Estratégias de Marketing em Supermercados: O Caso da Rede Comercial Carvalho



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Resumo Estratégias de Marketing em Supermercados: O Caso da Rede Comercial Carvalho Autoria: Nelson Alves de Souza Filho Este caso tem como objetivo apresentar a seguinte situação-problema: como é possível implementar uma estratégia de marketing baseada na qualidade de atendimento em uma empresa que atua em um setor que é definido como sendo de auto-serviço, ou seja, no qual vigora o modelo do cliente servir a si próprio? Dado que a competição na indústria supermercadista brasileira se intensificou após a estabilização da economia e com a chegada de competidores internacionais, é relevante compreender como supermercados de atuação regional posicionam-se frente a essas mudanças. A empresa descrita é a rede de supermercados Comercial Carvalho 19ª cadeia em volume de vendas (segundo ranking 2006 da Associação Brasileira de Supermercados ABRAS), com sede em Teresina, capital do estado do Piauí. Suas estratégias de marketing, recursos competitivos e posicionamentos em face das forças competitivas têm possibilitado competir com relativo sucesso em relação às empresas líderes do setor: Pão de Açúcar e Wal-Mart do Brasil. 1 Introdução A palavra supermercado já quer dizer que é auto-atendimento, mas só que tem alguns setores que ainda precisam de um pouco de mão-de-obra, por exemplo, lá na carne, ele [consumidor], chega e solicita a carne que quer, pede o pedaço que quer, a lingüiça, o queijo, tem o atendimento do caixa, tem o empacotador, tem a pessoa que vai deixar o carrinho dele lá [no estacionamento], enfim, e a gente está sempre pronto pra atender o cliente. Estas são palavras de Reginaldo Carvalho, Diretor-Presidente e fundador da rede de supermercados Comercial Carvalho. O relato acima é uma explicação dada à pergunta: como é possível implementar uma estratégia de marketing baseada na qualidade de atendimento em uma empresa que atua em um setor que é definido como sendo de auto-serviço, ou seja, no qual vigora o modelo do cliente servir a si próprio? Formular e implementar estratégias de marketing inovadoras em indústrias nas quais o modelo de gestão encontra-se amplamente consolidado é um desafio. A (rede) Comercial Carvalho, 19ª cadeia em volume de vendas (segundo ranking 2006 da Associação Brasileira de Supermercados ABRAS), com sede em Teresina, capital do estado do Piauí, concorre principalmente com Wal-Mart do Brasil e Pão de Açúcar. A próxima seção narra brevemente a história da Comercial Carvalho e de seus fundadores, bem como descreve o contexto no qual a empresa atua. Em seguida, é apresentada a situação-problema e outros aspectos associados aos recursos competitivos e ao posicionamento da empresa em relação às forças competitivas. Posteriormente são apresentadas considerações finais. Por último, são sugeridas as notas de ensino. 2 Antecedentes e Contexto Reginaldo Carvalho nasceu no ano de 1963, filho de comerciantes, na cidade de Esperantina (norte do Piauí). Desde os sete anos já ajudava o pai em um pequeno comércio, despachando no pé do balcão. Aos catorze anos mudou-se para Teresina com o objetivo de estudar e trabalhar. Trabalhou em uma vidraçaria, numa lanchonete e no zoológico da cidade. Posteriormente mudou-se para Luzilândia (cidade ao norte do estado), onde abriu uma vidraçaria. No entanto, o mercado da região era restrito e logo se tornou saturado. Em seguida, ainda em Luzilândia, Reginaldo iniciou um negócio de mercadinho, mas em pouco 1

tempo retornou para Teresina onde empreendeu novamente, dessa vez com uma loja de atacado. Em 1984, após o casamento, Reginaldo ficou responsável por vendas (ambulantes) em várias cidades do Piauí e Maranhão e sua esposa Evangelina passou a administrar a loja. Em 1985, eles abriram o primeiro ponto com a marca Comercial Carvalho. Como narra Evangelina, atualmente graduada em Administração e diretora financeira da Comercial Carvalho: Antes de 1986 nós já trabalhávamos com atacado que vendia praticamente os mesmos produtos de supermercado. [...] E vimos que havia uma brecha, que a gente poderia ir para o lado do varejo. Só que não foi assim de repente, a gente colocar um supermercado não. [...] [A primeira loja] Era uma loja feia, de chão todo manchado, cheio de buraco, não tinha carrinho, não tinha prateleira adequada, não tinha check out. Era uma coisa assim bem rústica. Era um depósito mesmo, fechado, muito feio, desarrumado, mas que tinha os mesmos produtos de supermercados e com preços bons. Em 1986 o casal inicia no universo dos armazéns, ainda em prédio alugado. Em 1991, inauguram a primeira loja em prédio próprio. Segundo Evangelina, despertou-se para a oportunidade do varejo após uma promoção na qual foram vendidos, no varejo, produtos de atacado cujas embalagens haviam sido avariadas. Por exemplo, as caixas avariadas que continham vinte barras de sabão foram descartadas e as barras re-embaladas em frações menores (cinco barras por caixa) e vendidas em promoção, no formato de varejo, para consumidores da vizinhança. É atribuído ao sucesso das vendas deste episódio, realizadas com o artifício de fracionar quantidades do atacado, a percepção da oportunidade de iniciar uma operação no varejo. A trajetória mais ascendente ocorre, porém, de 1996 em diante. Na figura 1, a seguir, observa-se que nos primeiros dez anos de operação a rede atingiu um crescimento médio de aproximadamente uma loja e meia por ano. De 1996 até 2006, já com a economia brasileira estabilizada, obteve-se crescimento médio de quatro lojas por ano, o que significa uma nova loja inaugurada a cada trimestre. A Comercial Carvalho obteve crescimento significativo num período no qual o cenário competitivo da indústria de supermercados no Brasil passou por profundas transformações. Dois fatos foram particularmente relevantes e seus efeitos se propagam até hoje. Primeiro, a internacionalização da indústria caracterizada pela chegada das grandes redes mundiais. Segundo, a estabilização da economia com o Plano Real, a partir de 1994. Por um lado, a internacionalização teve início com a chegada do Carrefour (de origem francesa), que inaugurou seu primeiro hipermercado em 1976, na cidade de São Paulo. Posteriormente, grupos internacionais como o americano Wal-Mart (em 1995) e o português Sonae (em 1997), ingressaram no mercado brasileiro. A entrada dessas redes de supermercados ocorreu por meio da implantação de lojas próprias e a expansão tem sido por meio de aquisições, situação na qual a competição interna intensifica-se. Por outro lado, a estabilização econômica promoveu uma mudança de hábitos de consumo no âmbito do varejo, notadamente no de alimentos. O fim da inflação permitiu que os consumidores passassem a comparar os preços dos estabelecimentos em bases mais estáveis. É nesse cenário de acirramento da competição que se inicia a trajetória de crescimento da Comercial Carvalho. Atuando principalmente nos estados do Piauí e Maranhão a empresa atingiu, após 20 anos de sua fundação, um faturamento da ordem de R$ 405 milhões (SUPERHIPER, 2006, p. 56). Ao todo são 58 filiais, incluindo lojas de varejo, atacado, e centros de distribuição. Nesse caso são analisados os negócios associados predominantemente ao varejo, que correspondem a aproximadamente 70% da receita, enquanto as operações de atacado respondem por 30%. As informações de 2007 indicam a presença de 32 lojas de 2

varejo, sendo 22 em Teresina, sete no interior do Piauí, e três no Maranhão. 70 60 58 55 50 49 50 40 43 Lojas 30 20 34 28 23 24 18 15 10 10 7 1 2 4 5 0 1986 1991 1996 2001 2006 Anos Figura 1 Evolução de abertura das lojas de varejo e atacado (valores acumulados) Fonte: Relatório interno da empresa. Os concorrentes estabelecidos no mercado de Teresina em março de 2007, são: a) Wal-Mart do Brasil: possui duas lojas. A primeira foi inaugurada em abril de 1997 como âncora do Shopping Teresina, com a marca HiperBompreço e tem cerca de 3.800 m 2. O Shopping Teresina possui localização privilegiada, amplo estacionamento gratuito e é climatizado, constituindo, portanto em boa localização para a loja Wal-Mart. A segunda loja, inaugurada em abril de 2005, possui a marca Bompreço, tem aproximadamente 2.450 m 2 e está localizada na Avenida Frei Serafim (importante corredor de ligação das zonas Leste e Sul ao centro da cidade), no sentido centro-subúrbio, rota de retorno das pessoas que saem do centro da cidade no fim da tarde e voltam para suas residências. b) Pão de Açúcar: possui quatro lojas. A entrada do Pão de Açúcar no mercado de Teresina ocorreu em 1982. A empresa possui uma filial na Avenida Frei Serafim, localizada antes da loja Wal-Mart/Bompreço (no sentido centro-subúrbio) e onde também está localizada uma loja da Comercial Carvalho. Além disso, existem três lojas situadas em bairros residenciais caracterizados por serem de classe média e todas dispõem de ambiente climatizado, estacionamento para clientes e têm tamanhos variando entre 600 m 2 e 1.200 m 2. A última inauguração, em meados de 2006, é de uma filial de alto padrão, com posto de gasolina, estacionamento e lojas de conveniência. c) Supermercado Major: possui apenas uma loja em bairro do subúrbio da cidade, densamente habitado, porém com vizinhança composta predominantemente por população de renda baixa. O estabelecimento comercial tem pouco mais de 300 m 2. Não foi obtida a data precisa de fundação, mas estima-se que a empresa exista há mais de dez anos. 3

O varejo de alimentos no Brasil, cuja distribuição é realizada sobretudo por meio dos supermercados, tem algumas características específicas. Para a Secretaria de Acompanhamento Econômico, do Ministério da Fazenda (SEAE/MF), a indústria supermercadista inclui: [...] empresas de venda integrada de bens duráveis (eletroeletrônicos, utilidades domésticas, têxteis etc.) e não duráveis (produtos alimentícios, de limpeza, de higiene etc.), [cujos produtos são] dispostos de forma departamentalizada, nas quais o próprio consumidor escolhe os produtos que deseja adquirir que se encontram acondicionados em gôndolas e/ou balcões e efetuam o pagamento diretamente nos caixas (checkouts). Esse tipo de comércio varejista é conhecido como de auto-serviço ou de autoatendimento. Este contrasta com a loja tradicional em que há a presença do vendedor ou balconista (BRASIL, 2004b, p. 4). Ainda de acordo com a SEAE, os supermercados e hipermercados caracterizam-se pelos seguintes aspectos (BRASIL, 2004a; 2004b): i) oferecem ao consumidor a oportunidade de eliminar o custo de várias paradas para adquirir um determinado conjunto de bens (one stop shopping uma só parada); ii) ofertam mix de produtos diversificados caracterizando a venda integrada; iii) podem diferenciar-se por meio dos serviços oferecidos, tais como: estacionamento; ar-condicionado; atendimento 24 horas ; vendas virtuais por telefone ou internet (delivery entrega em domicílio); aceitação de cartão de crédito ou cartão próprio da loja; aceitação de cheques pré-datados; aceitação de vale-alimentação; parcelamento dos pagamentos; prestação de serviço de limpeza, corte e embalagem de hortifrutis e carnes em geral; maior quantidade de produtos vendidos; melhores técnicas para exposição dos produtos; automação das lojas; condições de atingir o consumidor por meio de propaganda; oferta de marcas próprias, com preços inferiores aos produtos substitutos; maior nível de qualificação dos funcionários; empacotadores; corredores largos; fraldário; sanitários etc. A seguir, apresenta-se a situação-problema do caso, a saber: como é possível implementar uma estratégia de marketing baseada na qualidade de atendimento em uma empresa que atua em um setor que é definido como sendo de auto-serviço, ou seja, no qual vigora o modelo do cliente servir a si próprio? 3 Situação-Problema A Comercial Carvalho tem se valido de algumas das características expostas na seção anterior e também desenvolve estratégias de marketing que a diferenciam. Uma das evidências dessa diferenciação é a ligação do consumidor com a marca Comercial Carvalho. Isto pode ser notado na maneira como o Diretor Administrativo, Paulo Cezar, caracteriza o comportamento dos clientes: E nós temos a característica de sermos piauienses, [...] o nosso cliente se identifica com a gente. [...] Se ele tiver que reclamar, reclama muito mais na nossa loja [...], porque na nossa loja ele se sente à vontade e se sente como sendo o dono ou patrão, ou irmão ou mãe ou pai [...], ele se porta muito dessa forma, chega lá e manda mesmo! Procurar estabelecer um vínculo de identificação do consumidor com a marca não é uma estratégia nova. Atingir esse posicionamento na mente do cliente é que constitui um desafio. O Gerente da loja Carvalho Alternativo, Dalmar, localizada na Avenida João XXIII (que faz a ligação entre a zona leste e o centro da cidade) reforça o depoimento anterior: [...] a identificação do cliente com a Comercial Carvalho por sermos piauienses. [...] 82% dos teresinenses, dos piauienses, dizem que compram no Comercial Carvalho e muito por isso, por sentirem, meio que entre aspas, como o dono do Comercial Carvalho, por representá-los fora do âmbito do 4

Piauí. [...] O ambiente é meio que família, o cliente chega meio como se fosse o dono. A marca Comercial Carvalho tem aproximadamente 82% de share of mind dos consumidores teresinenses, índice revelado por instituto de pesquisa de opinião de Teresina. O relatório que revela esse índice tem circulação restrita às empresas que participaram do evento de premiação. A Comercial Carvalho não participou do evento de premiação, mas teve acesso aos dados relacionados à sua marca, por meio de sua diretoria. Esse resultado tem sido utilizado em campanhas publicitárias e a denominação Marca Inesquecível (título da pesquisa de opinião) é usado como slogan da empresa nas sacolas de compras e nas propagandas de TV. As táticas de chão de loja também contribuem para reforçar o alinhamento entre a estratégia de marketing, que visa proporcionar atendimento diferenciado, o mix de produtos e os preços. Com relação aos produtos demandados pelo consumidor da região, o senhor Farias, Gerente da loja da Avenida Frei Serafim destaca: E a gente vê que os nossos concorrentes pouco trabalham com carne na rola [carne com osso exposto no balcão] que é um dos produtos que vende [ênfase na voz] que o cliente gosta, e nós temos aquele atendimento direto com o cliente mesmo!. Portanto, a solução engenhosa da Comercial Carvalho para lidar com a concorrência foi desenvolver estratégias de marketing que permitissem explorar um recurso competitivo: a origem local. Uma vez que sortimento e mix de produtos, ou reputação de preço baixo, são recursos que podem ser imitados pelos concorrentes e tendem a não se constituir em fonte de vantagem competitiva. Diante disso, a Comercial Carvalho implementa estratégias de marketing que exploram a origem local e maximizam a reputação de qualidade diferenciada no atendimento ao cliente, embora o poder de barganha do consumidor individual em relação ao supermercado seja baixo. Na indústria supermercadista, em particular, o poder de barganha do consumidor é restrito, pois uma elevação de preços de um ou de poucos produtos não faz com que um consumidor procure a loja concorrente. A não ser que haja uma elevação significativa e nãotransitória dos preços da cesta básica de bens, o consumidor passa a comprar em outro supermercado, ou na mercearia da esquina (BRASIL, 2004a; 2004b). O Gerente da loja Carvalho Alternativo, Dalmar, sumariza esta situação: Depois da informatização das lojas, não só do Comercial Carvalho como dos supermercados no geral, esse poder [de negociação] praticamente anulou em virtude de ser tudo programado em código de barras. Então a partir do momento que o Comercial Carvalho coloca um preço xis, aquele preço não tem como ser alterado. Entendeu? Aí não tem como você negociar com o cliente. Ele já vem sabendo que o preço é aquele. Por não haver a possibilidade da barganha negocial no momento da venda, cliente a cliente, a política de preços da rede de supermercado também adquire relevância. O Diretor Comercial, senhor Reginaldo, explica essa questão da seguinte forma: Na realidade nós temos um preço único em todas as lojas, agora o que a gente faz é destinar os tipos diferentes de mercadorias pra aquele público, né, cada loja, cada bairro, tem um nível de consumo, um poder aquisitivo xis, e aí nós adequamos a loja àquele poder de compra daquela região, [...] Por exemplo, na loja do Riverside [loja âncora de um shopping] nós temos o que há de melhor, é nossa loja tipo A, para o cliente classe A. Lá no Alto da Ressurreição [bairro residencial da periferia com vizinhança de baixo poder aquisitivo] nós temos alguns produtos que são iguais [aos do Riverside], não pode mudar, mas temos boa parte dos produtos que são destinados àquela camada, àquele público C, D. 5

Por outro lado, o Diretor Operacional, Raimundo Fonseca, enfatiza a presença de pessoas para atender os clientes e a existência de interação entre os clientes e os funcionários das lojas: [...] Existe o corpo-a-corpo, porque o Carvalho são lojas médias, lojas tradicionais, convencionais, e os clientes estão corpo-a-corpo com o funcionário ali nas informações e tudo. O senhor Farias, Gerente da loja da Avenida Frei Serafim, destaca o atendimento ao cliente e atribui a causa do bom atendimento ao fato da empresa ter origem local: Eu vejo no Comercial Carvalho o atendimento, a importância que ele dá para o nosso cliente, eu vejo isso como fundamental, porque nós somos daqui nós conhecemos a cultura daqui. [...] Mas o ponto fundamental do Comercial Carvalho são as nossas raízes. Um dos Coordenadores Operacionais comenta a questão da empresa ter origem local relacionando um suposto traço cultural dos consumidores (de serem bairristas ) e a conseqüência desse traço para o Comercial Carvalho. O principal dentro da nossa empresa, primeiro, é ser regional. [...] Olha, os piauienses, seja o cearense, seja o pernambucano, nós somos bairristas, entendeu?. O Diretor de Marketing aborda essa questão por um ângulo diferente, na medida em que supõe que a identificação do consumidor com a empresa surge não só do fato de ter origem local, mas também por procurar expandir suas operações no Piauí: É assim, o diferencial do Comercial Carvalho hoje é porque ele é um grupo que se preocupa em crescer e chegar e crescer na sua terra entendeu? [...] Se preocupa em crescer em termos de Piauí. Isso faz uma diferença, porque ele está valorizando quem está lá no sul do estado. Quando chega um Comercial Carvalho lá é sinônimo de festa, porque as pessoas não terão mais que se deslocar da sua cidade pra vir até aqui. O Coordenador Financeiro também comenta sobre a origem local da empresa e o efeito positivo que isso implica na forma de atender os clientes, como sendo um recurso competitivo: Quando você falou em recurso raro, veio à cabeça a questão de nós sermos regionais em si, entendeu? [...] Mas muito pelo fato de sermos regionais, pela questão de você de lidar com a própria maneira de abordagem, é diferente, você trata o consumidor não de uma maneira formal, mas de uma maneira amigável, como se fosse um amigo. É possível verificar que alguns respondentes estabelecem uma relação ambígua de causa e efeito entre a reputação de origem local e a reputação de bom atendimento. Ou seja, os entrevistados atribuem ao fato de ser local a causa pelo atendimento diferenciado ao cliente, e vice-versa. Na medida em que foram surgindo respostas relacionadas à qualidade do atendimento ao cliente, fez-se o seguinte questionamento: Se o setor de supermercado caracteriza-se pelo auto-atendimento, no qual o próprio cliente escolhe a mercadoria que deseja, como implementar uma estratégia de marketing baseada na qualidade de atendimento?. Identifica-se que os clientes atribuem importância ao atendimento pessoal, segundo a percepção dos gestores, em decorrência de costumes locais de compra de carnes e outros produtos frios. Como pode ser observado nas palavras do Diretor Administrativo, Paulo Cezar: Então nós temos carne que vem na bandeja e carne desossada na loja. E o nosso cliente quer ver a carne, quer cheirar a carne, quer pegar a carne, então são coisas típicas da nossa região. Um dos Coordenadores Operacionais transmite bem a situação do dia-a-dia, com relação ao atendimento: O cliente não pode [passar para trás do balcão], não chega a tocar na carne, mas quando ele pede, a gente ainda dá uma luvazinha, bota na mão e ele pega na carne e diz qual é a carne que ele quer. Ou seja, o cliente demanda o atendimento pessoal em alguns departamentos, tais 6

como, na seção de frios e no balcão de carnes. Outro Coordenador, senhor Idelson, referindose à dimensão de interação no atendimento revela: Você [cliente] quer ver aquela peça lá e dizer eu quero é aquela ali, traga ela aqui pra cortar que eu quero ver cortando na minha frente. Nos secos a gente tem o auto-serviço, a gente chama auto-serviço. Mas nós ainda temos o artesanal que aqui ele [o cliente] não descarta. [...] Aí vem o setor de frios, eu quero o presunto cortado agora na minha frente! O atendimento pessoal em loja de auto-serviço tende a tornar a operação mais custosa. Nesse caso, as despesas com pessoal podem aumentar se comparadas a uma loja com menor número de funcionários. Questionado sobre o aumento de custos em decorrência disso, o Diretor Operacional esclarece que consegue superar a desvantagem de custos em virtude do aumento da satisfação do cliente com o serviço: Torna-se mais cara, mas temos retorno, porque o nosso diferencial é esse, exatamente esse. Dividir o departamento em duas áreas, serviço e autoserviço. Auto-serviço é aquele que o cliente pega a mercadoria, se serve, bota no carrinho e vai embora, e o serviço é aquele que ele pede a carne que quer: vem limpa, vem tratada, do jeito que ele quer, um quilo, dois quilos, três quilos, e aí vai embora. É a opção do cliente. A conseqüência esperada do aumento de custos é a impossibilidade de se praticar preços competitivos. Quando questionado sobre como manter preço competitivo operando de forma possivelmente mais dispendiosa, o mesmo Diretor responde que supera a desvantagem de custos por meio do aumento do volume de vendas: No volume de venda. Porque logicamente a venda, ela sempre... O cliente sempre tem a preferência pelo atendimento direto. Como a venda do balcão ela é maior do que a que está embalada. Isso cobre as despesas. É exatamente, quanto mais vende, mais a despesa cai. Portanto, apesar do supermercado se caracterizar pelo auto-atendimento, há indícios que o cliente prefere a loja que mantém algumas seções com atendimento pessoal. Ademais, em algumas seções os clientes preferem comprar alguns tipos de grãos no formato de vendas a granel, segundo relato dos gestores. Um dos gerentes enfatiza a questão do atendimento destacando a existência da venda a granel de alguns grãos: (...) Está vindo aí a modernidade e tudo mais, mas nessa loja mesmo, na Frei Serafim, nós ainda trabalhamos com a feirinha [venda de açúcar, farinha, e outros produto do gênero, a granel], porque sabemos que ainda temos clientes para aquilo dali [que preferem esse serviço]. O Diretor-Presidente relata que em Belém do Pará ainda há casos em que a venda de margarina é feita a granel. O cliente chega ao balcão, diz ao atendente quantos gramas quer, o atendente tira a margarina de um balde e põe em saco plástico transparente para pesar. O mesmo Diretor complementa: Aos poucos, por exemplo, já existem empresas que não têm mais o serviço de feirinha, por exemplo, na carne, só vem carne embalada. E nós não, ainda estamos preservando alguma coisa da cultura, de uma forma mesclada, vamos dizer assim. Com o intuito de reforçar o vínculo com os clientes, a Comercial Carvalho lançou, em 28 de março de 2007, o programa Integração cliente-empresa. Segundo informações divulgadas no website da empresa: O programa visa aprofundar a intimidade do cliente com o grupo. As lojas varejo do grupo foram escaladas para a realização de reunião matinal, com a presença de diretores do grupo, fornecedores, gerentes, colaboradores e clientes convidados. O programa começou pelas lojas de maior porte e obedece a ordem decrescente. O cliente tem vez e voz para reclamar, dar sugestões, conversar e saber como funciona todo o grupo, além de receber 7

um valioso prêmio a ser doado por um fornecedor que é escolhido como padrinho de cada reunião. Os encontros são realizados semanalmente, sempre as quartas-feiras, às setes horas da manhã. Com essa iniciativa o Grupo Carvalho reforça a sua clara prioridade de estar cada vez mais próximo do seu cliente (GRUPO CARVALHO, 2007). Esse programa possui cronograma divulgado no website, com as datas até o mês de novembro de 2007 nas quais ocorrerão os eventos, indicando a respectiva loja, o apresentador (mediador), e o padrinho que representa uma empresa fornecedora. Existe também a equipe de ouvidoria que é composta por funcionárias que desempenham o papel de intermediar situações especiais junto aos clientes. O número do telefone do serviço de ouvidoria (0800) está impresso em destaque na parte de trás das sacolas que embalam as compras dos consumidores. De acordo com o Diretor Administrativo: Nós estamos buscando [melhorias] através de nossa equipe de ouvidores, através da capacitação de nosso pessoal, as nossas lojas [...] estão dentro do mais alto padrão de qualidade, sem deixar a desejar [...]. No website da empresa, o serviço de ouvidoria é apresentado como um serviço por meio do qual é possível ter acesso aos diretores. Se você deseja sugerir, reclamar, reivindicar, solicitar orientações, apresentar projetos, idéias, ou simplesmente conversar sobre a nossa empresa, basta entrar em contato com a Ouvidoria do Carvalho. Ligue para 0800 86 15 16 e marque dia e hora, para conversar com qualquer integrante da nossa diretoria (GRUPO CARVALHO, 2007). Além disso, há outras estratégias que complementam a abordagem de qualidade no atendimento. Diante dos diferentes tipos de clientes, a empresa adota três bandeiras na rede: Comercial Carvalho, Carvalho Alternativo, esta última com 5 lojas em Teresina, e Carvalho Supermercado (uma filial recém inaugurada com essa bandeira). A bandeira Comercial Carvalho tem o formato de supermercado tradicional. A Carvalho Alternativo não oferece serviços ou confortos adicionais, nem mesmo a sacola para embalar as compras, no entanto, são vendidos produtos cujos preços são mais baixos (em torno de 5%, em relação às lojas da marca Comercial Carvalho). A única loja com a bandeira Carvalho Supermercado conta com uma estrutura mais moderna, com vistas a atender o consumidor mais exigente, e de maior poder aquisitivo. A construção dessa loja de alto padrão, no período de 2006-2007, objetivou conter a expansão do Pão de Açúcar, que estava por inaugurar uma loja de terceira geração, conforme publicidade da época. Existe ainda o Hiper Carvalho que tem um formato que atende tanto ao varejo quanto ao atacado ( atacarejo ), e que possui amplo estacionamento e restaurante (self-service). Além disso, existem evidências de que a empresa está apta para explorar sua reputação de origem local, pois, dentre outras coisas, os sócio-fundadores participam de campanhas de marketing. Como exemplo, o Diretor-Presidente já protagonizou propagandas veiculadas nas emissoras de TV, na qual convidava o público em geral para participar da tradicional festa de aniversário da empresa. Todos os anos essa festa tem início com uma missa de Ação de Graças, realizada no estacionamento do Hiper Carvalho. Essa cerimônia religiosa acontece na presença de funcionários, fornecedores, clientes, familiares dos fundadores, autoridades públicas e do público em geral. Em seguida ocorre a dupla carreata na qual os fundadores desfilam em trio elétrico pela cidade. Por fim, após o desfile em trio elético há o momento do corte do bolo de aniversário e a distribuição de prêmios que fazem parte da campanha de aniversário. Em 2007 foram sorteados 20 carros novos, dentre os consumidores que preencheram cupom promocional após realizarem suas compras nas lojas. Com relação à publicidade, o objetivo é de veiculação de campanhas simples, objetivas e de baixo custo, segundo o Diretor-Presidente: 8

A gente procura fazer um marketing, uma divulgação, de modo que não onere também, sempre bate lá na questão da redução de custo [...], tem que fazer a divulgação do produto de modo que não onere. E a coisa de maneira simples, dar lá o recado das campanhas e sem muita sofisticação. A empresa dispõe ainda de uma agência própria de publicidade que trabalha em consonância com os objetivos da área comercial. De acordo com o Diretor de Marketing: Na realidade eu trabalho direcionado com o comercial [departamento comercial]. E aqui, a Carvalho Publicidade não se resume só aqui a essa sala, ela tem também a nossa serigrafia, onde tem toda a criação de cartazes, panfletos. A nossa parceria direto pra gente botar os preços de oferta é com o comercial. O comercial vai lá discute, qual o melhor preço que vai pra a promoção da TV do dia, e o que é que a gente faz? A gente faz o agenciamento de mídia, que é para onde vai toda a mídia do grupo Carvalho. Negocia com os fornecedores, aí vê a possibilidade do fornecedor trazer o produto dele. [...] Na realidade esse espaço [no encarte publicitário impresso] é negociado com o comercial. A estratégia de venda de produtos usando marcas próprias está sendo implementada gradualmente. Ao contrário dos grandes players da indústria de supermercados nacional, a empresa ainda não conta com volume elevado para justificar esta prática em um grande número de produtos. Parte do esforço de marketing requer ativa participação dos fornecedores. No depoimento a seguir, o Diretor-Presidente esclarece os detalhes do modo como se relaciona com fornecedores: Bom, primeiro aqui nós temos uma parceria muito saudável com nossos fornecedores, nós solicitamos algo mais, sempre queremos o que há de melhor em termos de preço, comercialização e prazo, mas nós também damos o retorno nós queremos sempre posicionar muito bem os produtos deles [...] e com isso acaba dando uma boa negociação, onde eles conseguem reduzir no preço e a nossa parte fica por conta da exposição dos produtos, da participação que destinamos a cada produto nas lojas, a participação que a gente dá em mídia para os produtos, em todos os aspectos promocionais como folders, spot em rádio, anúncio na tv, carro de som, enfim e é por isso que a gente tem conseguido dar o retorno para o fornecedor, quando a gente solicita o melhor preço a gente repassa essa diferença para o consumidor para reverter em volume. Por outro lado, de acordo com Diretora Financeira o posicionamento em relação aos novos entrantes tem sido: A gente sempre esperou por isso [novos entrantes], não sentado, mas esperou trabalhando, fazendo a nossa parte, achando que a qualquer momento eles poderiam chegar, como podem também abrir mais uma loja aqui. É por isso que a gente está sempre abrindo mais lojas, sempre preocupadas com os clientes, com os colaboradores, fornecedores. Além disso, pratica-se uma política de preço dissuasivo, associada às promoções de prazos de pagamento para o consumidor. Na época da inauguração da segunda loja Wal- Mart/Bompreço na cidade, em abril de 2005, a Comercial Carvalho anunciou na TV uma promoção na qual o prazo concedido para os clientes que pagassem suas compras com cheque pré-datado era de 75 dias. Isto foi válido para seis lojas circunvizinhas à nova loja de marca Bompreço no decorrer da semana em que houve a inauguração. Por sua vez, a ameaça de serviços substitutos em relação aos supermercados é percebida por um dos Coordenadores Operacionais do seguinte modo: 9

Já existe hoje venda pela internet, em Fortaleza você compra lá e eles entregam com menos de 12 horas. Aqui [...], nós ainda temos o supermercado como uma diversão, diferente dos grandes grupos que exploram a correria pra se comprar e ir embora, a gente não. A dona de casa vai pro supermercado, leva seus filhos [...]. Por fim, mas não menos importante, destaca-se que a rivalidade entre as empresas concorrentes é elevada. Em relação a isto, a Comercial Carvalho realiza pesquisa de preços. De acordo com o Gerente da loja da Avenida Frei Serafim: Todos os dias nós estamos lá, fazendo pesquisa, acompanhando [o concorrente]. [...] Eles estão todos os dias aqui em nossas lojas fazendo pesquisa, nós também estamos lá fazendo pesquisa. No que diz respeito à rapidez nas decisões de retaliação, um dos Coordenadores Operacionais ressalta que enquanto as empresas que têm sua matriz em outras cidades, a Comercial Carvalho tem o centro de poder administrativo hierarquicamente próximo de seus gerentes e coordenadores, fato que reduz o tempo de resposta às mudanças no ambiente: Você hoje entrando ali na loja do competidor A, tem três carrinhos. Tem três carrinhos. Esse aí é um combate que ele quer jogar. Mas veja só, nós também somos muito agressivos no preço. [...] será que eles têm o poder bem rápido de decisões em preço? Porque... Veja só, você é subordinado aqui, a uma camada lá em cima e daqui que você chegue lá para ter decisões, né. É difícil! Você perde o quê? 24, 12 horas. Enquanto nós temos o poder de decisão na mão. E aí eu estou aqui na minha loja, e vejo o vizinho e ligo pro patrão: Patrão eles estão vendendo aqui a tanto. [Daí ele diz] Baixa o meu agora. Pronto, está decidido! Então é a batida, batida de frente. Bater de frente com o concorrente. Sabe por quê? Enquanto ele coloca um carrinho daquele dali, se você fez essa lista hoje, nosso preço amanhã já é outro. Eu acho muito perigoso aquilo dali, muito perigoso [...]. Há também a prática do benchmarking, que se refere à incorporação, por parte da Comercial Carvalho, das melhores práticas dos concorrentes. Isso pode ser observado na declaração do Diretor-Presidente ao relatar que sua empresa assimila e incorpora as práticas dos competidores quando são do interesse da empresa: Não, não resta dúvida que a concorrência ela é saudável. A concorrência ela nos traz alguns tipos de melhorias por algum tipo de ângulo, [...] e nós procuramos extrair as melhores. Aquilo que é bom do que eles estão praticando no mercado a gente procura fazer uma assimilação do que bom e uma triagem aí daquilo que é de bom. Observa-se também uma intensa rivalidade de natureza publicitária nos meios de comunicação, em especial na televisão, com inserções quase diárias dos três maiores competidores: Comercial Carvalho, Wal-Mart/Bompreço e Pão de Açúcar. De uma forma geral, a rivalidade foi descrita como acirrada e, por vezes, percebida como desleal. Essa deslealdade é enfatizada face ao modo agressivo como um dos competidores expõe as diferenças de preços entre lojas. Observa-se esse fato no depoimento de um dos diretores: Não, os concorrentes, eles de certa forma esses grandes aí dessas multinacionais, eles jogam às vezes até sujo, eles são desleais no que diz respeito a, por exemplo, ele divulga lá, que bota um carrinho [...], são injustos no modo de concorrer, eles colocam o carrinho lá dizendo que o nosso preço está mais caro e que o deles é mais barato. [...] É muito cômodo fazer isso. Eu também poderia pegar e tornar o nosso preço melhor ainda, [...], os grandes eles fazem uma concorrência desleal nesse sentido de querer de alguma forma mascarar a realidade deles. Um dos gerentes ressalta que é possível identificar divergências nas comparações de 10

preços exibidas por um dos competidores. De acordo com esse gerente, comparar os preços entre as diferentes lojas pode revelar a existência de artifícios considerados antiéticos, pois mascaram a realidade e podem induzir os consumidores a erro: No caso do competidor A, a gente observa que eles trabalham com muita ética quanto a concorrência, eles respeitam, a gente observa que é um jogo limpo, uma concorrência limpa e que só quem tem a ganhar é o cliente. Quanto ao competidor B eles usam assim, às vezes, uma estratégia que eu considero antiética, sabe, por exemplo, ele pega um carrinho e bota lá o carrinho de A, B e C. Só que ele pega um produto meu, um Leite + 5 [que é um produto premium, mais caro] aí ele pega o Leite + 5 que está na faixa de xis reais aí ele coloca no ticket da minha loja os xis reais, só que ele bota [no carrinho] dele, registra o dele como o Leite tradicional que é mais barato mesmo, certo. O nosso produto tradicional é mais barato que o deles, só que ele bota o Leite + 5 [no nosso carrinho] e bota o Leite tradicional [no carrinho dele]. [...] Isso é um jogo desonesto que eu considero e quando eu vi isso pela primeira vez eu fiquei super-chateado assim com esse tipo de concorrência, mas quanto ao competidor A eu acho ética a forma deles trabalharem. A seguir, a situação problema é retomada na consideração final. 4 Consideração Final Diante desses fatos e contexto competitivo, questiona-se: como é possível implementar uma estratégia de marketing baseada na qualidade de atendimento em uma empresa que atua em um setor que é definido como sendo de auto-serviço, ou seja, no qual vigora o modelo do cliente servir a si próprio? 5 Nota de Ensino O objetivo do presente trabalho é apresentar como a Comercial Carvalho enfrenta a concorrência de empresas líderes do setor, por meio de suas estratégias de marketing (LEVY; WEITZ, 2000; BAKER, 2005; TÉBOUL, 1988; 1999), seus recursos competitivos (BARNEY, 2002) e seu posicionamento em relação às forças competitivas (PORTER, 1986). Este caso é recomendado para o curso de graduação em Administração e para cursos de pósgraduação lato sensu em Marketing, Administração Estratégica e áreas afins. Questões que decorrem do caso poderiam ser formuladas do seguinte modo: i) como os supermercados de bairro, ou redes de atuação regional, poderão competir com as grandes empresas supermercadistas que dispõem de mais poder de marketing, em todas as dimensões? ii) é possível inovar de fato no marketing de varejo de alimentos? iii) é possível manter um modelo híbrido de atendimento em supermercados e ainda assim ser competitivo em preços? Os objetivos de ensino do caso são: i) familiarizar as pessoas participantes da discussão com a realidade enfrentada por redes de atuação regional no setor de supermercados; ii) permitir uma comparação de aspectos da realidade do varejo de alimentos com as teorias de marketing e administração estratégica; iii) incentivar o pensamento analítico, de modo a se considerar diversos fatores que podem influenciar decisões estratégicas. Espera-se que a descrição desenvolvida proporcione uma aprendizagem associada aos aspectos que precisam ser considerados nas tomadas de decisões acerca das estratégias de marketing de supermercados. Essa aprendizagem torna-se necessária, sobretudo quando o isomorfismo mimético em relação a um campo organizacional pode não constituir uma fonte de vantagem competitiva sustentável. Além disso, a utilização de conceitos teóricos associados à administração estratégica intenta favorecer a habilidade de pensar analiticamente, em face de decisões complexas. 11

As entrevistas apresentadas no caso reúnem relatos de cinco diretores, com média de 12 anos na empresa (nas áreas funcionais de comércio, finanças, operações, administrativo e marketing), além de quatro coordenadores comerciais, com média de sete anos na firma (hierarquicamente responsáveis pela supervisão dos gerentes de lojas), e três gerentes com tempo médio de seis anos trabalhando na organização (uma gerente de recursos humanos e dois gerentes de loja). Os depoimentos dos funcionários-chave retratam o desafio da formulação e implementação de estratégias de marketing de varejo em sintonia com hábitos e costumes de consumo locais, que, por sua vez, pode requerer a criação de um modelo híbrido de atendimento em supermercados. A descrição dos eventos é complementada por observações de campo e documentos da empresa. Uma análise alternativa do caso pode ser realizada da seguinte forma. a) Em relação à estratégia de marketing (LEVY; WEITZ, 2000; BAKER, 2005; TÉBOUL, 1988; 1999): Na área de marketing, a efetividade é aumentada por meio de estratégias de preço uniforme, posicionamento amplo, três bandeiras, campanhas publicitárias, e produtos com marca própria. Os gestores da Comercial Carvalho enfatizaram a atenção dada ao atendimento das necessidades dos clientes, em linha com os costumes locais de compras em supermercados. Dessa forma, a empresa preserva-se da implantação da elevada redução do contato humano no proscênio (TÉBOUL, 1988; 1999), nas atividades de atendimento ao cliente. Essa prática (de preservar o contato humano) parece coerente com a natureza da maioria das atividades de serviços, notadamente nas situações em que os próprios costumes dos consumidores requerem esse tipo de tratamento. Além disso, a área de marketing coopera com a área de operações ao direcionar a Comercial Carvalho para o posicionamento amplo de mercado, atendendo a vários segmentos no sentido de obter economias de escala na utilização dos recursos operacionais. Ela também coopera com a área de finanças ao utilizar preço uniforme nas lojas e dessa forma facilitar a implementação de controles de precificação. O marketing coopera com a área de recursos humanos na medida em que as campanhas publicitárias tendem a fortalecer a imagem da empresa junto ao mercado de trabalho e junto aos seus funcionários. b) Em relação aos posicionamentos competitivos (PORTER, 1986): No tocante à rivalidade entre as empresas existentes é estabelecido que o aumento da intensidade pode originar conseqüências negativas no desempenho para todos os competidores. Diante dessa força, a Comercial Carvalho tem se posicionado de modo defensivo com relação às ações de loja que envolvem, em especial, a sinalização de preços comparados. Seu posicionamento é ofensivo nas campanhas publicitárias. Com relação ao poder de negociação dos fornecedores afirma-se que fornecedores poderosos sugam a rentabilidade da indústria. A Comercial Carvalho tem se posicionado de forma defensiva em relação aos fornecedores de mercadoria na medida em que tenta manter relativo equilíbrio de poder de negociação por meio de sua política de reciprocidade, evitando dessa forma a perda de rentabilidade. Com relação aos novos entrantes há referência ao fato de que eles trazem o desejo de ganhar parcela de mercado. Nesse caso, a Comercial Carvalho tem se posicionado no sentido de antecipação, para evitar a perda de sua parcela de mercado. Quanto ao poder de negociação dos compradores a Comercial Carvalho restringe essa força ao praticar preços uniformes. E também ao deslocar o foco do cliente no preço para o foco em aspectos relacionados à prestação do serviço, ou seja, serviço de atendimento (no balcão de frios e pelo serviço de ouvidoria) e adequação do mix à demanda. Além disso, enfatiza-se, quanto aos produtos e serviços substitutos, que eles reduzem a rentabilidade potencial da indústria. Os gestores da Comercial Carvalho têm demonstrado certo ceticismo em relação a essa força. 12

c) Quanto aos recursos competitivos (BARNEY, 2002): Com base nos depoimentos dos gestores é possível afirmar que os recursos da empresa, atendimento ao cliente e origem local, são valiosos, pois capacitam a Comercial Carvalho a responder às ameaças e oportunidades do ambiente. Considerando como principais ameaças a chegada de competidores multinacionais e o acirramento da rivalidade entre os demais competidores existentes, os recursos são valiosos, pois têm contribuído para a manutenção de elevado índice de share of mind e volume de vendas. Os recursos são raros porque são controlados por um pequeno número de empresas competidoras. No caso do recurso origem local isso se verifica, pois apenas um concorrente menor, o Supermercado Major, detém essa condição. Além disso, o recurso atendimento diferenciado ao cliente, de acordo com a percepção dos gestores, é controlado pela Comercial Carvalho. Afirma-se que os recursos são difíceis de imitar quando resultam em desvantagem de custo para que seja obtido ou desenvolvido. A origem local é um recurso difícil de imitar, pelos demais competidores. Com relação ao atendimento ao cliente, os gestores afirmam que desenvolvê-lo implica elevação dos custos operacionais que é compensada pelo incremento no volume de vendas. Por outro lado, não é possível afirmar que os competidores incorreriam em desvantagem de custo para obter ou desenvolver esse recurso. A característica de organização (BARNEY, 2002, p. 160) refere-se às diretrizes e aos procedimentos para dar suporte à exploração dos recursos competitivos. Com relação à origem local e ao atendimento ao cliente, a Comercial Carvalho implementa procedimentos para explorar esses recursos. No primeiro caso, explora-se esse recurso por meio das campanhas publicitárias eventualmente protagonizadas pelos próprios fundadores. Além de desfilarem em trio elétrico na carreata anual de comemoração de aniversário da empresa. Para o atendimento ao cliente, por sua vez, a empresa implementa procedimentos específicos relacionados, dentre outras coisas, ao atendimento no balcão de frios e a ouvidoria. Por fim, é necessário registrar que esta pesquisa contou com o apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico CNPq, e foi desenvolvida entre os meses de outubro de 2005 e fevereiro de 2006. As informações estão atualizadas com dados de março de 2007. Referências bibliográficas BAKER, Michael J. Administração de marketing. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005. BARNEY, Jay B. Gaining and sustaining competitive advantage. 2 ed. New Jersey: Prentice Hall, 2002. BRASIL. Do parecer no tocante ao ato de concentração n. 08012.006967/2002-48. Parecer, n. 06029/2004/DF/COGSE/SEAE/MF de 01 de março de 2004. Lex: Secretaria de Acompanhamento Econômico, Brasília, p. 1-49, 2004a. Disponível em: <http://www.fazenda.gov.br/seae/documentos/pareceres/servicos/pcr060292004df_ac08012 006967200248.pdf>. Acesso em: 14 de fevereiro de 2005. BRASIL. Do parecer no tocante ao ato de concentração n. 08012.003972/01-18. Parecer, n. 008/COGSE/SEAE/MF de 01 de março de 2004. Lex: Secretaria de Acompanhamento Econômico, Brasília, p. 1-52, 2004b. Disponível em: <http://www.fazenda.gov.br/seae/documentos/pareceres/servicos/pcracbompreçocarrefourp ubl_raqueltt.pdf>. Acesso em 14 de fevereiro de 2005. 13

GRUPO CARVALHO. 2007. Disponível em: <http://www.grupocarvalho.com.br/integracao.html>. Acesso em: 22 de abril de 2007. LEVY, Michael; WEITZ, Barton A. Administração de varejo. São Paulo: Atlas, 2000. PORTER, Michael E. Estratégia competitiva: técnicas para análise de indústrias e da concorrência. 7 ed. Rio de Janeiro: Campus, 1986. SUPERHIPER Revista da Associação Brasileira de Supermercados. Ranking ABRAS 2006, ano 32, n. 364, p. 56-78, maio, 2006. TÉBOUL, James. De-industrialise service for quality. International Journal of Operations & Production Management, v. 8, n. 3, 1988.. A era dos serviços: uma nova abordagem de gerenciamento. Rio de Janeiro: Qualitymark, 1999. 14