UM TANTO DE CRIATIVIDADE, OUTRO TANTO DE GIZ: IMAGENS EM MOVIMENTO NA SALA DE AULA. Daniel Moreira S. Pinna UVA



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Transcrição:

UM TANTO DE CRIATIVIDADE, OUTRO TANTO DE GIZ: IMAGENS EM MOVIMENTO NA SALA DE AULA Daniel Moreira S. Pinna UVA O esboço de uma proposta Este breve ensaio tem sua origem em outro artigo apresentado no 8 P&D Design (2008), em que apresentei à comunidade acadêmica do Design brasileiro a experiência do Quadro-negro Animado. Mais do que um exercício, trata-se de um método de ensino de realização de cinema de animação desenvolvido para ser aplicado em sala de aula que necessita apenas de uma câmera fotográfica digital, quadro-negro, giz e inventividade por parte dos alunos. As observações colocadas aqui são, portanto, fruto da experiência em sala de aula na disciplina Princípios da Animação, do curso de graduação tecnológica em Design Gráfico Ilustração e Animação Digital. Exatamente cem anos antes do curso abrir suas portas, James Stuart Blackton lançava nos Estados Unidos o primeiro filme de animação de desenhos da história, chamando a atenção do mundo para as possibilidades criativas apresentadas pela nova técnica. Inspirado no trabalho do artista, desenvolvi a atividade do Quadro-negro Animado, no qual são misturados os ensinos de História, Estética, Desenho e da própria técnica da Animação, em aulas práticas onde o planejamento, o trabalho em equipe e o bom humor são essenciais para a realização de um produto audiovisual bem-acabado e interessante de ser assistido, uma vez finalizado. Descrevo neste artigo o método de trabalho proposto no exercício, as reações dos alunos e algumas observações com base nos resultados obtidos. Desenhos encantados O cinema de animação é uma arte surgida no século XIX que tomou contornos na primeira década do século XX, com as experimentações dos primeiros cineastas, em sua maioria artistas performáticos (atores, mágicos ilusionistas, lightning sketchers) ou oriundos das artes gráficas. Na Europa do século XIX, já era bastante popular uma forma de entretenimento conhecida como lightning sketches, apresentações ao vivo que

misturavam artes plásticas com performances espontâneas, em que o artista criava e modificava sua obra diante do olhar atento da plateia (pinturas, caricaturas, desenhos etc.). O objeto artístico resultante dos espetáculos era a própria performance assistida, e não a obra produzida. O artista era, ao mesmo tempo, autor e personagem da ação. The Lightning Sketcher, de Edwin G. Lutz. Ilustração para a revista Life, 15 abr. 1897. O cinema, nesta época, era considerado uma projeção da realidade, apresentando as ações tais e quais ocorridas no instante em que foram registradas. Não tardou, porém, para que alguns cineastas aprendessem a trapacear na produção de um filme. Georges Méliès artista gráfico e mágico ilusionista foi o precursor dos efeitos especiais no cinema. Fascinado com o que presenciara na projeção dos irmãos Lumière, em 1895, começou a produzir registros cinematográficos do cotidiano parisiense. Um acidente com sua câmera parou as filmagens por cerca de um minuto, sendo as mesmas retomadas em seguida. Quando assistiu ao material filmado, Méliès reparou que pessoas sumiam e apareciam em cena no ponto da obra em que a filmagem fora interrompida. Uma vez que a câmera registra os acontecimentos sob a forma de fotogramas na película, a interrupção nas filmagens não era sentida quando os fotogramas eram, posteriormente, projetados continuamente durante a exibição do filme. O acaso

levou-o ao desenvolvimento da técnica de substituição por parada de ação stop action ou stop trick, que lhe possibilitava criar, em seus filmes, incríveis ilusões como metamorfoses e misteriosos truques de desaparecimento. A técnica da substituição por parada de ação torna possível aos cineastas fazer pessoas e objetos se materializarem na tela instantaneamente, desaparecerem, transformarem-se em outros objetos ou até moverem-se sozinhos, de maneira rudimentar. Como em um passe de mágica! Bastava apenas, para isso, interromper as filmagens, modificar o espaço cênico e então dar continuidade à ação. Enquanto Méliès realizava filmes de efeitos especiais na França, nos Estados Unidos o artista britânico James Stuart Blackton entrava em contato com o cinema por intermédio de Thomas Edison. Entre suas diversas atividades (era também ator, mágico, jornalista e cartunista do periódico New York Evening World), Blackton apresentava espetáculos de lightning sketches esporadicamente. Após ter entrevistado Edison, em 1896, foi convidado pelo inventor e produtor para estrelar uma série de filmes de ação ao vivo baseados em suas performances. O filme de maior sucesso desta série, The Enchanted Drawing (1900), somava à performance de Blackton alguns efeitos mágicos, tirando proveito do processo de parar a filmagem para mudar a ação 1. Fotogramas do filme The Enchanted Drawing (1900). o vemos desenhar suas figuras na prancheta fixada no cavalete. De repente, um objeto que estava desenhado aparece fisicamente em sua mão enquanto a expressão do personagem desenhado muda para uma cara de espanto, também fazendo uso do mesmo processo de animação (BARBOSA JÚNIOR, 2002, p. 42). 1 O filme encontra-se disponível em arquivo digital no website da Biblioteca do Congresso Norte-americano, em: <http://www.americaslibrary.gov/cgi-bin/page.cgi/sh/animation/blcktn_1.> Acesso em: 30 mar. 2009.

Em 1906, Blackton realizou o primeiro filme de animação com desenhos da história, Humorous Phases of Funny Faces 2. A obra foi produzida a partir de ilustrações desenhadas com giz sobre um quadro-negro. O artista registrava com a câmera as sutis e sucessivas modificações nos desenhos. Trazia, assim, a linguagem dos lightning sketches para o cinema. Fotogramas da primeira sequência do filme Humorous Phases of Funny Faces (1906). A substituição por parada de ação foi a precursora da técnica de filmagem quadro a quadro (stop motion ou fotografia frame by frame), desenvolvida por Blackton para Humorous Phases of Funny Faces. Nesta técnica baseia-se até hoje a produção de filmes de animação. Na filmagem quadro a quadro, cada fotograma é registrado separadamente, de maneira sequencial, com sutis modificações nos desenhos ou objetos em cena, em relação ao quadro seguinte. No momento em que o filme é exibido, ocorre a ilusão de que os desenhos ou objetos em cena movem-se sozinhos, livres da presença da mão e da mente criativa que os desenhou no passado. Graças ao advento tecnológico das câmeras fotográficas digitais, atualmente encontradas até em telefones celulares, trabalhar com a técnica de filmagem quadro a quadro em sala de aula tornou-se algo razoavelmente fácil. Foi valendo-se apenas deste aparelho, de um tripé e de um quadro-negro e giz que os alunos desenvolveram seus primeiros filmes de animação. Quadro-negro Animado A proposta de realizarem filmes no quadro-negro serviu como pretexto para uma exposição histórica sobre os primeiros cineastas (Lumière, Edison, Méliès) 2 Disponível em: <http://www.americaslibrary.gov/cgi-bin/page.cgi/sh/animation/blcktn_3.> Acesso em: 30 mar. 2009.

e os pioneiros do cinema de animação (Blackton, Émile Cohl, Winsor McCay). Atentamente, os alunos divertiram-se assistindo aos filmes dos artistas, hoje disponíveis gratuitamente na Internet. Após apresentar os filmes de Blackton, a técnica de filmagem quadro a quadro é explicada e posteriormente ilustrada com o próprio exercício. A realização do exercício Quadro-negro Animado acontece em sala de aula. A proposta consiste em produzir um filme com o registro fotográfico de imagens quadro a quadro, utilizando como base a lousa. Para facilitar a finalização e a divulgação dos trabalhos em formato digital, os mesmos devem ser pensados para o padrão de imagem broadcast de baixa definição, sistema NTSC e formato de janela de 4:3 (720 x 480p, 72 dpi, sistema de cor RGB, frequência de 29,97 fps). Tais questões de ordem técnica devem ser previstas antes de se bater a primeira fotografia, para que a máquina possa ser configurada. Os alunos são encorajados a registrar pelo menos 60 fotos e a não utilizar o flash da câmera, uma vez que sua luz reflete no quadro. Também não devem empregar o zoom da câmera, mesmo que este seja óptico, pois se a câmera por algum motivo desligar (como a maioria dos aparelhos faz automaticamente para economizar energia) recolherá o jogo de lentes e dificilmente o fotógrafo conseguirá o ajuste exato do enquadramento que empregara até aquele momento. Por fim, devem-se evitar longos períodos de tempo com a câmera ligada fora de uso, sob pena de a bateria descarregar antes do término do exercício. O ideal é utilizar baterias plenamente carregadas e cartões de memória vazios. Uma vez posicionada no local adequado ao enquadramento desejado e configurada para a realização do exercício, deve-se manter a câmera desligada até que tudo esteja pronto para a primeira fotografia. Para a realização da atividade, os alunos se dividem em grupos que variam de quatro a oito integrantes. Um único aluno torna-se responsável por bater as fotografias dos desenhos no quadro-negro. Ele deve se concentrar apenas em fotografar. Além de evitar erros comuns, como esquecer de bater um ou mais fotogramas ou permitir que apareçam as mãos dos animadores nas imagens, isto diminui as chances de que o pó de giz entre no equipamento, causando danos nos circuitos. Os demais membros se concentram na confecção das imagens.

A tarefa de desenhar no quadro-negro normalmente é passada aos alunos com mais intimidade com o desenho. A eles somam-se os que ficam responsáveis apenas por apagar os desenhos antigos, agilizando o processo. Fotogramas do filme Velhinha, realizado apenas com desenhos. Para que as imagens sejam animadas, é necessário que cada imagem esteja na mesma posição daquela que a precede e seja semelhante à mesma, salvo uma pequena mudança. São as pequenas mudanças, sutis e progressivas, que permitem aos desenhos a ilusão de se movimentarem e de se modificarem como que por vontade própria, quando o filme é exibido. A câmera, portanto, uma vez posicionada, não pode ser mudada de posição sob nenhuma circunstância, sob pena de perdermos o registro da posição de uma imagem ao longo da sequência. Daí inclusive a necessidade de um tripé, que mantenha a câmera estável e sempre no mesmo lugar. Aluno Yuri Motta, da turma de Princípios e Desenho para Animação (2007.1), responsável pelas fotografias na realização do filme Die Motherfucker. No detalhe, a personagem foi confeccionada com cartolina verde, como um facilitador de trabalho. Os filmes realizados no quadro-negro não estão limitados apenas a protagonistas desenhados com giz. Em seu processo criativo, os alunos se

valem da interação das imagens desenhadas no quadro com objetos, recortes de papel e com a própria figura humana. Fotogramas do filme Die Motherfucker. Uma vez que a planta foi ilustrada em última etapa de crescimento, o desenho de sua cabeça foi substituído por um recorte de cartolina de duas peças crânio e maxilar para facilitar a animação do movimento que se seguiria. Para trabalhar objetos com volume, prendemos os mesmos sobre a superfície do quadro-negro, colando-os com uma fita adesiva ao mesmo tempo resistente e fácil de descolar. Para fazer um objeto se mover, é necessário descolá-lo do quadro, deslocá-lo ligeiramente e colá-lo em sua nova posição para que uma nova fotografia seja batida. Formas de papel são animadas do mesmo modo. Normalmente substituem desenhos, a fim de facilitar o trabalho dos animadores que, ao invés de retraçarem uma forma, deslocando-a no campo do quadro, recolocando-a em uma nova posição. Fotogramas de uma das sequências da vinheta Desanima Imundi. Nas obras que empregam a figura humana, o próprio ser vivo é tornado objeto para posteriormente ser animado. Para que não haja erros de continuidade no posicionamento das personagens, o ator deve abrir mão de sua capacidade autônoma de movimento, já que não possui a visão da composição como um todo, por encontrar-se de costas ou de lado para o quadro. Ele próprio torna-se um boneco/objeto, a ser manipulado por um animador outro aluno que, fora da cena, posiciona o companheiro no lugar

correto como quem manuseia um boneco de massa de modelar. O ator deve se concentrar em não sair da marcação. Fotogramas da vinheta Desanima Imundi. Aluno Flávio Alfaya contracena com uma lata de refrigerante, que flutua, rodopia, é amassada e, finalmente, explode sob seu comando. A técnica de manipulação do corpo humano (ou pixilation) permite realizar ações impossíveis pelo registro contínuo da câmera cinematográfica. Por exemplo, se permanecer com as pernas esticadas e os pés fincados no chão durante as fotos, e se deslocar entre uma imagem e outra, o ator parecerá deslizar pelo chão, sem dobrar os joelhos para se locomover. O exercício é proposto aos alunos uma semana antes da realização, permitindo que planejem os filmes e levem para a sala de aula todo o material necessário (câmera e tripé, e também folhas de papel cartão, desenhos já prontos, objetos, figurinos, adereços, pedaços de giz coloridos...). A falta de planejamento prévio inviabiliza muitas das ideias nascidas durante a aula, mas também favorece o improviso e o surgimento de ideias inusitadas e, por vezes, mais originais.

Fotogramas de sequências de encerramento da vinheta Desanima Imundi. Outro aspecto não previsto na criação do exercício foi a vontade de muitos grupos em apresentar seus integrantes ao final dos filmes, por meio de imagens estáticas ao longo dos créditos ou de sequências animadas em que os estudantes, por exemplo, fazem aparecer os próprios nomes, como que por mágica. Conclusão Foi com satisfação que notei o interesse e o engajamento dos alunos na atividade. Muitos apenas entenderam os mecanismos por trás da criação de um filme de animação no momento em que começaram a exercitar a técnica. Tamanho sucesso junto aos alunos, que adoraram o Quadro-negro Animado e aprenderam com ele, me incentivou a continuar aplicando o exercício em todas as disciplinas relacionadas à animação que leciono. No momento de publicação deste artigo, já existem 45 curtas animados no quadronegro produção somada dos anos de 2007 a 2009. Em 2010, novos surgirão. Os filmes mencionados na pesquisa bem como outros realizados com a mesma técnica podem ser assistidos no website O Quadro-negro Animado, disponível em <http://quadronegroanimado.blogspot.com/>. No endereço, dou continuidade a esta pesquisa e apresento novos desdobramentos.

Referências AMERICA S STORY. Blackton, Father of American Animation. In: The Library of Congress. Disponível em: <http://www.americaslibrary.gov/cgibin/page.cgi/sh/animation/.> Acesso em: 30 mar. 2009. BARBOSA JÚNIOR, Alberto Lucena. Arte da animação: técnica e estética através da história. São Paulo: SENAC, 2002. Enchanted drawing, the. Dirigido por J. Stuart Blackton. Produzido por J. Stuart Blackton e Albert E. Smith. Ação ao vivo, sil., pb. Duração: 1' 30". Estados Unidos: Edison Manufacturing Company, 1900. Humorous Phases of Funny Faces. Dirigido e produzido por J. Stuart Blackton. Animação e ação ao vivo, sil., pb. Duração: 3'. Estados Unidos: Vitagraph Company of America, 1906. QUADRO-NEGRO ANIMADO, O. Rio de Janeiro, 2008. Disponível em: <http://quadronegroanimado.blogspot.com/.> Acesso em: 7 set. 2009.