Grupo de Estudos sobre Organização e Representação do Conhecimento UNESP Marília Texto para discussão: FRIEDMAN, Alon; SMIRAGLIA, Richard P. Nodes and arcs: concept map, semiotics, and knowledge organization. Journal of Documentation, v. 69, n. 1, p. 27-48, 2013. Nós e arcos: mapas conceituais, semiótica e organização do conhecimento Luciana Beatriz Piovezan 21-02-2014 1 Sobre conceitos e significado O conceito tem um papel central não apenas em organização do conhecimento, mas em ciência da informação em geral (FRIEDMAN; SMIRAGLIA, 2013, p. 27). Hjørland, 2009. Apresentou diferentes visões de conceitos mostrando que estão associadas com diferentes visões de mundo e epistemologias e que tendem a competir entre si (HJØRLAND, 2009, p. 1519). Sua revisão conclui que o conceito é um construto socialmente negociado que deve ser identificado no estudo dos discursos (HJØRLAND, 2009, p. 1530 apud FRIEDMAN; SMIRAGLIA, 2013, p. 27-28). Stock, 2010. sintetiza várias abordagens para a definição de um conceito, sugerindo múltiplos pontos de vista epistemológicos competem em CI, mas dois tipos de definições, que ele chama explicação conceitual e semelhança familiar predominam no desenho de sistemas de informação (STOCK, 2010, p. 1966 apud FRIEDMAN; SMIRAGLIA, 2013, p. 28). Friedman; Thellefsen, 2011. relataram a emergência da teoria do conceito e semiótica em organização do conhecimento sob a definição do termo sistemas de organização do conhecimento. Usando dois componentes o relacionamento do conceito e a classificação do conceito os autores evidenciam como a teoria do conceito de Dahlberg captura a representação do conceito. Além disso, eles relatam que a OC como um domínio tem como seu foco a ordenação de conceitos, tanto de uma perspectiva teórica quanto de uma perspectiva aplicada (FRIEDMAN; THELLEFSEN, 2011, p. 665 apud FRIEDMAN; SMIRAGLIA, 2013, p. 28). Portanto, é importante entender como os autores do domínio entendem o significado de um conceito encontrado em um texto e em seu mapa visual. O propósito da pesquisa é
melhorar a compreensão da identidade socialmente negociada dos conceitos no domínio de OC (FRIEDMAN; SMIRAGLIA, 2013, p. 28). Este artigo relata um projeto de pesquisa no qual todos os mapas conceituais em duas séries de atas de eventos de OC foram sujeitos à análise semiótica avaliativa para observar padrões empregados no uso e significados dos conceitos por pesquisadores de OC. 1.1 Sobre o termo conceito Termo importante entre filósofos, em razão de estar relacionado a uma diversidade de preocupações (MARGOLIS; LAURENCE, 2005) e que causa disputa entre duas escolas filosóficas: a escola analítica (estudo da lógica e filosofia da linguagem) e a escola pósmoderna desconstrucionista (desconstrução de textos) (FRIEDMAN; SMIRAGLIA, 2013, p. 29). Frege, 1892. Distinguiu entre conceito e objeto, ao definir um conceito como uma função que tem um valor de verdade. O valor de um objeto para um argumento pode ser Verdadeiro ou Falso. Na terminologia de Frege, um objeto para o qual um conceito tem valor Verdadeiro diz-se que cai sob o conceito (FRIEDMAN; SMIRAGLIA, 2013, p. 29). Peacoke, 1999. Estabeleceu, com base em Frege, sua própria teoria do conceito. Definiu conceitos como constituintes de conteúdos que estão associados com expressões singulares, expressões lógicas e predicados. De acordo com Peacoke um conceito pode ser individualizado pela promoção de condições que um pensador deve satisfazer para possuir aquele conceito (PEACOKE, 1999, p. 2 apud FRIEDMAN; SMIRAGLIA, 2013, p. 29). Barthes, 1975. O autor observa como a linguagem manipula a ideologia da sociedade. Ele define mito como uma referência à teoria de sistemas cínicos de segundo grau e semiótica. Mais especificamente ele observa os usos das linguagens especiais, distinguindo o sistema mítico da linguagem per se e fazendo uma distinção entre significar (signify) e significante (signifier) em relação ao mito. Significar é representar, um significante é uma percepção de uma representação. Para Barthes, o significado é o conceito e o significante é a imagem acústica, baseado na definição de Saussure (FRIEDMAN; SMIRAGLIA, 2013, p. 29). Gaines, 2002. De acordo com o autor, a semiótica é vista como uma posição teórica única que pode servir para trabalhar conjuntamente as perspectivas linguísticas, cognitivas,
filosóficas, históricas, sociais e culturais, diferentemente de outros quadros teóricos (FRIEDMAN; SMIRAGLIA, 2013, p. 29-30). 1.2 Sobre mapas conceituais Um mapa pode ser definido como um ato representativo e o processo de fazer representações gráficas (Dicionário Webster, 1984, 725 apud FRIEDMAN; SMIRAGLIA, 2013, p. 30). Mapas conceituais contêm dois ou mais conceitos conectados com outras palavras para formar uma declaração significativa. Ocasionalmente são chamados de unidades semânticas ou unidades de significado. Em termos gerais, mapas conceituais podem ser considerados signos visuais sofisticados. Isto é, mapas conceituais representam conhecimento em forma de exibições eletronicamente monitoradas, como signos representam eventos ou coisas (FRIEDMAN; SMIRAGLIA, 2013, p. 30). Mapas conceituais consistem de textos e imagens, e links, que descrevem o relacionamento entre os nós e os arcos. Os nós são rotulados com texto descritivo, representando o conceito e os arcos representam o tipo de relacionamento entre eles. De acordo com Lambiotte et al. (1984), o relacionamento entre os arcos e os nós no mapa representa a conexão entre conhecimento e linguagem (FRIEDMAN; SMIRAGLIA, 2013, p. 30). 1.3 Semiótica: sobre significado e signos A semiótica, o estudo dos signos, deriva de especulações filosóficas sobre significado e linguagem (CHANDLER, 2004, p. 5 apud FRIEDMAN; SMIRAGLIA, 2013, p. 30). No século XIX deliberações sobre o significado do termo continuaram em duas escolas de pensamento que promoveram diferentes interpretações. 1. Charles Sanders Peirce (1839-1914) O filósofo americano propôs o estudo do signo como semeiosis e ofereceu uma fundação triádica do termo, onde qualquer coisa pode ser um signo, contanto que alguém o interprete como significando algo, ou se referindo a algo, ou estando para algo diverso de si (FRIEDMAN; SMIRAGLIA, 2013, p. 30). Peirce também discute os termos significante e significado, mas para ele, a teoria não é sobre linguagem e sim sobre a produção de significado. O autor usa um modelo triangular que consiste de objeto-signo-interpretante. Ele afirma que o signo é algo que está no lugar
de algo na mente de alguém. O significante, para Peirce, está para o Representamen, que é a forma, não necessariamente material na natureza que o signo toma. O significado para Peirce é o Objeto, que é aquilo sobre o que o signo se refere. Peirce acrescenta um elemento adicional, o Interpretante, que é a noção feita do signo (PEIRCE, CP 3.399 apud FRIEDMAN; SMIRAGLIA, 2013, p. 31). A parte mais importante da filosofia e esquema classificatório de Peirce consiste em sua divisão das condições do signo. O autor divide as três principais categorias, que incluem Interpretante, Representamen e Objeto em: o Primeiridade o modo de ser daquilo que é tal como é, positivamente e sem referência a qualquer outra coisa; o Secundidade o modo de ser daquilo que é tal como é, em respeito a um segundo, mas independentemente de um terceiro, que pode ser descrito como a representação ou Vorstellung, uma representação que é feita pelo sujeito que percebe do objeto-emsi; o Terceiridade o modo de ser daquilo que é tal como é, trazendo um segundo e um terceiro em relação um ao outro. 2. Ferdinand de Saussure (1857-1913) O linguista suíço chamou o estudo dos signos de semiologia o estudo da vida dos signos em sociedade. Ele propôs um modelo diádico, ou biparticionado, do termo signo. O signo, de acordo com Saussure, é feito do significante (a marca ou o som) e o significado (o conceito ou ideia). Tais termos não podem ser conceitualizados como entidades separadas, mas antes como mapeamento de diferenças significativas no ato de fala (FRIEDMAN; SMIRAGLIA, 2013, p. 30). Para Saussure, signos estão no lugar de outro objeto, enquanto que a linguagem opera como um sistema de signos sonoros. De acordo com o autor, palavras não são meramente nomes que representam coisas, mas são expressões que estão no lugar de algum conteúdo (FRIEDMAN; SMIRAGLIA, 2013, p. 31). Um signo é formado da união do significante e do objeto que representa. A conexão entre eles é arbitrária e convencional, mas apenas por meio dessa união sons significantes e ideias são articulados (FRIEDMAN; SMIRAGLIA, 2013, p. 32). Saussure (1983) examinou as relações entre discurso e a evolução da linguagem, investigando a linguagem como um sistema estruturado de signos de fala. Concentrou-
se na estrutura da linguagem na qual significados são constituídos por palavras trocadas nos sistemas de fala regidos por humanos (FRIEDMAN; SMIRAGLIA, 2013, p. 32). A abordagem saussuriana vê o signo em termos de um dado recorte de tempo e, em estudos diacrônicos, compara a mesma linguagem em tempos diferentes (FRIEDMAN; SMIRAGLIA, 2013, p. 32). A teoria de Saussure é uma teoria sobre como obter significado a partir de palavras. A teoria de Peirce, por outro lado, trata de como signos em geral, e não apenas palavras, tem significado atribuído (MAI, 2001, p. 596). A principal diferença entre os dois pensadores reside no fato de que Peirce examina como significados e representações surgem enquanto que Saussure examina como a estrutura do sistema no qual significados e representações acontece. Como significados são produzidos em um indivíduo? O que é a estrutura da linguagem pela qual um indivíduo se encontra representado como um indivíduo? 1.4 Signos e organização do conhecimento A organização do conhecimento é um domínio preocupado com a ordenação do que é conhecido particularmente para recuperação da informação (SMIRAGLIA, 2005). Numerosos pesquisadores em OC usam as definições de Peirce e Saussure do termo signo para dar suporte ao seu foco particular de estudo. Muitos deles têm estudado o aspecto semiótico do signo em relação ao significado, sendo os principais entre eles Buckland, Mai e Thellefsen. Buckland, 1997. O autor, com o emprego de análise semiótica, fez uma distinção entre a natureza do termo informação e do termo documento. Suas definições do termo informação abriram a discussão sobre o papel da linguagem no campo de OC (FRIEDMAN; SMIRAGLIA, 2013, p. 34). Mai, 2001. O autor discutiu a relação direta entre semiótica e indexação, sustentando que o processo de indexação envolve a interpretação e representação de documentos: esta atividade é altamente dependente do contexto social e cultural. De acordo com Mai, a teoria de Peirce é diretamente relevante para a maneira com a qual o significado de várias palavras e expressões é produzido em cenários individuais. Ele argumenta que a definição
de Peirce oferece uma análise mais descritiva do processo de classificação e indexação que indexadores devem necessariamente conhecer para alcançar seus objetivos (FRIEDMAN; SMIRAGLIA, 2013, p. 34). Thellefsen, 2004; 2006. Estudou o termo perfil de conhecimento no campo da organização. O autor o definiu como uma forma de identificar a base epistemológica, tanto científica quanto não científica, de um domínio. Pelo uso da teoria peirceana, Thellefsen tentou estabelecer o termo para oferecer uma melhor compreensão do domínio e permitir a usuários interagir melhor com o conhecimento (FRIEDMAN; SMIRAGLIA, 2013, p. 34). 2 Metodologia Exame dos anais das conferências internacionais da ISKO (1990-2010) e do workshop anual de classificação do SIG/CR da ASIS&T. [...] Para que um mapa fosse incluído no estudo teria que conter arcos e nós. 1. Pode o termo signo e sua classificação (como vislumbrada por Peirce e Saussure em termos de significado-significante vs objeto-signo-interpretante) ser aplicada aos mapas conceituais encontrados nos anais das conferências da ISKO e do SIG/CR? 2. O que podemos aprender a partir do uso de mapas conceituais sobre o significado do conceito no domínio de OC? (FRIEDMAN; SMIRAGLIA, 2013, p. 35). O passo seguinte foi a aplicação da análise de conteúdo onde as unidades de referência consistiram de três grupos: Peirce, Saussure e outros. o Para a classificação triádica de Peirce, o nó central do mapa deveria conter três arcos que exemplificassem Representamen, Objeto e Interpretante (FRIEDMAN; SMIRAGLIA, 2013, p. 36). o Para a classificação saussuriana de signo, o signo central encontrado nos mapas deveria ser diádico, consistindo de significante, a forma que o signo toma, e significado, o conceito que representa na linguagem falada (FRIEDMAN; SMIRAGLIA, 2013, p. 36). Com o uso do teste Qui-quadrado para testar várias hipóteses, estamos relatando uma estatística que nos diz que, com 90% de certeza, os resultados não são produtos do acaso (FRIEDMAN; SMIRAGLIA, 2013, p. 37).
3 Resultados Todos os mapas conceituais foram sujeitos à análise de conteúdo para determinar se o signo representado no mapa conceitual poderia ser atribuído à teoria semiótica de Peirce ou de Saussure, ou se nenhum construto semiótico era observável (FRIEDMAN; SMIRAGLIA, 2013, p. 37). Aproximadamente metade dos mapas conceituais (50,9%) foi caracterizados como contendo teoria semiótica ou peirceana ou saussuriana. Entre estes, predominou a teoria triádica de Peirce, encontrada em 68,6% de todos os mapas conceituais, sendo 69,3% na ISKO e 67,6 no SIG/CR (FRIEDMAN; SMIRAGLIA, 2013, p. 37). Foram encontrados 299 termos identificados como signos como definido por Peirce e 161 usando a definição de Saussure. Sob a definição de Peirce o termo mais utilizado foi conhecimento, aparecendo em 12 mapas conceituais. O segundo mais utilizado foi organização, ocorrendo em dez mapas conceituais. Em terceiro lugar, os termos foram bibliográfico e ontologia, e em quarto lugar, sentença. Os termos mais frequentes nos mapas sob o quadro de Saussure foram sistema, documento e índice aparecendo em quatro mapas cada. Em segundo lugar apareceram ontologia e teoria, em dois mapas cada (FRIEDMAN; SMIRAGLIA, 2013, p. 37). Para triangular a metodologia, os termos usados para identificar conceitos em um meta nível fora inseridos no software WordStat para análise. No primeiro passo os termos foram filtrados usando a taxonomia desenvolvida para análise de domínio dos anais da ISKO (SMIRAGLIA, 2011). [...] Há sutis diferenças aparentes. Primeiro, os clusters são proporcionalmente maiores no topo da distribuição dos mapas com conteúdo semiótico e categorias tais como usuário, tesauro e modelo estão no topo da distribuição, enquanto que categorias de conceitos mais teóricos, tais como ontologia ou domínio caem em frequência. Isso sugere uma grande ênfase em organização do conhecimento aplicada entre os mapas conceituais semióticos (FRIEDMAN; SMIRAGLIA, 2013, p. 41-42). Nós temos aqui evidências da granularidade do domínio, onde mais de 2.000 termos aparecem como conceitos essenciais em trabalhos de pesquisa, mas apenas 20 ocupam o topo da frequência de distribuição. Também, tem-se vocabulário mais concentrado entre os mapas conceituais com conteúdo semiótico, possivelmente porque de uma grande ênfase em organização do conhecimento aplicada (FRIEDMAN; SMIRAGLIA, 2013, p.42). Em comparação dos modelos conceituais peirceanos e saussurianos, as diferenças entre as duas abordagens foi sutil, mas aparente. Embora a ênfase principal seja em usuários, há uma levemente maior ênfase em aplicações pragmáticas (tesauros, contexto) entre o
vocabulário saussuriano e, portanto, uma levemente maior ênfase em construtos teóricos (classificação, modelo) (FRIEDMAN; SMIRAGLIA, 2013, p. 44). 4 Conclusão: o que nós e arcos nos dizem sobre OC como um domínio Foram descobertas duas diferenças essenciais: 1. A população de mapas conceituais mostra a mesma imensa granularidade do restante do domínio. Isso quer dizer, cada conferência tem alguns trabalhos que são da base teórica central, explorando a intensão do domínio; mas cada conferência tem mais trabalhos que forçam as fronteiras do domínio, alargando sua extensão. A granularidade encontrada no vocabulário conceitual de toda a população de mapas conceituais nos ajuda a visualizar esse constante alargamento do domínio (FRIEDMAN; SMIRAGLIA, 2013, p. 44). 2. Os mapas conceituais que demonstram teoria semiótica peirceana são, em um metanível, de natureza mais teórica usados para demonstrar evoluções dinâmicas juntamente com o tradicional triângulo peirceano. Os mapas saussurianos usam abordagens semióticas tipicamente estáticas para visualizar o significante e significado, mas tipicamente não vão além do mapa. A abordagem dos mapas peirceanos aos conceitos é em nível teórico; mapas saussurianos abordam os conceitos em níveis aplicados. Também foram observadas diferenças entre os nós e os arcos nos mapas conceituais semióticos. Isso sugere que o vocabulário de OC é ainda mais estruturado do que imaginávamos antes. Os nós representam conceitos em forma de substantivos; os arcos de relacionamento são representados por termos de ação, usualmente verbos.