Ocorrência de Aflatoxinas em Amendoim e Produtos Derivados

APLICAÇÃO DA FOTOCATÁLISE HETEROGÊNEA NO TRATAMENTO DE AFLATOXINA PROVENIENTE DE RESÍDUOS DE LABORATÓRIOS

Programa Analítico de Disciplina CAL471 Processamento de Cereais, Raízes e Tubérculos

As micotoxinas e a segurança alimentar na soja armazenada

Migração de Micotoxinas Durante a Parboilização do Arroz Mycotoxin Migration During the Parboiling of Rice

Transcrição:

Ocorrência de micotoxinas e características físico-químicas em farinhas comerciais 1 Ana Paula VIEIRA 2, Eliana BADIALE- FURLONG 3,*, Maria Lídia Mariano OLIVEIRA 4 RESUMO As farinhas que são freqüentemente utilizadas em preparos industriais e domésticos de alimentos, podem vir a ser um bom veículo para contaminantes de vários tipos, inclusive as micotoxinas que por ventura não sejam eliminadas durante a moagem. Com o objetivo de avaliar a qualidade das farinhas de trigo (especial, comum, integral) e farinhas de centeio comercializadas na região sul do Rio Grande do Sul, nos anos de 1995 e 1996, foram determinadas a composição química e ocorrência de micotoxinas: aflatoxina B 1, B 2, G 1, G 2 ; ocratoxina A e zearalenona. A caracterização físico-química mostrou que 27% das farinhas comercializadas como especiais

não se adequariam aos níveis recomendados pela legislação brasileira. O teste estatístico de contraste (SANEST), indicou que o conteúdo de cinzas pode explicar a presença de micotoxinas nas farinhas. As micotoxinas detectadas foram ocratoxina A e zearalenona, nos níveis de 12 e 53µg.kg -1 respectivamente. Palavras-chave: farinhas, micotoxinas, aflatoxina B 1, B 2, G 1, G 2, ocratoxina A e zearalenona. SUMMARY Ocurrence of mycotoxins and the physicochemical characteristics of commercialized flours. The flours which are often utilized in industrial and domestic preparation of provisions, might become a good vehicle for many types of contaminants, including the mycotoxins which by chance doesn't have been eliminated during the grinding. The quality assessment of wheat flours (special, common, integral) and rye flours commercialized in South zone of Rio Grande do Sul, during 1995 and 1996, was carried out, in which the chemical composition and ocurrence of mycotoxins: aflatoxin B 1, B 2, G 1, G 2 ; ochratoxin A and zearalenone were determined.the physicochemical characterisation showed that 70% of specials traded flours were found above the levels recommended by the Brazilian legislation. By

using the SANEST statistical treatment, it was demonstrated (found) a correlation between the ash content and the presence of mycotoxins in flours. The detected mycotoxins were ochratoxin A and zearalenone, in 12 and 53µg.kg -1 respectively. Keywords: flour, mycotoxins, aflatoxin B 1, B 2, G 1, G 2, ochratoxin A, zearalenone. 1 INTRODUÇÃO As farinhas de trigo utilizadas freqüentemente em preparos industriais e domésticos podem servir de veículo para contaminantes de vários tipos, inclusive de micotoxinas [21]. A qualidade das farinhas pode ser avaliada considerando diversas características mensuráveis como umidade, matéria mineral, lipídios e proteínas, que podem ser indicadores de identidade dos tipos de farinha disponíveis no comércio [9, 22]. Estas propriedades refletem o efeito do beneficiamento e podem ser empregadas para avaliar a qualidade tecnológica ou nutricional do produto [11]. A umidade e a temperatura são dois fatores críticos para o crescimento de fungos e produção de micotoxinas. Fatores geográficos, susceptibilidade da variedade do grão, condições de armazenamento também interferem na produção de metabolitos fúngicos, que podem ser mais de um tipo simultaneamente [8, 26]. No Brasil, dados sobre contaminação fúngica são suficientemente abundantes para se acreditar na incidência de toxinas, pois além da presença dos microrganismos, relatados

na literatura, as condições abióticas da região propiciam a produção de toxinas fúngicas. O processamento e o armazenamento de grãos podem alterar a microbiota, porém as micotoxinas permanecem no produto e podem estar relacionadas com outros fatores abióticos dos quais foi exposto o produto [4,17, 18]. Especificamente no Rio Grande do Sul, as avaliações de rações e grãos para consumo animal vêm demonstrando a incidência de aflatoxinas, ocratoxina e zearalenona [25]. No entanto, dados de produtos para consumo humano são escassos, principalmente no caso de derivados de trigo. O presente trabalho teve como objetivo avaliar a qualidade da farinha de trigo (especial, comum e integral) e farinha de centeio da região sul do RS, através da determinação de composição química, de ocorrência de micotoxinas: aflatoxinas B 1, B 2, G 1, G 2, ocratoxina A e zearalenona e, avaliar uma possível correlação entre as características fisico-químicas e a incidência de micotoxinas. 2 MATERIAIS E MÉTODOS 2.1 Amostras Foram realizadas amostragens, nos anos de 1995 e 1996, em estabelecimentos comerciais das cidades de Pelotas e Rio Grande no Estado do Rio Grande do Sul. Durante a coleta foi observado que se tomassem quantidades representativas das marcas mais freqüentes no comércio local. Para constituir os lotes, foram coletadas alternativamente, embalagens de farinhas de diferentes estabelecimentos, de modo a formar 54 lotes de 1Kg de farinhas comerciais, pertencentes a 17 moinhos regionais. 2.2 Composição Química Por se tratar de derivados de cereais foram realizadas

determinações dos teores de: umidade em estufa a 105ºC até peso constante; cinzas por incineração em mufla a 550ºC; proteínas pelo método de microkjeldahl e extrato etéreo, segundo a AMERICAN ASSOCIATION OF CEREAL CHEMISTS [2]. 2.3 Ocorrência de Micotoxinas A ocorrência de micotoxinas (aflatoxinas B 1, B 2, G 1, G 2 ; ocratoxina A; zearalenona) foi avaliada pelo multimétodo de cromatografia de camada delgada proposto por SOARES [26]. A confirmação para aflatoxinas foi realizada segundo PRZYBYLSKI [24]; para ocratoxina A de acordo com HUNT et al. [16] e zearalenona segundo GOLINSKI & GRABARKIEWICZ-SZCZENA [14]. 2.4 Análise Estatística As análises foram realizadas pelo sistema do programa SANEST [29]. Foi escolhida a análise de contraste porque é capaz de analisar as médias dos tratamentos de um experimento segundo GOMES [15]. 3 RESULTADOS E DISCUSSÃO 3.1 Amostragem Durante a coleta das amostras pode se verificar o grande número de moinhos que atuam com seus produtos no comércio local. Dos 54 lotes avaliados, mais de 50% são de marcas provenientes de moinhos de maior porte, as demais, são provenientes de moinhos menores que possuem no máximo duas ou três marcas diferentes. No levantamento foram também consideradas farinhas de trigo integral e centeio, pois vem sendo observada uma tendência a empregá-las associadas às de trigo especial para melhorar a qualidade da dieta através de alimentos ricos em fibra [9, 28].

Também foi observado que as farinhas comercializadas como especiais são as mais predominantes no mercado, correspondendo a 80% do total das amostras analisadas. 3.2 Composição Química das Farinhas Na Tabela 1 encontram-se os valores de composição química, agrupados em 14 marcas diferentes, cujas médias foram comparadas pelo teste de Duncan (α=0,05). A umidade média (Tabela 1), de todas as amostras foi de 13,29%, portanto de acordo com a legislação brasileira que estipula 15% de umidade para farinhas comerciais [7]. A

observação desse limite, normalmente assegura a conservação da qualidade das farinhas durante a estocagem comercial [9]. Quanto aos teores de cinzas, a marca H apresentou a maior média (1,94%), não apresentando diferenças significativas das marcas G e I. Estes teores mais elevados já eram esperados, uma vez que pertencem à farinhas tipificadas (adicionadas de fermento, vitaminas), centeio e integral, cujos valores estão de acordo com a Portaria 354 do Ministério da Saúde [7]. As demais marcas pertencem à farinhas comercializadas como especial, e apresentaram valores de 0,34 a 0,77% de cinzas. Esta variação pode indicar um alto grau de extração, o que pode provocar diferenças na qualidade tecnológica das farinhas de um mesmo tipo de trigo. Além disto o moleiro mistura várias frações de farinhas, com diferentes teores de cinzas, para obter uma mistura final que deve atender às necessidades dos produtos industriais e domésticos [12, 13]. De acordo com a legislação brasileira, as farinhas com teores de cinzas acima de 0,65 não poderiam se encaixar na categoria de especiais, no caso presente, 27% estão com teores superiores ao mencionado. Foi observado ainda, uma correlação inversa entre os parâmetros umidade e cinzas demonstrado pela Figura 1. Esta correlação é esperada e pode ser devido ao processo de umedecimento do grão de trigo, anterior à moagem, permitindo a penetração da umidade no interior do grão, facilitando a separação do farelo durante as etapas de moagem, com conseqüente diminuição dos teores de matéria mineral [9, 12, 13].

Para o conteúdo de proteínas não foram observadas diferenças significativas entre as amostras, ao nível de 5% de probabilidade. Os teores médios desta fração foram de 12,90%, indicando que as farinhas são, possivelmente, provenientes de trigos tipo mole, com características tecnológicas mais adequadas para produção de bolachas e "crackers" [12, 22, 23]. Esta característica também já esperada, uma vez que, o Brasil não é produtor de trigo do tipo durum. Quanto ao teor de extrato etéreo a amostra I apresentou maior média (1,96%), diferindo significativamente das demais amostras, pois tratava-se de farinha do tipo integral. O extrato etéreo das demais amostras apresentaram valores menores que os 2% citados na literatura [3, 7]. Estes valores podem ser explicados, pela dependência do solvente usado, da variedade do grão e das condições ambientais. Também pode ser um dado interessante quando se considera a diminuição da possibilidade de ocorrência de rancidez [3,12].

3.2 Ocorrência de Micotoxinas A avaliação da qualidade, em termos de contaminação dos produtos por micotoxinas destaca-se como um fator de grande importância em saúde pública pelo risco que realmente apresenta o consumo dos alimentos por elas contaminados [10]. A Tabela 2 apresenta os resultados do levantamento da ocorrência de micotoxinas (aflatoxinas B 1, B 2, G 1, G 2 ; ocratoxina A e zearalenona) nas farinhas amostradas. Das amostras suspeitas de ocratoxina A, 6% estavam confirmadamente contaminadas e pertenciam às farinhas do tipo especial. Em uma das amostras ocorreu co-contaminação com zearalenona. No entanto, os níveis detectados são inferiores aos limites sugeridos pela legislação brasileira para outros produtos, que não farinhas (50 e 200 µg.kg -1, respectivamente) [6].

A baixa ocorrência de micotoxinas observada vem sendo anteriormente relatada em outros levantamentos realizados, no entanto, é bastante característica a detecção de ocratoxina A, pois, em 1995, BADIALE-FURLONG et al. [5], detectaram esta micotoxina em trigo (40 µg. Kg -1 ) comercializado na zona sul do Rio Grande do Sul. No caso presente as farinhas especiais e de centeio apareceram contaminadas, o que leva a crer que o nível de contaminação no grão poderia ter sido maior, pois muitos trabalhos vêm acompanhando o efeito do beneficiamento nos níveis de contaminação. ALDRICK [1] e OSBORNE et al. [20] mostraram que o polimento (remoção da camada de pericarpo), anterior à moagem, apresentou melhores resultados quando aplicados em trigo para remoção de ocratoxina A. Chelkowski et al. apud ALDRICK [1], contrariando estas observações, demonstraram que a ocratoxina A não é removida do trigo durante a rotina de limpeza anterior a moagem, sendo igualmente distribuída na farinha e farelo durante o processo de moagem do trigo. Avaliou-se a possível relação entre a ocorrência de micotoxinas e a composição química através de análise de contraste [29]. A Tabela 3 mostra os dados da análise de contraste, realizada para se comparar as médias das amostras contaminadas e não contaminadas, dentro de cada marca (C, D,G, H)

Os contrastes estudados entre as amostras contaminadas e não contaminadas foram os seguintes: - C 1 = 3 X * 4 - (X 1 +X 2 +X 3 ), para as amostras da marca C; - C 2 = 3 X 8 - (X 5 +X 6 +X 7 ), para a amostras da marca D; - C 3 = X 10 - X 9, para a amostras da marca H; - C 4 = 3 X 14 - (X 11 +x 12 +X 13 ), para a amostras da marca G; - C 5 = 10 (X 4 +X 8 +X 10 +X 14 ) - 4 (X 1 +X 2 +X 3 +X 5 +X 6 +X 7 +X 9 + +X 11 +x 12 +X 13 ), para todas as marcas. * X = Média dos contrastes - que corresponde a média para as propriedades físico-químicas nas amostras contaminadas A variável umidade para os contrastes C 1, C 3, C 4 e C 5 foi maior para as amostras contaminadas, em relação às não contaminadas, ou seja, a umidade está relacionada com a presença de micotoxinas nestas amostras, conforme já era esperado [1, 4, 19]. A ocorrência de micotoxinas nas amostras mais úmidas pode ter sido favorecida por umidades relativas altas, baixas temperaturas e alta precipitação pluviométrica, que possivelmente propiciaram um sistema adequado para a micota manifestar seu potencial toxigênico. A literatura menciona que a contaminação fúngica e

consequentemente a produção de micotoxinas ocorre, mais frequentemente nas porções mais externas do grãos, portanto uma maior extração para obtenção das farinhas aumentaria a possibilidade de contaminação destas (Badiale-Furlong, 4). No caso deste trabalho, foi observado que o teor de cinzas, para os contrastes C 1, C 2, C 3 e C 5, também apresentaram valores médios maiores para as amostras contaminadas em relação às não contaminadas, indicando que o conteúdo de cinzas pode explicar a presença de micotoxinas nas farinhas. Observa-se ainda, que, a variável proteína neste caso não está relacionada com a contaminação das amostras. Os resultados sugerem que os teores de umidade e cinza poderiam se associados, resultar num modelo matemático preditório da ocorrência de micotoxinas, desde que, uma amostragem maior fosse realizada. 4 CONCLUSÕES Os resultados obtidos neste trabalho, permitem concluir que: (1) quanto à composição química, o teor de cinzas apresentou maior variação; (2) 27% das farinhas comercializadas como especial não atendem aos requisitos de composição para o tipo especificado; (3) o conteúdo de ocratoxina A (12µg.kg -1 ) e zearalenona (26µg.kg -1 ) em farinhas dos tipos centeio, especial e tipificadas são inferiores aos limites sugeridos pela legislação para outros produtos; (4) os teores de umidade e cinzas podem estar relacionados com a ocorrência de micotoxinas. 5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS [1] ALLDRICK, A. J. The effects of processing on the occurrence of ochratoxin A in cereals. Food Additives and Contaminants. v. 13; Suplement; p. 27-28, 1996. [2] AMERICAN ASSOCIATION OF CEREAL CHEMISTS -

Aproved Methods of Analysis, 8ª ed., St. Paul, Minisota, American Ass. of Chemistry, 1983. [3] ARAÚJO, W. M. C. & CIACCO, C. F. Funcionalidade dos lipídios da farinha de trigo na panificação. Ciência e Tecnologia de Alimentos, v. 12, n. 1, p. 3-13, 1992. [4] BADIALE-FURLONG, E. Tricotecenos em trigo: um estudo de metodologia analítica, incidência, contaminação simultânea por outras micotoxinas e de alguns fatores que influem na produção no campo. Campinas, 1992, 120p. Tese (Doutorado em Ciência dos Alimentos). Faculdade de Engenharia de Alimentos. Universidade, Estadual de Campinas (UNICAMP). [5] BADIALE-FURLONG, E.; VALENTE SOARES, L.; LASCA, C. C.; KOHARA, E. Y. Mycotoxin and fungi in wheat stored in elevators in State of Rio Grande do Sul, Brazil. Food Additives and Contaminants, v. 12, n. 5, p. 683-688, 1995. [6] BRASIL. Leis, decretos, etc. Ministério da Agricultura. Portaria nº 183, de 21 de março de 1996. Diário Oficial da União, Brasília, 25 de março de 1996. Art. 1. Adotar Regulamento Técnico MERCOSUL sobre Limites Máximos de Aflatoxinas Admissíveis no Leite, Amendoim e Milho, Aprovado pela Resolução do Grupo Mercado Comum do Sul nº 56/94, de 01 de janeiro de 1995. [7] BRASIL. Leis, decretos, etc. Ministério da Agricultura. Portaria nº 354, de 18 de julho de 1998. Diário Oficial da União, Brasília, que aprova Norma Técnica referente à farinha de trigo, identidade e caracterização mínima da qualidade. [8] BULLERMAN, L. B.; SCHOEREDER, L. L. & PARK, K. Y. Formation and control of mycotoxins in food. Journal of Food Protection, v. 47, n. 8, p. 637-646, 1984. [9] CIACCO, C. F. & CHANG, Y. K. Tecnologia de massas

alimentícias. São Paulo: Ícone, 1986, 127p. [10] COLAÇO, W.; FERRAZ, U.; ALBUQUERQUE, L. R. Incidência de aflatoxinas em amendoim e produtos derivados consumidos na cidade de Recife, no período de 1989 a 1991. Rev. Inst. Adolfo Lutz, v. 54, n. 1, p. 1-4, 1994. [ Lilacs ] [11] DUTCOSKY, S. D. Desenvolvimento de tecnologia de fabricação de biscoitos e massas alimentícias isentos de glúten a partir da farinha de arroz. Curitiba, 1995. 158p. Dissertação (Mestre em Tecnologia Química) - Universidade Federal do Paraná. [12] EL-DASH, A. A.; CAMARGO, C. O. & DIAZ, N. M. Fundamentos da tecnologia de panificação. São Paulo, Coordenadoria da Indústria e Comércio, 1982, 351p. (Tecnologia agroindustrial, 6). [13] ELIASSON, A. - C. & LARSON, K. Cereals in breadmaking: a molecular colloidal approach. New York, Marcel Dekker, Inc. 1993, 374p. [14] GOLINSKI, P. & GRAPARKIEWICZ-SZCZENA, J. Chemical confirmatory tests for ochratoxin A, citrinin, penicillic acid, sterigmatocystin and zearalenone performed directly on thin layer chromatographic plates. Journal of the Association of Official Analitycal Chemists, v. 67, n. 6, p. 1108-1110, 1984. [ Medline ] [15] GOMES, F. P. Curso de estatística experimental. Piracicaba, 1990. [16] HUNT, D. C.; McCONNIE, B. R. & CROSBY, N. T. Confirmation of ochratoxin A by chemical derivatization and high performance liquid chromatography. Analyst, v. 105, p. 89-90, 1980. [17] LÁZZARI, F. A. Umidade, fungos e micotoxinas na

qualidade de sementes, grãos e rações. Curitiba, Ed. do Autor, 1993, 140p. [18] MANFRON, P. A.; LAZZAROTTO, C. & MEDEIROS, S. L. P. Trigo: aspectos agrometeorológicos. Rev. Ciência Rural, v. 23, n. 2, p. 233-239, Santa Maria, 1993. [19] MAROCHI, M. A. & SOARES, L. M. V. Metodologia para determinação de tricotecenos e zearalenona em grãos. Bol. SBCTA, v. 27, n. 1, p. 1-8, 1993. [20] OSBORNE, B. G.; IBE, F.; BROWN, G. L.; PETAGINE, F.; SCUDAMORE, K. A.; BANKS, J. N.; HETMANSKI, M. T. and LEONARD, C. T. The effects of milling and processing on wheat contaminated with ochratoxin A. Food Additives and Contaminants. v. 13; n. 2; p. 141-153; 1996. [ Medline ] [21] PEREIRA, M. L. & CHANG, Y. K. Contaminantes do trigo e farinha e medidas de sanitização na indústria de moagem e panificação. Higiene Alimentar, v. 7, n. 26, p. 20-29, 1993. [ Lilacs ] [22] PIZZINATTO, A.; MAGNO, C. P. R. S. & CAMPAGNOLLI, D. M. F. Avaliação e controle de qualidade da farinha de trigo. Instituto de Tecnologia de Alimentos - ITAL, Centro de Pesquisa e Tecnologia de Cereais - CEPEC, Campinas, p. 67, 1996. [23] PRATT JR., D. B. Criteria of flour quality. In: POMERANZ, Y. Wheat Chemistry and Technology. Minnesota: American Assossiation of Cereal chemists, p. 201-226, 1978. [24] PRZYBYLSKI, W. Formation of aflatoxin derivatives on thin layer chromatographic plates. J. Assoc. Off. Anal. Chem., v: 58, p. 163-164, 1975.

[25] SANTURIO, J. M.; BALDISSERA, M. A. & ALMEIDA, S. H. E. Aflatoxinas, ocratoxina A e zearalenona em grãos e rações destinadas ao consumo animal no Sul do Brasil. In: Anais do VII Encontro Nacional de Micotoxinas, São Paulo, p. 14, 1992. [26] SOARES, L. M. V. Micotoxinas: um método para análise simultânea e incidência em alimentos comercializados na região de Campinas - São Paulo. Campinas, 1987. (Tese Doutorado). Faculdade de Engenharia de Alimentos. Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). [27] SOARES, L. M. V. & FURLANI, R. P. Z. Survey of mycotoxins in wheat and wheat products sold in health food store of the city of Campinas, state of São Paulo. Rev. Microbiol., v. 27, n.1, p. 41-44, 1996. [ Lilacs ] [28] ZHANG, D. & MOORE, W. R. Effect of Wheat Bran Particle Size on Dough Rheological Properties. J. Sci. Food Agric. v. 74; p. 490-496; 1997 [29] ZONTA, E. P.; MACHADO, A. A. Sistema de análise estatística para microcomputadores - SANEST. Pelotas, RS, 1984. 1 Recebido para publicação em 11/09/98. Aceito para publicação em 17/05/99. 2 Profª Departamento Ciência dos Alimentos UFPel/RS Campus Universitário (Fone: 0532-757232). 3 Profª Departamento de Química FURG/RS (Fone: 0532-311900/R 147). 4 Engenharia de Alimentos. * A quem a correspondência deve ser enviada.