Convergência: utilities com Smart Grid e PLC e operadoras de telecomunicações podem somar II 24/09/2007 19:58 :: João Carlos Fonseca Por ocasião do VIII Seminário Nacional de Telecomunicações da Aptel, realizado em Brasília (DF), a TELEBRASIL entrevistou, em mesa-redonda, José Gonçalves Viera e Agostinho Celso Pasqualicchio da Associação Nacional de Empresas Proprietárias de Infra-estrutura e de Sistemas Privados de Telecomunicações. Em foco, o impacto das tecnologias Smart Grid e PLC utilizadas pelas utilities nas convergências das telecomunicações e as perspectivas de parceria entre as distribuidoras de energia elétrica e as operadoras de telecomunicações. A Aptel, presidida por Luiz Jatobá, tem assento nos Conselhos Fiscal e Consultivo da TELEBRASIL. Em entrevista exclusiva, a TELEBRASIL ouviu dois especialistas com experiência no setor de energia elétrica que detalharam e comentaram, com a segurança de quem trabalha a muitos anos no meio, aspectos interessantes sobre a tecnologia PLC ( Power Line Communication ), sobre o emergente conceito de Smart Grid, além da sinalização sobre um road map para aproximação entre distribuidores de energia elétrica e operadores de telecomunicações. O engenheiro José Gonçalves Viera, tocantinense de Indianópolis, é superintendente de Novos Negócios e Captação da CELG (Companhia Energética do Estado de Goiás) uma das empresas fundadoras da Aptel, em abril de 1999 e é diretor de Inovações Tecnológicas da Associação Nacional de Empresas Proprietárias de Infra-estrutura e de Sistemas Privados de Telecomunicações. Ele é engenheiro de telecomunicações pela UnB (1977). Agora está voltado para o desenvolvimento de negócios. O economista Agostinho Celso Pasqualicchio, goiano de Anápolis, está há 20 anos no setor de energia elétrica, com experiência na Eletropaulo. Hoje é professor da Universidade Mackenzie (SP) e consultor da Aptel. Ele é economista pela USP com pós-graduação na Universidade de Illinois (USA). ENTREVISTA TELEBRASIL Em que estágio técnico se encontram o PLC ( Power Line Communication ) e o Smart Grid ( rede inteligente )? Viera Em 1999, a Aptel realizou, no Rio de Janeiro, seu primeiro seminário sobre PLC da América do Sul (N.R. a TELEBRASIL cobriu o evento). Nessa época, achávamos que essa tecnologia tinha tanto obstáculos que dificilmente iria vingar. Falava-se em 20 e 30 anos para que o PLC ficasse viável. TB E agora, passados oito anos? Vi Tal como o celular e o computador pessoal, a tecnologia PLC agora é uma realidade. É uma tecnologia bastante adequada para um nicho do distribuidor de energia elétrica, pois utiliza a capilaridade da rede elétrica. TB Estamos falando no PLC que chega ao cliente ou o que fica na alta tensão? Vi Há dois tipos de PLC: o indoor, que chega, em tese, a todas as tomadas elétricas da casa, e o PLC de acesso. De uma maneira bem geral, o PLC tem um equipamento master, próximo ao transformador de energia elétrica, um outro equipamento no quadro elétrico da casa e um modem que fica dentro do domicílio. TB E o PLC em média tensão? Vi Já estamos trabalhando com o PLC em média tensão, isto é, até 13.8 kv. Na CELG, temos um P&D já aprovado pela Aneel e em franco desenvolvimento junto à Fitec, cujo título é Aplicação de PLC em média tensão banda larga para supervisão de rede elétrica dentro do conceito de Smart Grid.
TB O PLC, no Brasil, é utilizado nos domicílios ou pela empresa de energia? Pasqualicchio Em ambas as situações. TB E a questão dos custos? Pa Eu acho que os custos ainda podem baixar. O potencial de uso, sobretudo em domicílios mais antigos em que os eletrodutos têm dificuldade em arcar com uma nova fiação é muito elevado. Com sua popularização, os custos do PLC indoor devem baixar e o potencial de inserção digital dessa tecnologia nas próprias casas deverá aumentar. TB Então, a inclusão digital pode ocorrer via PLC? Vi Não só pode como deve. A Aptel, em 2004, juntamente com outros parceiros, desenvolveu o Projeto Barreirinhas, no Maranhão. Nesse projeto, o PLC ajudou a comunidade dando-lhe acesso à informação. TB Já houve outros Barreirinhas? Vi Estamos partindo para o Barreirinhas 2, com maior quantidade de pontos. A própria CELG instalou PLC em suas dependências. A Eletropaulo tem desenvolvido um trabalho muito significativo. A CEE do Rio Grande do Sul e a própria Copel também têm aplicações. A entrevista prossegue com diálogo técnico e econômico sobre a tecnologia de Power Line Communication e surge o Projeto Opera da UE. TB Qual a taxa de transmissão do PLC? Vi Os atuais equipamentos de PLC já estão com taxa nominal de 200 Mbit/s. Pesquisas recentes indicam que as taxas do PLC podem ainda ser mais altas. No início, essas taxas eram de poucos Mbit/s. O conceito que hoje utilizamos na CELG é o de um mix de tecnologias. A tecnologia PLC se adequa ao ambiente de rede de transmissão e ao multisserviço, tanto indoor quanto em média tensão. TB O PLC é utilizado para medição do consumo de energia elétrica? Vi Quando se fala em serviços PLC para distribuição de energia elétrica, a medição do consumo é um nicho extraordinário e que se adequa muito bem. Haja visto que o meio de transmissão é o próprio cabo elétrico. A aplicação do PLC não é só na parte de medição, mas também na de supervisão de rede, de controle de fraudes. TB Já houve algum estudo de custos sobre o uso do PLC para a inclusão digital? Pa Sim. Diversos estudos foram feitos. Um dos mais interessantes é o de Barreirinhas, no sul do Maranhão, com IDH (índice de desenvolvimento humano ) de menos que 450, o que é muito baixo. Em Barreirinhas, há uma quantidade grande de escolas. A CELG e a Eletropaulo, juntamente com outros fornecedores, trouxeram a conexão Internet para a comunidade via sistema satelital GESAC, com distribuição pelo PLC. TB É economicamente viável? Pa É especialmente viável. Você utiliza a rede elétrica. Ela é um bem que está lá e que não deve ser subutilizado de forma nenhuma. TB Já há fabricação local de PLC? Vi Utilizam-se componentes importados. O que se tem aqui são representantes de fabricantes estrangeiros. TB O que é o projeto Opera (N.R. Open PLC Rechearch Alliance)? Pa É um projeto da Comunidade Européia ( N.R. integra o projeto banda larga para todos ), constituído por 11 países europeus mais o Brasil, que é representado pela CELG. São 26 entidades participando. É um projeto muito importante, que dá visibilidade ao Brasil lá fora. TB Vai haver financiamento? Vi Em parte. Nós entramos com metade dos custos, digamos assim. O projeto Opera já está em andamento e vai até 2008. Vão ser três testes de campo na Europa Lisboa, Madri e Áustria e um no Brasil, na CELG. TB E o Opera em relação à UTC norte-americana? Vi A diversidade vai somar para nós. Não se estuda mais a viabilidade do PLC; essa fase acabou.
O Opera é um imenso projeto para estudar aplicação e desenvolvimento de negócios. No Opera são oito grupos de trabalho, com a CELG participando de quatro. Eu gosto muito de citar o grupo de trabalho n o 6, que é sobre business plan para uso da tecnologia PLC. TB Então, o PLC é uma realidade? Pa Os subúrbios parisienses já usam. A cidade de Saragosa, na Espanha, já utiliza PLC em um experimento para voz, dados e imagens. Vi O Projeto Opera abrange esses três serviços e mais as aplicações do controle da distribuição de energia elétrica com telemedição, telemetria, telessupervisão e telecontrole. A entrevista passa a discutir o conceito de Smart Grid ou rede inteligente. TB E o Smart Grid nesse contexto? Vi O Smart Grid é um conceito que chegou há pouco no Brasil, mas que na Europa e nos EUA já vêm sendo desenvolvido há algum tempo. Genericamente, o Smart Grid é um projeto no qual você vai aplicar uma plataforma e meios de comunicação. Com eles, você vai supervisionar a rede de distribuição de energia elétrica em vários de seus aspectos, dentre eles, interrupção de energia, qualidade da rede e medição. TB O Smart Grid utiliza a própria rede de energia elétrica? Vi Na verdade, Smart Grid é um conceito formal e operacional para uma rede elétrica eficiente. Pode utilizar qualquer tecnologia para prover dados necessários a essa finalidade. Dentro desse conceito de rede elétrica eficiente um conceito que se quer para o Brasil, a Aptel está trabalhando juntamente com a Universidade Mackenzie (SP). TB Como o Projeto Opera se relaciona ao conceito de Smart Grid? Vi No conceito do Opera, como eu fiz questão de explicar, vai haver um grupo de trabalho coordenado pela Diretoria da Aptel sobre Smart Grid. Este é um novo conceito, irreversível, para automação da operação de energia elétrica com custo/benefício altamente favorável. Temos utilities no Brasil bem adiantadas quanto ao uso do Smart Grid, como, por exemplo, a Eletropaulo. TB Como funciona o Smart Grid? Pa Ele é um conceito que traz diversas vantagens, dentre elas a otimização dos custos de infraestrutura da empresa. Por exemplo, na falta de energia em determinado segmento do sistema, hoje, pelo sistema tradicional da década de 60/70, não se contempla a imediata recomposição da rede. TB São os apagões? Pa Exatamente, são os apagões. Na verdade, se houver um sistema inteligente que isole a parte que foi afetada ou prejudicada no sistema de energia, isto passa a ser uma vantagem muito grande para a empresa, ao reduzir custos com manutenção de estruturas e de atendimento a clientes em call centers. Vi O Smart Grid, rede inteligente ou rede eficiente, faz o controle de falhas, a automação de alimentadores e de subestações e integra processos. Permite que a distribuidora de energia elétrica tenha uma estratégia para com seus clientes, orientando-os sobre a melhor forma de consumir a energia. O conceito de Smart Grid para energia elétrica equivale, em telecomunicações, ao conceito de controle de módulos e componentes da rede. TB A idéia básica do Smart Grid? Vi O que se quer, agora, é enxergar a rede de energia elétrica sob a ótica da inteligência dessa rede para com os consumidores. Para isso, precisamos implantar uma plataforma de telecomunicações. TB Os investimentos para o Smart Grid são elevados? Pa Não, frente aos benefícios colhidos. A prospecção de custo/benefício, levando em conta diferentes arquiteturas e técnicas e com base em determinado nível de investimentos, indica resultados totalmente favoráveis. Hoje, a relação custo/benefício do Smart Grid no Brasil é de 1:3 a 1:5. Ou seja, você vai investir uma unidade e seu retorno será três a cinco vezes maior na média quatro vezes. TB As arquiteturas do Smart Grid são proprietárias? Pa Sim, por enquanto.
TB Que aplicações de Smart Grid existem no mundo? Vi Trata-se de um conceito relativamente novo. Recebemos, através da Aptel, um convite para visitar um grande projeto nos EUA. No Texas, há um projeto de Smart Grid em franca operação. No Brasil, já existem empresas distribuidoras interessadas (N.R. o entrevistado lê uma longa lista), além da Universidade Mackenzie e da USP e da própria Aptel, que firmou um convênio "guardachuva" com a Mackenzie. TB Em termos de Smart Grid, vão ser só projetos-piloto ou vai ser "para valer"? Vi Ótima esta sua observação. Agora não se trata mais de dizer que vamos estudar alguma coisa e que ela poderá vir a se tornar realidade, tal como no começo do PLC. Agora são projetos de desenvolvimento e de aplicação nas distribuidoras de energia. E o PLC? Como ele transmite seus dados através da rede de energia elétrica, é uma das tecnologias talvez uma das principais que integra o conceito de Smart Grid. A entrevista passa a tratar da convergência entre as empresas distribuidoras de energia elétrica e as operadoras de telecomunicações. TB Uma pergunta em tema amplo, o Smart Grid permitirá que as empresas de energia elétrica ofereçam serviços de telecomunicações? Vi Essa colocação é importante. O conceito de Smart Grid é direcionado para dar mais eficiência ao sistema de energia elétrica e cria um mercado competidor. Em minha opinião, a médio prazo, as empresas distribuidoras de energia competem entre si e a que for mais eficiente vai levar vantagem. É bom lembrar que no conceito de Smart Grid, o que se quer é o controle de todos os processos, de maneira automatizada. TB Sim, mas como é que fica o Smart Grid no oferecimento de serviços de telecomunicações? Vi Veja bem, não vamos misturar conceitos. O Smart Grid precisa de uma plataforma de comunicação para oferecer as descritas facilidades. É preciso estabelecer um projeto de rede de comunicação para que o Smart Grid possa oferecer todas essas facilidades. TB Isso é uma das vertentes... Vi Sim. Agora, como a gente pode ter um modelo de parceria? TB Um modelo de negócios? Vi Isso, um modelo de negócios. Eu, particularmente, defendo que as operadoras de telecomunicações podem ser boas parceiras. Não aquele modelo se me permite a colocação do compartilhamento de postes. TB Postes estão fora dessa discussão, não é? Vi Sim. A disputa do aluguel de postes está totalmente fora. São coisas totalmente diferentes do PLC e do Smart Grid. É bom nem lembrar. É um ponto de atrito. O que queremos não são pontos de atrito e sim de convergência. Algumas operadoras de energia elétrica estão com o conceito de utilities. No caso, é formar sua plataforma de comunicação e fazer parcerias para cair na "nuvem" oferecida pelas telecomunicações. TB Haveria clima para as operadoras de telecomunicações participarem na implementação do Smart Grid e disponibilizarem serviços? Pa Eu vou sustentar minha colocação em termos estruturais. Hoje em dia, o ser humano gasta um terço da energia total disponível no Planeta com transportes. Não sei o quanto o setor de telecomunicações pode colaborar, quanto à redução do consumo de energia. Aparentemente, energia elétrica e comunicações são setores distintos e opostos, mas estão aí integrados. TB Estão convergindo? Pa Exatamente, trata-se de convergência. Tenho observado uma coisa curiosa em nossas palestras na Aptel. Empresas que aparentemente teriam tecnologias e soluções opostas com base em telecomunicações, hoje, totalmente divergentes, propõem a sua integração. Você agora tem uma plataforma e aquele conceito da década de 90 de oferecer tudo com exclusividade está sendo superado. Uma empresa pode oferecer uma solução, incluindo a integração com uma plataforma de outra empresa que seria supostamente sua concorrente. TB De onde se conclui? Pa Concluímos que o benefício para todas as empresas é interessante, pois ocorre um redução brutal de custos com ganhos de eficiência.
TB Então, poderia haver um entendimento entre os segmentos de energia elétrica e de telecomunicações? Vi Eu acredito que estamos chegando a uma fase bastante interessante, envolvendo os conceitos de convergência e de integração de facilidades. É hora para sentar à mesa e conversar sobre isso. No caso da CELG, estamos abertos para haver um planejamento conjunto, em que se conjuguem esforços e facilidades. TB Já houve algum estudo, de ordem jurídica ou regulatório, sobre essa convergência? Pa Nós, na Aptel, fazemos um acompanhamento muito grande da legislação e ao mesmo tempo mantemos um objetivo de integração. A Aneel é para o setor elétrico, a agência regulatória de base, em conseqüência do modelo implantado em 1990, com o conceito de modicidade. TB O que vem as ser modicidade? Pa Para o setor de energia elétrica, é o conceito para que a população goze de um produto de qualidade, ao mais baixo preço. Por exemplo, o fim do descruzamento tarifário que o setor tinha até recentemente. A proposta para o descruzamento tarifário veio do uso do conceito de modicidade tarifária. Em qualquer receita adicional ou ganho de produtividade do setor de energia elétrica, uma parcela deve ser transferida para benefício da população. TB As telecomunicações tem o conceito de modicidade? Pa Não. Nas telecomunicações, o princípio é o de que ganha quem apresentar o menor custo. Por exemplo, o preço dos serviços de provedores de Internet varia de acordo com as bases que eles deve amortizar, pelo princípio de custo/benefício. Então ganha, para qualidades iguais, quem apresentar o menor preço. A entrevista discute o conceito de um possível road map entre dois importantes segmentos da infra-estrutura. TB Como seria um road map para a convergência entre empresas de energia elétrica e as operadoras de telecomunicações? Vi Historicamente, as empresas de energia elétrica sempre tiveram pactos próprios para as suas áreas operativa, distributiva e de controle comercial de seus clientes. Recentemente, as empresas de energia elétrica desejaram potencializar o melhor o uso de sua infra-estrutura para outro tipo de serviços. Daí o PLC e o Smart Grid para baratear e dar melhor serviços a seus clientes. TB E o road map? Vi Eu acho que se abre um caminho para a convergência entre as operadoras de telecomunicações e as empresas de energia elétrica. Na verdade, algumas empresas de energia elétrica já possuem em seu core business, a prestação de serviços de telecomunicações para os meios corporativos em parceira. Temos a Copel Telecom, a Infovias da Cemig, a Eletropaulo e a CELG e outras empresas trabalham dentro dessa ótica. Não no sentido de competir e sim de agregar valor a seu core principal de negócios, através de parcerias. As prestadoras de serviços de telecomunicações encaixam 100% dentro dessa ótica. TB Palavras finais? Vi A Aptel vai trabalhar em conjunto com seus colaboradores, empresas distribuidoras, universidades, indústria, fornecedores, órgão governamentais no conceito de Smart Grid para que ele saia da fase dos conceitos e dos estudos e passe para a de soluções práticas para o bem da sociedade. Firmamos um convênio guarda-chuva com a Mackenzie e vamos convidar colaboradores para encontros multidisciplinares, inclusive para o Smart Grid. TB Incluindo o setor de telecomunicações? Vi Talvez não no início, pois se está modelando o conceito, mas certamente abrem-se parcerias a médio prazo. Pa O que estamos pensando é o que será o setor elétrico das próximas décadas. Ele não é mais um setor com as idéias de 1960 e 1970. Ele vai usar toda a integração e toda a inteligência que o ser humano criou em benefício da sociedade. O setor elétrico quer colaborar com a inclusão digital, com o setor de educação e o bem estar da população. A proposta futura do setor elétrico e da Aptel é esta.