PSICO-ONCOLOGIA E TERMINALIDADE: CASOS EM QUE O PACIENTE É UMA CRIANÇA



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Transcrição:

PSICO-ONCOLOGIA E TERMINALIDADE: CASOS EM QUE O PACIENTE É UMA CRIANÇA Tatiane Cristine Froelich Resumo O presente trabalho tem por objetivo apresentar a relação que se estabelece entre um diagnostico de câncer, no caso em crianças, e a idéia eminente na maior parte dos casos, de terminalidade da vida. Bem como, fazer referencia a importância da psico-oncologia ao promover um espaço de acolhimento, há familiares, pacientes e/ou profissionais da área. A pesquisa evidencia ainda a importância de cuidados paliativos, estando esgotadas as possibilidades terapêuticas e com o agravamento progressivo do quadro clínico do paciente. Este estudo caracteriza-se por uma pesquisa de revisão bibliográfica de cunho qualitativo que aborda as temáticas: ciclo de vida e morte, buscando relacionar as mesmas ao contexto que se constitui a partir de um diagnóstico de leucemia, principalmente quando o paciente for uma criança. Com base nas bibliografias estudas evidencia-se que o temor da morte quase sempre acompanha o diagnóstico do câncer ao longo de todo o percurso terapêutico do paciente. Também fica evidente que o adoecer do filho desencadeia reações emocionais intensas nos pais, que requerem acompanhamento psicológico sistemático durante o tratamento oncológico. Sendo assim, de grande importância a prática da psico-oncologia com o objetivo de promover intervenções preventivas; cuidados paliativos com o paciente, familiares e equipe de saúde. Palavras-Chave: criança; leucemia; psico-oncologia; morte. Introdução O câncer está entre os maiores causadores das mortes na atualidade e cada vez mais vem sendo enfrentado por diferentes grupos na sociedade. Esta patologia caracteriza-se pela proliferação descontrolada de células anormais e que podem ocorrer em qualquer local do organismo. Atinge crianças, adolescentes, homens, mulheres, idosos. As neoplasias mais frequentes na infância são as leucemias (glóbulos brancos), tumores do sistema nervoso

135 central e linfomas (sistema linfático) (Brasil, 2008). Mas independente a faixa etário e/ou tipo, o câncer carrega consigo a eminência da idéia de fatalidade e questões ligadas com mudanças físicas, imagem corporal, entre outras crenças influentes no tratamento, onde a ansiedade, medo e fantasias sobre a doença terão de ser enfrentadas. A percepção da doença está diretamente ligada à morte, fazendo com o que o paciente alimente sentimentos pessimistas. Partindo disso os profissionais vem buscando novas formas de intervenção dentro da psico-oncologia com o objetivo de informar, tratar, identificar fatores estressores que podem influenciar no processo do tratamento, bem como, planejar de acordo com as necessidades psicossociais do paciente, familiar e equipe de saúde a intervenção psicossocial mais indicada para aliviar o sofrimento acarretado pelo diagnóstico. Dada a complexidade da doença neoplásica, bem como, o risco da perda eminente, de acordo com Costa e Lima, (2002) o tratamento deve ser abrangente, exigindo atenção não só para as necessidades físicas, como também para as demandas psicológicas e sociais do paciente, incluindo a participação ativa da família e profissionais da saúde que trabalham com oncologia. Temos por objetivo discutir/apresentar, a partir deste trabalho, a relação que se estabelece entre um diagnostico de câncer, no caso em crianças, e a idéia eminente na maior parte dos casos, de terminalidade da vida. Bem como, fazer referencia a importância de ser criado um espaço de acolhimento, nos quais familiares, pacientes e/ou profissionais da saúde possam esclarecer duvidas e compartilhar angustias, temores, culpas, experiências com outras pessoas que se encontram na mesma situação vital. Bem como, a necessidade de cuidados paliativos uma vez esgotadas as possibilidades terapêuticas e com o agravamento progressivo do quadro clínico do paciente. Método O presente trabalho buscou retratar, a partir de uma pesquisa de revisão bibliográfica, a leitura de autores que abordam as temáticas: ciclo de vida e morte, buscando relacionar as mesmas ao contexto que se constitui a partir de um diagnóstico de câncer, principalmente quando o paciente for uma criança. Para tanto, realizou-se um levantamento bibliográfico, utilizando como palavras chave de pesquisa ciclo de vida; morte. Também, fez-se um Levantamento teórico das pesquisas publicadas a partir de 2005 no portal Google acadêmico, com base nas palavras chaves: psico-oncologia, leucemia, criança. O levantamento resultou em 62 trabalhos

136 publicados, sendo selecionados para o presente trabalho apenas os artigos publicados no portal SCIELO e PEPSIC. Este estudo se caracteriza como uma pesquisa exploratória e descritiva de caráter qualitativo. Diante disso, o trabalho justificou-se como exploratório por levantar informações e dados que permitem uma melhor compreensão dos temas (GIL, 2006). Utilizou-se a vertente de pesquisa qualitativa, visto que busca a compreensão dos fenômenos através de um papel participante do pesquisador, por meio de uma análise subjetiva de dados, considerando que a pesquisa qualitativa evita números e lida com interpretações das realidades sociais (BAUER; GASKELL, 2002). Tendo em vista que os textos analisados já foram publicados, os critérios éticos observados nesta pesquisa dizem respeito ao compromisso da pesquisadora em respeitar a autoria e manter a fidelidade das informações. Resultados e Discussão A morte sempre inspirou poetas, músicos, artistas e todos homens em comuns. Há registros sobre a morte como uma perda, degeneração, ruptura, mas também, como fascínio, sedução, uma grande viagem, descanso, alivio. A morte é caracterizada como a última etapa do ciclo vital onde representa o poder sobre o qual não temos nenhum controle, invisível, intangível, indomável e desconhecido (EIZIRIK 2001). De acordo com Kovacs (2008), a morte faz parte do desenvolvimento humano desde a mais tenra idade. Inicialmente a criança vive a ausência da mãe. No decorrer do desenvolvimento do sujeito, vão sendo vivenciadas diversas perdas, passarinho que morre, formiga pisoteada e que para de andar, até a perda de algum familiar, pessoa próxima. Dependendo da faixa etária, a criança não tem dimensão do significado do ocorrido, mas chora, se desespera, pois percebe a partir das atitudes dos adultos que algo ocorreu. O diagnóstico de câncer na infância atinge de maneira devastadora a criança e a família, afetando sua unidade e expondo-os a grandes aflições e angústias (Patterson, Holm & Gurney, 2004). A percepção e conscientização da possibilidade de morte da criança acabam por facilitar desestruturações pessoais e manifestações de stress e medo nos familiares e na criança durante todo o processo de diagnóstico e tratamento da criança (Françoso e Valle, 1999; Ulisses de Carvalho, 2008; Yin & Twinn, 2004).

137 O impacto de um diagnóstico de possível perda pode interferir na dinâmica de toda família. Considerando a complexidade da doença neoplásica, o tratamento deve ser abrangente, exigindo atenção não só para as necessidades físicas, como também para as demandas psicológicas e sociais do paciente, incluindo a participação ativa da família (Costa e Lima, 2002). Princípios estes, que segundo Gimenez (1994) norteiam o campo de ação delimitado pela Psico-oncologia, definindo seu foco de estudo e intervenção. Assim, a busca pela cura não deve se basear somente na recuperação biológica, mas também no investimento da recuperação do bem-estar da criança, abalada anteriormente pela ocorrência da doença (Françoso & Valle, 1999). Torna-se necessário ter atenção e cuidado a esses familiares, o que poderá favorecer a recuperação de seu bem-estar, beneficiando inclusive a criança doente. Para Gimenes (1992), o modo como os pais enfrentam o diagnóstico e tratamento da doença é, em parte, determinado pelas suas histórias e experiências passadas com a doença câncer, seus valores e crenças pessoais, mas depende também dos recursos sociais disponíveis na comunidade para lidar com algum evento estressante. Desse modo, como mostram Lopes e Valle (2001), o câncer infantil e seu tratamento têm um impacto sistêmico sobre a organização familiar, que a torna vulnerável ao sofrimento psíquico que atinge não apenas a criança, como também seus cuidadores. Ao analisar as publicações da área Oliveira, Torrano-Masetti e Santos (1999) concluíram que um acompanhamento sistemático junto aos familiares do paciente oncológico mostra-se de enorme relevância no contexto da enfermidade de um filho em desenvolvimento. Na medida em que pode proporcionar "conforto psíquico e elaboração dos intensos sentimentos de culpa, desamparo e revolta que o adoecer de um ente querido normalmente desencadeia" (p. 49-50). Vários estudos realizados com acompanhantes e familiares de pacientes com câncer apontam para o desgaste emocional da vivência da situação em diferentes momentos da doença, como repetidas visitas à médicos, hospitais e a necessidade de assegurar que as medicações sejam dadas em horas específicas, (Bradford, 1997; Kazak et al., 2004; Kazak et al., 2005; Patiño-Fernandez et al., 2008). Considerando as implicações biopsicossociais da enfermidade e as complexas demandas da terapêutica, a inclusão dos pais no tratamento do câncer infantil é extremamente importante. Objetivo este, que a psico-oncologia busca alcançar ao

138 preconizar a importância da oferta de espaços diferenciados de acolhimento, nos quais os pais possam esclarecer suas dúvidas e dividir suas apreensões, de modo a compartilhar experiência com outras pessoas que se encontram na mesma situação vital. Para assim, minimizar o impacto a longo prazo que o câncer da criança tem em suas famílias. O psicólogo deve, num momento inicial, observar as percepções dos familiares que dispõem a exercer o papel de acompanhante, além de identificar o conhecimento que o mesmo possui sobre o problema de saúde que o paciente possui. Isso se faz necessário para minimizar angustias que poderão ocorrer sobre os procedimentos que muitas vezes são desconhecidos, uma vez que o cuidar exige um alto nível de exigência e sobrecarga emocional. As reuniões familiares também são necessárias, pois o objetivo é fornecer suporte emocional e informações sobre os procedimentos hospitalares, promovendo, junto aos familiares, a conscientização sobre os recursos que podem ser mobilizados no enfrentamento da doença, trabalhando as resistências às mudanças e inserindo a unidade familiar como parte integrante do processo terapêutico. A criação de um grupo de acompanhantes é importante, pois com essa tarefa podese aprimorar as estratégias de enfrentamento do processo de tratamento por parte do acompanhante. Num modelo com o intuito de ser de apoio, aberto, composto por no máximo cinco e no mínimo três pessoas, podendo ser coordenado por um psicólogo e um terapeuta ocupacional, com duração de uma hora e frequência semanal. Através da criação desse grupo, proporcionaria a oportunidade que os acompanhantes encontrassem de falar livremente de suas tensões e dificuldades enfrentadas no cotidiano hospitalar, de compartilhar suas emoções com pessoas que vivenciavam a mesma situação de crise vital e de se sentir escutados, compreendidos e amparados por profissionais da equipe. Também, há a possibilidade de incluir atendimentos individuais ambulatoriais dependendo das necessidades de cada familiar, onde o foco principal será a re-significação de seus medos e angustias sobre a morte de um familiar. Uma vez esgotadas as possibilidades terapêuticas e com o agravamento progressivo do quadro clínico do paciente, passa-se ao estágio dos cuidados paliativos. De acordo com Higginson (1993) os cuidados paliativos surgiram como uma resposta às necessidades dos pacientes terminais que já não se beneficiavam mais com as ofertas terapêuticas. Ainda, segundo o autor, os cuidados paliativos passam a ser considerados importantes,

139 principalmente na primeira metade do século devido à rápida queda nas taxas de mortalidade, possibilitando assim, uma melhora nos serviços de saúde, para que pacientes, familiares e equipes obtivessem melhor condições de saúde e qualidade de vida. Para Silva e Hortale (2006) o cuidado paliativo é reconhecido como uma abordagem que melhora a qualidade de vida dos indivíduos e familiares na presença de doenças terminais. Definindo-se através da prevenção e alívio do sofrimento, identificando, avaliando e tratando a dor e outros problemas causadores dos sofrimentos físico, emocional, espiritual e social, que são aspectos considerados essenciais e orientadores do cuidado. Pode ser oferecido em instituições de saúde bem como na própria residência, para indivíduos com doença terminal (desde seu diagnóstico até o momento da morte) e aos seus familiares (durante o curso da doença e em programas de enlutamento). Os cuidados paliativos podem e devem ser oferecidos o mais cedo possível no curso de qualquer doença crônica potencialmente fatal, para que esta não se torne difícil de tratar nos últimos dias de vida. Principalmente quando considerado que estes programas de cuidados paliativos podem ser inseridos em instituições hospitalares, asilos, casas de repouso, moradias assistidas, clínicas e no domicílio (home care) (SILVA, HORTALE, 2006). Sobre cuidados paliativos, a Organização Mundial da Saúde (1990) estabelece seis princípios: valoriza a vida e considera a morte como um processo natural; nem abrevia nem prolonga a vida; provê o alívio da dor e outros sintomas que geram sofrimento; integra os aspectos psicológicos e espirituais dos cuidados ao paciente, permitindo oportunidades para o crescimento; oferece uma equipe interdisciplinar e um sistema de suporte para a família durante a doença do indivíduo e em seu próprio processo de luto (SILVA, HORTALE, 2006; BROMBERG, 1998). Conforme Saunders e Sykes (1993), cuidados paliativos são oferecidos para o corpo; à família e para a pessoa em si. A proposta de cuidados paliativos, busca levar o paciente a uma possibilidade de viver tanto quanto lhe for possível, mas levando em conta suas próprias possibilidades e desejos. Assim, avaliar a demanda do paciente terminal permite a tradução dessas necessidades em objetivos de atuação prática da equipe de cuidados, para oferecer-lhes um cuidado mais adequado. Para Dunlop e Hockley (1990) os objetivos em maior evidência apresentados são: alívio de sintomas de sofrimento e oferta de apoio social, emocional e espiritual aos pacientes que têm uma doença terminal; orientação e apoio aos parentes e

140 demais pessoas enlutadas; aconselhamento e apoio à equipe que cuida desses pacientes; programas educativos, com base multidisciplinar. Cuidados paliativos significam a preocupação com a melhora de qualidade de vida do paciente terminal e com a melhora da qualidade da morte. Ou, como definido em Bromberg (1998, pg 201): A morte adequada é a ausência de sofrimento, a preservação de relações importantes, um período para o luto antecipatório, alivio de conflitos remanescentes, crença no infinito, exercício de opções e atividades viáveis, consistência com as limitações físicas, tudo dentro dos objetivos do ego ideal de cada um. Os cuidados paliativos assumem grande relevância principalmente quando o paciente com doença terminal como a leucemia é uma criança. Valle (1994, p. 239) mostra que "é muito difícil para os pais se prepararem para a morte de seu filho", uma vez que esse desfecho lhes parece absurdo por representar uma inversão da ordem natural das coisas, já que se espera que os filhos enterrem seus pais. Sendo que juntamente com o filho que se perdeu vão-se os sonhos e idealizações, os investimentos afetivos, as expectativas e os projetos de futuro que os pais acalentaram e depositaram na criança. Quando a morte é inevitável, é preciso compreender que, após o desfecho fatal, à família resta elaborar o doloroso trabalho de luto, e que "cada um faz seu luto como consegue" (Valle, 1994, p. 239). Percebe-se, assim, a necessidade de respeitar a configuração singular do processo de enlutamento de cada família. O luto não deve ser medicado, pois não é uma doença; é um sentimento que, como tal, deve ser vivido e sentido até que se desgaste (Freud, 1917). Conclusões O temor da morte quase sempre acompanha o diagnóstico do câncer e permanece como uma sombra que paira ao longo de todo o percurso terapêutico do paciente. Além dos fatores culturais e das dimensões simbólicas associadas à doença, há que se considerar o fato de que a enfermidade grave em crianças e adolescentes geralmente desperta comoção e consternação nos adultos. Os dados analisados permitem concluir que o adoecer do filho desencadeia reações emocionais intensas, que requerem acompanhamento psicológico sistemático para auxiliar os pais a conterem e elaborarem as ansiedades vivenciadas nas situações que permeiam o

141 processo de tratamento oncológico. Os achados da literatura sugerem, assim, a necessidade e importância de disponibilizar programas de intervenção preventiva junto aos pais que acompanham o tratamento de seus filhos. Destacando-se neste estudo como técnicas e práticas da psico-oncologia que possibilitam suporte à família, orientação à equipe e bem estar e qualidade de vida ao paciente: acompanhamento sistemático à família; estabelecer reuniões familiares; criar grupo de acompanhantes; atendimento ambulatorial individual quando necessário. Também, uma vez esgotadas as possibilidades terapêuticas e com o agravamento progressivo do quadro clínico do paciente, passar para o estágio dos cuidados paliativos. De um modo geral é possível evidenciar a partir das leituras, que o trabalho realizado por uma equipe multiprofissional que conta com o profissional de Psicologia facilita o delineamento de um protocolo de tratamento mais adequado. Facilitando desde a etapa da transmissão do diagnóstico, passando pelos diferentes estágios do tratamento, até o acompanhamento regular da criança e da família nas fases livres de doença (follow up). Até mesmo naqueles casos em que a morte é inevitável, as intervenções psicológicas são fundamentais para auxiliar os pais a elaborarem o processo de luto e trabalhar a frustração da equipe de saúde que se dedicou a promover e prolongar a vida com qualidade, ou pelo menos, com menos sofrimento, daquele paciente. Referências BAUER, Martin W.; GASKELL, George. Pesquisa qualitativa com texto, imagem e som: um manual prático. Rio de Janeiro: Vozes, 2002. BROMBERG, M, H, P, F. Cuidados paliativos para o paciente com câncer: uma proposta integrativa para a equipe, pacientes e famílias. In: CARVALHO, M. M. M. J. de (org). Resgatando o viver: psico-oncologia no Brasil. São Paulo: Summus, 1998, p. 186-231. COSTA, Juliana Cardeal da; LIMA, Regina Aparecida Garcia de. Crianças/adolescentes em quimioterapia ambulatorial: Implicações para a enfermagem. Revista Latino-americana de Enfermagem. Ribeirão Preto, v. 10, n. 3, jun. 2002. Disponível em <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=s0104-11692002000300007&lng=pt&nrm=iso>. Acessos em 01 out. 2011. DEL BIANCO FARIA, Ana Maria; CARDOSO, Carmen Lúcia. Aspectos psicossociais de Acompanhantes cuidadores de Câncer com Crianças: Estresse e enfrentamento. Estudo de

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