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Transcrição:

AJES - INSTITUTO SUPERIOR DE EDUCAÇÃO DO VALE DO JURUENA ESPECIALIZAÇÃO EM EDUCAÇÃO INFANTIL E ALFABETIZAÇÃO 9,0 ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO NA EDUCAÇÃO INFANTIL: O MUNDO DA LEITURA E ESCRITA PARA A CRIANÇA PRÉ-ESCOLAR Alesandra Aparecida da Silva alerodriguesslva@hotmail.com Orientador: Prof. Ilso Fernandes do Carmo COLÍDER/2013

AJES - INSTITUTO SUPERIOR DE EDUCAÇÃO DO VALE DO JURUENA ESPECIALIZAÇÃO EM EDUCAÇÃO INFANTIL E ALFABETIZAÇÃO ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO NA EDUCAÇÃO INFANTIL: O MUNDO DA LEITURA E ESCRITA PARA A CRIANÇA PRÉ-ESCOLAR Alesandra Aparecida da Silva Orientador: Prof. Ilso Fernandes do Carmo Trabalho apresentado como exigência parcial para a obtenção do título de Especialização em Educação Infantil e Alfabetização. COLÍDER//2013

RESUMO As práticas de leitura e escrita na educação infantil são alvo de ferrenhas discussões na classe docente por estar ainda obscuras para grande parte dos alfabetizadores e profissionais da educação. Detecta-se no interior das escolas de educação infantil, duas frentes opostas. Uma defende a alfabetização como uma prática a ser realizada na educação para solucionar o fracasso escolar do ano seguinte, enquanto que a outra defende práticas mais contextualizadas e lúdicas, propícias à faixa etária. Por esta razão, o tema escolhido visa encontrar sob as bases teóricas de alfabetização, letramento e educação infantil, abordagens que direcionem as práticas de leitura e escrita para com a criança pré-escolar de forma significativa, numa necessidade atual de educação voltada para o desenvolvimento integrado. Nesta perspectiva, o trabalho foi desenvolvido por meio da pesquisa bibliográfica para que à luz das teorias de alfabetização, letramento educação infantil, representadas por SOARES (2001), CAGLIARI (1998), e CARVALHO (2010), se ampliassem os conceitos de alfabetização e letramento, seja possível refletir sobre as práticas que se deve propor a criança em idade pré-escolar visando situações significativas de aprendizagem. De acordo com os estudos realizados foi possível verificar que a alfabetização ao longo dos anos passou por fases de ressignificação, culminando em dois processos polêmicos, o de codificar e o de letrar. A indefinição teórico-metodológica sobre os dois processos resultou no privilégio, ora da alfabetização, ora do letramento. Entretanto, considera-se que para superar os fracassos históricos do processo de alfabetização no país é preciso compreender que os processos são complementares. Ambos precisam estar integrados na Educação Infantil, onde a cultura da leitura e escrita se revelam. Da mesma forma, a ludicidade precisa ser uma constante no desenvolvimento infantil. Portanto, as práticas de leitura e escrita na Educação Infantil precisam respeitar as diferenças socioculturais de acesso a leitura e escrita minimizando as diferenças de seu acesso ao mesmo tempo em que estimula a apropriação do sistema como tecnologia e bem de direito de todos. Palavras chave: alfabetização, letramento, educação infantil.

SUMÁRIO INTRODUÇÃO...04 1. A LEITURA E A ESCRITA DO SÉCULO XXI...07 1.1 Desafios da era contemporânea...07 2. UM NOVO OLHAR PARA O PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO...09 2.1 O X da questão: concepção, métodos e controvérsias...09 2.2 Alfabetização e letramento: perspectivas de superação...14 2.3 Educar para a autonomia: as relações diretas da alfabetização e letramento na aprendizagem...19 3. A CRIANÇA PRÉ-ESCOLAR, A LEITURA E A ESCRITA...23 3.1 Alfabetizar ou não, na educação infantil?...23 3.2 A criança e o processo de leitura e escrita...25 3.3 Alfabetizar e letrar, ler e escrever: o que fazer com a criança préescolar?...28 CONCLUSÃO...38 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...41

INTRODUÇÃO O presente trabalho é fruto de uma reflexão sobre as práticas de leitura e escrita voltadas para a criança em fase pré-escolar. O professor de educação infantil se vê diariamente em meio a discussões, coletivas, teórico-metodológicas sobre como organizar tais práticas sem que deixe de lado as premissas básicas da educação infantil. Tendo em vista o contexto educacional atual, apontando para a aprendizagem integrada, amparada no ser humano como sujeito ativo nos âmbitos político, econômico, étnico-social e afetivo, que se apropria dos conhecimentos históricos construídos e que a partir destes reconstrói e intervém no meio em que vive, é preciso buscar as intervenções pedagógicas possíveis para auxiliá-lo na construção e utilização do saber. Entretanto, o cenário educacional atual aponta uma educação que não atende as necessidades do individuo enquanto pessoa, pois ainda se baseia em conhecimentos transferidos pelo professor através de conteúdos pouco significativos para a criança, prioriza o processo de leitura e escrita de forma mecânica e sem situações reflexivas. O fruto desta são pessoas que leem, mas não desvendam as palavras, e escrevem reproduzindo ideais de outrem. Desse modo, a educação infantil, primeiro espaço onde a intervenção pedagógica acontece, constituindo-se diariamente sobre práticas de leitura e escrita, é um espaço propício para reflexões e intervenções coletivas que refletem a insatisfação com a atual fase educacional ao mesmo tempo em que se vale das alternativas mais simples para a solução do problema. Visto que, esses métodos não atendem mais as necessidades do indivíduo nos dias de hoje. Portanto, o ensino fragmentado por áreas de atuação em que a escola adota há séculos não pode mais auxiliar o indivíduo deste século que busca uma visão ampla de compreensão e interferência no mundo em que vive. Encontrase aí o principal dilema da educação atual. Quais seriam os conhecimentos que a escola, enquanto formadora de cidadãos necessita priorizar?

05 Uma das possibilidades para uma educação na era moderna é a perspectiva do letramento. Entretanto, há uma insegurança do professor enquanto sujeito ativo da educação e como fruto da educação tradicional que lhe formou as bases. Cabe aqui duas razões: Primeiro, carrega consigo as marcas do medo de arriscar e estar errado. Segundo, o mundo moderno favoreceu tanto as práticas inter-sociais que ele mesmo desconhece os recursos disponíveis, logo foge a lógica de que é o dono do saber, como aprendeu. Portanto, a era digital traz consigo a exigência de novas formas de agir tanto para o aluno quanto para o professor. Isso porque requer um casamento perfeito entre prática e teoria. Pois um sujeito atual, além de ser obrigado a decifrar os signos e códigos para conseguir se comunicar, precisa refletir e se posicionar frente à eles. Não cabe a ele apenas a tarefa de compreender e ser compreendido, como outrora, é preciso apropriar-se das formas de comunicação. A nova perspectiva educacional de alfabetizar e letrar traz consigo novos desafios. Como definir as práticas de leitura e a escrita da criança pré-escolar na perspectiva do letramento? O que fazer para que as duas facetas da base de formação da leitura e escrita caminhem unidas? O quê fazer para que a educação infantil minimize as diferenças socioculturais de acesso a leitura e escrita? As reflexões formam sempre duas correntes. Uma, defende que a função da educação infantil deveria ser de mostrar a criança os princípios alfabéticos para que esta, ao terminar aquela fase, conheça a representação do sistema de escrita e escreva palavras. Enquanto que a outra, aponta outros objetivos e não é sua função, ensinar ler e escrever. Considerando tais fatores a clareza conceitual e metodológica, do que é alfabetização, do que se compreende deste processo e do que se busca com a educação infantil parece ser prioritária para a compreensão do problema e das possíveis soluções a serem buscadas. Por esta razão, o presente trabalho busca por meio da pesquisa bibliográfica, encontrar sob as bases teóricas de alfabetização, letramento e educação infantil, abordagens que direcionem as práticas de leitura e escrita para com a criança pré-escolar de forma significativa, numa necessidade atual de educação voltada para o desenvolvimento integrado.

06 Essa não é uma tarefa fácil, por isso a perspectiva de alfabetizar e letrar não é unanimidade no universo educacional. Falta conhecimento para aqueles que consideram o letramento uma característica isolada da alfabetização. Tomar consciência de que temos necessidades de buscar teorias que possam contribuir com a construção de uma educação significativa implica reconhecer que temos dificuldades em alfabetizar letrando. A proposta de letramento aliado à alfabetização é partir do ponto seguro e ampliar os horizontes. O seguro para a criança é os seu meio, é a partir dele que o professor deve auxiliá-lo a perceber e refletir sobre os dizeres escritos e falados e perceber os fazeres que não são escritos e muito menos falados. A leitura e a apropriação da escrita como tecnologia de representação da fala, de composição de significados registrados por meio de elementos gráficos só tem sentido se tiverem vivas, se significar, produzir reação. Se isso não ocorre, não se pode dizer que o indivíduo apropriou-se da leitura. É importante que saibamos que somos peças fundamentais para que as crianças construam uma nova visão de mundo e de ensino, pois, os professores interferem na construção da aprendizagem dos alunos pelo que ele faz e pelo que ele não faz. O trabalho encontra-se divido em três capítulos. O primeiro apresenta uma reflexão sobre os desafios do ler e escrever na atualidade e o papel da escola na formação do indivíduo na era da informação. O segundo busca traçar um elo entre o que está implícito no processo de alfabetização e o reflexo destes nas práticas reais do uso da leitura e escrita pelo indivíduo, ao mesmo tempo em que discute os conceitos de alfabetização e letramento apontando, à luz dos teóricos, as possibilidades de transformação das práticas nos processos de ler e escrever. O terceiro discute as relações que a criança em fase pré-escolar mantém com as situações reais de leitura e escrita, e aponta algumas práticas a serem desenvolvidas para a formalização do falar e escrever a partir de pressupostos teórico-metodológicos pautados na indissociabilidade entre alfabetização e letramento.

CAPÍTULO I: A LEITURA E A ESCRITA DO SÉCULO XXI 1.1 DESAFIOS DA ERA CONTEMPORÂNEA A linguagem surgiu como uma necessidade básica do ser humano para a interação com os demais. Ela é a forma mais natural e peculiar que o homem conseguiu desenvolver a partir do contato com o outro, pois o seu aperfeiçoamento só é possível se houver relação entre as pessoas. O ser humano produz situações para ser compreendido, produz mecanismos para compreender o outro, para ler o que ele pretende dizer. Esses mecanismos foram transmitidos de geração em geração, da mesma forma em que foram transmitidos as experiências de povos antigos, suas histórias, lendas e crenças. Embora estas práticas sejam efetivas e naturais na sociedade, produzindo sentido e tornando-se uma língua nata, a escola tende a reproduzi-la tão sistemática e burocraticamente que esta perde a razão de sua essência, a comunicação. Não raro tem se encontrado nas publicações nacionais constatações de que as pessoas não conseguem fazer-se entender pela língua escrita, da mesma forma em que não conseguem entendê-la para usufruir delas no seu cotidiano. Tais condições tem provocado uma verdadeira crise nas dependências das instituições educativas. (CAGLIARI, 1998). Mas quais seriam as causas do insucesso escolar? De acordo com PASTORE (2012), há um descompasso considerável entre as novas tecnologias e a escola. A primeira evoluiu, ao passo que a segunda não conseguiu acompanhar, ficou atrasada Os dados indicam que faltam pessoas capacitadas para ocupar vagas de trabalho, enquanto sobram pessoas nas filas a procura de emprego. Tal situação se dá pela a ausência de capacitação. Esta por sua vez, ocorre pela má formação educacional que recebem na educação pública, ainda no ensino básico. As pessoas estão incapacitadas de pensar, de serem autônomas, de lerem e escreverem com propriedade.

08 Neste cenário, a educação que sempre apontou caminhos, apresenta-se sem certezas absolutas, até por que agora, a verdade é relativa. Há sempre uma nova forma de ver o mundo, aliás, há várias. Talvez por que a característica do novo milênio é mesmo a complexidade, as várias vias de se transitar por muitos caminhos em um mesmo tempo. Enfim, em meio a tantas possibilidades de ação e interação, a educação se encontra numa busca conflitante das possíveis várias saídas. Sabe-se certamente, que o contato com um turbilhão de informação não quer dizer necessariamente a apropriação de conhecimentos ou a construção deste. Surge um novo questionamento no campo educacional. Como educar para a nova era? Como transformar a sociedade atual informatizada, dita como a sociedade do conhecimento em sociedade que usufrui da informação em favor da cidadania e do conhecimento? Onde a crise educacional começa? Tais questões vêm intrigando a elite educacional que buscam soluções, propostas, projetos para uma possível solução.

CAPÍTULO II: UM NOVO OLHAR PARA O PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO 2.1 - O X DA QUESTÃO: CONCEPÇÃO, MÉTODOS E CONTROVÉRSIAS. A literatura nacional tem publicado uma grande diversidade de obras que falam de ensino (processos) e métodos visando uma possível superação do fracasso da alfabetização nacional. Entretanto, a clareza destes, nem sempre é como se espera, isso porque ao relatar o processo de ensino atual, provoca-se uma confusão conceitual que pouco auxilia na prática pedagógica. Portanto, (...) às vezes, é preciso voltar às origens, aos princípios básicos, as coisas simples e claras, rever a história (...) alguns pontos gerais a respeito de ensino, aprendizagem e métodos. (CAGLIARI, 1998. p.36). Considerado o autor, a clareza de aspectos tão importantes na pratica pedagógica se faz necessária para uma atuação consciente do professor numa educação em crise conceitual e metodológica. Neste aspecto, o autor define, com propriedade, o ensino e a aprendizagem. A concepção que se tem destes dois aspectos são determinantes nos métodos selecionados no cotidiano da educação. Ensino e aprendizagem são processos que não ocorrem simultaneamente. O primeiro é um ato coletivo que se dá sob organização sequencial e temporal, por parte de quem ensina para que aquele que ouve possa compreender o que lhe é transmitido. O ensino tem a sua base na oralidade, na fala, na exposição. Ele, por si só, não pode construir nada, a pessoa que ensina não pode aprender pelo outro. Dessa forma, a principal característica do ensino é a de ser um processo homogêneo, um conhecimento é exposto da mesma forma para todos os indivíduos. (CAGLIARI, 1998. p. 39). Por outro lado, a aprendizagem caracteriza-se como um processo individual, ao passo que cada indivíduo aprende conforme seu desenvolvimento intelectual. Por essa razão, a aprendizagem se aproxima da heterogeneidade à medida que sua ordem se dá na peculiaridade do indivíduo em aprender tendo por base suas experiências sociais e pessoais. Diante desta assertiva, a aprendizagem pode ocorrer em qualquer ambiente. As pessoas aprendem umas com as outras, e esta premissa vale também para as crianças, os alunos aprendem com outros alunos, encontram soluções para problemas significativos, pensam, tomam atitudes, estratégias importante para a

10 aprendizagem. O ambiente escolar é uma forma prática e organizada, mas não é a única. O indivíduo aprende também na informalidade, com a mesma produtividade. (CAGLIARI,1998. p.38). As reflexões do autor sobre ensino aprendizagem trazem em sua essência a reflexão sobre as bases do conhecimento. Enquanto que o ensino se aproxima da base racionalista de conhecimento em que o individuo aprende se exposto ao conhecimento, a aprendizagem se volta para ao interacionismo em que o individuo aprende por meio das situações externas e processos internos. Tais reflexões são indispensáveis para discernir quais são as características que a educação atual pretende formar nos indivíduos que frequentam espaço escolar, adotando práticas condizentes com as suas concepções. As escolas geralmente enfatizam demasiadamente o processo de ensino, dando menos ênfase aos processo de aprendizagem. O fruto desta concepção, são as tentativas de busca de classes homogêneas, desconsiderado as verdadeiras aprendizagem diferente em cada criança e com ela seu processo gradual de aprendizagem. De acordo com as discussões propostas, a alfabetização, durante muitos anos foi, talvez ainda seja, resultado do método de, ensino e como consequência deste, a criança não dominava o funcionamento da escrita, resultando numa leitura sem produção de significados, e numa escrita que não representa as verdadeiras intenções da fala. São estas as principais características de uma formação pessoal pautada no método de ensino, e que se tornou alvo de amplas discussões no âmbito educacional por se caracterizar posteriormente como indivíduo passivo, possibilitando o fracasso educacional. O método traz consigo a ideia de que a criança é uma pagina em branco, onde se precisa imprimir tudo e essa função cabe à escola. (CAGLIARI, 1998). Seguindo esta linha, na alfabetização a técnica empregada é o do montadesmonta da linguagem, em que se escolhe uma palavra, geralmente muito simples, sem significação, apenas por fins práticos, e dela se extrair pedaços para destes se formem novas palavras. Desta forma, as sílabas são organizadas sem que se reflita realmente sobre o papel da escrita, nas situações reais da linguagem.

11 Isso traz consigo, as implicações do método em que o professor ensina e o aluno aprende. Na prática, o professor significa tudo o que a criança escreve e esta faz a sua função, separa e junta os pedacinhos. Em seu consciente, ela cumpriu sua parte e se perplexa quando o professor não compreende o que fez, pois imagina que ele é que entende da língua. A distante relação entre a língua falada e o modo em que esta se revela na escrita nas escolas é o que fez o autor, e inúmeros outros autores brasileiros, questionar o modelo secular da educação. E é pela mesma razão que os dados revelam-se tão insatisfatórios na atualidade. O autor afirma que nenhum falante nato da língua, fala em pedacinhos, com palavras apoiadas em sequência de sílabas que não existem, o que ocorre frequentemente no dia-a-dia das escolas. Atribui-se a este fator, o fato da criança ter se formado em repetir modelos e quando precisa escrever com propriedade, provavelmente tentara retomar ao que já tem experiência. Exemplos citados pelo autor, provoca a reflexão para que apesar de, com o tempo, o individuo mesmo ao ler e escrever, não consegue ser autônomo e não se sente inserido na comunicação escrita, muito menos reconhece que aquele código decifrado é o mesmo que ele utiliza na sua informalidade oral. Sobre este aprisionamento ao código, o autor declara que trata-se de uma fórmula perfeita para o adestramento (CAGLIARI, 1998. p. 51). Quando a capacidade de tomar decisões seguindo o comando do pensamento é negada ou negligenciada do ser humano, ele perde sua identidade, afinal é um ser racional e enquanto ser racional temos toda a liberdade do mundo de acharmos o que quisermos, seja lá a respeito do que for, com que idade for, na rua, na sala de aula, na igreja ou em qualquer lugar (CAGLIARI, 1998. p. 51). A considerar a afirmação do autor, a escola tem até hoje, realizado a tarefa de aprisionar a racionalidade das crianças durante a fase de formalização do conhecimento da língua falada. Foram considerações como estas que denominaram a pedagogia de Paulo Freire como pedagogia libertadora. Foram escritas inúmeras obras abordando as dificuldades das pessoas que depois de alfabetizadas não conseguiam escrever com eficiência. A dificuldade em escrever, segundo FREIRE (1997), se dá porque a

12 pessoa não conseguiu forma-se como um leitor pensante, autônomo e exigente. Isso não esta ligado a leitura que se propunha na escola, de porções e período. O escritor defendeu como ninguém a leitura do desvendamento, da compreensão do lido e da representação da fala, constituída socialmente, que por sua vez, transmite a ideia sobre o lido gerando uma cadeia entre ser e escrever como processo de liberdade, suas palavras continuam atuais, pois se nossas escolas, desde a mais tenra idade de seus alunos se entregassem ao trabalho estimular neles o gosto da leitura, gosto que continuassem a ser estimulado durante todo o tempo da sua escolaridade, haveria possivelmente um número bastante menor de pós- graduandos falando de sua incapacidade de escrever. (FREIRE, 1997. p. 25). Nas sábias palavras do autor, vê-se o reflexo da educação que se inicia cedo, concebida, às vezes, como obrigação da escola. Às vezes, porque não raramente, as reflexões e responsabilidades não são frequentes sobre o fato de aprender ler e escrever. As formas sobre as quais se ensina ou se aprende são determinantes para quem aprende. Aprende a reproduzir ou a produzir. Sob esta perspectiva, discute-se, teoricamente, o fato de que as pesquisas revelarem, ainda hoje, um fracasso na função prioritária da escola, ler e escrever. Sendo o processo de alfabetização, e as formas que esta se dá nos espaços escolares do Brasil, um tema polêmico e delicado, SOARES (2004), afirma que a educação vive atualmente em um período critico, propício para que se examine as praticas outrora desenvolvidas a luz das teorias cientificas para que se apontem os novos caminhos e se reconheçam os descaminhos que dificultam os avanços (p. 99 ). Evidencia-se assim, que as inúmeras reflexões sobre o método utilizado para alfabetizar, compreendido como o processo de ensinar a ler e escrever, sendo o ler a capacidade de transformar sinais gráficos em sons e o escrever a de transformar sons em sinais gráficos, resultaram na busca de novas formas de ensino ancoradas nos estudos psicológicos do desenvolvimento humano, ampliando o processo de alfabetização, e, no mínimo, ressignificando-o. A alfabetização é em si um processo complexo e por essa razão, polêmico. Há divergências teóricas em torno de assunto. Mas as principais, segundo a síntese da autora, são os consideram a alfabetização, o resultado de um processo de aquisição do sistema alfabético ortográfico e suas convenções em uma lógica

13 linguística cognitiva. (SOARES, 2004). Outros, compreendem que a leitura e escrita são resultados do contato cotidiano com praticas de escritas em variados gêneros e contextos com os mais diferentes objetivos. E, finalmente aqueles que acreditam ser impossível dissociar as duas dimensões já que esta se dá em constante relação do individuo com o social. Por essa razão, o fato de alfabetizar traz consigo três dimensões interdependentes. Uma linguística, em que se traduz sons em sinais gráficos. Uma cognitiva, em que num processo interno o individuo aprende as regras do sistema de escrita, do código de significação e de produção de sentido. E, uma sociocultural, em que o individuo seleciona e adequa as práticas de leitura e escrita aos diferentes contextos em que necessite utilizá-las. Sob estas considerações, examina-se que um dos descaminhos citados pela autora é privilegiar uma ou outra dimensão e por essa razão descaracterizar a plenitude do processo de alfabetização. De fato, isso ocorreu quando propagadas as críticas ao método tradicional de alfabetização, aliadas às publicações das teorias construtivistas. Segundo (SOARES, 2004), a interpretação da teoria de Piaget, que tem como base o sujeito construtor de seu conhecimento e a ampla descrição da aquisição escrita em uma criança, descritas por FERREIRO e TEBEROSKY (1985), apud SOARES (2004), apenas reforçaram a insegurança dos professores frente ao ensino tido como tradicional, formando as práticas construtivistas, entretanto o equívoco se deu por se tratar da firmação de uma base psicológica e não pedagógica. Acreditando que as relações de fala e escrita seriam construídas pelo sujeito de forma incidental e assistemática, os parte dos professores deixaram de lado a reflexão sobre a sistematização linguística, ampliando o fracasso entre o ler e o escrever. (SOARES, 2004. p.21). O privilegiar o conhecimento do aluno nada tem a ver com deixar de auxiliálo no processo de conhecer o sistema de escrita historicamente construído. Sozinhas as crianças não se tornam leitores ou escritores. As contribuições piagetianas e a descrição de Emília Ferreiro, não poderiam (nem podem) serem confundidas com métodos de alfabetização porque não os são, nem nunca foram. As pesquisas propuseram reflexões nas bases teóricas da aprendizagem e estas

14 impulsionavam novas praticas pedagógicas ancoradas nas necessidades individuais das crianças, (CARVALHO, 2010). Não se pode negar as contribuição das teorias citadas, entretanto tomá-las como metodologias foge as dimensões da alfabetização, tão bem descritas por SOARES (2004). Por outro lado, as contribuições apontam falhas na metodologia de ensino dominante, na época, como por exemplo, ao provar o fato de que as crianças que não estão em contato diário com a escrita e, portanto, percebem a escola como situação alheia ao seu mundo, não deveriam se deter a ler em pedacinhos ou fazerem cópias. Antes disso, deveriam descobrir o prazer em ler, escrever, atribuir sentidos as coisas que veem na escola, dando a esta a mesma importância da vida além dela. 2.2 ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO: PERSPECTIVAS DE SUPERAÇÃO Diante de tais contribuições, as buscas por novos parâmetros de aprendizagens, coincidiram com as novas necessidades exigidas pela sociedade em evolução tecnológica, pautadas em novas concepções de homem e de educação que ansiavam por ampliar as formas de alfabetizar, usadas ate então. (SOARES, 2004). Foi no final da década de 80, que surge uma nova terminologia para se referir as novas necessidades de ler e escrever, o letramento. A palavra letramento aparece pela primeira vez na literatura brasileira no livro de Mary Kato, quando esta se referia a condição da escola em auxiliar o aluno a dominar com eficiência a língua falada e a língua escrita. Por essa razão, a palavra letramento tem origem na palavra inglesa literacy, que significa estado ou condição daquele que é literat. Literat, por sua vez significa a pessoa que não só sabe ler e escrever, mas que faz uso competente e frequente da língua, escrita e falada. Diferente desta versão, letrado, na língua portuguesa significa pessoa erudita, com domínio da literatura. (SOARES, 2001. p.15). Nas discussões sobre letramento, acredita-se que letrado é o individuo que vive imerso nas praticas de leitura e escrita, aproximando-se, pois, da definição inglesa. Com base em tais pressupostos, a palavra letramento invade a área da pedagogia, das ciências sócias e da linguística como um fenômeno das novas

exigências da vida social em que a leitura e a escrita ultrapassa o sistema alfabéticoortográfico e penetra em campos comportamentais e atitudinais do individuo (SOARES, 2001. p.15). Letramento se tornou o termo utilizado para designar a condição do individuo que além de decifrar o que há escrito, é capaz também de compreender a cultura representa naquele código como expressão da sua vida real. Letramento é, portanto, a condição de ensinar e apreender as praticas sociais da leitura e da escrita (SOARES, 2001). Desta forma, com a palavra letramento e seu significado nasce também, as palavras alfabetizados, e letrados. Sendo a primeira, a expressão do individuo que aprende o código linguístico como processo formal de ler e escrever e a segunda, expressão daquele que se insere em práticas reais de leitura e escrita. Por essa razão, o letramento é considerado estado ou condição que um indivíduo, ou grupo social adquirida como consequência de ser praticante ativo da leitura e escrita no contexto em que vive. Estado ou condição, porque são situações que podem ser alterados com o tempo. Um exemplo dado pela autora é a de que uma pessoa analfabeta pode apresentar uma condição de certo nível de letramento ainda que não conheça o código alfabético escrito. Entretanto, faz uso do mesmo código em sua versão oral e consegue aproximar-se, pela experiência sócio cultural, da formalidade do padrão escrito, quando se apóia nos signos para decifrar as situações cotidianas de leitura, para pedir que outrem registre em escrito o que gostaria de dizer a um terceiro. São aquisições importantes para a compreensão do sistema de leitura e escrita. Outro exemplo diferente, é o de pessoas que depois de alfabetizados e decifrando perfeitamente o código linguístico escrito, não conseguem vivenciá-lo nas práticas reais de leitura e escrita, demonstram dificuldades em preencher formulários, compreender orientações escritas e articular a compreensão e a leitura, grave problema da sociedade alfabetizada (CARVALHO, 2010). Entretanto, uma pessoa analfabeta pode vir a alfabetizar-se, da mesma forma em que uma pessoa alfabetizada pode adquirir níveis importantes de letramento, por essa razão a palavra letramento torna- se uma condição, um estado (SOARES, 2001). 15 5

16 Algumas situações corriqueiras são altamente influenciáveis no processo de letramento. Ler sob diferentes objetivos e necessidades, em diferentes contextos em signos que não sejam somente as alfabéticas. Ler por vontade, e em qualquer lugar, pois, as pessoas se interagem com diferentes fontes de impressos, com funções reais em que se descobrem parte do mundo representado, passando a representarse por ele, interferindo de tal forma no mundo, como este interfere na personalidade delas. Por razões tão interpessoais, complexas e profundas, o letramento não pode ser concebido apenas em seu caráter formador social. Dai as razões dos equívocos na área da educação, já abordados neste capítulo. Há dois fenômenos interrelacionamentos presentes no letramento, as competências de ler e escrever. Na dimensão individual do letramento, a leitura envolve (...) um conjunto de habilidades linguísticas e psicológicas, que se estendem desde habilidade decodificar palavras escritas ate a capacidade de compreender textos escritos. (SOARES, 2001. p.68). Pode-se dizer que, nas palavras expostas, letrar-se é adquirir competências básicas não só para ler o mundo, mas para ler as palavras. Ou seja, a relação letra/som é tão fundamental quanto a compreensão do lido. (FREIRE, 1997. p.20). A habilidade de reconhecer sinais gráficos e a eles atribuir sons, analogias, comparações, definições sobre o lido construindo significado é fundamental para que o indivíduo possa ler os mais diversos materiais, seja praticante da leitura do desvendamento. (FREIRE, 1997). Ainda na perspectiva individual, a escrita como tecnologia, exige um conjunto de habilidades diferentes, mas, também linguísticas e psicológicas de registrar as unidades sonoras, ao mesmo tempo em que transmite o significado pretendido a outrem, em outro tempo e em outro espaço, desta forma, o interlocutor se transforma em um ouvinte ideal, operações puramente cognitivas. Quando consegue ler um dinheiro, ditar um texto o analfabeto relaciona internamente habilidades importantes de leitura escrita, foge-lhe, entretanto, as questões ortográficas da escrita, a decifração do código linguístico escrito. Tais pontuações mostram que letramento é mais do que o convívio com a leitura escrita.

17 Sabiamente, FREIRE, (1989), escreve que a leitura do mundo precede a leitura da palavra (p.09). Entretanto, afirma que quando aprendemos a ler, o fazemos sobre a escrita de alguém que antes aprendeu a ler e a escrever. Ao aprender a ler nos preparamos para imediatamente escrever a fala que socialmente construímos. (FREIRE, 1997.p.25). Esta seria uma gênese da palavra letramento, pois, letrada é a pessoa que consegue ler e escrever com compreensão uma frase simples e curta sobre sua vida cotidiana (UNESCO, 1958), apud SOARES, (2001, p. 71). Eis aqui a razão da polêmica da palavra, sendo esta mais complexa do que aparenta. Letrar é não privilegiar nenhuma das características básicas do letramento, o ler e o escrever, o individual e o social, a aquisição da escrita e atribuição de significados. A autora afirma que sendo o letramento, a apropriação da leitura e escrita, existem vários níveis de letramento. Pois, se não assim, chega-se a um impasse conceitual. Uma pessoa que consegue adquirir parte das habilidades de leitura e escrita, como nos exemplos aqui citados, não pode ser considerada iletrada, pois adquiriu parte das habilidades de letramento, ao mesmo tempo em que não pode ser considerada letrada, por não tê-las na totalidade, ou seja, não domina com competência a escrita e a leitura do código. Então a mesma autora busca esta definição. Conclui-se que há diferentes níveis de letramento, que dependem tanto das necessidades quanto das demandas do indivíduo, tanto do seu meio quanto contexto social e cultural. No contexto individual de letramento estão privilegiadas as habilidades psíquicas desenvolvidas pelas dimensões da leitura e da escrita sendo que estas estão ancoradas nas experiências socioculturais e afetivas. No contexto social, este é um produto de transmissão cultural e, portanto, contextualizado que se faz presente na era contemporânea e para ser compreendido em sua amplitude requer uma análise do contexto, sem este o letramento descaracteriza-se. (SCRIBNER, 1984, apud SOARES, 2001). O que se pode definir portanto, é que o letramento envolve práticas individuais e socioculturais de leitura e escrita, assim definidas na Declaração de Persépolis, (1975),

18 (...) assim concebido, o letramento cria condições para a aquisição de uma consciência crítica das contradições da sociedade em que os homens vivem e de seus objetivos; ele também estimula a iniciativa e a participação do homem na criação de projetos capazes de atuar sobre o mundo, de transformá-lo e de definir os objetivos de um autêntico desenvolvimento humano (apud SOARES, 2001, p. 77). Compreendendo, pois, a formação do ser humano, consideradas no aspecto do letramento, voltamos a antiga discussão do alfabetizar e do letrar, do processo de ensinar a ler e escrever ou do processo de considerar como estas práticas ocorrem no mundo real. Ao buscar a ampla bibliografia temática de Magda Soares, é possível concluir que não se pode considerar um processo na ausência do outro, não é possível conceber a alfabetização sem o letramento, da mesma forma em que é impossível realizar as práticas de letramento sem a alfabetização, são estes, dois processos integrados. Há no processo de ler e escrever a aquisição da escrita convencional, socialmente representada como código linguístico desenvolvido desde os primórdios da humanidade e há também o desenvolvimento de habilidades do uso e identificação deste sistema nas práticas cotidianas das pessoas. Seria um descaminho tomar estes processos como divergentes, opostos. Estes são indissociáveis, simultâneos e interdependentes (SOARES, 2004, p. 22). Ao alertar sobre os possíveis equívocos que podem ocorrer na prática pedagógica dos professores que lidam com as crianças na faixa etária de alfabetização, a autora poderá que é necessário que se busque novas alternativas de ensino que considerem a integridade destes dois processos, superando as dificuldades enfrentadas no passado e que se refletem na escolaridade da população atual ao mesmo tempo em que se busca um futuro diferente, com mais significação da participação social da escola. Aspectos importantes desenvolvidos no âmbito escolar nas últimas décadas precisam ser considerados como uma evolução, sejam eles a compreensão do processo de aprendizagem, a capacitação profissional pautadas em fundamentação teórica como baliza para se repensar os processos de alfabetização. Busca-se então, um ensino direto, organizado pautado na dimensão sociocultural que potencializa as habilidades e competências do uso social da leitura e escrita nas situações cotidianas. Considera-se, portanto, que alfabetizar e letrar é, sem dúvida,

19 o desfio lançado para que a escola forme pessoas capazes de ler e escrever com plena autonomia. 2.3 EDUCAR PARA A AUTONOMIA: AS RELAÇÕES DIRETAS DA ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO NA APRENDIZAGEM. Que a escola tem o compromisso de formar pessoas que possam atuar efetivamente no mundo em que vivem todos sabem. Entretanto, é preciso considerar aspectos que parecem óbvios, mas que na realidade estão obscuros, mascarados por práticas que não condizem com os objetivos esperados nem com as ansiedades de uma população que vive em uma sociedade rica em situações de leitura e escrita. Por essa razão, entende-se que novas formas de ler o mundo, requer novas metodologias de ensino, afinal, as técnicas utilizadas para uma sociedade do passado, com menos acesso as tecnologias precisam ser reconsideradas, ressignificadas, quiçá, substituídas, ao fazerem parte da educação no contexto atual (CAGLIARI, 1998). Um método de ensino para a atualidade deve considerar como ser em pleno desenvolvimento, com plena participação nas práticas sociais de leitura e escrita e que traz consigo os conhecimento construídos a partir de tais experiências. Desta maneira, a linguagem oral é, sobretudo, uma expressão da racionalidade, de uma maneira intencional de comunicação e interação com o mundo. Refletir sobre a fase de alfabetização na atualidade é tomá-la como integrante ao processo de letramento, ainda que a palavra letramento não esteja explícita, as práticas realizadas precisam estar apoiadas na amplitude do processo de aquisição e uso da linguagem, pois, influencia diretamente no desenvolvimento da autonomia da pessoa. È importante reconhecer, ainda, que as classes atuais são compostas de crianças com histórias de vida singulares e por esta razão possuem conhecimentos diferentes frutos desta singularidade. É preciso lembrar que algumas crianças aprendem coisas lá em casa, têm lápis, papel, livros, outros nunca tiveram nada disso. (CAGLIARI, 1998. p. 53).

20 A criança desde muito cedo vai se construindo como um ser que interage com os registros orais e escritos da comunicação humana. Ela consegue perfeitamente compreender o mundo que a cerca, comunicar-se com ele e produzir sentidos. Ela lê o mundo. Não através da leitura morta, fixada nas letras que adquirimos durante a passagem para a vida adulta, mas na leitura de imagens, de histórias, de fantasias presentes nos livros. É por isso que a literatura deve fazer parte da vida da criança (NEDER; POSSARI, 2008). Compreende-se, portanto, que cada criança tem suas peculiaridades e por esta razão, o ensino não pode se der apenas visando o aspecto coletivo, afinal cada criança necessita de uma maneira peculiar de intervenção por parte do professor, além da magia das histórias lidas e recontadas, pela conversa, por desenhos, ou pelo silêncio, por esta também ser uma forma de comunicação. O que realmente é importante é que o professor possa conhecer a criança, seu perfil, seu ritmo de aprendizagem, sua história de vida, seus ideais e como estes refletem nas diferentes manifestações de leitura e escrita. Para a busca do conhecimento individual, o professor pode basear-se nas atividades coletivas propostas, como a escrita e o desenho, já é possível notar a relação individual da criança com o mundo da leitura e escrita, a forma com que pega o lápis, a vontade de escrever, ou não, os registros produzidos, são situações simples, mas que trazem consigo a possibilidade de uma leitura docente para o universo linguístico da criança, culturalmente desenvolvido e que podem ser a base para a intervenção. (CAGLIARI, 1998). As intervenções a que o autor se refere devem ser oportunas e pontuais e por essa razão, a clareza teórica e prática do que as crianças fazem, por que fazem ou deixam de fazer, e como fazem, é crucial. É neste aspecto que as considerações realizadas por Magda Soares fazem sentido, as pesquisas acerca da aprendizagem desenvolvidas e expandidas no universo educacional é um grande avanço para esta definição. Ao pontuar e intervir, o professor questiona, dá informações busca o desequilíbrio das informações para que novos conhecimentos sejam construídos. O erro é, nesta perspectiva, um produto para a análise e reflexão a fim de provocar o avança. Se para isso, for preciso mais subsídios para a produção de sentido, que seja. Sabe-se que a criança faz uso do conhecimento acumulado, e isso não pode ser negligenciado ao se propor qualquer atividade. Quanto mais

21 informações a criança tiver sobre o novo, mais fácil será estabelecer relações sobre o que já tem. Aqui está o grande segredo da aprendizagem: o aprendiz não só aprende o ponto, mas aprende a aprender. A verdadeira aprendizagem proporciona aos alunos generalizar o processo de tal maneira que a intermediação do professor vai, aos poucos, cedendo lugar à sua própria independência e competência para buscar as explicações adequadas por si mesmo e a construir seu próprio saber. Quanto mais cedo o aprendiz chegar a essa autonomia, melhor será para ele: aprenderá melhor, mais rapidamente, com mais dados (CAGLIARI, 1998. p.57). Nas palavras do autor, verifica-se uma relação direta, entre o produto de aprendizagem. Para a conquista da autonomia do aprendiz, o processo vivenciado por ele precisa permitir que ele seja autônomo. Ou seja, obtidas as informações, ele elabora, questiona, ressignifica, imprime a marca pessoal avançando na aprendizagem. Isto nada tem a ver com um ensino pautado na repetição e na prática passiva a partir de um modelo de leitura e escrita que não produz significado real. A busca da autonomia como leitor e escritor, perpassa por situações simples, mas valorosas, de liberdade para pensar, conversar, produzir, ler, aproximar as situações na escola com aquelas significantes que tem contato fora dela. São situações em que precisam agir em situações de decisão, incentivadas a organizar, a produzir sentido àquilo que escrevem, falam, expressando-se em sua totalidade. Só assim é possível aflorar a criatividade, a espontaneidade das produções e a segurança e espontaneidade do ato de ler. A avaliação é, neste contexto, o resultado de um processo de aprendizagem, dinâmica e contínua permitindo a intervenção do professor. Afinal, a criança não aprende sozinha, ela aprende com, aprende para, modifica o saber a cada nova experiência. A dinamicidade deste processo, por vezes deixa os professores receosos, com uma pré disposição a voltar às bases em ele ensina e o aluno aprende. Entretanto, o autor alerta que, ao longo do processo de aprendizagem em que o foco está voltado para a criança, estas também, podem ler e escrever, fazer tudo de acordo com as convenções linguísticas, mas com graus elevados de autonomia e criatividade. E então a insegurança causada pela falsa aparência de caos por razão da grande euforia das crianças vai sendo equilibrada pela rotina, pela organização e pela autonomia que se torna visível. (CAGLIARI, 1998. p.60).

22 Embora este seja o caminho para a educação atual, o autor lembra algo muito importante, que se tornam elementos fundamentais para o sucesso do processo e superação dos objetivos. Segundo ele, além da preparação do professor, educar para a autonomia requer paciência por parte dos pais, ao se tratar de um processo com frutos mais demorados. Sobre a postura da escola, o autor afirma que esta necessita de foco, de saber o que quer e como quer. Não se concebe uma educação autônoma com ideais pautados na passividade, para a autonomia, precisa-se de uma escola preparada para ser uma oficina de trabalho, não apenas uma sala de aula onde o professor ensina e o aluno tem que se virar para aprender (CAGLIARI, 1998. p.60). Observando o que diz o autor, pode-se considerar que a formação para a autonomia do aluno leitor e escritor perpassa pela própria formação do aluno enquanto pessoa. As práticas a serem desenvolvidas com as crianças precisam pautar-se em ideias humanos, afetivos, socioculturais, não apenas os cognitivos de decifração linguística. Sem estas reflexões é impossível formar crianças que leem com autonomia, que escrevem o que realmente pensam e que significam os processos de ler e escrever como fruto de comunicação social com objetivos claros de interação humana.

CAPÍTULO III: A CRIANÇA PRÉ-ESCOLAR, A LEITURA E A ESCRITA 3. 1 - ALFABETIZAR OU NÃO, NA EDUCAÇÃO INFANTIL? Se o processo de alfabetização em si, é considerado polêmico por fatores políticos, metodológicos e até conceituais, há que se imaginar o mesmo processo discutido sob critérios pautados na educação infantil. Talvez seja um dos fatores mais polêmicos que perpassa a discussão atual na fase final da educação infantil. No âmbito teórico, a polêmica que perpassa a razão de ler e escrever na pré-escola reflete as correntes existentes nos interiores das escolas. Por trás destas práticas, há razões teórico-metodológicas que balizam as atitudes e concepções a respeito da leitura e escrita. As questões de como a criança aprende ler e escrever, o que é alfabetização e o que se entende por escrita define as ações a serem desenvolvidas neste universo infantil. (SCARPA, 2006). Apresenta-se na realidade duas correntes, em uma delas, acredita-se nas bases gêneses do ensino pré-escolar no Brasil, em que a pré-escola seria responsável por proporcionar situações de preparação para a escrita, treino motor e exercícios de prontidão, para que as crianças pudessem conseguir escrever, ler e calcular nos anos seguintes, enquanto a outra acredita que a educação infantil tem objetivos específicos e a leitura e escrita que se espera possui outros parâmetros de desenvolvimento No aparato legal que sustenta as bases da educação infantil, compreendese que esta, é um espaço privilegiado para o exercício da cidadania à medida que possibilita à criança oportunidades para expressar seus sentimentos, desejos e conhecimento construído a partir da interação com o grupo cultural ao qual faz parte, ao mesmo tempo em que se familiariza com a própria imagem construindo o seu verdadeiro eu, conhece seus limites e potencialidades, amplia seus valores e valoriza ações de solidariedade, cooperação, cuidados com a saúde, respeitando a forma natural de aprendizagem infantil, a brincadeira. (BRASIL, 1998). Desta forma, a criança é vista como um ser historicamente construído, inserida em organizações familiares resultantes da cultura em determinado tempo histórico. Por essa razão, recriam o mundo de acordo com o meio em que vive por

24 meio das diferentes linguagens, ampliando seus conhecimentos a partir da interação com os outros grupos e espaços, expandindo e produzindo cultura. Esta é uma visão de aprendizagem em que a criança desenvolve-se interligado com fatores ambientais que influenciam o seu desenvolvimento, possibilita a reflexão de que a escola não é a única responsável pelo desenvolvimento do indivíduo, mas que tem a função de promover práticas que possibilitem o seu avanço na diversidade. Nestas práticas inclui-se a cultura escrita como tecnologia desenvolvida no âmbito social, e por essa razão indispensável à formação do ser humano. Grande parte das crianças que atualmente frequentam a educação infantil, convivem num universo em que vivem imersas em um mundo tomado pela multimídia. Desde cedo, elas entram em contato com os códigos escritos, no controle da TV, nas teclas do computador, interpretam com facilidade as informações publicitárias expressas nos comerciais de TV, os caminhos para as músicas e outras funções do aparelho celular ou do notebook. Isto quer dizer que possuem a capacidade de articular as formas de linguagem para interagir e construir significados. Pode-se dizer, portanto, que elas não mais vão para a escola para aprender a ler e escrever, elas são leitoras e produtoras de texto. (SCARPA, 2006). Observando o que diz a autora, a clientela de hoje não permite mais que a escola negligencie os seus conhecimentos empíricos em detrimento de uma possível preparação para o ler e escrever futuro. As crianças precisam destas práticas para já, para compreender o universo atual, e por esta razão as técnicas aplicadas há décadas não condizem mais com as necessidades de leitura e escrita para hoje. Acrescenta-se a este fator a ampliação dos termos ler e escrever que transformaram seus significados tornando-se mais amplos e atingindo outras áreas do saber. Entretanto, a inclusão no mundo letrado não é unânime, não são todas as crianças que convivem em um universo de escrita, muitas ainda vivem em um universo pouco propício às práticas de leitura e escrita, com menos contato a adultos alfabetizados e a pessoas leitoras. Isto influencia diretamente no modo como anseiam a escola e os processos de ler e escrever e traz consigo uma responsabilidade maior para a escola a fim de que esta desperte esta vontade, não propiciada pela cultura. (SCARPA, 2006).

25 Neste aspecto a contribuição da educação infantil é prioritariamente a de minimizar tais diferenças socioculturais envolvendo as crianças nos hábitos prazerosos de ler e identificar códigos sociais escritos tanto no contexto em que a criança vive, mesmo que limitado, e em outros, em outros tempos e espaços. Sobre esse assunto, FERREIRO e TEBEROSKY (1985), apud SOARES (2009), afirmaram que a criança que vem de um universo que a escrita é uma constante, poderá chegar na pré escola com uma expectativa maior de ler e escrever possivelmente diferente daquela criança cujo contato familiar com papéis, lápis e outros materiais impressos sejam escassos. Reconhece-se, certa dificuldade em lidar em uma turma repleta de diferenças socioculturais, em que uma parte apresenta maior familiaridade que a outra em relação aos conhecimentos construídos a partir das práticas sociais de leitura e escrita. Entretanto, uma educação com base na aprendizagem precisa compreender também, o ritmo de cada criança. Entretanto, reconhece-se que a leitura e a escrita é algo que pode ser adquirido por qualquer criança, mas precisa ser desejada, contextualizada, discutida para que não se torne um fardo, ou para que não seja uma espécie de obrigação da escola. (CAGLIARI, 2009, p.107). Neste aspecto, o autor declara ser imprescindível o fato do professor conhecer os alunos, suas expectativas, seus sonhos, para que a função social da leitura e da escrita seja compreendida por eles. Portanto, a perspectiva que se tem de leitura e escrita na educação infantil, se aproxima das práticas sociais de leitura e escrita, defendidas por SOARES (2004), na indissociabilidade dos processos de alfabetização e letramento, em que não só se busque uma base alfabética, mas que se aproxime das condições de uso reais dos processos de ler e escrever. 3.2- A CRIANÇA E O PROCESSO DE LEITURA E ESCRITA Falar sobre ler e escrever na educação infantil implica reconhecer o processo de desenvolvimento infantil que se dá prioritariamente por meio das situações de brincadeira. VYGOTSKY (1998), diz que é por meio da brincadeira que a criança executa as funções mentais superiores. Assim, ao brincar a criança não só