154 AÇÃO ORDINÁRIA Nº. 2010.51.01.023352-3 SENTENÇA TIPO A AUTOR: CONSELHO REGIONAL DE ECONOMIA 1ª. REGIÃO-RJ RÉU: CONSELHO REGIONAL DE CONTABILIDADE JUIZ FEDERAL: FIRLY NASCIMENTO FILHO S E N T E N Ç A CONSELHO REGIONAL DE ECONOMIA 1ª. REGIÃO RJ CORECON ajuizou a presente ação em face do CONSELHO REGIONAL DE CONTABILIDADE - CRC, objetivando: (1) ORDEM judicial para: (1.1) que o réu se abstenha de exigir o registro profissional de contabilista das pessoas regularmente inscritas nos quadros da autora; (1.2) que o réu se abstenha de fiscalizar, lavrar autos de infração, instaurar processos administrativos e impor penalidades aos economistas; (2) DECLARAÇÃO judicial para reconhecer a sua competência exclusiva para fiscalizar e punir economistas; (3) ANULAÇÃO de todos os atos fiscalizatórios e punitivos exarados pela ré contra os economistas (pessoas naturais ou jurídicas). Com a petição inicial vieram os documentos de fls. 14/75. Pelo autor foram pagas as custas judiciais integralmente, conforme fls. 77. Regularmente citada, a parte ré ofereceu a contestação de fls. 88/95, devidamente instruída com as peças de fls. 96/136. A parte autora apresentou a réplica de fls. 139/153, reiterando os termos iniciais. Vieram os autos conclusos para sentença. É O RELATÓRIO. PASSO A DECIDIR. Cuida a presente demanda da possibilidade de a parte ré ter cometido abusos em suas atividades institucionais, notadamente quanto à fiscalização e punição de profissionais não subordinados à sua administração. Um dos princípios basilares a ser seguido pela Administração Pública é o da legalidade estrita. Sobre o tema, MARIA SILVIA ZANELLA DI PIETRO, professora de Direito Administrativo da Universidade de São Paulo, afirma: MGT 1
155 (...) Segundo o princípio da legalidade, a Administração Pública só pode fazer o que a lei permite; no âmbito das relações entre particulares, o princípio aplicável é o da autonomia da vontade, que lhes permite fazer tudo o que a lei não proíbe. Essa é a idéia expressa de forma lapidar por Hely Lopes Meirelles (1989:78) e corresponde ao que já vinha explícito no artigo 4 o. da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789: a liberdade consiste em fazer tudo aquilo que não prejudica a outrem; assim, o exercício dos direitos naturais de cada homem não tem outros limites que os que asseguram aos membros da sociedade o gozo desses mesmos direitos. Esses limites somente podem ser estabelecidos em lei. (Direito Administrativo, editora Atlas, São Paulo, 1993, p. 59). profissionais. Tal princípio é plenamente aplicável às autarquias especiais, que são os Conselhos Sobre os limites do poder de polícia, calha à fiveleta a lição, sempre precisa, do mestre DIÓGENES GASPARINI: 13. O ato de polícia É administrativo e, como tal, pode ser vinculado ou discricionário. Deve observar, para sua validade, os requisitos (competência, finalidade, forma, motivo, objeto e causa) comuns a todos os atos dessa espécie, mais a proporcionalidade. Esta consiste no uso adequado da coação. Assim, entre a medida adotada e o desejo da lei, há de existir essa proporcionalidade, sob pena de vício de nulidade do ato de polícia e de responsabilidade de seu autor. Correta, pois, é a observação de Fritz Fleiner, segundo a qual a autoridade administrativa não pode empregar meio de coação mais severo do que seja necessário para conseguir o fim proposto (apud Régis Fernandes de Oliveira, Infrações e sanções administrativas, São Paulo, Revista dos Tribunais, 1985, p.77). (...) (Direito Administrativo, 1995, Saraiva, São Paulo, p. 113) Analisando-se as alegações e peças acostadas aos autos, verifica-se que o réu realizou fiscalização de profissional estranho aos seus quadros e sob administração da parte autora. Segundo o réu, tal ação foi equivocada, uma vez que não questiona que as atividades previstas no artigo 14 da Lei n 1411/51 e no artigo 3º do Decreto n 31.794/52 são ou exclusivas do economista ou compartilhadas com contabilistas e administradores. (fls. 90), além do que: (...) MGT 2
156 jamais pretendeu, institucionalmente, sustentar que alguma competência privativa do economista seria, na verdade, do contabilista. (fls. 90). A parte ré alega, ainda, que: (...) entre as atividades do Contestante está a de fiscalização das atividades privativas do profissional da Contabilidade, exigindo que para estas a pessoa seja inscrita no CRC. (...) g.n. (fls. 89). Nessa trilha, o próprio réu reconhece que a competência para fiscalizar as pessoas inscritas nos quadros do CORECON, ora autor, e eventualmente puni-las é do próprio autor, não devendo, portanto, haver ingerência de outros Conselhos profissionais na esfera de atuação dos economistas. De fato, o réu não possui competência para fiscalizar a atuação de economistas, nem mesmo quando houver indícios de que tais profissionais extrapolam os limites de suas atribuições, invadindo área de atuação de outras profissões, pois tal ocorrência deverá ser apurada e punida, se for o caso, pelo próprio autor, conforme preconiza o artigo 10 da Lei n. 1411 de 1951. Tal entendimento vai ao encontro da jurisprudência, como se verifica abaixo: PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. MULTA APLICADA PELO CONSELHO REGIONAL DE CONTABILIDADE. PERÍCIA JUDICIAL REALIZADA POR PROFISSIONAL DE ECONOMIA. POSSIBILIDADE. CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. OBSERVÂNCIA DOS CRITÉRIOS DEFINIDOS PELOS 3º E 4º DO ART. 20 DO CPC. REDUÇÃO. DESCABIMENTO. I - Afigura-se indevida a multa imposta ao profissional de economia, nomeado para atuar como perito judicial, pois embora não possua registro profissional junto ao Conselho de Contabilidade, é graduado em economia e vinculado ao Conselho Regional de Economia - CORECON, e, em razão da natureza dos serviços prestados, foi aceito regularmente pelo juízo nomeante para elaboração do laudo pericial, assim não estava sujeito à fiscalização do Conselho Regional de Contabilidade - CRC/GO. II - A fixação da verba honorária em R$ 600,00 (seiscentos reais), atende os termos do 4º do art. 20, do diploma processual civil, com observância das normas contidas nas alíneas a, b e c do 3º do aludido dispositivo legal, respeitando-se o princípio da causalidade, o grau de zelo do profissional, o esforço despendido pela defesa e a natureza e importância da causa, na espécie. III - Apelação desprovida. Sentença confirmada. (TRF1, 8ª. T, AC 200435000200229, REL DES FED SOUZA PRUDENTE, e-djr1 12/11/2010 P 549) MGT 3
157 CONSELHO REGIONAL DE CONTABILIDADE - CONSELHO REGIONAL DE ECONOMIA - PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO - INCOMPETENCIA DO CRC PARA APLICAR PENALIDADES. O cerne da questão examinada é a natureza da perícia realizada pela impetrante, tratando-se de discussão acerca do descumprimento de cláusulas de Contrato de Prestação de Serviços, em nada abrangendo assunto contábil. A impetrante tem formação superior no curso de economia e se encontra vinculada ao Conselho Regional de Economia - CORECON. A impetrante estava apta para apresentar o laudo pericial para o qual foi nomeada, assim como estava sujeita à fiscalização do CORECON e não do Conselho Regional de Contabilidade. Apelação e remessa oficial não providas. (TRF3, 3ª.T, AMS 200261000145632, REL J NERY JUNIOR, DJF3 CJ1 22/9/2009 P 183) O poder de polícia mencionado acima, bem entendido, deve ser limitado à seara do próprio Conselho ao qual os profissionais estejam vinculados, não possuindo os demais Conselhos o direito de usurpar a competência fiscalizatória e punitiva do CORECON. Cabe ressaltar que havendo indícios de que profissionais de uma determinada área estejam atuando indevidamente em atividade privativa de outras profissões, haverá sempre a possibilidade de se levar ao Ministério Público Federal a notícia da prática do exercício ilegal de profissão. Quanto à suposta pressão da ré para que economistas se filiem aos seus quadros, tal possibilidade é nula, como já reconhecido pela jurisprudência: ADMINISTRATIVO - REGISTRO NO CONSELHO REGIONAL DE CONTABILIDADE (CRC) - IMPOSSIBILIDADE - ATIVIDADE BÁSICA - EMPRESA INSCRITA NO CONSELHO REGIONAL DE ECONOMIA (CORECON). 1. O artigo 1º, da Lei Federal nº 6.839/80, determina o registro de empresas e a anotação dos profissionais legalmente habilitados nas entidades competentes para a fiscalização do exercício das diversas profissões, em razão da atividade básica ou em relação àquela pela qual prestem serviços a terceiros. 2. A atividade básica exercida pela impetrante obriga-a ao registro no Conselho Regional de Economia (CORECON). 3. É indevida a inscrição da impetrante no Conselho Regional de Contabilidade (CRC), pois é impossível pretender a filiação a dois conselhos profissionais. 4. Remessa oficial desprovida. (TRF3, 4ª. T, REOMS 200561000153691, REL. J FABIO PRIETO, DJF3 4/11/2008) Nessa trilha, com razão o autor, uma vez que o próprio réu reconhece a impertinência de sua MGT 4
158 ação fiscalizatória fora dos limites de sua competência institucional. Isto posto, JULGO PROCEDENTE O PEDIDO PARA: (1) ORDENAR que o réu se abstenha de exigir a inscrição de economistas em seus quadros e de fiscalizar, lavrar autos de infração, instaurar processos administrativos e impor penalidades aos economistas; (2) DECLARAR que somente o CORECON possui competência para fiscalizar e eventualmente punir economistas; (3) ANULAR todos os atos fiscalizatórios e punitivos exarados pela ré contra economistas (pessoas naturais ou jurídicas); (4) CONDENAR o CRC/RJ nas custas e nos honorários advocatícios de 10% do valor dado à causa. P. R. I. Após o trânsito em julgado, dê-se baixa e arquivem-se os autos. Rio de Janeiro, 28 de novembro de 2011. FIRLY NASCIMENTO FILHO JUIZ TITULAR DA 5ª VARA FEDERAL (assinado eletronicamente) MGT 5