A MESA EDUCADORA COMO PROPOSTA PEDAGÓGICA Lisiane Gazola Santos Nanci Gabriela Cardoso Fernandes Resumo: Este trabalho visa acompanhar e analisar a continuidade de um projeto de formação de educadores da educação Infantil iniciado pelo Programa Fundo do Milênio para a Primeira Infância de responsabilidade da Fundação Mauricio Sirotsky Sobrinho, UNESCO, Banco Mundial atendendo a comunidade do município de Eldorado do Sul/RS, desde o ano de 2008. No ano de 2011 o Programa, a Fundação, a UNESCO e o Banco Mundial se retiraram da parceria da Mesa Educadora do referido município, mas o projeto continua, sob a organização da Secretaria Municipal de Educação e com apoio da ULBRA Guaíba e visa contribuir para uma educação infantil de qualidade que garanta à criança oportunidades de brincar e aprender, de ampliar seu universo cultural e de se socializar através da qualificação do atendimento prestado por creches e escolas de educação infantil: comunitárias, públicas e filantrópicas para crianças de 0 a 5 anos. Palavras-chave: educação infantil- creche formação de professores 1 INTRODUÇÃO O Programa Fundo do Milênio para a Primeira Infância visa melhorar a qualidade da educação infantil, a partir da capacitação de professores e dirigentes das escolas de educação infantil viabilizando material pedagógico e equipamentos e com a constituição de uma Mesa Educadora - espaço de trabalho e de aprendizagem permanente para as educadoras da educação infantil, que atendam crianças de 0 a 5 anos. Nesse caso, atendendo as educadoras do município de Eldorado do Sul, o município que recebeu orientações e acompanhamento do Programa Fundo do Milênio para a Primeira Infância de responsabilidade da Fundação Mauricio Sirotsky Sobrinho, UNESCO, Banco Mundial e Gerdau desde 2008 passou a constituir e a gerenciar, a partir de 2011, sua própria Mesa Educadora. Esta nova etapa originou-se a partir da finalização das referidas parcerias e conta com o apoio e acompanhamento do curso de Pedagogia da ULBRA Guaíba. A partir da inclusão da creche na lei que regulamenta a estrutura e o funcionamento do sistema de ensino LDB9394/96, o que significa que a creche enquanto instituição responsável pelo atendimento à criança pequena se configura como um dos componentes do sistema de ensino, e ainda que tendo caráter escolar a instituição deve ser objeto de fiscalização dos órgãos superiores (MEC, Conselhos Estaduais/Municipais, Conselhos de Educação). Historicamente a creche tem sido a instituição de educação da infância apesar do papel marginal delegado a esta instituição pelas políticas sociais implementadas no Brasil. O Brasil nas últimas décadas apresenta uma demanda pela expansão da educação infantil compatível
2 com seu perfil sócio-demográfico. Uma urbanização crescente, a participação das mulheres no mercado de trabalho, a queda dos índices de mortalidade infantil, já anunciava na década de setenta, que estavam constituídos os indicadores para expansão da educação infantil (ROSEMBERG, 1999). Mas, desde o seu surgimento até os dias de hoje, o modelo de educação pré-escolar, denominado nos anos 60 e 70 de educação pré-primária sempre divergiu do modelo de creche destinada às classes subalternas. As idéias sobre educação da infância e a luta pelo direito de atendimento à criança pequena, surgidas nas décadas de 70 e 80 1 se efetivaram, na Constituição 1988. Quando a creche é reconhecida como instituição educativa da criança de 0 a 3 anos, um direito da criança, uma opção da família e um dever do Estado e na LDB 9393/96 como 1ª etapa da Educação Básica. De modo geral, o trabalho desenvolvido na instituição creche ao longo do tempo tem sido reconhecido como de cunho assistencial-custodial, neste aspecto Kulhmann (1999), avalia que a distinção entre a instituição creche e a pré-escola não se limita apenas ao seu recorte institucional, mas deve remeter-se também a sua destinação social. Ou seja, algumas instituições de educação infantil tais como as creches foram criadas na sua origem para a classe trabalhadora enquanto os jardins de infância não, mas isso não determinou que o processo educativo não ocorresse. Somente se deu de forma diferenciada, para a população desfavorecida uma educação mais assistencialista. Tendo isso em conta, chamamos a atenção para a necessidade de um conhecimento mais aprofundado dos processos, conflitos e embates sociais que concorreram para a determinação das políticas públicas de atendimento criança pequena no Brasil no âmbito da creche, bem como indicamos a avaliação do Programa Mesa Educadora campo de pesquisa e sua interface com as políticas públicas e a promoção de uma educação de qualidade. 2 OBJETIVOS - Acompanhar o desenvolvimento da proposta da Mesa Educadora, no município de Eldorado do Sul e a mobilização da comunidade para a formação de um Conselho Gestor. - Participar da construção do projeto pedagógico para a formação dos educadores de creche do município beneficiado.
3 Para uma discussão de política nacional para criança pequena no Brasil, na atualidade, torna-se necessário uma recuperação do contexto histórico e político responsável pela criação e caracterização da creche enquanto instituição. A base das políticas para a infância, tem sido em grande parte determinada pelos conceitos e funções atribuídos à educação infantil, nessa sociedade. No Brasil, as primeiras creches instaladas no início da República confundem-se com asilos infantis em razão do seu atendimento quase que exclusivo às crianças órfãs, em regime de internato, ao invés de proteger os filhos de operários durante o período de trabalho. Apesar de existir algumas diferenças entre os asilos infantis e as primeiras creches instaladas no Brasil, os dois tipos de instituições se confundem por atender crianças órfãs em regime de internato, crianças carentes e por restringir suas atividades à assistência médica, sanitária, de guarda e cuidados. (KISHIMOTO, 1988; VIEIRA, 1988). Enquanto na Europa as creches já existiam desde o século XVIII, os jardins de infância desde o século XIX, no Brasil ambos surgiram enquanto instituições somente no século XX (KRAMER, 1982). Entre os anos 1930 a 1980 teremos uma fase determinada por um acentuado intervencionismo por parte de um Estado balizado por valores ancorados nas noções de pátria e civismo que se manifestará na administração e nos programas de atenção à infância. Segundo Kramer (1982), os discursos oficiais dos anos 30 anos 80 relacionaram a assistência médico-pedagógica à criança ao desenvolvimento da nação. O intervencionismo proposto vai se manifestar nos anos 30 através da criação de estabelecimentos assistenciais, oficiais (DNCr 1941, SAM, FEBEM, LBA) e de práticas variadas. Nos anos 60 e 70, temos à regulamentação dos direitos da mulher e iniciativas de programas de assistência à criança menor de sete anos e a criação de agências internacionais, tais como a OMEP, o UNICEF e a UNESCO. Com seu caráter assistencial elas influenciaram as políticas de atendimento à infância e de combate à pobreza que passam a ser reconhecidos por esses órgãos como ameaças ao desenvolvimento do país, a educação da infância será um meio de superação do subdesenvolvimento e aceleração do progresso (ROSEMBERG, 1984, 2002). Com a LDB 9394/96 consagrada à educação infantil. Pela primeira vez a creche enquanto instituição será pensada como parte integrante do sistema de ensino, configurandose num campo de análise e atuação dos órgãos públicos de educação. Não obstante, a inclusão da creche na legislação como instituição de educação infantil não será traduzida na garantia plena da criança pequena como um sujeito de direitos.
4 3 CONSIDERAÇÕES FINAIS De posse dessas considerações, com os novos tempos e avanços da educação infantil, nos anos 80 e 90, em especial o caso da creche, nos surgem algumas questões: É possível a superação da dicotomia entre cuidado e educação imposta na política de creche no Brasil? Qual o papel reservado a creche e as escolas de educação infantil enquanto instituições para o atendimento à criança pequena? Estas são algumas das questões que orientam o presente projeto de extensão que busca acompanhar o desenvolvimento das propostas da Mesa Educadora, refletir sobre as condições de possibilidade de implantação de um programa que busca qualificar o atendimento de crianças em instituições de educação infantil seja elas creches filantrópicas, comunitárias ou públicas e suas possibilidades de viabilidade com parcerias. Convém destacar que, a Mesa Educadora do Município de Eldorado do Sul passou a funcionar de maneira autônoma em agosto do ano de 2011, o primeiro grupo de educadoras da Educação Infantil do município formadas neste formato atual concluiu seu curso de capacitação, em dezembro de 2011. O Conselho Local Mesa Educadora de Eldorado do Sul está articulando o poder público do município e a comunidade para a estruturação de um espaço próprio para o funcionamento Mesa Educadora compartilhando a estrutura oferecida pelo município e o espaço já existente no campus da ULBRA Guaíba. No ano de 2012, o planejamento do curso de formação buscou priorizar duas grandes temáticas a serem desenvolvidas: a adaptação e a organização dos tempos e espaços na Educação Infantil. 4 REFERÊNCIAS BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional LDB Lei nº 9394/96. GOHN, Maria da Glória. A força da periferia: a luta das mulheres por creches em São Paulo. Petrópolis: Vozes, 1985. KRAMER, Sonia. A política do pré-escolar no Brasil: arte do disfarce. Rio de Janeiro: Achimé, 1982.. Privação cultural educação compensatória: análise crítica. Cadernos de Pesquisa. São Paulo: nº 42, pp.54-62. Ago, 1982. KISHIMOTO, Tizuko Morchida. A Pré-Escola Em São Paulo (1877-1940). São Paulo: Edições Loyola, 1988.. Educação Infantil Integrando Pré-escola e Creches na busca de socialização da criança. In: Vidal, Diana G. HILSDORF, Maria L. Spedo. Brasil 500 Anos: tópicos em História da Educação. São Paulo: Ed. da USP, 2001. KUHLMANN Jr. Moysés. Infância e Educação Infantil: uma abordagem histórica. Porto Alegre: Editora Mediação, 1998.
5. Educando a Infância Brasileira. In: Lopes, Eliane Marta Teixeira (Org). 500 anos de educação no Brasil. Ed. Autêntica. Belo Horizonte: 2003. ROSEMBERG, Fúlvia. Expansão da Educação Infantil e Processos de Exclusão. Cadernos de Pesquisa. Fundação Carlos Chagas, São Paulo nº (107), 7-40,1999.. O movimento de mulheres e a abertura política no Brasil. O Caso da Creche. Cadernos de Pesquisa. São Paulo (51): 73-79, nov. 1984.. Organizações Multilaterais, Estado e Políticas de Educação Infantil. Cadernos de Pesquisa. São Paulo (115): 25-63, março, 2002. TORRES, Rosa Maria. Melhorar a Qualidade da Educação Básica? As estratégias do Banco Mundial. In: TOMMASI, Livia de. WARDE, Miriam Jorge & HADDAD, Sérgio (Org). O Banco Mundial e as Políticas Educacionais. São Paulo: Cortez, 1998. TOMMASI, Livia de. WARDE, Miriam Jorge & HADDAD, Sérgio (Org). O Banco Mundial e as Políticas Educacionais. São Paulo: Cortez, 1998. VIEIRA, Lívia M. Creches no Brasil: de mal necessário a lugar de compensar carências rumo à construção de um projeto educativo. Dissertação de Mestrado. Faculdade de Educação. UFMG. Belo Horizonte, 1986.. Mal Necessário: Creches no Departamento Nacional da Criança (1940-1970). Cadernos de Pesquisa. São Paulo (67): 3-16, novembro, 1988.