RELAÇÕES RACIAIS NA PERSPECITIVA CURRICULAR E EDUCACIONAL

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Transcrição:

RELAÇÕES RACIAIS NA PERSPECITIVA CURRICULAR E EDUCACIONAL "Que a água seja refrescante. Que o caminho seja suave. Que a casa seja hospitaleira. Que o Mensageiro conduza em paz nossa Palavra." Benção Yoruba

Porque esta temática étnico-racial? Dados e estatísticas nacionais demonstram as desvantagens da população negra em relação a população não negra (branca) Entender como que o racismo se configura em todos os espaços da vida social, inclusive no âmbito das instituições de ensino superior e nos espaços profissionais de economistas, contabilistas, advogados, etc. Exemplos corriqueiros destas configurações: Claudia Silva Ferreira, 38 anos, auxiliar de limpeza, morta arrastada por carro da PM

Porque falar de racismo na educação? Entender como o racismo está presente no cotidiano da educação é uma condição para a construção de um projeto educacional que possibilite a compreensão do sujeito e da diversidade humana. Consiste em entender as relações interpessoais com base na igualdade de direitos e na constante critica em função da transformação das bases sociais de reprodução das desigualdades e injustiças.

Para isso é preciso romper o silêncio entre nós... Contribui para que as diferenças da cor da pele, o cabelo, traços físicos, sexualidade, sejam entendidas como desigualdades naturais, onde as pessoas negras são vistas como inferiores. Impede o reconhecimento do potencial intelectual de alunos(as) negros(as). Impede a liberdade das pessoas, pois não estamos livres dos preconceitos, estereótipos e estigmas.

Mas o que é racismo? É um conjunto de opiniões pré- concebidas que valoriza as diferenças biológicas entre os seres humanos a partir da crença da superioridade de uns sobre os outros a partir de sua matriz racial. Justificou a escravidão e o avanço do capitalismo mundial, O domínio de determinados povos por outros, Os genocídio que ocorreram durante toda a história da humanidade, até os nossos dias.

Preconceito? É um juízo preconcebido, manifestado geralmente na forma de uma atitude discriminatória perante pessoas, lugares ou tradições considerados diferentes ou "estranhos". Costuma indicar um desconhecimento pejorativo do outro. O principio do preconceito é uma generalização superficial, ou seja, o estereótipo. Ex: "todos os baianos são preguiçosos Faz parte do domínio da crença, não do conhecimento, não tem base racional e por isso a dificuldade de combatê-lo.

Discriminação? Na esfera do direito, a Convenção Internacional sobre a eliminação de todas as formas de Discriminação Racial, de 1966, em seu artigo 1º, conceitua discriminação como sendo: Qualquer distinção, exclusão, restrição ou preferência baseada em raça, cor, descendência ou origem nacional ou étnica que tenha o propósito ou o efeito de anular ou prejudicar o reconhecimento, gozo ou exercício em pé de igualdade de direitos humanos e liberdades fundamentais nos campos político, econômico, social, cultural ou em qualquer outro domínio da vida pública.

O que é o currículo? (Documentos de identidade: Uma introdução às teorias do currículo. Tomaz Tadeu da Silva) É resultado das relações sociais de poder existentes no espaço educacional e fora dele. Constrói subjetividades e identidades: quando privilegia um determinado conhecimento e cultura hegemônico em detrimento a outros. Opera principalmente através dos rituais, práticas e configuração espacial e temporal da escola. Não é imparcial: É socialmente e culturalmente definido, reflete uma concepção de mundo, de sociedade e de educação.

O que é o currículo? Não é um campo dado, mas em construção. Permeado por relações de poder e de conflito. Os diversos movimentos sociais de resistência constituem o contraponto que reivindica o reconhecimento das diversas raízes culturais existentes no contexto social e de ensino. Por isso, pode-se entender que o currículo, assim é caracterizado pelo constante devir.

O currículo oculto É constituído por todos aqueles aspectos do ambientes escolar que, sem fazer parte do currículo oficial, explícito, contribuem de forma implícita, para a aprendizagem sociais relevantes. São atitudes, comportamentos, valores e orientações que permitem que os sujeitos se ajustem da forma mais convenientes as estruturas e as pautas de funcionamento, que diga-se, são indesejáveis, injustas e antidemocráticas.

O que se aprende? Na dimensão gênero, sexualidade ou raça, aprende-se através do currículo oculto como ser homem ou mulher, como ser heterossexual ou homossexual, bem como a identificação com uma determinada raça socialmente aceita. Privilegia a cultura branca, elitizada, masculina, europeia e heterossexual.

O multiculturalismo liberal ou humanista Em nome da humanidade comum entre os sujeitos, apela para o respeito, a tolerância e a convivência pacífica e harmônica entre as diferenças culturas. Deve-se tolerar e respeitar a diferença porque sob a aparente diferença há uma mesma humanidade.

As facetas do multiculturalismo liberal ou humanista Perde-se A dimensão social e histórica da construção das diferenças e desigualdades. A percepção sobre as relações de poder que estão na base do debate sobre a diferença. A dimensão dos processos institucionais, econômicos, estruturais que estão na base da produção da discriminação e da desigualdade baseada na diferença cultural. O racismo não pode ser eliminado sem levar em consideração o combate a discriminação racial no emprego, na educação, na saúde... Por isso, a obtenção da igualdade de direitos depende de uma modificação substancial do currículo existente.

Como o racismo acontece na educação brasileira? O currículo universitário e escolar privilegia os padrões estéticos, culturais e sociais branco-europeus, dentro e fora da escola, Prejudica a participação de alunos(as) negros(as), de seus familiares, e também de profissionais negros/as nas escolas.

As consequências desse currículo Para os(as) alunos(as) negros(as): Auto rejeição Baixo autoestima Ausência do reconhecimento de sua capacidade pessoal Rejeição ao seu outro igual racialmente Timidez Pouca ou nenhuma participação em sala de aula Ausência de reconhecimento positivo do seu pertencimento racial Dificuldade no processo de aprendizagem Recusa a ir a escola e consequentemente, a evasão escolar

As consequências desse currículo Para alunos(as) brancos(as): Cristalização de um sentimento irreal de superioridade, perpetuando um círculo vicioso que reforça a discriminação em todas as esferas do ensino e na sociedade.

O que nós temos a ver com isso? Como educadores(as), pais, mães, profissionais, não podemos ficar em silêncio diante do crime de racismo e suas consequências no cotidiano escolar. Precisamos identificá-los e combatelos. Precisamos ter a coragem de falarmos sobre as nossas diferenças humanas com respeito, sem medo, receio, preconceito e sem discriminação.

Como nós vemos essa questão? Grande parcela dos(as) pessoas diz não perceber os conflitos e a discriminação raciais no espaço educacional; Falta-lhes compreender em quais momentos acontecem essas atitudes e práticas discriminatórias pois naturalizamos estas.

Como enfrentar o racismo no currículo? Inicialmente, precisamos nos questionar: Será que estou favorecendo, consciente ou inconscientemente, a manutenção, a indução ou a propagação do racismo, do preconceito e da discriminação racial na minha sala de aula, na minha instituição e na minha comunidade?

Precisamos saber mais de nós mesmo... O que é a lei 10.639/03? Afinal, que bicho é esse?

O que é a lei 10.639/03? Luta do movimento social Ação Afirmativa: Ações afirmativas são medidas especiais e temporárias, tomadas ou determinadas pelo estado, espontânea ou compulsoriamente, com o objetivo de eliminar desigualdades historicamente acumuladas, garantindo a igualdade de oportunidades e tratamento, bem como de compensar perdas provocadas pela discriminação e marginalização, decorrentes de motivos raciais, étnicos, religiosos, de gênero e outros, visando combater os efeitos acumulados em virtude das discriminações ocorridas no passado.

Para fim o ou inicio de conversa: Sankofa é um pássaro africano de duas cabeças e segundo a filosofia africana significa aproximadamente voltar ao passado para resignificar o presente. O pássaro tem uma cabeça voltada para o passado e outra cabeça voltada para o futuro. Resgatar a memória para continuar fazendo história no presente. Pássaro Sankofa, símbolo africano que significa retornar às origens.