O custo financeiro do Estado brasileiro
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- Laura Silva Martini
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1 Boletim Econômico Edição nº 48 novembro de 2014 Organização: Maurício José Nunes Oliveira Assessor econômico O custo financeiro do Estado brasileiro 1
2 O comportamento dos juros da dívida pública A gastança de dinheiro público já ultrapassou, e muito, a capacidade do governo de honrar seus compromissos. Mas, além de aumentar despesas com a máquina estatal, o setor público também viu a conta com os juros aumentar para patamares nunca antes vistos. Dados do Banco Central (BC) mostram uma situação preocupante para o país. De janeiro a setembro deste ano, o desembolso de estados, de municípios, do Distrito Federal e da União com encargos financeiros chegou a R$ 209,1 bilhões quase três vezes maior do que o valor gasto 12 anos atrás, de R$ 72,3 bilhões, no mesmo período de A dinheirama representa oito vezes o orçamento anual do Bolsa Família, de R$ 25 bilhões, e corresponde a 5,53% do Produto Interno Bruto (PIB), nível normalmente visto em países em crise. Como os gastos públicos com obras e despesas da máquina estatal têm aumentado a um ritmo maior do que a arrecadação tributária significa dizer que tão cedo o governo não conseguirá saldar o principal da dívida, mas apenas parte dos juros. O governo tem duas formas de contabilizar o desempenho fiscal. Na conta mais abrangente, chamada de resultado nominal, listam-se todas as obrigações, como pagamentos de salários e despesas com a máquina administrativa, além da conta de juros. Durante a primeira campanha ao Palácio do Planalto, em 2010, a então candidata Dilma Rousseff assumiu o compromisso de entregar um saldo positivo nessa conta. Mas, com a economia mais fraca, passou a gastar mais, para estimular o crescimento. Com isso, o déficit nominal triplicou, 2
3 saltando de R$ 93,6 bilhões, ao fim do governo Lula, para R$ 249,7 bilhões, no acumulado em 12 meses até setembro de Sem conseguir equilibrar essa conta, restou ao governo contabilizar o esforço fiscal por uma metodologia mais favorável, chamada de resultado primário. Nela, excluem-se todos os gastos financeiros, como empréstimos e juros pagos aos detentores de títulos da dívida pública. A meta para 2014 era economizar 1,9% do PIB, ou R$ 99 bilhões. Em nove meses, porém, acumulou-se um saldo negativo de R$ 15,7 bilhões o pior resultado desde Gráfico 1: Evolução do pagamento dos juros da Dívida Pública (em R$ Bilhões) (acumulado de janeiro a setembro de cada ano) Fonte: Banco Central Dívida líquida também cresce Se não bastasse o crescimento dos encargos financeiros da dívida pública (juros e amortizações) verifica-se também que o montante da dívida líquida em relação ao Produto Interno Bruto (PIB) também vem crescendo, apesar do governo tentar mascarar através de uma contabilidade criativa. O gráfico 2 apresenta e evolução do montante da dívida líquida em percentual do PIB no período de outubro de 2013 a setembro de
4 Gráfico 2: Evolução da Dívida Líquida em relação ao PIB (em %) Fonte: Banco Central Rombo nas contas públicas O saldo negativo do superávit primário é tão ruim que o governo deu o braço aos analistas que já vinham apontando o fiasco, e admitiu, pela primeira vez no ano, que não conseguirá cumprir a meta para Até o fim do mês, o Executivo encaminhará ao Congresso Nacional uma proposta para alterar a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). No documento, terá de dizer não apenas que fracassou em alcançar o objetivo, mas indicar de onde sairão os recursos necessários para cobrir o rombo. O governo só conseguirá o dinheiro extra através do bolso do contribuinte. O Brasil já tem uma das cargas tributárias mais elevadas do mundo, mas, por causa da arrecadação ruim e do aumento de gastos, 4
5 terá de elevá-la ainda mais, de modo a compensar o fraco resultado fiscal do ano. O gráfico 3 mostra que o déficit nominal, que é diferença entre o superávit primário (receitas despesas da União) menos o pagamento dos juros da dívida pública, cresceu muito nos últimos anos, a partir do início do governo Dilma. Gráfico 3: Evolução do déficit nominal (em R$ Bilhões) Fonte: Banco Central Entretanto, o melhor seria reduzir as despesas públicas, de modo a ampliar o esforço fiscal sem aumentar a carga tributária. Houve um comprometimento muito forte do resultado fiscal, em função de políticas adotadas para estimular a demanda interna, como desonerações de impostos de consumo e de tributos sobre a folha de pagamentos, sobretudo para a indústria. Além disso, boas partes das receitas arrecadadas são extraordinárias, o que reduz a qualidade do esforço fiscal até o momento. São medidas que, além de não terem surtido o efeito esperado, uma vez que o crescimento interno desabou, contribuíram para reduzir a transparência das contas públicas. Diante de tantas medidas pouco usuais nas contas públicas, bancos e consultorias passaram a calcular não mais o resultado nominal ou primário, mas o recorrente que exclui as receitas extraordinárias, usadas para dar à contabilidade pública uma saúde artificial. 5
6 Dados do Dividômetro Conforme mostra o Dividômetro da Auditoria Cidadã da Dívida, no ano de 2014, apenas até 11 de setembro, o governo federal já gastou R$ 825 bilhões com juros e amortizações da dívida. Este valor representa 51% de todos os gastos federais até aquela data. Este valor já é maior que os gastos com a dívida federal feitos em todo o ano passado (R$ 718 bilhões). Um dos fatores que tem aumentado este custo é a nova dívida feita pelo governo federal junto ao setor financeiro a juros altíssimos e prazos curtos para obter recursos a serem emprestados ao BNDES a juros baixos, e a prazos muito longos para este banco financiar empresas privadas. Ou seja, ao invés de baixar os juros e obrigar os bancos privados a emprestar ao setor produtivo, o governo prefere continuar alimentando os ganhos imensos dos bancos. O governo calcula que este mecanismo do BNDES gerará um custo de R$ 23 bilhões em A Auditoria Cidadã já vem alertando sobre este mecanismo desde Parte dos R$ 825 bilhões gastos com juros e amortizações da dívida em 2014 é apresentada como sendo refinanciamento da dívida, valor este que é constantemente desprezado por analistas neoliberais e pessoas ligadas ao governo, alegando que se trataria de uma mera rolagem, ou seja, o pagamento de amortizações (principal) da dívida por meio da emissão de novos títulos. Segundo estes analistas, isto representaria apenas a troca de títulos velhos por novos, sem custo para o governo. 6
7 A grande parcela da rolagem não representa o pagamento de amortizações, mas sim, o pagamento de juros, sendo que o governo não divulga tal parcela. Além do mais, se a atual questionável dívida não existisse, as novas dívidas que estão sendo feitas para pagar a tal rolagem poderiam servir para investimentos na saúde, educação, transporte e diversas outras áreas sociais. A figura abaixo mostra que 42,04% do Orçamento Geral da União para 2014 estão comprometidos com a rolagem da dívida pública, ou seja, com os encargos financeiros representados pelo pagamento de juros e amortizações. 7
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