Módulo 3 - Psicologia da Aprendizagem. Unidade 1: Aprendizagem: conceitos básicos, componentes e características da aprendizagem.



Documentos relacionados
A PRÁTICA PEDAGÓGICA DO PROFESSOR DE PEDAGOGIA DA FESURV - UNIVERSIDADE DE RIO VERDE

Necessidade e construção de uma Base Nacional Comum

Profa. Ma. Adriana Rosa

Principais Teorias da Aprendizagem

MÍDIAS NA EDUCAÇÃO Introdução Mídias na educação

Elaboração de Projetos

Departamento das Educação Pré-escolar

Unidade I. Estrutura e Organização. Infantil. Profa. Ana Lúcia M. Gasbarro

SÍNDROME DE DOWN E A INCLUSÃO SOCIAL NA ESCOLA

INTERPRETANDO A GEOMETRIA DE RODAS DE UM CARRO: UMA EXPERIÊNCIA COM MODELAGEM MATEMÁTICA

Denise Fernandes CARETTA Prefeitura Municipal de Taubaté Denise RAMOS Colégio COTET

O COORDENADOR PEDAGÓGICO: A PERCEPÇÃO DE AUUTOEFICÁCIA EM RELAÇÃO ÀS SUAS ATRIBUIÇÕES FUNCIONAIS.

AS CONTRIBUIÇÕES DAS VÍDEO AULAS NA FORMAÇÃO DO EDUCANDO.

JOGOS ELETRÔNICOS CONTRIBUINDO NO ENSINO APRENDIZAGEM DE CONCEITOS MATEMÁTICOS NAS SÉRIES INICIAIS

O LÚDICO COMO INSTRUMENTO TRANSFORMADOR NO ENSINO DE CIÊNCIAS PARA OS ALUNOS DA EDUCAÇÃO BÁSICA.

A escola para todos: uma reflexão necessária

CASTILHO, Grazielle (Acadêmica); Curso de graduação da Faculdade de Educação Física da Universidade Federal de Goiás (FEF/UFG).

Jéssica Victória Viana Alves, Rospyerre Ailton Lima Oliveira, Berenilde Valéria de Oliveira Sousa, Maria de Fatima de Matos Maia

REPRESENTAÇÕES DE AFETIVIDADE DOS PROFESSORES NA EDUCAÇÃO INFANTIL. Deise Vera Ritter 1 ; Sônia Fernandes 2

AULA 03. Profº André Luis Torres SABERES E PRÁTICAS

Humanismo: Principais conceitos e relação com a Educação

Prefeitura Municipal de Santos

PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO: ELABORAÇÃO E UTILIZAÇÃO DE PROJETOS PEDAGÓGICOS NO PROCESSO DE ENSINO APRENDIZAGEM

A IMPORTÂNCIA DA PARTICIPAÇÃO DOS PAIS NA EDUCAÇÃO DOS FILHOS NO CONTEXTO ESCOLAR

5 Considerações finais

PROJETO MEDIAR Matemática, uma Experiência Divertida com ARte

CLASSE ESPECIAL: UMA ALTERNATIVA OU UM ESPAÇO REAL DE INCLUSÃO?

IMPLANTANDO O ENSINO FUNDAMENTAL DE NOVE ANOS NA REDE ESTADUAL DE ENSINO

Mestrado Profissional em Ensino de Biologia em Rede Nacional - PROFBIO PROPOSTA

ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO NUMA ESCOLA DO CAMPO

CAPÍTULO I DAS DIRETRIZES DO CURSO

Unidade I ESCOLA, CURRÍCULO E CULTURA. Profa. Viviane Araujo

Informações gerais Colégio Decisão

DESENVOLVENDO COMPETÊNCIAS MATEMÁTICAS Marineusa Gazzetta *

Aprimoramento através da integração

Educação a distância: criando abordagens educacionais que possibilitam a construção de conhecimento

Escola Básica e Secundária de Velas. Planificação Anual Psicologia 10º Ano de Escolaridade Curso Profissional. Ano Letivo 2013/2014

FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES NO CONTEXTO TECNOLÓGICO: DESAFIOS VINCULADOS À SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO

O LÚDICO NA APRENDIZAGEM

EXPRESSÃO CORPORAL: UMA REFLEXÃO PEDAGÓGICA

UNIVERSIDADE FEDERAL DE OURO PRETO PROJETO BÁSICO CURSO DE APERFEIÇOAMENTO EM PRODUÇÃO E ORGANIZAÇÃO DE CONTEÚDO NA EAD CURSO PARA DOCENTES DA UFOP

Curso de Pedagogia Ementário da Matriz Curricular

Revista Filosofia Capital ISSN Vol. 2, Edição 4, Ano EAD E O PROCESSO AVALIATIVO: BREVE ENSAIO SOBRE UMA PEDAGOGIA EM CONSTRUÇÃO

Um currículo de alto nível

Presença das artes visuais na educação infantil: idéias e práticas correntes

PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO

O PROCESSO DE INCLUSÃO DE ALUNOS COM DEFICIÊNCIAS NO MUNICÍPIO DE TRÊS LAGOAS, ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL: ANÁLISES E PERSPECTIVAS

PROBLEMATIZANDO ATIVIDADES EXPERIMENTAIS NA FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES/AS

A INFORMÁTICA E O ENSINO DA MATEMÁTICA

ADMINISTRAÇÃO GERAL MOTIVAÇÃO

Dispõe sobre o atendimento educacional especializado aos alunos identificados com altas habilidades ou superdotados no âmbito do Município de Manaus.

PLANEJAMENTO OPERACIONAL: RECURSOS HUMANOS E FINANÇAS MÓDULO 10

EMENTAS DAS DISCIPLINAS OFERECIDAS NO CURSO DE PEDAGOGIA Catálogo 2012

ITINERÁRIOS DA EDUCAÇÃO MATEMÁTICA: O ESTÁGIO SUPERVISIONADO E A FORMAÇÃO DO PROFESSOR DE MATEMÁTICA

UTILIZAÇÃO DA PLATAFORMA MOODLE PARA O ENSINO DE MATRIZES E DETERMINANTES

PLANEJAMENTO E AVALIAÇÃO. Prof. Msc Milene Silva

Curso: Diagnóstico Comunitário Participativo.

IDENTIFICANDO AS DISCIPLINAS DE BAIXO RENDIMENTO NOS CURSOS TÉCNICOS INTEGRADOS AO ENSINO MÉDIO DO IF GOIANO - CÂMPUS URUTAÍ

Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul FACULDADE DE EDUCAÇÃO

Composição dos PCN 1ª a 4ª

O Determinismo na Educação hoje Lino de Macedo

AS RELAÇÕES DO ESTUDANTE COM DEFICIÊNCIA INTELECTUAL E SUAS IMPLICAÇÕES NO ENSINO REGULAR INCLUSIVO

O ensino da cultura nos livros didáticos de Espanhol como Língua Estrangeira

EMENTAS DAS DISCIPLINAS

ABORDAGEM INTERACIONISTA COGNITIVISTA: A EPISTEMOLOGIA GENÉTICA DE PIAGET

Módulo 9 A Avaliação de Desempenho faz parte do subsistema de aplicação de recursos humanos.

O LETRAMENTO DE SURDOS NA SEGUNDA LÍNGUA

TENDÊNCIAS RECENTES DOS ESTUDOS E DAS PRÁTICAS CURRICULARES

Redes de políticas: novos desafios para a gestão pública

A Sustentabilidade e a Inovação na formação dos Engenheiros Brasileiros. Prof.Dr. Marco Antônio Dias CEETEPS

TUTORIA EM EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Maria Teresa Marques Amaral. Introdução

Curso de Psicologia CÓDIGO B PROGRAMA

Palavras chave: Formação de Professores, Tecnologias Assistivas, Deficiência.

O uso de jogos no ensino da Matemática

CONSTITUINDO REFERENCIAIS TEÓRICO-METODOLÓGICOS: CONTRIBUIÇÕES DO PIBID PARA O TRABALHO COM ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO

Guia prático do alfabetizador

Organização Curricular e o ensino do currículo: um processo consensuado

PROGRAMA DE METODOLOGIA DO ENSINO DE EDUCAÇÃO MORAL E CÍVICA

Gestão de impactos sociais nos empreendimentos Riscos e oportunidades. Por Sérgio Avelar, Fábio Risério, Viviane Freitas e Cristiano Machado

UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS FACULDADE DE COMUNICAÇÃO E BIBLIOTECONOMIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM STRICTO SENSU EM MESTRADO EM COMUNICAÇÃO

OS CANAIS DE PARTICIPAÇÃO NA GESTÃO DEMOCRÁTICA DO ENSINO PÚBLICO PÓS LDB 9394/96: COLEGIADO ESCOLAR E PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO

EMENTÁRIO DAS DISCIPLINAS DO CURSO DE PEDAGOGIA: DOCÊNCIA E GESTÃO EDUCACIONAL (Currículo iniciado em 2009)

Aula 1 Uma visão geral das comorbidades e a necessidade da equipe multidisciplinar

As respostas devem ser assinadalas na Folha de Resposta, a qual deverá ser entregue ao Fiscal de Sala Itapetininga, 04 de Dezembro de 2015

REGULAMENTO ESTÁGIO SUPERVISIONADO CURSO DE LICENCIATURA EM PEDAGOGIA FACULDADE DE APUCARANA FAP

Planejamento - 7. Planejamento do Gerenciamento do Risco Identificação dos riscos. Mauricio Lyra, PMP

O QUE APORTAM E O QUE OCULTAM AS TECNOLOGIAS DA INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO NO ENSINO A DISTÂNCIA DA FURG: UM OLHAR SOBRE O CURSO DE PEDAGOGIA

O ESTÁGIO SUPERVISIONADO COMO ESPAÇO DE CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE DOCENTE DE LICENCIANDOS EM MATEMÁTICA

PSICOLOGIA E DIREITOS HUMANOS: Formação, Atuação e Compromisso Social

DESENVOLVIMENTO INFANTIL EM DIFERENTES CONTEXTOS SOCIAIS

TEXTO PRODUZIDO PELA GERÊNCIA DE ENSINO FUNDAMENTAL COMO CONTRIBUIÇÃO PARA O DEBATE

O USO DO TANGRAM EM SALA DE AULA: DA EDUCAÇÃO INFANTIL AO ENSINO MÉDIO

Mudança gera transformação? Mudar equivale a transformar?

Disciplina Corpo Humano e Saúde: Uma Visão Integrada - Módulo 3

COLÉGIO MATER CONSOLATRIX PROJETO DE INTERVENÇÃO DE PSICOLOGIA

Motivação. Robert B. Dilts

Introdução à Terapia ABA. Psic. Me. Robson Brino Faggiani Especialista em Terapia Comportamental e Cognitiva

PROJETO DE EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA DE FORMAÇÃO CONTINUADA PARA EDUCADORES DE JOVENS E ADULTOS

Coleta de Dados: a) Questionário

Transcrição:

Módulo 3 - Psicologia da Aprendizagem Unidade 1: Aprendizagem: conceitos básicos, componentes e características da aprendizagem. 1. O que é aprendizagem? Como aprendemos? 1.1. A Psicologia e a Educação Uma polêmica bem conhecida, relativa à interseção entre os estudos da Psicologia e da Educação é a da própria existência de uma área chamada Psicologia da Educação. Muitos questionam a sua existência, afirmando que esta área nada mais é que uma seleção de conteúdos, estudos e explicações de diferentes áreas da Psicologia, não constituindo um corpo organizado de conhecimentos. Outros entendem que a Psicologia da Educação traz contribuições e estudos originais, agrega conteúdos novos à Educação, constituindose em uma área de conhecimento com todos os atributos necessários desenvolvimento de pesquisas, enunciação de conteúdos e objetivos próprios. Ela não constitui uma série de recomendações, cuidados e dicas que garantem um bom ensino. Não tem como meta prescrever princípios para ensinar bem, mas sim desenvolver a capacidade explicativa do fenômeno educacional que lhe garanta o lugar de ciência fundamental para a Educação. Coll et alii (2004) 1 destacam alguns fatores que esclarecem o porquê de tantas divergências internas da Psicologia, quando se trata da abordagem da Educação: A existência de diferentes marcos teóricos adotados ao estudar os processos educacionais; a variedade de conceitos de Educação e de ensino existentes, tomados como ponto de partida para os estudos psicológicos; a atribuição de variados graus de importância aos componentes psicológicos e aos educacionais no estudo dos processos de ensino e de aprendizagem; as dificuldades de realização de pesquisas em Psicologia, mesmo quando têm objetos de estudo mais concretos, como no caso da Educação; dificuldade no estabelecimento da relação teoria-prática em Psicologia associada à cobrança de intervenções como ocorre, por exemplo, nas dificuldades de aprendizagem. 1 COLL, C. et al (orgs.). Desenvolvimento Psicológico e Educação. V.2, Psicologia da Educação. Porto Alegre: Artes Médicas, 2004.

A relação entre a Psicologia e a Educação, em sua evolução histórica, avançou em três áreas: o desenvolvimento infantil, a psicometria (disciplina inserida na Metodologia das Ciências do Comportamento e que estuda a medida psicológica) e a aprendizagem. Mesmo com as alterações desta relação no correr da história, os estudos sobre a aprendizagem se mantiveram foco privilegiado da Psicologia da Educação e merecem destaque na formação docente. Consideremos, portanto, que a Psicologia da Educação tem três dimensões teórico-conceitual, tecnológico-projetiva e técnicoprática, sendo essencial à formação docente para ambientes presenciais ou online. Concluímos com Chakur (2001) 2 que a psicologia da educação pode facilitar ao docente em formação condições para conhecer melhor o aluno e suas condições de aprendizagem, para buscar com maior eficácia as causas do insucesso na aprendizagem, para fundamentar uma prática pedagógica de excelência. 1.2. Aprendizagem: variados conceitos e enfoques. São vários os conceitos de aprendizagem, de acordo com as idéias que os fundamentam e as abordagens teóricas que lhes dão suporte. Todos têm em comum alguns aspectos: o interesse pelos processos que compõem a aprendizagem humana, pelos fatores que interferem neste processo, pelas diferenças de ritmo que o caracterizam, pela motivação e pelas causas das dificuldades de aprendizagem. Hilgard (1966) apresentou um conceito clássico, que é citado até hoje. Aprendizagem é o processo pelo qual uma atividade tem origem ou é modificada pela reação a uma situação encontrada, desde que as características da mudança de atividade não possam ser explicadas por tendências inatas de respostas, maturação ou estados temporários do organismo (por exemplo, fadiga, drogas etc.) (p. 3). 3 Podemos extrair desta definição duas conclusões importantes:. Toda aprendizagem implica mudança. Embora seja um processo interno, ela se apresenta de forma observável através do comportamento.. Não são aprendidos apenas conhecimentos e habilidades, mas conteúdos afetivos e atitudes. 2 CHAKUR, Cilene Ribeiro de Sá Leite (org.). Problemas da Educação sob o olhar da Psicologia. Araraquara: FCL/Laboratório - Editorial/UNESP, 2001. 3 HILGARD, Ernest Ropiequet. Teorias da aprendizagem. São Paulo: Herder, 1966.

Alguns outros conceitos de aprendizagem, bastante conhecidos, podem ser citados: Aquisição ou mudança relativamente estável de comportamentos ou de processos mentais, devida à interação com o meio, experiência ou exercício. Processo de aquisição e assimilação, mais ou menos consciente, de novos padrões e novas formas de perceber, ser, pensar e agir. 4 Mudança do comportamento observável, mensurada através de instrumentos e procedimentos específicos, sob a ação de contingências do meio externo. Auto-atualização de potencialidades do self, respondendo à tendência natural de aprimoramento do ser humano. Construção de estruturas cognitivas progressivamente mais sofisticadas, como decorrência de adaptações suscitadas pelo ambiente. 1.3. Instâncias da aprendizagem Grossi (1990) 5 criou um esquema das instâncias da aprendizagem, que pode ser útil para aclarar este conceito: INSTÂNCIAS DA APRENDIZAGEM 4 SCHMITZ, E. Fundamentos da Didática. São Leopoldo: UNISINOS, 1993. 5 GROSSI, Esther Pillar. A contribuição da psicologia na educação. Em Aberto. Brasília, v.9, n. 48, p.45-50, out/dez. 1990.

Segundo o esquema há quatro esferas que envolvem o organismo (indivíduo): o outro, a cultura, a Ciência e a realidade. Este organismo é assim definido pela autora: (...) conjunto de órgãos que nos constituem, à nossa bagagem genética, ao que nos faz fisicamente distintos dos demais. O organismo é a instância onde memorizamos o que aprendemos, onde criamos automatismos. Por que escrevemos rapidamente? Porque criamos esquemas automáticos que nos permitem fazer isto; e isto está no organismo. (Grossi, 1990, p. 49). Vocês acham que o termo organismo pode se confundir com corpo? Pois a autora se preocupa em distinguir os dois, com um exemplo bem apropriado: Uma mão é organismo enquanto estiver simplesmente sendo vista como um pedaço de alguém. No momento em que fizer um gesto de adeus ou um gesto de OK, já não é mais organismo; trata-se de uma manifestação do corpo. O corpo é a forma como o organismo atua. Pode-se comparar o organismo a uma tela e o corpo, à imagem que a inteligência e o desejo projetam sobre essa tela. (Grossi, op.cit., p. 49).

O sujeito que aprende (organismo) compreende portanto inteligência, desejo (motivação) e corpo. Ele é enriquecido com uma outra dimensão: a social, composta das quatro esferas citadas anteriormente (o outro, a cultura, a Ciência e a realidade). A quarta instância, a realidade, não é atingida ou aprendida diretamente, mas através de um processo do qual vocês ouvirão falar muito no nosso Módulo: a MEDIAÇÃO. Aprendemos a realidade ou o mundo externo através da mediação do outro, da cultura, da ciência, de um sistema de valores, de uma rede de significados e representações. Todo este processo requer do indivíduo que aprende a ação, pois a aprendizagem não ocorre de forma passiva por parte do sujeito. Finalmente a linguagem, estudada no próximo Módulo, é posicionada no esquema como veículo da aprendizagem. Não falamos aqui apenas da linguagem oral ou escrita, mas do variado repertório de linguagens de que o ser humano dispõe. O que mais decisivamente influencia a enunciação de um conceito de aprendizagem é o arcabouço teórico a que está relacionado. Ele define o conceito de homem que norteia os estudos realizados, o recorte da problemática a ser abordada, o tratamento metodológico e até mesmo a utilização dos resultados obtidos. Alguns autores como Lapp et al (1975) 6, por exemplo, falam de modelos de aprendizagem que determinam modelos de ensino: a) Modelo clássico ou tradicional o indivíduo que aprende é visto como passivo ou depositário do conhecimento, tomando como foco o professor, transmissor do conhecimento, e os métodos de ensino. b) Modelo tecnológico (tecnicista) enfatiza as técnicas e o domínio do conteúdo, a transmissão de informações e o desenvolvimento de competências orientadas para o futuro, visualizáveis através de comportamentos observáveis e mensuráveis. c) Modelo personalizado destaca o indivíduo como centro do processo, seus interesses, experiências, necessidades e aspectos emocionais, considerando-o de forma dissociada do envoltório social. d) Modelo interacional dá relevo à dialética da interação entre professor e aluno e importância à interação, à comunicação, ao diálogo. Volta-se para a análise crítica de problemas sócioculturais. 6 LAPP, D., BENDER, H., ELLENWOOD, S. & JOHN, M. Teaching and Learning: Philosophical, Psychological, Curricular Applications. NY: Macmillan, 1975.

1.4. Paradigmas teóricos do estudo da aprendizagem Ferreira (1986) 7 afirma que a Psicologia da Educação se ocupa das questões relativas a três áreas de estudo: aprendizagem, desenvolvimento humano e ensino. Suas pesquisas buscam, em última instância, o aprimoramento dos processos de ensino e aprendizagem. A autora descreve três paradigmas teóricos dominantes na Psicologia. Cada um deles representa uma visão das relações indivíduo sociedade e repercute na Psicologia da Educação, nas concepções de desenvolvimento humano e de aprendizagem: - Objetivista - Subjetivista - Histórico-crítico 1.4.1. Paradigma Objetivista Fundamenta-se na Psicologia experimental e na visão do homem como um fato observável a partir dos comportamentos que manifesta. O meio o controla e condiciona. Com isto a Educação fica reduzida à manipulação de estímulos externos que possam conduzir a respostas consideradas desejadas e a aprendizagem à verificação dos efeitos objetivos deste processo, uma adaptação passiva ao ambiente. Destacam-se nesta corrente:. Pavlov (1849-1936) realizou o condicionamento de cães, formulando o conceito de condicionamento clássico ou respondente (transferência de uma resposta associada a um estímulo para outro, que inicialmente não a provocava).. Thorndike (1874-1949) formulou a Lei do Efeito (todo e qualquer ato que produz satisfação fica indissociavelmente ligado à situação em que ocorreu e, quando ela se reproduz, a probabilidade de repetição do ato é maior do que antes, havendo a fixação do acerto inicialmente acidental).. Watson (1878-1958) criador do termo Behaviorismo e do conceito de generalização de estímulos, condicionou bebês a sentirem medo de ratos de brinquedo, provando assim a possibilidade de controle do comportamento através de estímulos externos.. Skinner (1904-1990) enunciou o conceito de condicionamento operante, trabalhando experimentalmente com ratos provou que o comportamento pode ser modelado através da utilização de reforços positivos e negativos. 7 FERREIRA, M.G. Psicologia Educacional: análise crítica. São Paulo: Cortez: Autores Associados, 1986.

1.4.2. Paradigma Subjetivista Fundamenta-se na Psicologia de cunho filosófico e preconiza a centralização do processo educacional na satisfação das necessidades dos educandos, segundo a sua natureza e desenvolvimento, vistos de forma natural. Sua expressão principal são os modelos nãodiretivistas de Educação. Em oposição à abordagem anterior, vê o homem como um ser autônomo, criado para a liberdade e não determinado pelo meio. A Educação deve, então, criar situações favoráveis ao desenvolvimento pleno das suas potencialidades, tendências e predisposições naturais. Destacam-se nesta corrente:. Dewey (1859-1952) valoriza a iniciativa e a independência, que levam à autonomia e ao autogoverno, propõe a educação progressiva, que amplia a experiência da criança e lhe permite o domínio sobre a própria vida. A aprendizagem se dá através da pesquisa individual e coletiva.. Maslow (1908-1970) focaliza os seus estudos na motivação humana através de um ciclo e da hierarquização em uma pirâmide.. Rogers (1902-1987) principal nome da corrente humanista em Psicologia, enuncia uma crença inabalável na natureza positiva do ser humano. O homem precisa, segundo ele, desenvolver plenamente as potencialidades pessoais. Entre elas destaca a tendência natural da evolução humana à busca da harmonia consigo mesmo e com os demais. Confiança nos próprios desejos e intuições, liberdade e responsabilidade para agir e disponibilidade para criar compõem essas qualidades positivas do self. Criou o termo nao-diretivo, aplicado à Psicoterapia e à Educação, definindo o respeito à liberdade essencial ao homem. Para o professor chamado de facilitador da aprendizagem algumas qualidades são essenciais: autenticidade, empatia, congruência e respeito incondicional ao ser que aprende. 1.4.3. Paradigma Histórico-crítico Tem como questão central o indivíduo como ser histórico, sendo a relação homem-sociedade vista como interação recíproca em que ambos se afetam e se transformam. A Educação pode simplesmente reproduzir as relações sociais existentes, adaptando o homem ao meio. Pode, no entanto, contribuir para a transformação da realidade e para a emancipação do homem formando indivíduos críticos e reflexivos, prontos para

interferir ativamente na prática social. São valorizados o diálogo, a interação, o processo de mediação. A aprendizagem é, encarada desta forma, construção humana permanente, efetiva e contínua, que resulta de trocas dialéticas como o meio histórico e social. Destacam-se nesta corrente:. Piaget (1896-1980) Faz um estudo psicogenético do desenvolvimento humano (estudo das formas mais primitivas de conhecimento até as mais complexas). Para ele o sujeito estabelece troca com o meio, através de duas dimensões: a assimilação e a acomodação. Nos dois casos é ativo no processo de aprendizagem, agindo sobre o meio inicialmente através de esquemas de ação e mais tarde através dos esquemas de representação.. Vygotsky (1896-1934) Autor da Teoria sociointeracionista do desenvolvimento humano e da aprendizagem. Enfatiza a construção do conhecimento como uma interação mediada por várias mediações. Desta forma os conceitos espontâneos, trazidos pela criança, transformam-se em conceitos científicos. 1.5. Características da aprendizagem Processo dinâmico não é absorção passiva, exige atividade externa (física) e interna, participação integral do indivíduo em todos os seus aspectos. Processo contínuo está presente do início ao fim da vida humana. Processo global (compósito) todos os aspectos que constituem a personalidade são ativados no processo de aprendizagem. Processo pessoal a aprendizagem é intransferível. Tem maneira, ritmo, preferências, métodos pessoais. Processo gradativo ocorre através de processos gradativamente mais complexos. Um efeito disso é a gradação de conteúdos, dos mais fáceis para os mais difíceis, na organização curricular. Processo cumulativo as experiências anteriores, os conceitos construídos anteriormente servem de base para a aquisição de novos conteúdos. 1.6. Fatores determinantes da aprendizagem

Em uma abordagem inicial podemos dizer que a aprendizagem está sustentada por três fatores: família, escola e aluno, que se complementam. Temos que considerar, no entanto, que a aprendizagem não é apenas formal, que é promovida por instituições de ensino e formação e conduz ao recebimento de diplomas, certificados e qualificações. Temos também aprendizagens não-formais, que ocorrem em ambientes não escolares como locais de trabalho, organizações da sociedade civil (associações, sindicatos e partidos políticos, por exemplo) e aprendizagens informais, que acontecem no cotidiano, não intencionalmente. Desta forma, olhando o processo pela ótica da Psicologia, podemos destacar como fatores interferentes na aprendizagem: Inteligência, incluindo a atenção, a percepção, a memória. Motivação. Experiência anterior. Fatores socioculturais. 1.7. Aprendizagem em ambientes virtuais A vertiginosa expansão da tecnologia de informação e comunicação criou a demanda de pesquisas sobre uma forma de aprendizagem há poucos anos não conhecida: a aprendizagem em ambientes virtuais ou aprendizagem online. Segundo Barajas (2003) 8 ambiente virtual de aprendizagem (AVA) é um espaço ou uma comunidade organizada com o propósito de aprender, o que cria a necessidade da articulação de três fatores essenciais o aparato tecnológico que lhe dê suporte, o desenvolvimento de uma metodologia adequada e uma concepção clara de aprendizagem, de construção do conhecimento. Neste Módulo pretendemos em diversos momentos, pela especificidade do curso, abordar esta modalidade de aprendizagem. É claro que ela mantém características e especificidades da aprendizagem como a estudávamos há alguns anos, mas tem sutilezas e nuances que são ainda pouco familiares para nós, professores, e fortes impactos na nossa formação, ainda muito tradicional. 8 BARAJAS, M. Entornos Virtuales de Aprendizaje en la enseñanza superior: fuentes para una revisión del campo. In: Barajas, M. (Coord.): La tecnologia educativa en la enseñanza superior. Madrid, McGraw-Hill, 2003, p. 3-29.

Como dizem Medeiros et alii (2001) 9, com propriedade, esta formação não pode ser do tipo "o professor entra por uma porta tradicional e sai por um portal virtual.". Moran (2007) 10, ao falar sobre Educação a Distância em uma entrevista, afirma que ela traz mudanças profundas nos processo de ensino e aprendizagem e até mesmo na maneira radical como se pensa o conhecimento. E conclui: Alteram-se dimensões já dominadas no campo da prática docente, como a distribuição de tempos e espaços especiais, agora associados ao uso de estratégias educativas com suporte em ferramentas tecnológicas que alteram e amplificam as dimensões de eficiência e de qualidade nos processos educativos; todavia, temos presente que essas mediações, se entendidas em seus fins, não são suficientes à instauração de transformações de fundo, assim como do dar conta das possibilidades de aprendizagem (Moran, 2007). 9 Medeiros, M. et alii. Teacher's Capacitation for the Organization of the Learning Environment. Conference Proceedings / CD-ROM of 20th ICDE World Conference, Düsseldorf, April, 2001. Session Posters. 10 MORAN, J. M. A Internet nos ajuda, mas ela sozinha não dá conta da complexidade do aprender. Disponível em http://www.educacional.com.br/entrevistas/entrevista0025.asp. Acessado em 12/12/2007.