Jornalismo Comunitário: Ferramenta Social x Influência Social Uma Pesquisa de Campo e de Conceitos 1



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Transcrição:

Jornalismo Comunitário: Ferramenta Social x Influência Social Uma Pesquisa de Campo e de Conceitos 1 Ana Paula Navarrete Munhoz da CUNHA 2 Angelo Sottovia ARANHA 3 UNESP, Bauru, SP RESUMO Hoje em dia o Jornalismo Comunitário é visto como o primo pobre do Jornalismo Especializado. Porém, mesmo sendo pouco estudado e praticado, esse tipo de jornalismo é ainda um precioso instrumento de mobilização social. Esta pesquisa propõe analisar como os jornais estão inseridos na comunidade atualmente, além de relatar se o jornal exerce influência nos bairros distribuídos e como essa influência é percebida. O intuito é discutir se mesmo com o advento das novas tecnologias no ramo editorial, o jornalismo comunitário ainda é um instrumento de mobilização nos bairros em que são produzidos e distribuídos. Os jornais analisados são de duas comunidades da cidade de Bauru, sendo eles: o Jornal do Ferradura, na comunidade Ferradura Mirim, e o Jornal Comunitário Voz do Nicéia, da comunidade Jardim Nicéia. As duas comunidades estão à margem da sociedade e são consideradas favelas, de acordo com os critérios de análise do Observatório de Favelas, organização social de pesquisa, consultoria e ação pública dedicada à produção do conhecimento e de proposições políticas sobre as favelas e fenômenos urbanos PALAVRAS-CHAVE: Jornalismo Comunitário, Jornalismo Social, Ferramenta Social, Influência Social TEXTO DO TRABALHO Esta pesquisa de iniciação científica propõe uma análise destinada ao jornalismo comunitário, com o objetivo de levantar dados e questionar se a modalidade exerce a função de ser uma ferramenta social e se ele é elemento influenciador do meio em que é distribuído. De acordo com Beatriz Dornelles (2004), os primeiros relatos de jornalismo comunitário foram encontrados na capital de São Paulo. Segundo ela, no dia primeiro de 1 Trabalho resultado de projeto de iniciação científica financiada pela agência FAPESP- apresentado na Divisão Temática Jornalismo, da Intercom Júnior IX Jornada de Iniciação Científica em Comunicação, evento componente do XXXVI Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação 2 Estudante de Graduação 9º. semestre do Curso de Jornalismo da FAAC-UNESP, email: anap.navarrete@gmail.com 3 Orientador do trabalho. Professor do Curso de Jornalismo da FAAC-UNESP, email: sottovia@faac.unesp.br 1

setembro de 1895, circulou, provavelmente, o que seria o primeiro jornal comunitário do país, o Braz. A Associação de Jornais e Revistas de Bairro do Estado de São Paulo (AJORB), afirma que "O Braz" foi editado pelo então Coronel Albino Bairão e inicialmente os jornais retratavam as sociedades de amigos do bairro, as lutas por independência política e eram extremamente engajados em ideologias, exteriorizando suas preferências por candidatos ou programas do governo. Dornelles ainda afirma que, a filosofia editorial do jornal deve ser comunitária, ou seja, as matérias produzidas para o jornal devem atender aos anseios e reivindicações da comunidade que, dentro do possível, determinará quais as notícias que devem ser divulgadas pelo jornal, desde que não atendam nenhum interesse pessoal ou partidário. O diretor/ou jornalista do periódico deve, também, participar ativamente de todas as atividades promovidas pela comunidade, ajudando a buscar soluções da forma como se fizer necessária" (DORNELLES, 2004). Isso começa a acontecer mais intensamente após 1930, quando os jornais passaram a ser mais voltados para os problemas da comunidade. Porém com a chegada da ditadura militar ele volta a assumir um papel de cunho mais ideológico e partidarista. Hoje em dia, cada jornal tem seu perfil e linha editorial, mas todos têm em comum o fato de serem, ou tentarem ser, porta-vozes das suas comunidades e por isso é tão importante o jornalismo comunitário para uma sociedade em que as informações são tão concentradas em grandes centros, e em grandes empresas de comunicação. O jornal comunitário é muito mais do que um órgão de informação; é um instrumento de mobilização. É ele que vai estabelecer a verdadeira comunicação entre os membros da comunidade, o debate de seus problemas e a participação de todos nas soluções a serem dadas (CALLADO, 1986). Por esses e outros motivos, prova-se o quão importante é a atuação do jornalismo comunitário, pois é como exercer, indiretamente, influência sobre as mudanças que irão ou não acontecer na comunidade em que ele é distribuído. Para Marcondes Filho, autor de "Quem Manipula Quem?", o jornalismo comunitário ajuda na socialização do individuo, diferentemente dos jornais da grande imprensa. Para ele, "este tipo de jornalismo traz a humanização e a realização do sujeito como um indivíduo importante e não somente mais um, sendo esse um espaço da realização individual que já não é mais possível na sociedade que tende a cada vez mais nivelar as pessoas deixando-as na generalidade" (MARCONDES, 1 987). 2

Em vista disso, mesmo com as grandes evoluções tecnológicas no ramo editorial, que encaminham o jornalismo de grande porte para outras vertentes, o jornalismo comunitário continua sendo importante porque o convívio social, em comunidade, continua primordial para o ser humano se estabelecer como indivíduo atuante e inserido na comunidade em que vive. Por este motivo esta pesquisa será tão importante: Ela ajudará a mostrar a importância que os periódicos de bairro têm para os moradores e seus respectivos grupos sociais. Mesmo que eles tenham outras fontes de informação como a internet, a televisão e até mesmo o rádio, o jornal comunitário é que o aproxima dos assuntos locais, enquanto a grande mídia explora apenas assuntos que estão, muitas vezes, distantes da realidade desses moradores. O Jornalismo Comunitário é tão importante quanto qualquer outro tipo de jornalismo. No entanto, tem ficado em segundo plano e é conhecido como o 'primo pobre'; é pouco estudado, comentado e vivenciado. O autor Marco Morel acredita que: "apesar de ser pouco valorizado (como as favelas e seus moradores também o são) ele é importante na medida em que, ao mesmo tempo, luta e registra a caminhada de significativos setores das classes trabalhadoras urbanas. É um jornalismo que, apesar das dificuldades e limitações, é parte importante da História do povo..." (MOREL, 1986). Ainda em seu livro "Jornalismo Popular nas Favelas Cariocas", Morel afirma a importância do jornal comunitário atuante, porque se for aceito e bem praticado o jornal comunitário pode modificar a realidade dos moradores, além de ser um retrato da comunidade. "A iniciativa de construir uma imprensa de favelas é importante para a construção da identidade dos movimentos sociais" e "na verdade - o jornalismo das favelas deve fazer a grande tarefa coletiva que é recontar (passado) e também construir (presente e futuro) a História das favelas" (MOREL, 1986). Por isso é tão importante estudar o Jornalismo Comunitário e sua influência exercida em uma comunidade, e investir em pesquisas como esta. O Jornalismo Comunitário é um agente provedor de iniciativas, ideias e mudanças. 1.1 Jornal Do Ferradura E Jornal Voz Do Nicéia O "Jornal do Ferradura" e o jornal "Voz do Nicéia" são periódicos resultantes de (o jornal é resultado de dois projetos de Extensão da FAAC - Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação da UNESP - Bauru. Ambos os projetos são orientados por um professor responsável. Os dois projetos contam com bolsas de Extensão Universitária devido ao seu cunho social e educativo e são realizados em duas comunidades marginalizadas da cidade 3

de Bauru, no interior de São Paulo. Os dois jornais, além de serem distribuídos de casa em casa na própria comunidade, são também distribuídos em órgãos públicos como a câmara dos vereadores, prefeitura, gabinetes de políticos, ONGS e na própria comunidade acadêmica (UNESP) com a finalidade de ser o catalisador social, que leva os problemas da comunidade aos órgãos que podem oferecer as respostas para as perguntas e as soluções para esses problemas. Imagem 1: Foto De João Paulo Monteiro - Equipe Voz Do Nicéia De acordo com o coordenador dos projetos, a ideia sempre foi produzir um jornal comunitário que fosse realmente a 'voz' dos moradores do bairro. Além de ferramenta social, os jornais buscam sempre apresentar conteúdos críticos, apartidários, que levantem questões relativas a problemas comuns dos moradores, não sejam doutrinários, sejam imparciais e, ao mesmo tempo, fomentador de ideias e soluções para os problemas relatados no bairro. Os dois jornais são bimestrais, com tiragem de 1000 exemplares em cada edição, em preto e branco, formato tablóide. Geralmente as edições veiculam duas matérias frias; uma matéria principal; um quadro cuja função é divulgar os trabalhos da comunidade, como fotos, redações, poesias; um quadro no qual um profissional de determinada área analisa e responde questões que sejam de interesse comum do bairro geralmente perguntas ligadas a questões jurídicas, e de saúde; seção de classificados; e uma seção em que os moradores 4

dão a sua opinião sobre algum tema sugerido pelo jornal, como por exemplo: eleições, Copa do Mundo, Olimpíadas, etc. Imagem 2: Foto De Helena Schiavoni - Equipe Voz Do Nicéia 1.2. Jardim Nicéia e Ferradura Mirim A comunidade do Jardim Nicéia originou-se em pleno governo militar, tendo seus arredores completamente preenchidos por condomínios fechados, repletos de câmeras, cercas de arame farpado e vigilância 24 horas. De acordo com a pesquisadora Fernanda Corghi (2008) em sua tese de mestrado "Urbanização e segregação socio-espacial em Bauru": "(...) a área estudada chama a atenção por apresentar uma complexa fragmentação territorial "onde uma relativa concentração de condomínios fechados se dá em meio a um assentamento de baixa renda não regularizado (...). A ocupação irregular,denominada Jardim Nicéia, teve origem durante o governo militar (1964-1988), governo que busca desenvolver o capitalismo, porém não investe em política social. O processo de favelização surgiu como sintoma de parte dos migrantes que não tinha condição de financiar uma casa pelo sistema de financiamento da habitação e invadiu áreas institucionais. O Nicéia se enquadra nesse processo e, atualmente, se encontra em contraste fronteiriço e temporal aos loteamentos fechados que surgiram depois da década de 90 (...)" (CORGHI,2008). Hoje em dia uma parcela dos moradores luta para conseguir a posse legal de suas terras por meio de um processo de usucapião e a comunidade foi inserida no Programa "Cidade Legal". Este programa é de responsabilidade do Governo do Estado de São Paulo e, de 5

acordo com o site institucional Cidade Legal, tem o objetivo de implementar, agilizar e desburocratizar as ações e os processos de regularizações fundiárias de núcleos habitacionais. Por meio do programa, a Secretaria de Estado da Habitação, através de um Convênio de Cooperação Técnica, oferece orientação e apoio técnico às prefeituras para a regularização de parcelamentos do solo e de núcleos habitacionais, públicos ou privados, para fins residenciais, localizados em área urbana ou de expansão urbana". O bairro conta com cerca de 1000 moradores. As moradias são precárias, as redes de esgoto, água e energia elétrica chegam até a comunidade e as contas também, porém em uma parte do bairro somente a água chega. Ligações improvisadas, denominadas popularmente de "gatos" são muito comuns. Não há nenhuma escola no bairro, apenas uma creche para crianças de até 5 anos. Não há nenhum hospital ou posto de saúde próximo ao bairro. O ponto de ônibus é improvisado, sem cobertura ou qualquer indicação de que ali seja um ponto de ônibus. Há apenas uma árvore grande que fica na frente de uma casa, onde os moradores esperam, de hora em hora, os ônibus da única linha que chega ao bairro. Há um pequeno mercadinho. E muitos indícios de jovens e adultos usuários de drogas. Imagem 3: Foto De João Paulo Monteiro - Equipe Voz Do Nicéia O esgoto fica a céu aberto e as crianças brincam em uma tubulação da obra de Galeria de Águas Pluviais que está parada. Não há nenhuma sede de Centro Comunitário ou 6

Associação de Moradores, porém, a Associação existe e suas reuniões são realizadas na casa dos líderes comunitários. O jornal passou a ser veiculado regularmente a partir do começo do ano 2009. De acordo com a equipe do jornal, os moradores são muito solícitos e participam ativamente de toda a produção do jornal, desde a elaboração de pautas até a sua distribuição de casa em casa. Imagem 5: Foto De Camila Mello - Equipe Jornal Do Ferradura O bairro Ferradura Mirim é considerado a maior favela de Bauru. Com aproximadamente 5 mil moradores, de acordo com a Secretaria de Planejamento da cidade de Bauru - a SEPLAN- os moradores estão vivendo em terrenos que ainda não foram regularizados. Para o autor do artigo "Educação comunitária: promovendo a construção da cidadania no bairro Ferradura Mirim", Antonio Francisco Marques, o bairro passou a ser ocupado desde a década de 1980 (...) [e] os moradores não possuem documentos que comprovem a posse dos lotes ocupados. Já existem casas de alvenaria, mas a predominância ainda é de barracos, as ruas não possuem asfalto e, nos dias de chuva, ficam intransitáveis para automóveis, até mesmo para a empresa de transportes coletivos que atende o bairro, obrigando os moradores a transitarem a pé até as áreas de asfalto das imediações para poderem tomar o ônibus e seguir para os seus compromissos (empregos, escolas)". (MARQUES, 2009) 7

Imagem 6: Foto De Helena Schiavoni- Equipe Voz Do Nicéia O autor afirma que a maioria dos moradores vivia em áreas rurais de vários estados do país. O acesso a educação é prejudicado pela falta de infraestrutura e transporte. Marques afirma que a totalidade dessa população é formada por adultos e jovens, "empregados em trabalhos de pouca ou nenhuma qualificação, na maioria das vezes sem carteira assinada, de subempregados ou desempregados, que sobrevivem de atividades informais e donativos, consequentemente, não possuem qualificação profissional e têm baixo nível de escolaridade. O quadro de marginalidade social a que estão submetidos constitui-se um dos fatores que geram alcoolismo, tráfico e consumo de drogas, violência, prostituição e demais decorrências típicas da precariedade de vida dessas famílias" (MARQUES, 2009). O bairro também está incluído no projeto "Cidade Legal" e já conseguiu com a ajuda de ONG s e apoio do poder público, uma biblioteca, o asfaltamento dos arredores do bairro e o emplacamento das casas. 2. Objetivos: 2.1 Objetivos Gerais Identificar se o jornal exerce influência na comunidade em que é veiculado. E, se existir, de que maneira é apresentada e quais as consequências dessa influência para os moradores da comunidade e para os responsáveis que produzem o jornal. 8

2.2 Objetivos Específicos 1- Como os jornais são fruto de projetos de Extensão Universitária, um dos objetivos específicos é estender e praticar profundamente a tríplice acadêmica: Ensino, Pesquisa e Extensão; 2- Pesquisar o atual panorama do Jornalismo Comunitário e coletar dados importantes sobre a produção de jornais populares e\ou comunitários no interior do estado de São Paulo; 3- Analisar a linha editorial e traçar padrões e diferenças entre os jornais estudados. 4- Analisar de que maneira a Ética e a Deontologia são aplicadas nos jornais estudados e se os próprios jornais não são influenciados por alguém/alguma instituição; 5- Pesquisar profundamente o conceito de Jornalismo Comunitário e, a partir das análises qualitativas e quantitativas que esta pesquisa alcançar, questionar se o conceito está sendo exercitado em sua totalidade. Se não, apresentar propostas que levem a um novo conceito de Jornalismo Comunitário; 6- Elaborar uma pesquisa que seja inovadora e que abra as portas para o campo, visto que a área de Jornalismo Comunitário é pouco estudada em nosso país; 7- Apresentar os resultados da pesquisa em Congressos, Jornadas, Fóruns e outros eventos acadêmicos. 3 Metodologia 1. Será feita uma pesquisa bibliográfica sobre os temas: jornalismo comunitário, influência social, ferramenta social, jornalismo popular, favelização, movimentos sociais; 2. A pesquisadora frequentará os bairros Jardim Nicéia e Ferradura Mirim para conhecer amplamente os problemas locais, as pessoas que residem nesses núcleos e suas lideranças. A partir disso selecionará as pessoas que irão responder o questionário. A pesquisadora buscará, também, acompanhar o trabalho das equipes de ambos os jornais para certificar como é o processo de criação das edições dos jornais veiculados nos bairros e órgãos públicos; 3. Após a fase de reconhecimento e seleção dos moradores, a pesquisadora irá elaborar um questionário que vise mostrar claramente a impressão que os moradores dos bairros têm de seus respectivos jornais, se eles são efetivamente reconhecidos nas comunidades estudadas 9

e como os jornais atuam nos bairros. O questionário deve conter no máximo três páginas. Estão previstos também a elaboração de elementos de identificação e carta de consentimento, e serão explicadas, no ato do questionário, as instruções, métodos e objetivos da pesquisa; 4. O questionário será elaborado tomando as seguintes precauções: questões abertas e fechadas. Quanto às fechadas, elas serão objetivas e diretas, com linguagem clara e simples. Priorizando respostas diretas (tricotômicas: Sim, não, não sabe. Hierarquizadas: frequentemente, ocasionalmente, nunca) e que não deixem o entrevistado em dúvida. A escolha é justificada pelo fato da comunidade contar com grande índice de analfabetismo. Questões mais elaboradas poderiam prejudicar a interpretação e o andamento da pesquisa. 5. Serão selecionados 50 moradores de cada bairro, 100 moradores no total. O questionário será aplicado pessoalmente em visita à casa do morador; 6. O questionário será recolhido, analisado e tabulado. 7. Por fim, os resultados serão analisados quantitativamente e qualitativamente para a elaboração do relatório final; 4 Cronograma Realizaremos as seguintes etapas durante a pesquisa: 1. Mês 1 e 2: Levantamento bibliográfico e elaboração dos questionários que serão respondidos pelos moradores dos bairros em que o Voz do Nicéia e Jornal do Ferradura são distribuídos. 2. Mês 3 e 4: Seleção dos participantes que vão responder ao questionário através de entrevistas. Aplicação do questionário. 3. Mês 5 e 6: Análise e interpretação dos dados coletados. 4. Mês 7 a 12: Apresentação da pesquisa preliminar em forma de artigo científico em congressos, simpósios, fóruns e outros eventos acadêmicos e produção do TCC - trabalho de conclusão de curso utilizando a pesquisa como base. 6. Mês 12: Revisão e entrega. 10

Atualmente a pesquisa está em fase de análise e interpretação dos dados coletados nos questionários. 5 Formas De Análises Dos Resultados 1. Por meio do questionário, realizaremos uma pesquisa quantitativa e organizaremos os dados coletados para obter a melhor análise do resultado esperado. Tabularemos todas as respostas e fazer gráficos e tabelas para ilustrar as proporções das respostas, e assim prepararemos a pesquisa para uma análise qualitativa. 2. A partir daí, produzir um relatório da pesquisa qualitativa e analisar se existem, bem como quais as características e consequências dessas influências e o que o morador exige do jornal do seu bairro. Será elaborado um artigo para apresentação da pesquisa, após as análises preliminares, com o intuito de apresentação em eventos acadêmicos. Também conheceremos e analisaremos os profissionais que produzem o jornal e o conteúdo por eles apresentado. Após essas duas etapas, as conclusões encontradas serão redigidas em um relatório que contribua para a análise crítica do jornalismo comunitário e enumere os elementos influenciatórios e suas consequências. Além disso, será possível inferir o panorama atual do jornalismo comunitário do interior do estado de São Paulo e contribuir para a pesquisa em Comunicação, Jornalismo e, mais precisamente, em Jornalismo Comunitário. 11

REFERÊNCIAS ARANHA, Angelo Sottovia. A Função do jornalismo comunitário hoje. Dissertação (Mestrado em Comunicação). Programa de Pós Graduação em Comunicação. Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação. Universidade Estadual Paulista. UNESP. Campus de Bauru., 1998. BUENO, Wilson. A Imprensa Comunitária do interior: uma tentativa de sistematização. In: Cadernos de Jornalismo e Editoração Eletrônica da ECA/USP, número 10, 1979. CALLADO, A. A. & ESTRADA, M.I.D. Como se faz um Jornal Comunitário. Petrópolis: Vozes, 1985. COGO, Denise Maria. No Ar... Uma Rádio Comunitária. São Paulo, Paulinas, 1998. CELADEC. Jornalismo Popular. São Paulo: Paulinas, 1984. DORNELLES, Beatriz. Jornalismo "Comunitário" em cidades do interior. Porto Alegre: Sagra Luzzatto, 2004. LOPES, Eduarda Escila Ferreira. A comunicação Social e sua eficácia no Programa de Desfavelamento de Bauru. 1996. Monografia. (Projeto Experimental do Curso de Comunicação Social Habilitação em Relações Públicas). Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação da UNESP, Câmpus de Bauru. MAGGIO, Elizabeth. Vamos fazer um jornal? São Paulo: Moderna, 2000. MANOEL, Marco. Jornalismo Popular nas favelas cariocas. Rio de Janeiro, RJ: Rioarte, 1986. MARCONDES FILHO, Ciro. Comunicação e jornalismo: a saga dos cães perdidos. São Paulo: Hacker, 2002.. Quem manipula quem?. 2. Ed. São Paulo : Vozes, 1987. MATTIA, Olívar & LAZZAROTTO, Valentim. Comunicação Popular: perfil, história e alternativas das falas de um povo. Caxias do Sul: EDUCS, 1996. NEUMANN, L. (1990). Educação e comunicação alternativa. Petrópolis: Vozes. PERUZZO, Cicília M.K. Comunicação nos movimentos populares a participação na construção da cidadania. Petrópolis: Vozes,1998..Vozes Cidadãs: aspectos teóricos e análise de experiências de comunicação popular e sindical na América Latina. São Paulo: Angellara, 2004. PROENÇA, José Luiz. Contribuição para o Estudo de Jornalismo de Bairros. Dissertação (Mestrado em Jornalismo) 1984. Coordenadoria de Jornalismo e Editoração da Escola de Comunicação e Artes. Universidade de São Paulo. São Paulo. SILVA, Gislene Rosa. Identidade da periferia: o papel das rádios comunitárias na construção da cidadania.monografia de especialização em Jornalismo Social. PUC, São Paulo, 2003. 12

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