GOVERNO UTILIZA EMPRESAS PUBLICAS PARA REDUZIR O DÉFICE ORÇAMENTAL, ENDIVIDANDO-AS E ARRASTANDO-AS PARA A SITUAÇÃO DE FALENCIA TÉCNICA



Documentos relacionados
Os sistemas de Segurança Social e da CGA utilizados pelo governo como instrumento orçamental

Porque razão a banca e o governo querem transferir os Fundos de Pensões para a Segurança Social Pág 1

Marketing e Publicidade 2ºANO 1º SEMESTRE

NOVO REGIME JURÍDICO DA REABILITAÇÃO URBANA. Decreto-Lei n.º 309/2007, de 23 de Outubro Workshop IHRU 12 Abril 2010

2 1,2 1,3 2,5 2 3,2 3 0,5-4,2 1,8 1,3% 1,9 0,9 0,8 2,2 1,7 3,1 2,9 0,4-4,1 1,8 1,16%

1 A INEFICIENCIA ENERGÉTICA EM PORTUGAL AGRAVA A CRISE ECONÓMICA E SOCIAL

PARECER N.º 26/CITE/2006

C N INTERPRETAÇÃO TÉCNICA Nº 2. Assunto: RESERVA FISCAL PARA INVESTIMENTO Cumprimento das obrigações contabilísticas I. QUESTÃO

CAPITAL DE GIRO: ESSÊNCIA DA VIDA EMPRESARIAL

O SUCH Serviço de Utilização Comum dos Hospitais é uma associação privada sem fins lucrativos ( pessoa colectiva de utilidade pública).

OE2011: Um orçamento que vai destruir a economia e que ataca quem trabalha e os pensionistas Pág. 1

Legislação MINISTÉRIO DAS FINANÇAS

PROJETO DE LEI N.º 83/XIII/1.ª ASSEGURA A GRATUITIDADE DA CONTA BASE

Famílias falidas esquecem-se do perdão do resto da dívida

ANEXO A à. Proposta de REGULAMENTO DO PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO. relativo ao Sistema europeu de contas nacionais e regionais na União Europeia

8 de Março E urgente acabar com as discriminações que a mulher continua sujeita em Portugal Pág. 2

Tribunal de Contas. ACÓRDÃO N.º 2/ ª S/PL de 28 de Janeiro de R.O. n.º 20/02 Processo n.º 1779/2002 SUMÁRIO:

Procedimento dos Défices Excessivos (2ª Notificação de 2014)

Prova Escrita de Economia A

GOVERNO. Orçamento Cidadão 2015

PPP O que são e quais as suas consequências para o SNS e para os portugueses Pág. 2

AUDIÇÃO NA COMISSÃO PARLAMENTAR DO AMBIENTE, ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO E PODER LOCAL. Projeto de Lei Nº 368/XII

PROJECTO DE LEI N.º 267XI/1.ª LINHA DE CRÉDITO BONIFICADO DE APOIO À ACTIVIDADE AGRÍCOLA

ACÓRDÃO Nº 22 / JUN/1ª S/SS

ACORDÃO Nº 73 /03 3 JUNHO/1ªS/SS

GRUPO PARLAMENTAR ASSEMBLEIA LEGISLATIVA REGIONAL DOS AÇORES VII Legislatura

A COLOCAÇÃO DE ESCRITÓRIOS PODE VOLTAR AOS 150 MIL/170 MIL M2 EM 2009

contribuir para ocultar a descida real do poder de compra dos salários e das pensões de reforma em Portugal contribui para que continue.

FEUP RELATÓRIO DE CONTAS BALANÇO

Formação em Protecção Social

Tomada de posição do STAL sobre a ADSE

O PÚBLICO fez um guia explicativo para as cinco grandes mudanças deste regime.

DIRECTRIZ DE REVISÃO/AUDITORIA 872

PROPOSTA DE LEI N. /2011 REGIME DA DÍVIDA PÚBLICA

Fundo de Investimento Imobiliário Fechado Beirafundo

Gabinete do Presidente. Reunião de Câmara extraordinária 09 de setembro de 2015

Rendimentos e despesas das famílias europeias

REUNIÃO EXTRAORDINÁRIA DA CÂMARA MUNICIPAL DE S. JOÃO DA MADEIRA

PROGRAMA CIDADANIA ATIVA MANUAL DO PROMOTOR ANEXO 4: PREENCHIMENTO DO RELATÓRIO DE PROGRESSO

Fundo de Investimento Imobiliário Fechado Imomar

I ENCONTRO NACIONAL DAS EMPRESAS DO SECTOR DA CONSTRUÇÃO E IMOBILIÁRIO Lisboa, 5 de Junho de 2012

Programa Janela Eficiente tem potencial de negócio de 500 milhões 08/03/11, 18:31

Gestão dos Pequenos Negócios

Trabalho nº1 Análise Económico Financeira. BRISA Auto-Estradas de Portugal, S.A.

Telecomunicações. Introdução

ÁREA DE FORMAÇÃO: CONTRAIR CRÉDITO CRÉDITO AUTOMÓVEL

Ordem dos Advogados Largo São Domingos 14-1º, Lisboa Tel.: Fax:

MINUTA DE CONTRATO DE ATRIBUIÇÃO DE APOIOS FINANCEIROS A PESSOAS COLECTIVAS PRIVADAS SEM FINS LUCRATIVOS PROGRAMA MODELAR

ONG S E ASSOCIAÇÕES. Aproveite bem todas as dicas, fotos e textos deste guia, pois eles são muito importantes.

Marxismo e Ideologia

Empresas em Portugal 2012

Os riscos do INVESTIMENTO ACTIVO MAIS, produto financeiro complexo, dependem dos riscos individuais associados a cada um dos produtos que o compõem.

Decreto-Lei nº 27/2001, de 3 de Fevereiro

UNIVERSIDADE CATÓLICA PORTUGUESA Faculdade de Ciências Económicas e Empresariais CONTABILIDADE FINANCEIRA II EXAME FINAL

Encontro Nacional de Instaladores

CONCURSO NACIONAL DE LEITURA

PARECER N.º 175/CITE/2009

Empresas Públicas de transportes colectivos com 4994 milhões de Capitais Próprios negativos Pág. 1

CARTILHA SOBRE DIREITO À APOSENTADORIA ESPECIAL APÓS A DECISÃO DO STF NO MANDADO DE INJUNÇÃO Nº 880 ORIENTAÇÕES DA ASSESSORIA JURIDICA DA FENASPS

Consulta pública. Sistema de Cobertura do Risco de Fenómenos Sísmicos

EXAME NACIONAL DO ENSINO SECUNDÁRIO VERSÃO 2

Um país mais competitivo e amigo do investimento

Fundação Denise Lester

DOCUMENTOS DE GESTÃO FINANCEIRA Realizado por GESTLUZ - Consultores de Gestão

TÓPICO ESPECIAL DE CONTABILIDADE: IR DIFERIDO

Correção 9)As operações de mercado aberto envolvem variações nos encaixes compulsórios que os bancos. Conceito de Déficit e Dívida Pública

A ALTA VELOCIDADE EM PORTUGAL::- sem viabilidade económica e financeira

Decreto-Lei nº 103/2009, de 12 de Maio

MUNICÍPIO DO PORTO SANTO RELATÓRIO DE GESTÃO CONSOLIDADO

Fundo de Investimento Imobiliário Fechado Fundolis

Implicações da alteração da Taxa de Juro nas Provisões Matemáticas do Seguro de Vida

Análise: Desemprego Jovem e medidas de apoio IEFP. Análise: Desemprego Jovem e Medidas de Apoio IEFP

Quadro 1 Dimensão do controlo da EDP e da GALP por capital estrangeiro

Duração da Prova: 120 minutos. Tolerância: 30 minutos. Utilize apenas caneta ou esferográfica de tinta indelével, azul ou preta.

PROJECTO DE LEI N.º 351/XI

Regulamento Financeiro do Partido Social Democrata (Aprovado na Comissão Política Nacional de )

REGULAMENTO E TABELA GERAL DE TAXAS DA FREGUESIA DE NEIVA

Análise da proposta de deliberação das alterações do Preçário da Universidade Aberta

O custo financeiro do Estado brasileiro

ipea políticas sociais acompanhamento e análise 7 ago GASTOS SOCIAIS: FOCALIZAR VERSUS UNIVERSALIZAR José Márcio Camargo*

O DOMÍNIO DOS TRANSPORTES RODOVIÁRIOS DE MERCADORIAS PELOS PRIVADOS, O LOCK-OUT DOS PATRÕES, O PREÇO DO GASÓLEO E A MANIPULAÇÃO DA OPINIÃO PÚBLICA

Madeira. Bens e serviços. Açores. Taxa Taxa intermédia. Observações / Legislação reduzida

Fundo de Investimento Imobiliário Fechado Imorocha

GESTÃO FINANCEIRA UMA ANÁLISE SIMPLIFICADA

DEMONSTRAÇÃO DO VALOR ADICIONADO

VALOR DOS DIREITOS DE PROPRIEDADE INTELECTUAL NO SECTOR CULTURAL E CRIATIVO

1. Tradicionalmente, a primeira missão do movimento associativo é a de defender os

GUIA PRÁTICO SUBSÍDIO DE DESEMPREGO PARCIAL

RELATÓRIO INTERCALAR (nº 3, do artigo 23º, da Decisão 2004/904/CE)

5 Instrução e integração

ASPECTOS AVANÇADOS NA ANÁLISE

De acordo com a definição dada pela OCDE,

Após 41 anos de descontos e 65 de idade reformei-me. Fiquei com UMA SÓ reforma calculada a partir dos descontos que fiz nesses 41 anos.

Conselho Nacional de Supervisores Financeiros. Better regulation do sector financeiro

UMA APRECIAÇÃO GERAL AOS INVESTIMENTOS PORTUGUESES NO BRASIL

Numa turma de 26 alunos, o número de raparigas excede em 4 o número de rapazes. Quantos rapazes há nesta turma?

INFORMATIVO ROTÁRIO GLOBALOUTLOOK GUIA SOBRE O MODELO DE FINANCIAMENTO DA FUNDAÇÃO ROTÁRIA

Transcrição:

GOVERNO UTILIZA EMPRESAS PUBLICAS PARA REDUZIR O DÉFICE ORÇAMENTAL, ENDIVIDANDO-AS E ARRASTANDO-AS PARA A SITUAÇÃO DE FALENCIA TÉCNICA RESUMO DESTE ESTUDO Os principais jornais diários portugueses divulgaram recentemente em grandes caixas, alguns deles na 1ª página, que as dividas das empresas publicas atingiam 17.500 milhões de euros. E como é habitual em muitos media portugueses não explicaram por que razão isso acontecia, podendo criar nos leitores a falsa ideia que isso resultava de serem empresas públicas. Está-se assim perante aquilo a que Phippe Breton designa por enquadramento manipulatório, pois uma analise objectiva das causas de tais dividas levam a conclusões bem diferentes. Existem impostos cuja cobrança se justifica porque são necessários precisamente para financiar as infra-estruturas dos transportes. São nomeadamente o Imposto Automóvel (IA), agora designado Imposto sobre os Veículos (ISV), e o Imposto sobre Produtos Petrolíferos (ISP). No período 2005-2009, as receitas obtidas pelo Estado, através do IA/ISV e do ISP, deverão atingir 20.051,6 milhões de euros de acordo com os dados dos Relatórios dos OE 2005-2009. Apesar de arrecadar mais de 20.000 milhões de euros de receitas com estes dois impostos, as dotações orçamentais atribuídas por este governo às empresas publicas de transportes para o financiamento de infra-estruturas e aquisição de material circulante têm sido manifestamente insuficientes. Entre 2005 e 2009. as transferências do Orçamento do Estado para as empresas públicas de transportes (REFER, CP, Carris, Metro, etc.), para financiamento de infra-estruturas e aquisição de material circulante, atingirão apenas 2.289,5 milhões de euros. Como consequência, as empresas públicas de transportes serão obrigadas a se endividarem em mais 3.773 milhões de euros (mais 63% do que o transferido do Orçamento do Estado), no período 2005-2009, só para poderem cumprir o programa de investimentos constante do PIDDAC, ou seja, o programa mais importante de investimentos do Estado. Como consequência da insuficiência das transferências do Orçamento do Estado, as dividas aos bancos apenas de quatro empresas publicas de transportes (REFER, CP, Carris e Metro de Lisboa) atingiam, já no fim de 2007, 7.983,2 milhões de euros, e os juros pagos por estas empresas totalizaram, só em 2007, 444,7 milhões de euros. Estes elevados montantes de juros contribuíram para que estas quatro empresas tivessem tido, em 2007, 532 milhões de euros de prejuízos. Esta situação provocou que estas quatro empresas públicas apresentassem em 2007 Situações Liquidas e Capitais Próprios negativos, isto é, o seu Activo (aquilo que possuíam mais o que tinham a receber) já não era suficiente para pagar o seu Passivo (tudo o que deviam), pois o seu Passivo já era superior ao seu Activo em 3.272,5 milhões de euros,, o que significava que, já em 2007, aquelas quatro empresas estivessem tecnicamente falidas. É arrastando as empresas públicas de transportes para a situação de falência técnica, que este governo tem conseguido também reduzir o défice orçamental. Mesmo as indemnizações compensatórias a que as empresas de transportes públicas têm direito a receber por prestarem à população serviços a um preço inferior ao seu custo são pagas tarde e a más horas. Por ex., as 2008 só começaram a ser pagas a partir de Outubro deste ano (Parecer do Tribunal de Contas, pág. 7), o que agravou as dificuldades financeiras destas empresas. Uma das mensagens que este governo e os seus defensores nos media têm procurado fazer passar é que as empresas públicas são um sorvedouro de dinheiro para o Orçamento do Estado. No entanto, de acordo com o Parecer do Tribunal de Contas sobre a Conta Geral do Estado de 2007, no período 2003-2007, a despesas do Estado com apoios financeiros não reembolsáveis às empresas publicas atingiram 5.655 milhões de euros, mas às empresas privadas já somaram 6.694,1 milhões de euros, ou seja, mais 1.000 milhões de euros (pág. 104). Portanto, o apoio financeiro do Estado às empresas privadas foi bastante superior ao concedido às empresas públicas. Por isso, não se pense que este apoio só teve lugar recentemente (mais de 24.000 milhões à banca, mais de 1.300 milhões de euros à Quimonda e sector automóvel, etc.). Normalmente os media falam do apoio do Estado às empresas públicas mas esquecemse de falar, fora de períodos de crise como é o actual, do apoio do Estado às empresas privadas. È a informação de dois pesos e de duas medidas que temos em Portugal.

No dia 13 de Janeiro de 2008, os principais jornais diários portugueses, utilizando o relatório da Auditoria aos débitos e ao prazo médio de pagamento das Empresas Públicas, publicado pelo Tribunal de Contas, que está disponível no seu sitio na Internet, publicaram grandes caixas, alguns na 1ª pagina, em que se podia ler : Empresas do sector público com dividas de 17.500 milhões (Público); Dividas das empresas públicas superam 11% do PIB nacional (Diário Económico). Mas como é habitual, esses mesmos jornais não investigaram, nem contextualizaram, nem explicaram por que razão isso sucede. E embora não tenham afirmado expressa e directamente isso, poderão ter criado nos leitores a falsa ideia de que isso sucedia pela simples razão de serem empresas públicas. Philippe Breton, no seu livro A palavra manipulada, classifica aquela forma de apresentar a noticia como uma forma de manipulação, designando-o por enquadramento manipulatório que consiste em ordenar os factos de tal modo que da nova imagem da realidade resulte a convicção em bases de certo modo falsas. (pág. 114). Efectivamente, se aqueles jornais se tivessem dado ao trabalho de investigar, de saber por que razão as empresas públicas, nomeadamente as de transportes, apresentam dividas elevadas, e se explicassem isso aos leitores, naturalmente a percepção da realidade que os leitores obteriam seria certamente muito diferente da que obtiveram com a leitura daquela noticia como foi publicada. Neste estudo vamos procurar explicar por que razão as empresas publicas de transporte, que são as que apresentam maiores dividas, estão endividadas e, algumas delas, até já tecnicamente falidas. IMPOSTOS SOBRE OS TRANSPORTES SOMAM MAIS DE 20.000 MILHÕES DE EUROS COM ESTE GOVERNO Existem impostos cuja cobrança se justifica porque são necessários para financiar despesas com as infra-estruturas dos transportes. São os casos, nomeadamente do Imposto Automóvel (IA), agora designado Imposto sobre os Veículos (ISV), e do Imposto sobre Produtos Petrolíferos (ISP). As receitas destes dois impostos durante o período deste governo, ou seja, no período 2005-2009, consta do quadro seguinte, que foi construído com dados dos Orçamentos de Estado apresentados por este governo. QUADRO I Receitas do Estado obtidas através do Imposto Automóvel (IA, agora ISV) e do Imposto sobre Produtos Petrolíferos (ISP) no período 2005-2009 ORÇAMENTO DO ESTADO -Milhões de euros ANOS IA/ISV (Imposto Automóvel / Imposto sobre Veículos) ISP (Imposto sobre Produtos Petrolíferos) TOTAL 2005 1.160,0 3.040,0 4.200,0 2006 1.175,0 3.070,0 4.245,0 2007 1.184,0 3.170,0 4.354,0 2008 (*) 940,7 2.561,9 3.502,6 2009 (*) 1.100,0 2.650,0 3.750,0 SOMA 5.559,7 14.491,9 20.051,6 (*) Em 2008 e 2009 no ISP está deduzida contribuição de serviço rodoviária para a empresa Estradas Portugal FONTE: Relatórios OE 2005, 2006, 2007, 2008 e 2009 No período 2005-2009, as receitas do Estado, só com o actual Imposto sobre Veículos e o Imposto sobre Produtos Petrolíferos atingirão, 20.051,6 milhões de euros. E neste valor não está incluído a chamada contribuição de serviço rodoviária, criada pela Lei nº 51/2007, que é uma parcela do ISP, que é desviada directamente para a empresa Estradas de Portugal sem passar pelo Orçamento do Estado e que, por isso, não está incluída nos valores do quadro I. Esta contribuição de serviço rodoviário, só nos anos de 2008 e 2009, representa mais 1.113 milhões

de euros. E tudo isto ainda não inclui o chamado Imposto de circulação, cuja receita reverte integralmente para as Autarquias e que, também por isso, não entra no Orçamento do Estado. GOVERNO REDUZ DOTAÇÕES DO ORÇAMENTO DO ESTADO PARA EMPRESAS PÚBLICAS DE TRANSPORTES DESTINADAS A INVESTIMENTO PARA REDUZIR DÉFICE ORÇAMENTAL Apesar de obter só para o Orçamento do Estado mais de 20.000 milhões de euros de receitas com impostos que incidem sobre o sector de transportes, as dotações do Orçamento do Estado atribuídas por este governo às empresas publicas de transportes para o financiamento de infraestruturas e aquisição de material circulante têm sido manifestamente insuficientes como revela o quadro seguinte construído com dados constantes dos Relatórios que acompanharam os Orçamentos do Estado para o período 2005- QUADRO II- PIDDAC por programas Apenas sector de transportes ANOS INVESTI- MENTO TOTAL FINANCIAMENTO DO ORÇAMENTO DO ESTADO (Cap.50) Financiamento Comunitário Outras Fontes (EMPRESTIMOS CONTRAIDOS PELAS EMPRESAS PÚBLICAS) % Financiamento Orçamento do Estado do INVESTIMEN- TO TOTAL % EMPRESTIMO DO INVESTIMEN- TO TOTAL 2005 2.797,9 674,4 796,1 1.327,4 24,1% 47,4% 2006 1.994,5 761,9 564,9 667,8 38,2% 33,5% 2007 2.515,0 611,9 597,4 1.305,7 24,3% 51,9% 2008(*) 432,6 120,0 119,2 193,4 27,7% 44,7% 2009(*) 657,2 121,3 256,8 279,1 18,5% 42,5% SOMA 8.397,3 2.289,5 2.334,5 3.773,4 27,3% 44,9% (*) A partir de 2008, inclusive, os investimentos das Estradas de Portugal deixou de constar do PIDDAC, por isso deixou de haver controlo da Assembleia da República sobre esses investimentos FONTE : Relatório que acompanha o Orçamento do Estado : 2005-2009. Assim, no período compreendido entre 2005 e 2009, as transferências do Orçamento do Estado para as empresas públicas de transportes (REFER, CP, Carris, Metro, etc.), para financiamento de infra-estruturas e aquisição de material circulante, somarão somente 2.289,5 milhões de euros, sem incluir a contribuição por serviço rodoviário, que é uma parcela das receitas do ISP desviadas directamente apenas para as Estradas de Portugal, quando as receitas obtidas directamente pelo Orçamento do Estado de impostos que incidem sobre os transportes, durante o mesmo período (2005-2009),sem incluir também aquela mesma contribuições por serviço rodoviário, totalizarão mais de 20.000 milhões de euros. Como consequências as empresas públicas de transportes serão obrigadas a se endividarem em 3.773,4 milhões de euros (mais 63% que o transferido do Orçamento do Estado), durante o mesmo período 2005-2009, para poderem cumprir só o programa de investimentos constante do PIDDAC, ou seja, o programa mais importante de investimentos do Estado. É evidente que é transferindo do Orçamento do Estado para as empresas públicas de transportes dotações insuficientes para financiar as infra-estruturas de transporte e a aquisição de material circulante, ou seja, através desta engenharia financeira, que este governo tem conseguido também reduzir o défice orçamental. Mas esta politica está a determinar o agravamento vertiginosos do endividamento das empresas públicas de transporte e a sua, consequente, degradação financeira. GOVERNO PROVOCA FALENCIA TECNICA DAS EMPRESAS PÚBLICAS DE TRANSPORTE O aumento do endividamento das empresas publicas, determinado pela politica deste governo dominada pela obsessão de reduzir o défice orçamental, está a provocar o aumento rápido das despesas das empresas públicas de transportes com o pagamento de juros. como revela o quadro seguinte. QUADRO III - Situação económica e financeiras públicas de transportes Em Milhões de euros EMPRESA EMPRESTIMOS ENCARGOS FINANCEIROS RESULTADOS SITUAÇÃO LIQUIDA

2006 2007 2006 2007 2006 2007 2006 2007 REFER 1.776,1 2.080,7 195,0 228,0-162,2-162,8-811,0-974,0 CP 2.481,7 2.617,3 82,9 118,2-192,9-183,9-1.638,1-1.823,1 CARRIS 314,8 336,6 19,8 26,3-52,2-39,3-382,6-418,8 METRO LISBOA 2.785,5 2.948,6 69,5 72,2-146,9-144,2 64,7-56,7 TOTAL 7.358,1 7.983,2 367,2 444,7-554,2-530,2-2.767,0-3.272,5 FONTE: Relatórios e Contas - 2006t e 2007 As dividas aos bancos apenas destas quatro empresas publicas de transportes atingiam, no fim de 2007, 7.983,2 milhões de euros, tendo aumentado mais de 600 milhões euros entre 2006 e 2007. Como consequência, os encargos financeiros, ou seja, os juros pagos por estas empresas alcançaram, em 2006, 367,2 milhões de euros e, em 2007, 444,7 milhões de euros, um aumento de 77,4 milhões de euros de juros em apenas num ano. Estes elevados montantes de juros determinaram, por sua vez, que as quatro empresas publicas de transportes tivessem tido, em 2006 e em 2007, mais de 530 milhões de euros de prejuízos em cada um destes anos. Esta situação provocou que estas quatro empresas públicas apresentassem em 2007, Situações Liquidas e Capitais Próprios negativos, isto é que o seu Activo (aquilo que possuíam mais o que tinham a receber) já não era suficiente para pagar o seu Passivo (tudo o que devem), pois as suas dividas eram já superiores a tudo que possuíam e que tinham a receber em 3.272,5 milhões de euros, o que significava que todas elas já estivessem tecnicamente falidas em 2007. É arrastando as empresas públicas para a situação de falência técnica que este governo tem conseguido também reduzir o défice orçamental. A manutenção desta situação de falência técnica é insustentável e levará inevitavelmente ao aumento dos preços dos transportes públicos e de impostos necessários para financiar o buraco financeiro que a politica deste governo esta a provocar nas empresas públicas. OS SUBSIDIOS DO ESTADO ÀS EMPRESAS PRIVADAS É SUPERIOR AOS CONCEDIDOS ÀS EMPRESAS PUBLICAS Uma das mensagens que este governo e os seus defensores nos media têm procurado fazer passar é que as empresas públicas são um sorvedouro de dinheiro para o Orçamento do Estado. No entanto,, no período 2003-2007, portanto antes da crise, o apoio às empresas do sector privado foi bastante superior ao das empresas públicas como mostra o quadro seguinte, construído com dados constantes do Parecer do Tribunal de Contas sobre a CGE de 2007. QUADRO IV Despesa do Orçamento do Estado com apoios financeiros não reembolsáveis Em EMPRESAS 2003 2004 2005 2006 2007 TOTAL 1.750, Publicas Privadas Bancos e outras instituições financeiras 3 530,8 979,9 1.232,8 1.162,2 5.656,0 1.456, 2 1.402,4 1.570,3 1.117,8 1.147,6 6.694,3 507,1 341,0 237,3 237,8 214,4 1.537,6 FONTE : Parecer sobre a Conta Geral do Estado - 2007- Tribunal de Contas Entre 2003 e 2007, de acordo com o Tribunal de Contas, a despesa do Estado com apoios financeiros não reembolsáveis a empresas publicas somou 5.656 milhões de euros, mas a empresas privadas atingiu 6.694,3 milhões de euros, ou seja, mais de 1.000 milhões de euros do que a empresas públicas. E aos bancos e outros instituições financeiras esta despesa do Estado também não reembolsável alcançou 1.537,6 milhões de euros, Por outro lado, em 2007, só em subsídios não reembolsáveis a empresas privadas o Estado despendeu 519,2 milhões de euros, enquanto os subsídios a empresas publicas somaram 402,2 milhões de euros (pág. 105 do Parecer do Tribunal de Contas). Por aqui se vê bem quem é o sorvedouro de dinheiros do Orçamento do Estado de que normalmente os media não falam.

Mesmo as indemnizações compensatórias a que as empresas públicas de transportes colectivos têm direito por prestarem à população um serviço a preços inferiores aos seus custos tem sido pagas por este governo tarde e a más horas. No Parecer do Tribunal de Contas, na pág. 7, sobre esta questão lê-se o seguinte: A titulo de exemplo, assinale-se que, apenas em 9 de Outubro de 2008, foi aprovada a Resolução do Conselho de Ministros que promove a distribuição das indemnizações compensatórias para 2008, pelas empresas prestadoras de serviço público, o que significa dez meses em que as empresas prestaram tais serviços, sem auferir as compensações a que têm direito. Estão neste caso as empresas do sector de transportes e comunicações E no seu Parecer, o Tribunal de Contas ainda acrescenta o seguinte: Não pode, porém deixar de se salientar que os estrangulamentos causados pelo próprio Estado às suas empresas pela não disponibilização tempestiva das verbas que lhe são devidas. vai, certamente, forçar a maior recurso ao endividamento bancário para acorrer a necessidades de tesouraria (pág. 7), inevitavelmente com elevados custos financeiros para estas empresas. Mas estes pontos do Parecer do Tribunal de Contas foram ignorado por muitos jornais, naturalmente por não ser do agrado do poder politico e económico dominante na sua campanha contra as empresas publicas, campanha essa que é alimentada também por actos de má gestão dos homens colocados pelo governo nas administrações de muita empresas públicas, de que é exemplo recente o caso da promoção ao topo da carreira na CGD de Armando Vara, antigo Secretário de Estado e ministro de um governo PS, que é actualmente administrador numa empresa concorrente da CGD, o MillenniumBCP. Eugénio Rosa. Economista Cristina da Nóbrega