Formação do professor do aluno surdo usuário de implante coclear: uma proposta em parceria com o fonoaudiólogo Ana Claudia Tenor Secretaria Municipal de Educação de Botucatu e-mail: anatenor@yahoo.com.br Comunicação Oral Relato de Experiência Resumo O objetivo desse estudo foi acompanhar o desenvolvimento de linguagem do aluno surdo usuário de implante coclear e capacitar os professores que atuavam com esses alunos. O trabalho foi desenvolvido em um núcleo do interior do estado de São Paulo que desenvolve um trabalho de suporte à inclusão e aos professores. Participaram do trabalho a coordenadora do núcleo, cinco professores do ensino regular e duas professoras de sala de recursos multifuncionais que atendiam esses alunos.o estudo foi desenvolvido em quatro etapas: na primeira etapa a fonoaudióloga acompanhou o desenvolvimento de linguagem dos alunos, na segunda etapa conversou sobre a comunicação dos alunos surdos junto a coordenadora e professoras de sala de recursos; na terceira etapa realizou uma reunião com a coordenadora, professores que atendiam esses alunos e ministrou uma palestra; na quarta etapa conversou com os pais desses alunos para discutir sobre o trabalho desenvolvido em parceria com os professores e identificar suas expectativas em relação ao desenvolvimento de linguagem da criança surda. Os professores de sala de recursos e do ensino regular reconheciam a importância do ensino de Libras e da inserção de Libras em sala de aula para o melhor desenvolvimento dos alunos surdos. Os pais se mostraram resistentes ao ensino de Libras e tinham como expectativa o desenvolvimento da comunicação oral. É necessário o desenvolvimento de um trabalho envolvendo as famílias, professores do AEE e do ensino regular. PALAVRAS- CHAVE: Formação; professor; aluno surdo; implante coclear 1
Introdução O implante coclear é uma prótese eletrônica usada para promover a estimulação auditiva nos indivíduos com perda neurossensorial profunda bilateral, que tem como finalidade melhorar a capacidade de comunicação oral destes indivíduos (SCARANELLO, 2005). Os estudos evidenciaram que o nível de envolvimento familiar é um aspecto a ser considerado, sendo que o grau de comprometimento dos pais no processo de (re) habilitação da criança é decisivo para o sucesso do tratamento (MOELLER, 2000; BEVILACQUA; FORMIGONI, 2005; MORET et. 2006; RESEGUI-COPPI, 2008). A literatura evidenciou que um número significativo de pais que optam pelo implante coclear deposita na cirurgia a última esperança de fazer o filho ouvir e falar. Entretanto, essa tecnologia não assegura o desenvolvimento das habilidades auditivas e de linguagem oral, pois isso depende de inúmeros fatores, tais como: a capacidade de memória auditiva, adequada estimulação no ambiente familiar, intervenção fonoaudiológica precoce, entre outros (SANTANA, 2005; 2007; YAMANAKA et al. 2010; GALE, 2011; MOMENSHON-SANTOS; OLIVEIRA; HAYASHI, 2011; VALADAO et al. 2012; LEDERBERG; SCHICK; SPENCER, 2013). Nesse sentido, pesquisadores têm debatido o uso de implante coclear e o ensino da língua de sinais, considerando que as crianças surdas usuárias desse dispositivo e inseridas em um ambiente bilíngue podem se beneficiar, além de a inserção da língua de sinais não interferir de forma negativa no desenvolvimento auditivo e linguístico dessas crianças (GALE, 2011; GUIMARÃES; KELMAN; NASCIMENTO, 2011; KELMAN et al. 2011; VALADAO et al. 2012). O trabalho de linguagem com a criança surda sofre influência da orientação dos profissionais aos pais e a escola. O fonoaudiólogo enquanto profissional que atua com as questões de linguagem poderá auxiliar os professores a compreenderem as habilidades e necessidades linguísticas do aluno surdo. Nessa perspectiva o fonoaudiólogo poderia oferecer parcerias às escolas, auxiliando o professor a avaliar o desenvolvimento linguístico do aluno surdo, a compreender as dificuldades de comunicação, bem como estabelecer estratégias para superá-las (LAMÔNICA; MATUMOTO; MOURA, 2013). 2
Sendo assim, o objetivo desse estudo foi acompanhar o desenvolvimento de linguagem do aluno surdo usuário de implante coclear e capacitar os professores que atuavam com esses alunos. Metodologia O estudo foi desenvolvido no ano de 2011, em um núcleo do interior paulista, que desenvolvia um trabalho de apoio à inclusão de alunos surdos no ensino regular. Participaram do trabalho a coordenadora do núcleo, cinco professoras do ensino regular e duas da sala de recursos multifuncionais. A pesquisadora era a fonoaudióloga que atendia cinco alunos usuários de implante coclear, sendo três da Educação Infantil (dois do gênero masculino e um do gênero feminino), dois do Ensino Fundamental (um do gênero masculino e um do gênero feminino). Dois alunos da Educação Infantil cursavam a Etapa 1 e um a Etapa 2, e os dois alunos do Ensino Fundamental cursavam o 2º ano. Na primeira etapa a fonoaudióloga avaliou a linguagem dos alunos surdos. Na segunda etapa discutiu a respeito do desenvolvimento de linguagem dos alunos surdos junto a coordenadora e professoras de salas de recursos multifuncionais. Na terceira etapa agendou uma reunião da qual participou a coordenadora do núcleo, cinco professoras do ensino regular, duas professoras da sala de recursos e ministrou uma palestra abordando os temas: recursos tecnológicos para o aluno deficiente auditivo, desenvolvimento de linguagem, estratégias de comunicação, sugestões de atividades para trabalhar as habilidades auditivas e linguagem no contexto escolar. Na quarta etapa ocorreu uma reunião com os pais dos alunos, da qual participaram a coordenadora do núcleo e as duas professoras da sala de recursos. Foi apresentado o trabalho desenvolvido em parceria com as escolas, fonoaudiólogo e professores de sala de recursos, bem como identificada as expectativas das famílias em relação ao desenvolvimento de linguagem da criança surda. Resultados e discussão Os alunos surdos apesar de fazerem uso de implante coclear, ainda não tinham desenvolvido a linguagem oral. As famílias tinham a expectativa de desenvolvimento da oralidade e não aceitavam o ensino de Libras aos filhos surdos. Os professores se demonstravam preocupados com o fato dos alunos surdos não apresentarem 3
uma língua constituída, bem como com as dificuldades que vinham ocorrendo no processo de ensino e aprendizagem desses alunos e consideravam necessário o ensino de Libras para auxiliar no processo de letramento. As professoras de sala de recursos multifuncionais também consideravam importante o ensino de Libras aos alunos com surdez, principalmente para os que cursavam o Ensino Fundamental e apresentavam dificuldades escolares em decorrência da falta de uma língua constituída, mas respeitavam a opção da família e não ensinavam Libras sem o consentimento dos pais. O estudo apontou a necessidade de o fonoaudiólogo desenvolver um trabalho junto às famílias dos alunos surdos e também com a escola. Conclusões Os resultados apontaram a necessidade de um trabalho com as famílias das crianças surdas, buscando sensibilizá-las para a importância do ensino de Libras e envolvê-las com a escola. Além do trabalho com as famílias é importante o fonoaudiólogo estender sua ação a toda equipe escolar e fortalecer a atuação em parceria com o professor de sala de recursos multifuncionais e professor de ensino regular para que juntos possam pensar em ações e estratégias que auxiliem o desenvolvimento do aluno surdo. Referências BEVILACQUA, M.C.; FORMIGONI, G.M.P. O desenvolvimento das habilidades auditivas.in:bevilacqua,m.c.; MORET, A.L.M. Deficiência auditiva: conversando com familiares e profissionais da saúde. São José dos Campos: Pulso, 2005, p. 179-201. GALE, E. Exploring perspectives on cochlear implants and language acquisition within the deaf community. Journal of Deaf Studies and Deaf Education, v. 16, n. 1, Winter, 2011. GUIMARAES, A.D.S.; KELMAN, C.A.; NASCIMENTO, R.T. Expectativas dos pais quanto aos benefícios do implante coclear em contextos educacionais bilíngues. In:Anais... VII Congresso Brasileiro Multidisciplinar de Educação Especial, VIII 4
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