A Percepção Ambiental na RESEX do Rio Ouro Preto e os Indícios de que a Floresta em pé é a Base para o Desenvolvimento Local.



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Transcrição:

A Percepção Ambiental na RESEX do Rio Ouro Preto e os Indícios de que a Floresta em pé é a Base para o Desenvolvimento Local. Fabiana Bezerra Neves dos Santos Bióloga e pesquisadora do Grupo de Pesquisa Energia Renovável Sustentável Universidade Federal de Rondônia (UNIR), Porto Velho (RO). Contato: fabianapvh@yahoo.com.br Artur de Souza Moret Doutor em Planejamento Energético e Coordenador do Grupo de Pesquisa Energia Renovável Sustentável e Professor da Universidade Federal de Rondônia (UNIR) Contato: amoret@unir.br Resumo O objetivo desse texto é analisar a Percepção Ambiental como referência teórica para compreender que os procedimentos e os métodos praticados na estrutura local são determinantes para manter os ecossistemas da RESEX Rio Ouro Preto pouco alterados. As bases de estudo foram: documentos oficiais, relatórios de projeto implementados na RESEX, projeto RADAMBRASIL e imagens de satélite LandSat-5. Os resultados indicaram que a taxa de desmatamento vem diminuindo e que esse fato representa que a população compreende (mesmo que não seja explícito) a floresta em pé como necessária para a sobrevivência. Esse comportamento é demonstrado através de ações econômicas (atividades produtivas pouco impactantes e baixa intensividade de desmatamento) e atividades de fiscalização (os moradores fiscalizam a entrada de pessoas). Esses dois fatos são identificados como Percepção Ambiental, pois não são externalizados nas falas dos extrativistas e nos documentos de solicitação de financiamento e nos seus respectivos relatórios, dessa forma isso representa os indícios da visão de mundo e que podem ser ancorados no Desenvolvimento Sustentável. Palavras-chave: Percepção ambiental, floresta em pé, desenvolvimento local.

1- Introdução As Reservas Extrativistas (RESEX) são áreas destinadas ao uso sustentável das populações extrativistas. A subsistência baseia-se no extrativismo, na agricultura de subsistência e na criação de animais de pequeno porte. Essas áreas são controladas pelo Estado em contratos de concessões para proteger os meios de vida e da cultura dessas populações e assegurar o uso sustentável dos recursos naturais (Alegretti,1994). Existem atualmente na Amazônia cinqüenta e nove (59) RESEX, cobrindo uma área aproximada de 19 milhões de hectares. As principais justificativas para a criação dessas áreas de preservação são: os conflitos fundiários e a pressão pelo desmatamento em áreas ocupadas pelas comunidades. Os estudos demonstraram que os Extrativistas que são moradores da área estudada preservam a Biodiversidade local, participam e desenvolvem processos sustentáveis, executam projetos de desenvolvimento em processo de auto-gestão, desenvolvem atividades econômicas com baixa intensividade de terra e praticam a fiscalização das áreas para coibir as invasões. São duas as referências teóricas para esse texto e essas não são compreendidas separadamente: Desenvolvimento Sustentável e Percepção Ambiental. Mas, sobretudo numa conjugação de que só há comunidades sustentáveis se a percepção ambiental indicar que os desejos coletivos são balizados por conceitos extremamente abrangentes: humanidade, paz, democracia, liberdade, igualdade de gênero, raça e cor. A seguir destacam-se as definições para balizar a discussão teórica, a primeira sobre Desenvolvimento Sustentável e segunda sobre Percepção Ambiental: Do ponto de vista econômico, a possibilidade de crescimento tem que ser definida de acordo com a capacidade de suporte dos ecossistemas, pensando-se simultaneamente em maior equidade e aumento da eficiência econômica (que suavize os processos de elevação da entropia). Essas são regras iniciais de um modelo de desenvolvimento sustentável, que deve contemplar objetivos ecológicos relacionados com a integridade dos ecossistemas, com a manutenção da capacidade de suporte dos sistemas naturais, com a preservação da biodiversidade (necessária para assegurar a evolução biológica), com o respeito aos limites do meio ambiente físico. Paralelamente, no plano social, o modelo de desenvolvimento sustentável deve preocupar-se em promover a coesão e a mobilidade social, deve visar elevar a participação política dos cidadãos e respeitar a sua identidade cultural, assegurandolhes o acesso ao poder e o desenvolvimento das instituições sociais (CAVALCANTI, 2001). Veiga (2005, p.), afirma que: o desenvolvimento sustentável é um dos mais generosos ideais surgidos no século passado. Só comparável à bem mais antiga idéia de justiça social. Ambos são valores fundamentais de nossa época, por exprimirem desejos coletivos enunciados pela humanidade, ao lado da paz, da democracia, da liberdade e da igualdade.

O desenvolvimento sustentável (DS) não pode ser compreendido como simples acúmulo das contribuições do que representa cada palavra, mas sim um novo conceito e abrangente que tem avanços no que tange as concepções econômicas, ambientais, ecológicas, sociais, técnicas, políticas, financeiras. Ou seja, consiste em mudar de paradigma baseado em três gerações de direitos humanos: direitos políticos, civil e cívicos; direitos econômicos, sociais, culturais e a trabalho digno; direitos coletivos ao meio ambiente e ao desenvolvimento (SACHS, 2004; REIS; SILVEIRA, 2000). De outra forma, segundo o PNUD (1990): por desenvolvimento sustentável entendemos por um processo de mudança social em que a exploração dos recursos, as opções de investimento, o processo tecnológico e as reformas institucionais se realizam de maneira coordenada, ampliando as atuais e futuras possibilidades de satisfazer as necessidades e aspirações humanas. A Percepção Ambiental de um indivíduo ou comunidade está diretamente ligada à forma de se relacionar com as questões ambientais. O desenvolvimento desse aspecto é fundamental para fortalecer a cidadania e a participação efetiva da comunidade em questões locais, estabelecendo atitudes proativas perante a situação e possibilitando a mudança de paradigmas de valores e modelos de desenvolvimento (HAMMES, 2002). O desequilíbrio ambiental decorrente, dentre outros fatores, do aumento populacional, do consumo de recursos em escala muito maior que a capacidade da Natureza, e práticas nãosustentáveis de uso dos recursos naturais tem contribuído para a perda da biodiversidade e com a extinção de espécies e a destruição de ecossistemas é atribuída a problemas ambientais relacionados com as crescentes necessidades humanas. A caça predatória ilegal, a derrubada de florestas, as queimadas, a poluição de rios, são fatores apontados como ameaça á biodiversidade. (OKAMOTO, 1997) Uma das dificuldades para proteção dos ambientes naturais esta na existência de diferenças nas percepções dos valores e da importância dos mesmos entre os indivíduos de culturas diferentes ou de grupos que desempenham funções distintas nesses ambientes. Cada indivíduo percebe, reage e responde diferentemente às ações sobre o meio ambiente em que vive, a percepção ambiental compreende melhor as relações estabelecidas entre o homem e o meio ambiente. (HAMMES,2002). A Percepção Ambiental, como procedimento científico, pode ser entendida como as diferentes maneiras sensoriais (percebidas através dos sentidos) que os seres humanos captam, percebem e se sensibilizam pelas: realidades, ocorrências, manifestações, fatos, fenômenos, processos ou mecanismos ambientais observados in loco. Neste contexto, através da percepção e interpretação ambiental, podem-se atribuir valores e importâncias diferenciadas para a natureza. Segundo Macedo (2000), a Percepção Ambiental conduz a um nível de conscientização ecológica que realça a responsabilidade de conservação da natureza como requisito de manutenção da

sobrevivência humana, no qual o respeito à natureza deve ser valor incorporado ao conceito de desenvolvimento, sobretudo quando é numa perspectiva das populações locais. A população interage para que não seja destruída a base de desenvolvimento constituído pelo solo, vegetação, rios e ar, num sentido da manutenção da qualidade de vida ligado e ao desenvolvimento. Partindo das concepções acima podemos compreender que os processos (econômicos, ambientais e de gestão) implementados na RESEX se aproximam da concepção de Desenvolvimento Sustentável, além dos resultados aparecem nos indicadores ambientais de desmatamento, da preservação da biodiversidade e da preservação do ecossistema. Essas práticas apresentam a Percepção Ambiental como um mecanismo de interpretação, visto que as atividades humanas no local não alteram significativamente o ecossistema local. Entretanto, para que haja um Desenvolvimento Sustentável efetivo os indicadores sociais necessitam sofrer modificações radicais, necessitando de intensa intervenção nas áreas social, de transporte de mercadorias, de mercado para as produções, de moradia, de saúde, de educação, de financiamento das atividades e de gênero. 1.2- Reserva Extrativista Rio Ouro Preto A RESEX do Rio Ouro Preto foi criada pelo Decreto N 99.166 de 13/03/1990, com uma área aproximada de 201.334 há, localiza-se no extremo oeste do estado de Rondônia, próxima à fronteira com a Bolívia, nos territórios municipais de Guajará-Mirim e Nova Mamoré. A RESEX do Rio Ouro Preto foi criada pelo Decreto N 99.166 de 13/03/1990, com uma área aproximada de 201.334 há, localiza-se no extremo oeste do estado de Rondônia, próxima à fronteira com a Bolívia, nos territórios municipais de Guajará-Mirim e Nova Mamoré. A área é drenada pela bacia do Rio Ouro Preto, que nasce na Serra Pacaás Novos, entre a Área Indígena Uru-Eu-Wau- Wau e o P.E Guajará Mirim. Imagem 01: RESEX do Rio Ouro Preto/RO Fonte: IBAMA, 1998. A bacia do Rio Ouro Preto é considerada uma região de vale periodicamente inundável, com poucas áreas de terra firme não-alagável. O nível desse Rio pode variar em até 3 metros, e por isso, no 'inverno', quando as águas estão mais altas, é navegável por embarcações de 15 a 30 tons, no 'verão', com as águas mais baixas, apenas pequenas embarcações e canoas conseguem transpô-las. Os solos da reserva tem baixa fertilidade, com predominância de areias quartzolas hidromórficas e álicas, Glei pouco úmido, ao longo dos cursos d'água. A vegetação que cresce sobre eles é composta por formações florestais abertas, com palmeiras e cipós, savanas arbóreas abertas e densas (OLMOS, 2002).

A estrutura organizativa da RESEX Rio Ouro Preto é composta por duas associações que tem objetivos de viabilizar a permanência dos Extrativistas na Reserva: ASROP- Associação de Seringueiros do Rio Ouro Preto e ASAEX- Associação de Seringueiros Agro- Extrativistas do Baixo Rio Ouro Preto. Atualmente a população total é de cerca de 310 pessoas e que desenvolvem atividades econômicas predominantes de produção de farinha puba; em menor escala tem-se: látex, castanha, frutas. Entretanto, há uma importante atividade econômica em fase inicial que implantação do uso da cadeia do babaçu: casca (papel e carvão), mesocarpo (farinha multi-mistura), coco (carvão) e a amêndoa (óleo vegetal para geração de eletricidade, sabonete e da torta produz-se ração animal); essa atividade está sendo importante para demonstrar que a biodiversidade local pode ser utilizada de maneira sustentável e produzir resultados positivos para modificação da qualidade de vida local. 2- Materiais e Métodos Esse texto é um dos resultados de estudo realizado na área da RESEX do Rio Ouro Preto, tendo como bases teóricas o Desenvolvimento Sustentável e a Percepção Ambiental. A base de informações foi constituída por estudos do GPERS (Relatórios de Projeto, Monografias), Proposta de Plano de desenvolvimento da Reserva Extrativista do Rio Ouro Preto (CASTILHO,1997), imagens do satélite LandSat-5 de desmatamento no período de criação da RESEX ate o ano de 1998 e dados do Projeto RADAMBRASIL. O estudo de caso se constitui nos dados de desmatamento da RESEX, nomeado por Floresta em Pé, e as concepções dos seus moradores. Os indicadores de Percepção Ambiental são compreendidos pelas seguintes visões processuais: fatos, fenômenos, processos, captar, perceber, sensibilizar, manifestar. As análises foram realizadas tendo como base a inter-relação entre a Percepção Ambiental e o Desenvolvimento Sustentável, ou seja, os resultados que aparecem na Percepção Ambiental são indícios importantes para as intervenções que podem levar ao Desenvolvimento Sustentável. 3- Resultados e Discussão Os dados de percepção são discriminados em duas vertentes: sentido e efetividades, ou seja, duas questões diferenciadas, uma que representa a (mudança) visão de mundo do indivíduo e a outra que é a efetivação dessa visão em ações executadas. Essas são descriminadas em indicadores: sentido (captar, perceber e sensibilizar) e efetividades (manifestações, fatos, fenômeno, processos e mecanismos). O quadro a seguir apresenta os indicadores de Percepção Ambiental aplicados no estudo de caso da Floresta em pé no RESEX do Rio Ouro Preto.

Quadro 01: Indicadores de Percepção Ambiental aplicados na RESEX do Rio Ouro Preto. Indicadores de Aplicação na floresta em pé percepção ambiental Captar Desenvolver atividades com floresta em pé Perceber Sensibilizar Manifestações Fatos Fenômeno Processos Importância para a própria sobrevivência Fiscal da própria área e das outras áreas próximas Não desmatar mais que o necessário Morador, fiscal e empreendedor Baixo desmatamento Baixa migração da Reserva Mecanismos Iniciar atividades para diversificar e com menor desmatamento Fonte: Elaboração própria, 2007 3.1 O Desmatamento na área da RESEX do Rio Ouro Preto. O desmatamento até 1998 era de 3,71% correspondendo a 7468 ha, com valores unitários: 1990-1965 ha, 1996-7113 e 1998-7468. O incremento do desmatamento foi de 5147 ha de 1990-96 e de 3555 entre 1996-98 e a média desmatada entre 1990-96 foi de 858 ha e 178 entre 1996-98. Dessa forma, pelas características locais de atividade econômica e dinâmica populacional, o desmatamento tende à base da última variação percentual, pois a maior parte dos moradores utiliza entre 1 e 2 ha desmatados para atividade econômica e o desmatamento incremental segue lógica de 1 ha a cada três anos, que é o tempo que a terra cansa com o cultivo da mandioca. Os dados projetados para o desmatamento estão apresentados no quadro 02, demonstrando que os valores são pequenos na área estudada e esses estão coerentes com as imagens 02 e 03. É interessante observar que a pressão pelo desmatamento é grande no entorno da área (parte colorida em vermelho), imagem 03, e essa pressão não tem provocado desflorestamento efetivo na área estudada; esse fato é muito diferente de outras Reservas extrativistas em que o desflorestamento cresce, mesmo que a atividade seja o manejo florestal e o extrativismo. Quadro 02: Dados de desmatamento da RESEX do Rio Ouro Preto 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2008 7112* 7468* 7112 7290 7468 7646 7824 8002 8180 8358 8536 8714 8892 3,53 3,62 3,71 3,80 3,89 3,97 4,06 4,15 4,24 4,33 4,42 Fonte: elaboração própria, 2007; * Dados medidos.

Imagem 02: Quantidade de Floresta em pé na Área Imagem 03: Desmatamento na RESEX. Tipos de Vegetação: Fai - Floresta aberta (áreas de tensão ecológica) Fal - Floresta aberta com palmeiras e cipó Fap - Formação pioneira arbórea Fas - Floresta aberta com palmeira; Pag - Formação pioneira graminosa Pap - Formação pioneira arbórea inundada; Pau - Formação pioneira arbustiva Saa - Savana arbórea aberta; e Sad - Savana arbórea densa Fonte: Interpretação e Análise de Imagens do Satélite LandSat-5, órbitas-ponto: 232-67, 232-68, 233-67 e 233-68; Realizado pelo CSR - Centro de Sensoriamento Remoto - IBAMA. Fonte: Mapa Fitoecológico, Folha SC-20/Porto Velho do Projeto RADAMBRASIL (escala 1:1.000.000); Digitalização feita pela SEDAM-RO. 3.2 Atividade econômica na RESEX do Rio Ouro Preto Historicamente, a produção agrícola desempenha um papel significativo em termos de segurança alimentar e complementação de renda familiar na área estudada. Em 1992, 62,14% dos domicílios da Reserva possuíam roça, com um tamanho médio de 1,38 há (5,5 tarefas) (MILIKAN, 1994). Em 1996, 60% dos domicílios possuíam roça, com um tamanho de 1,43 ha. As principais produções anuais eram: mandioca, farinha, arroz, milho, feijão e banana. O cultivo de fruteiras em pequenas quantidades, pomares maiores, situando-se próximo aos barracões dos seringais. Algumas das culturas permanentes mais encontradas são: Café, Laranja/limão/tangerina, Cacau, Cupuaçu, Caju e etc. Em relação aos produtos não-madeireiros os mais significativos para a comunidade são: copaíba, babaçu, açaí, patuá e tucumã, a comunidade faz uso de babaçu para retirar a palha, o patuá e o açaí para consumo. Destaca-se que culturas de maior impacto na floresta, tais como as monoculturas e exploração florestal, não são desenvolvidas e demonstram que há grande preocupação com essas atividades; em contraposição a esse fato têm-se duas questões características: 1- a renda média familiar é pequena e de apenas de 1 a 2 salários mínimos mensais (MORET, 2005) e 2- há um potencial econômico significativo de madeira: cedro, mara branca, angelim, cinzeiro e itaúba (MORET, 2007). A legislação que rege as RESEX é rigorosa no que tange a atividades econômicas, entretanto isso não representa um impedimento tendo em vista a fiscalização federal ser ineficiente. A responsabilidade de fiscalização cabe ao órgão gestor da Reserva (CNPT/IBAMA) e

segundo o plano de utilização da RESEX (1997) os próprios moradores são responsáveis pela fiscalização da sua colocação e das outras. As atividades executadas para o desenvolvimento da RESEX (Planafloro, RESEX I, RESEX II) têm relativo sucesso apenas no que tange ao desflorestamento, pois as condições de vida não são alteradas de maneira significativa. Mas cabe registrar que, mesmo não tendo resultados positivos no que tange a questões mais ligadas a qualidade de vida (saúde, educação, moradia, renda), no que se refere ao desmatamento os resultados são positivos como destacado acima. Quadro 03: Atividades econômicas agrícolas desenvolvidas na RESEX do Rio Ouro Preto Cultura semi perene Culturas perenes arroz Milho mandioca macaxeira café banana Abacaxi cupuaçu laranja pupunha acerola (há) (há) (há) (há) (pés) (pés) (pés) (pés) (pés) (pés) (pés) 516 7 43 5009 2087 1346 2291 521 410 210 60 Fonte: Moret, 2005. A reflexão dessa questão é fundamental, pois as causas surgem na Percepção Ambiental dos moradores, tais como: a baixa migração da Reserva, o fluxo migratório dos jovens para Reserva e o comprometimento e a participação em desenvolver atividades econômicas novas que não desflorestem. 4- Conclusão Considerando que os objetivos de uma RESEX são de proteger os meios de vida e a cultura das populações tradicionais, e assegurar os uso sustentável dos recursos naturais, nesse caminho a RESEX do Rio Ouro Preto detectam-se duas importantes questões: que esses fatos representam a atribuição de valores diferentes à natureza e que essa atribuição se dá em virtude de ser à base do desenvolvimento local. Esses indícios são incongruentes com os indicadores sociais da Reserva, a necessidade financeira dos moradores, com a renda, com os indicadores de saúde, educação, de produção e de acesso a cultura. Ou seja, esses indicadores poderiam induzir o uso da biodiversidade local para gerar renda, através de desmatamento, de culturas de intensidade de área e gado. Entretanto, até o momento não há indícios de essas atividades venham a ser implementadas nessa RESEX. Os resultados indicaram que a taxa de desmatamento vem diminuindo e que esse fato representa que a população compreende (mesmo que não seja explícito) a floresta em pé como necessária para a sobrevivência. Esse comportamento é demonstrado através de ações econômicas (atividades produtivas pouca impactantes e baixa intensividade de desmatamento) e atividades de fiscalização (os moradores fiscalizam a entrada de pessoas).

5- Referências Bibliográficas ALEGRETTI, M.H. Reservas Extrativistas: Parâmetros para uma política de desenvolvimento sustentável na Amazônia. In: ANDERSON,A; ALEGRETTI,M.H.; M, A; SCHWARTZMAN, S.; MENEZES, M.; MATTOSOS,R.; FLEISCHFRESSER,V.; FELIPPE,D.; WAWZYNIAK,V.; ARNT,R. O destino da floresta; reservas extrativista e desenvolvimento sustentável na Amazônia (edição). Instituto de Estudos Amazônicos e Ambientais. Fundação Konrad Adenauer. Rio de janeiro,1994. CASTILHO,C.E.A. Proposta de Plano de desenvolvimento da Reserva Extrativista do Rio Ouro Preto. Brasília. IBAMA, 1997. CAVALCANTI, C. Condicionantes biofísicos da economia e suas implicações quanto à noção do desenvolvimento sustentável. In: Economia do Meio Ambiente: teoria, políticas e a gestão de espaços regionais. ROMEIRO, A. R. et all. Org. Instituto de Economia, UNICAMP. Ed. EDUNICAMP, 3 a ed. Campinas, 2001. GPERS. Óleo vegetal como combustível para energia elétrica em pequenos aglomerados de Rondônia como forma de geração de renda. Porto Velho, 2005. Relatório de projeto de pesquisa do programa de P&D ANEEL/El Paso do Brasil/ TERMONORTE: 2004-2005. HAMMES, V. S. (Ed.) Julgar, percepção do impacto ambiental. Brasília: Embrapa Informação Tecnológica, v.4 (Educação Ambiental para o desenvolvimento sustentável, v.4), 2002. MACEDO, R.L.G. Percepção e conscientização ambientais. Lavras: UFLA/FAEP, 2000. MILIKAN, B. Análise do Levantamento Sócio-Econômico da Reserva Extrativista do Rio Ouro Preto. Projeto Reservas Extrativistas/ CNPT/ IBAMA, 1994. MORET, A S.; Relatório do levantamento Sócio Econômico da Reserva Extrativista do Rio Ouro Preto(ASAEX). Porto Velho. Universidade Federal de Rondônia, 2005..; Relatório Biodiversidade em Reserva extrativista: estudo de caso do levantamento do potencial de babaçu para consolidar economicamente a RESEX do Rio Ouro Preto. Porto Velho. Universidade Federal de Rondônia e Conselho Nacional de Pesquisa Cientifica, 2007. OKAMOTO, J. Percepção ambiental e comportamento. São Paulo: IPSIS, 1997. OLMOS, F. As Unidades de Conservação de Rondônia - PLANOFORO, Porto Velho RO. 2002. PNUD. Nossa própria agenda.1990. REIS, L. B. dos e SILVEIRA, S. (org.). Energia elétrica para o desenvolvimento sustentável. EDUSP, 2 a ed. São Paulo, 2000. SACHS, I. Desenvolvimento- Includente, sustentável sustentado. Ed. Garamond. Rio de janeiro, 2004. VEIGA, J.E. da. Desenvolvimento Sustentável- O desafio do Século XXI. Ed. Garamond. Rio de Janeiro, 2005.