VÍNCULO DE EMPREGO. CIRURGIÃO DENTISTA. A atividade exercida pelo autor se inseria nas necessidades normais e permanentes do empreendimento - CENTRO ODONTOLÓGICO - importando no estado de sujeição do trabalhador em relação ao empregador. Presentes os elementos configuradores da típica relação de emprego - trabalho pessoal, não-eventual, oneroso e subordinado. Caracterizada a prestação de serviços nos moldes do art. 3º da CLT, são devidas as parcelas dele decorrentes. Recurso a que se dá provimento. Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de Recurso Ordinário em que são partes: ANTONIO ELIAS SADER SANTOS, como Recorrente, e CENTRO ODONTOLÓGICO BELFORDENT LTDA ME, como Recorrido. Irresignado com a r. decisão proferida pelo MM. Juízo da 3ª Vara do Trabalho do Município de Nova Iguaçu, da lavra do EXMO. JUIZA DO TRABALHO FERNANDO REIS DE ABREU, às fls. 62/63, que julgou IMPROCEDENTE, o pedido veiculado na inicial, recorre ordinariamente o reclamante, pelas razões de fls. 68/74. Insurge-se o reclamante contra a decisão de origem, demonstrando seu inconformismo com o entendimento de que o autor confessara que era mero prestador de serviços e, portanto, não caberia o reconhecimento do vínculo empregatício em face da ré, assim como os demais pleitos decorrentes do pedido rejeitado. Provido o Agravo de Instrumento para destrancar o recurso principal, tem-se inexigível o recolhimento das custas pelo recorrente para fins do exercício da faculdade recursal. Contrarrazões às fls. 81/83. Deixo de encaminhar os autos ao Douto Ministério Público do Trabalho, por não vislumbrar interesse que justifique sua intervenção no feito, na oportunidade, sendo certo que, se assim desejar, poderá fazê-lo em sessão de julgamento. É o relatório. V O T O I. CONHECIMENTO Conheço do recurso, por atendidos seus pressupostos de admissibilidade. 3101/rcbs 1
II. MÉRITO VÍNCULO EMPREGATÍCIO. CIRURGIÃO DENTISTA Insurge-se o reclamante contra a sentença que julgou improcedente o pedido de declaração de vínculo de emprego com a reclamada no período de 03/12/2007 a 03/11/2009. Afirma, em síntese, que os documentos carreados aos autos e o depoimento do preposto da reclamada deixaram evidente a existência de vínculo de emprego. A r. sentença não reconheceu o vínculo de emprego por entender que o reclamante não era subordinado à reclamada, mas um profissional autônomo, considerando que no documento de fls. 43 o reclamante confessou que era mero prestador de serviços. Com a devida vênia ao entendimento de origem, da análise dos documentos juntados aos autos, entendo que há provas de que a relação mantida com a reclamada foi de emprego. Os documentos de fls. 33/35 e o termo das declarações prestadas perante o Conselho Regional de Odontologia do Rio de Janeiro demonstram que o reclamante, por determinação da reclamada, teve o seu nome e número de registro profissional afixado em uma placa externa como responsável técnico da clínica odontológica. O responsável técnico pelos serviços prestados em um clínica mantida pela ré, por óbvio, é um empregado, e não um profissional autônomo que não esteja subordinado ao estabelecimento. Além disso, o documento de fls. 50 (fls. 43 dos autos principais), demonstra que os dentistas, inclusive o reclamante, deviam observar os procedimentos estabelecidos pela reclamada para o atendimento dos pacientes, o que vai contra a autonomia que possuem os verdadeiros profissionais autônomos. Já a prova oral também confirmou a prestação de serviços do reclamante, bem como o trabalho de outros dentistas para a reclamada, sem CTPS assinada, nos seguintes termos (fls. 60): (...) a ré se constitui em Centro Odontológico e não possui nenhum dentista com CTPS assinada. (...) Os profissionais autônomos prestam serviços por contra própria e assumem os riscos da atividade, enquanto que os empregados prestam serviços por conta alheia, sendo da empregadora os riscos da atividade, o que ocorre no caso dos autos. Ainda, os dentistas estavam subordinados ao sócio diretor da Clínica, Dr. Anderson, o que indica subordinação à reclamada. Já no documento de fls. 27, a reclamada declara que o reclamante presta serviços na clínica, na função de cirurgião dentista, com remuneração mensal de R$ 3.000,00, e, diante da fraude constatada, pouco impressiona a afirmação de que estes serviços eram prestados como profissional liberal. 3101/rcbs 2
O trabalho era não-eventual, com onerosidade, exercido de forma pessoal, com subordinação e com uso de equipamentos e receituário da reclamada (fls. 52/58). Ademais, o fato dos dentistas possuírem certa liberdade para escolher os horários em que prestam os serviços não exclui a ocorrência de subordinação e, consequentemente, de vínculo de emprego, se considerada a presença dos demais requisitos inerentes a essa relação. O vínculo de emprego, fundado no princípio da primazia da realidade, emerge da prestação de serviços, independentemente da contratação formal - art. 442 da CLT. Os elementos de prova colacionados geram convicção de que a relação jurídica travada entre as partes era de emprego, evidenciando que a reclamada, ao invés de contratar dentistas como empregados, mantinha-os prestando serviços como profissionais liberais para desempenho de suas atividades com subordinação jurídica e onerosidade. Considerando que a reclamada é um Centro Odontológico que presta serviços de odontologia, é evidente que deve empregar dentistas para viabilizar o atendimento de seus pacientes. Caracterizada a prestação de serviços nos moldes do art. 3º da CLT, são devidas as parcelas dele decorrentes. Imperativa, portanto, a reforma do julgado para, reconhecendo o vínculo empregatício pretendido, julgar PROCEDENTE, EM PARTE, o pedido, e condenar a reclamada - Centro Odontológico Belfordent Ltda Me a proceder a anotação do contrato de trabalho na CTPS do autor, no período de 03/12/2007 a 03/11/2009, na função de cirurgião dentista, observado o salário pactuado, bem como ao pagamento do aviso prévio, férias e terço constitucional, 13º Salário, vale-transporte, FGTS e multa compensatória e indenização substitutiva de seguro desemprego. As parcelas ora deferidas deverão ser apuradas em liquidação de sentença, considerando-se a integração do período do aviso prévio indenizado no seu cálculo. Caso apurada em liquidação de sentença a existência de valores pagos a idêntico título, necessário se faz a dedução, sob pena de se estar contribuindo para o enriquecimento indevido de uma das partes. Dou provimento ao recurso para deferir as alíneas ii, em parte, iii, em parte, iv e v da exordial. DA ANOTAÇÃO NA CTPS. MULTA PECUNIÁRIA Trata-se de obrigação de fazer que, segundo regra expressa da lei (artigo 39, 2º, da CLT), pode ser cumprida por terceiro, razão porque não se pode impor à reclamada a condenação em astreintes. De resto, a não anotação da CTPS do recorrente impõe o cumprimento da obrigação pela Secretaria da Vara do Trabalho. De outra parte, há penalidades administrativas específicas para o inadimplemento patronal, segundo estatui a Seção VIII do Capítulo I, Título II da 3101/rcbs 3
CLT, a cargo do órgão local da DRT, sendo multa legal prevista com caráter administrativo que não reverte em favor do trabalhador. Assim, procede o pedido elencado na alínea ii do rol de pedidos, exceto quanto à multa pecuniária. MULTA DO ARTIGO 477 DA CLT A condenação no pagamento da multa do parágrafo oitavo do artigo 477 da CLT decorre da inadimplência das verbas oriundas da rescisão contratual, sendo irrelevante que o vínculo de emprego só tenha sido reconhecido por intermédio da presente ação. Defiro. DA MULTA DO ART. 467 DA CLT A disposição do art. 467 da CLT, por se tratar de sanção, deve ser interpretada restritivamente. O art. 467 da CLT, em sua atual redação, que assim estabelece: "Em caso de rescisão de contrato de trabalho, havendo controvérsia sobre o montante das verbas rescisórias, o empregador é obrigado a pagar ao trabalhador, à data do comparecimento à Justiça do Trabalho, a parte incontroversa dessas verbas, sob pena de pagá-las acrescidas de 50% (cinqüenta por cento)". Assim, não se observa a incidência do comando do referido artigo, na medida em que não havia parcelas a serem consideradas incontroversas. Assim, condeno a reclamada as reparações elencadas na alínea iii do rol de pedidos, exceto quanto à multa do art. 467 da CLT. DA INDENIZAÇÃO SUBSTITUTIVA DO SEGURO-DESEMPREGO EQUIVALENTE A 05 SALÁRIOS DO AUTOR. DANO CAUSADO O seguro-desemprego é regido pela Lei nº 7.998/90 (com as alterações introduzidas pelas Leis nºs 8.900/94, 10.608/02 e pela Medida Provisória nº 2.164-41/2001), e os procedimentos que disciplinam à concessão do benefício estão previstos nas Resoluções, emitidas pelo Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador. A indenização substitutiva do seguro-desemprego é decorrência da inviabilidade de recebimento do benefício, na forma da Súmula nº 389 do C. TST. Por óbvio, a indenização substitutiva levará em conta o teto previsto na legislação pertinente. Esclareça-se que o pagamento da indenização será apurado em liquidação de sentença, na forma do inciso I, parágrafo 2 do artigo 2 da Lei 8900/94. Indefiro o pedido de alínea vi. 3101/rcbs 4
DO DANO MORAL Pretende o reclamante indenização por danos morais, sob o argumento de que a reclamada colocou cartazes e panfletos utilizando o nome e a inscrição no CRO do autor, sem sua autorização, o que ocasionou notificação do Conselho Regional de Odontologia. No entanto, o autor, em declaração prestada ao CRO/RJ, afirmou que sabia que a propaganda era veiculada internamente. Decerto, a Constituição Federal, em seus artigos 5º, V e X, assegura indenização por dano moral, quando violadas a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas. Entretanto, para que se caracterize o dano moral é necessário que haja a ação culposa ou dolosa do agente, sendo que a responsabilidade civil será imputada apenas quando restar configurada a hipótese do art. 927 do novo Código Civil: Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187) causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. A obrigação de indenizar nasce quando demonstrado o nexo de causalidade entre o dano ao bem jurídico protegido e o comportamento do agente. Na hipótese dos autos, nenhuma prova foi produzida no sentido de constatar que o reclamado tenha cometido qualquer ato ilícito. Portanto, não se revela comprovada a situação fática descrita na inicial, não tendo sido demonstrada a prática pela reclamada de qualquer procedimento ilícito, apto a ensejar o pagamento de indenização por dano moral. Indefiro o pedido contido na alínea vi. DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS Indevida a verba honorária, uma vez que não foram preenchidos os requisitos da Lei nº 5.584/70 que permanece em eficácia. Nesse sentido se expressa jurisprudência uniforme, consoante o Enunciado nº 329 que ratifica o Enunciado nº 219, ambos editados pelo C. TST e que ora se acompanha. Indefiro o pedido de alínea viii da exordial. III. CONCLUSÃO Pelo exposto, conheço do recurso e, no mérito, dou-lhe provimento para reformar a decisão de primeiro grau e julgar PROCEDENTE, EM PARTE, o pedido, para declarar a existência de vínculo empregatício com a reclamada - Centro Odontológico Belfordent Ltda ME, em decorrência, determino seja procedido ao correspondente registro na CTPS do reclamante, no período de 03/12/2007 a 03/11/2009, condenando a ré ao pagamento do aviso prévio, férias e terço constitucional, 13º Salário, vale-transporte, FGTS e multa compensatória e indenização substitutiva de seguro desemprego, a serem apuradas em 3101/rcbs 5
liquidação de sentença, na forma da fundamentação supra que integra este dispositivo. Mantido o valor fixado à causa. Observe-se a inversão do ônus da sucumbência. Autoriza-se ainda, a dedução dos valores pagos a títulos idênticos, a fim de se evitar o enriquecimento sem causa. Juros e correção monetária na forma da lei, observada a Súmula Nº 381 do C. TST. Recolhimentos fiscais nos termos determinados pelo art. 12-A da lei 7.713/88, excluídos ainda, os juros de mora de sua base de cálculo. Recolhimentos previdenciários na forma da Lei nº 10.035/00. A C O R D A M, os Desembargadores que compõem a 1ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da Primeira Região, por unanimidade, conhecer do recurso e, no mérito, dar-lhe provimento para reformar a decisão de primeiro grau e julgar PROCEDENTE, EM PARTE, o pedido, para declarar a existência de vínculo empregatício com a reclamada - Centro Odontológico Belfordent Ltda ME, em decorrência, determinar seja procedido ao correspondente registro na CTPS do reclamante, no período de 03/12/2007 a 03/11/2009, condenando a ré ao pagamento do aviso prévio, férias e terço constitucional, 13º Salário, vale-transporte, FGTS e multa compensatória e indenização substitutiva de seguro desemprego, a serem apuradas em liquidação de sentença, na forma da fundamentação. Mantido o valor fixado à causa. Observe-se a inversão do ônus da sucumbência. Autoriza-se ainda, a dedução dos valores pagos a títulos idênticos, a fim de se evitar o enriquecimento sem causa. Juros e correção monetária na forma da lei, observada a Súmula Nº 381 do C. TST. Recolhimentos fiscais nos termos determinados pelo art. 12-A da lei 7.713/88, excluídos ainda, os juros de mora de sua base de cálculo. Recolhimentos previdenciários na forma da Lei nº 10.035/00. Rio de Janeiro, 14 de março de 2012 DESEMBARGADOR JOSÉ NASCIMENTO ARAUJO NETTO RELATOR 3101/rcbs 6