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ACTA OBSTETRICA E GINECOLOGICA PORTUGUESA Órgão oficial da Federação das Sociedades Portuguesas de Obstetrícia e Ginecologia Official journal of the Federation of Portuguese Societies of Obstetrics and Gynecology Director CARLOS FREIRE DE OLIVEIRA Editor-Chefe/Editor in Chief DIOGO AYRES-DE-CAMPOS Corpo Editorial/Editorial Board José Barros JOÃO BERNARDES Carlos Calhaz-Jorge Nuno Clode Ana Rosa Costa Alexandra Matias Fernando Mota JOsé Alberto moutinho JOsé Maria moutinho Filomena Nunes Carla RamaLho Isabel Torgal Editor de Produção/Production Editor MARILDA SANTANA Editora/Publisher MOMENTO MÉDICO, LDA Administração/Administration PAULO LEITE Conselho Científico: Fernanda Águas, Ana Aroso, António Bacelar Antunes, Ana Campos, Conceição Cardoso, Ingeborg Chaves, João Dória, Luís Graça, Carlos Marques, José Martinez de Oliveira, Teresa Mascarenhas, Nuno Montenegro, Paulo Moura, Daniel Pereira da Silva, Carlos Plancha, João Luís Silva Carvalho, Mário Sousa, José Vicente Pinto A Acta Obstetrica e Ginecologica Portuguesa é uma revista editorialmente independente, propriedade da Federação das Sociedades Portuguesas de Obstetrícia e Ginecologia (FSPOG). A revista publica trabalhos científicos originais avaliados por revisores, em todas as àreas relacionadas com a Ginecologia e Obstetrícia. O objectivo principal da revista é a promoção e divulgação da investigação científica nestas àreas, sobretudo entre os médicos da Especialidade. Outro objectivo é a divulgação da investigação científica realizada em Portugal em meios internacionais de grande impacto. É uma revista bilingue que aceita artigos escritos em inglês ou em português, sendo sempre necessário a inclusão de um Título e um Sumário em inglês. As submissões de artigos devem ser feitas on-line no site: www.aogp.com.pt A revista é publicada trimestralmente, sendo enviada gratuitamente a todos os Especialistas e Internos Complementares de Ginecologia e Obstetrícia, inscritos na FSPOG. Os pedidos adicionais de subscrição devem ser dirigidos à Empresa Editora. A publicidade inserida na revista é da responsabilidade única da Empresa Editora. Todos as solicitações para inclusão de publicidade devem ser dirigidos a: Momento Médico, Praça de Alvalade 9, 3º B, 1700-037 Lisboa; Tel: 217828060; Fax: 217828069; e-mail: geral@momentomedico.pt. Os direitos de autor dos artigos publicados nesta revista são automaticamente transferidos dos autores para a FSPOG na altura da aceitação para publicação. É da responsabilidade dos autores informar os editores, na altura da submissão, de quaisquer impedimentos existentes para esta transferência destes direitos, bem como de conflitos de interesse existentes, relativos à investigação realizada e à publicação do artigo. É expressamente proibida a reprodução ou fotocópia de parte ou totalidade desta revista para distribuição, sem permissão da FSPOG. A cópia da revista é apenas permitida para uso interno e pessoal. Indexada em Acta Obstetrica e Ginecologica Portuguesa is an editorially independent publication, property of the Federation of Portuguese Societies of Obstetrics and Gynecology (FSPOG)). The journal publishes original, peer reviewed, scientific work in all areas related to Obstetrics and Gynecology. The main aim of the journal is the promotion and disemination of scientific research in these areas, predominantely between clinicians in the speciality. Another aim of the journal is the international dissemination at high impact levels of scientific research carried out in Portugal. It is a bilingual journal, accepting articles written either in English or in Portuguese, but in all cases needing the inclusion of a Title and an Abstract in English. Article submission should be made on-line at the site: www.aogp.com.pt The journal is published every three months and send free of charge to all Specialists and Residents in Obstetrics and Gynecology registered at the FSPOG. Addicional subscription orders should be directed to the Publisher. Advertisments included in the journal are the sole responsibility of the Publisher. All advertisement booking should be addressed to: Momento Médico, Praça de Alvalade 9, 3º B, 1700-037 Lisboa; Tel: +351217828060; Fax: +351217828069; e-mail: geral@momentomedico.pt. Copyright of articles published in this journal is automatically transferred from the authors to the FSPOG at the time of acceptance for publication. It is the responsibility of authors to inform the editors, at the time of submission, of any circunstance affecting this transfer of copyright, as well as to disclose any existing conflicts of interest regarding the conducted research and publication of the article. Reproduction and photocopying of the whole or part of this journal for general distribution without permission of the FSPOG is expressily forbidden. Copying of the journal is allowed for strictly internal and personal use. ISSN 1646-5830 Depósito Legal nº 257465/07

Sumário/Summary Vol. 4 Nº 3 Julho/Setembro 2010 Editorial São necessárias medidas urgentes para baixar a taxa nacional de cesarianas Diogo Ayres de Campos........................................................................ 115 Artigo de Opinião/Opinion Article Medicina Materno-Fetal que futuro para a sub-especialidade / Maternal-Fetal Medicine - what future for the sub-speciality? Nuno Montenegro... 118 Artigos Originais/Original Articles Recorrências no carcinoma da mama: características em função do intervalo livre de doença / Breast cancer recurrence: characteristics according to disease free interval Ana Cláudia Rodrigues, Ana Sofia Custódio, Sofia Saleiro, Sandra Lemos, Cristina Frutuoso, Carlos Freire-de-Oliveira........................................................................ 119 Cirurgia obliterativa do prolapso dos órgãos pélvicos uma opção ainda válida? / Obliterative surgery for pelvic organ prolapse an option that remains valid? Pedro Conde, Isabel Grilo, Amália Martins, Pedro Matins, Andrade Moniz... 126 Impacto da idade maternal avançada nos resultados da gravidez / Impact of advanced maternal age on pregnancy outcomes Ana Moreira, Raquel Mota, Carla Ramalho, Alexandra Matias... 132 Artigos de Revisão/Review Articles Líquen plano erosivo genital: revisão da literatura / Genital erosive lichen planus: a review of the literature Marta Rodrigues, Gisela Fornelos, Elisa Paredes... 137 Monitorização ambulatória da pressão arterial na gravidez / Ambulatory blood pressure monitoring in pregnancy Marlene Sousa, Joana Cabrita... 147 Mutilação genital feminina a importância de reconhecer e de saber como agir / Female genital mutilation - the importance of recognition and management Ana Correia Campos... 152 Caso Clínico/Case Report Útero didelfos, hemivagina cega e agenesia renal ipsilateral, a propósito de um caso clínico / Didelphic uterus and obstructed hemivagina with ipsilateral renal agenesis: a case report Rita Abreu, Marcela Guerra, Mário Oliveira, Fernando Mota... 157

Acta Obstet Ginecol Port 2010;4(3):115-117 Editorial São necessárias medidas urgentes para baixar a taxa nacional de cesarianas Desde há muitos anos que a taxa de cesarianas é internacionalmente considerada como um indicador de qualidade dos cuidados obstétricos e, ao contrário de outros indicadores perinatais em que Portugal se encontra entre os melhores do mundo, neste caso temos estado continuadamente na cauda da Europa. Os últimos dados oficiais sobre a taxa de cesarianas em Portugal datam de 2007, altura em que atingiu os 34,8% 1. Dados referentes apenas aos hospitais públicos nacionais, apontam para uma tendência crescente desta taxa entre 2007 e 2009 2, o que, juntamente com o aumento do número de partos em hospitais privados, onde a percentagem de cesarianas em 2005 atingiu os 65,9% 3, leva a crer que a taxa global de cesarianas em 2009 ronde os 36%. É de referir que seis hospitais públicos nacionais apresentaram em 2009 uma taxa de cesarianas acima dos 40%, e que apenas em doze esta foi abaixo dos 30%. Portugal é um dos países europeus com maior taxa de cesarianas (Quadro I), sendo ultrapassado apenas Quadro I. Taxas de cesarianas, mortalidade materna e mortalidade perinatal em diversos países, de acordo com os dados oficiais mais recentes. Países ordenados por ordem decrescente da taxa de cesarianas. 115

Quadro II. Incidência de complicações nas cesarianas electivas e nos partos vaginais 14. pela Itália. Todos os restantes países europeus em que este dado se encontra disponível, têm uma taxa de cesarianas que não ultrapassa os 30%, e vários têm uma taxa inferior a 20%. Os países europeus com taxas de cesarianas mais baixas são, de forma geral, também aqueles que apresentam valores de mortalidade materna ou mortalidade perinatal mais baixos. A cesariana está associada a riscos de saúde superiores aos do parto vaginal, mesmo quando realizada electivamente (Quadro II). Entre estes destacam-se as lesões uretral e vesical, os riscos de histerectomia, trombo-embolismo, complicações infecciosas, reinternamentos hospitalares e morbilidade respiratória do recém-nascido, bem como a maior incidência de placenta prévia, rotura uterina e morte fetal nas gestações subsequentes 14. A cesariana electiva reduz ligeiramente a incidência de incontinência urinária nos três meses subsequentes ao parto, bem como o prolapso útero-vaginal. Os custos associados à cesariana são claramente superiores aos do parto vaginal, não só pelos materiais gastos e tempo de bloco operatório, como também pela maior morbilidade que acarreta. É urgente que a comunidade obstétrica e gineco- lógica portuguesa tome medidas para reduzir a taxa nacional de cesarianas, indicador que actualmente nos envergonha dentro da comunidade europeia e que consome desnecessariamente recursos a um país com dificuldades económicas. Embora a meta de 15%, estabelecida em 1985 pela Organização Mundial de Saúde, nos pareça actualmente desactualizada, a análise das taxas de cesariana noutros países europeus sugere que não são justificáveis valores nacionais superiores a 25%. Diogo Ayres de Campos Editor-Chefe AOGP 1. Alto Comissariado da Saúde. Indicadores actuais do PNS. Outubro 2008. http://www.acs.min-saude.pt/files/2008/10/mcm-curia-out2008.pdf (acedido em 27 Abril 2010). 2. Fonte: ARS Norte. 3. Entidade Reguladora da Saúde. Relatório sobre o estudo técnico de caracterização dos prestadores não públicos de cuidados de saúde com centros de nascimento. Junho 2007. http://www.ers.pt/actividades/ pareceres-e-recomendacoes/824999.pdf (acedido em 27 Abril 2010). 4. Betrán, AP, Merialdi M, Lauer JA, Bing-Shun W, Thomas J, van Look P, Wagner M. Rates of cesarean section: analysis of global, regional and national estimates. Paed Perinat Epidemiol 2007;21:98-113. 5. Lumbiganon P, Laopaiboon M, Gülmezoglu AM, Souza JP, 116

Taneepanichskul S, Ruyan P, Attygalle DE, Shrestha N, Mori R, Nguyen DH, Hoang TB, Rathavy T, Chuyun K, Cheang K, Festin M, Udomprasertgul V, Germar MJ, Yanqiu G, Roy M, Carroli G, Ba-Thike K, Filatova E, Villar J; World Health Organization Global Survey on Maternal and Perinatal Health Research Group. Method of delivery and pregnancy outcomes in Asia: the WHO global survey on maternal and perinatal health 2007-08. Lancet 2010;375(9713):490-9. 6. Gyarmati B, Vásárhelyi B, Treszl A. Obstetricians professional experience and risk of cesarean section in uncomplicated pregnancy. Acta Obstet Gynecol Scand 2010;89(1):156-7. 7. NTC Watch. NHS Maternity Statistics England 2008/09. October 2009. http://nctwatch.wordpres.com/2009/10/30/nhs-maternity-statisticsengland-200809 (acedido em 12 Abril 2010). 8. National Vital Statistics Reports 2009;57(12):3. 9. OECD Indicators - Health at a Glance 2009. OCDE Press 2009:105. 10. Ministério da Saúde, Brasil. Parto Humanizado e seguro. Saúde Brasil 2006;117;4-5. 11. Hogan MC, Foreman KJ, Naghavi M, Ahn SY, Wang M, Makela SM, Lopez AD, Lozano R Murray CJL. Maternal mortality for 181 countries, 1980 2008: a systematic analysis of progress towards Millennium Development Goal 5. Lancet 2010;375:1609-23. 12. World Health Organisation. Neonatal and Perinatal Mortality: country, regional and global estimates. WHO Press, 2006. http://whqlibdoc. who.int/publications/2006/9241563206_eng.pdf (acedido a 27 Abril 2010). 13. Alto Comissariado da Saúde. Indicadores e metas do PNS, 2008. http:// www.acs.min-saude.pt/pns/nascer-com-saude/mortalidade-perinatal/ (acedido a 27 Abril 2010). 14. National Collaborating Centre for Women s and Children s Health. Clinical Guideline: caesarean section. April 2004. http://www. nice.org.uk/nicemedia/live/10940/29334/29334.pdf (acedido em 2 Setembro 2010). 117

Montenegro N Artigo de Opinião/Opinion Article Medicina Materno-Fetal que futuro para a sub-especialidade? Maternal-Fetal Medicine what future for the sub-speciality? Nuno Montenegro* Hospital de S. João, Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Passados alguns anos sobre o reconhecimento da Sub-especialidade de Medicina Materno-Fetal pelo Conselho Executivo da Ordem dos Médicos (OM), julgo oportuno algumas reflexões a propósito. A exemplo de outros países ditos desenvolvidos, entendeu o Colégio de Especialidade de Ginecologia e Obstetricia, sob a presidência do Professor Carlos Oliveira, propor ao Conselho Executivo da OM a criação, entre outras, desta Sub-especialidade, em meados da década de 90. Só em Agosto de 2004, durante a presidência do Professor Luís Mendes Graça, foram titulados os primeiros sub-especialistas. Será oportuno lembrar, que nos critérios de atribuição do titulo por consenso, constituía uma das exigências, o exercicio de funções num Hospital de Apoio Perinatal Diferenciado há pelo menos 5 anos, entendido então que haveria primeiro que configurar a creditação dos Centros / Locais de exercício para só depois poder creditar os profissionais. Subentendiase, e julgo que ainda hoje se deve aplicar o mesmo principio, que a aquisição de experiência diferenciada (Sub-especialidade) e nesta área especifica da Especialidade só seria possível nestes Centros, da rede pública dos serviços de saúde. Volvidos mais de 5 anos, o cenário no que respeita ás instituições e aos recursos humanos, bem como as politicas nacionais, regionais e locais, terão alterado as circunstâncias. Verificam-se hoje e de facto, constrangimentos vários e em vários Serviços de Hospitais de Apoio Perinatal Diferenciado, alguns comprometendo seriamente o primeiro desígnio e a resposta assistencial diferenciada, apesar do esforço desesperado dos profissionais em tentar manter a qualidade e a quantidade da referida diferenciação. Há que reconhecer hoje que alguns hospitais, á custa da saída de profissionais e de novos modelos de gestão, não terão garantidas as condições para acolher ou contribuir para a creditação / idoneidade de subespecialistas. Também e de novo, há que reconsiderar e por muitas dúvidas que haja, que as iniciativas do sector privado da saúde nos últimos anos, com a criação Serviços (?) nesta especialidade, nos desafiam a reflectir sobre o futuro da formação e creditação da sub-especialidade. O modelo de formação que foi proposto no passado - ciclo de estudos especiais passará a ser utópico. A formação em exercício e quase automática para os especialistas que exercem a actividade em hospitais centrais e universitários poderá ser a única saída. Mas os incentivos á qualificação terão que vir do Ministério da tutela. Na forma de contratos diferenciados para os sub-especialistas? Com criação de quotas obrigatórias para os hospitais atrás tipificados? E já agora, que ilações tirou o Ministério que nos tutela do esforço dos profissionais e da Ordem que os representa ao pugnar pela diferenciação e qualificação dos recursos humanos disponíveis? *Director de Serviço, Professor Associado 118

Acta Obstet Ginecol Port 2010;4(3):119-125 Artigo Original/Original Article Recorrências no carcinoma da mama: características em função do intervalo livre de doença Breast cancer recurrence: characteristics according to disease free interval Ana Cláudia Rodrigues*, Ana Sofia Custódio*, Sofia Saleiro*, Sandra Lemos*, Cristina Frutuoso**, Carlos Freire-de-Oliveira*** Hospitais da Universidade de Coimbra Abstract Objective: To compare tumour characteristics between three groups of breast cancer patients, according to different intervals in disease-free survival. Material and methods: Retrospective assessment of 121 cases of unilateral non-metastatic breast cancer treated at our institution between January 1992 and December 2002, who suffered a recurrence after a disease-free period. Patients were divided into three groups according to the time of first treatment failure: A- recurrence detected within two years, B- recurrence detected between two and five years, C- recurrence detected after five years. The clinical and pathological characteristics of the tumours were compared between the tree groups. Results: Fifty-four women were in group A (44.6%), 41 in group B (33.9%), and 26 in group C (21.5%). Group C had a significantly lower number of initial stage tumours when compared with groups A and B (I A-20.4%, B-19.5%, C-42.3%; IIa A-29.6%, B-21.95%, C-30.8%; IIb A-22.2%, B-21.95%, C-11.5%; IIIa A-7.4%, B-9.76%, C-0%; IIIb A-20.4%, B-26.8%, C-15.4%). Rare breast tumours of good prognosis were more frequent in group C than in group A (p=0.021). Group A had a significantly higher number of ER-negative tumours (A-55.6%, B-19.5%, C-19.2%). Mean global survival was 32.2 months in group A,57.9 months in group B and 102.4 months in group C (p<0.001). Mean survival after recurrence was also higher in group C (p=0.003). Conclusions: These findings suggest that patients with earlier breast cancer recurrences have higher rates of ER-negative tumours and a lower survival. There was delayed onset of recurrence in stage I and Ia-tumours. Keywords: breast cancer; recurrence; metastasis; disease-free period; tumour stage Introdução As recorrências tumorais são responsáveis pela maioria das mortes por cancro da mama, que continua a ser a segunda principal causa de morte na mulher *Médica Interna Complementar de Ginecologia/Obstetrícia **Assistente Hospitalar de Ginecologia ***Professor Catedrático de Ginecologia em todo o mundo 1. Esta é uma doença heterogénea, conhecida pela propensão para recorrer, desde poucos meses a várias décadas, após o tratamento inicial. Demicheli et al identificaram dois picos de recorrência locoregional e metastização à distância aos 18 e 60 meses 2. Crowle et al constaram a existência de recorrências mais de 30 anos após o tratamento cirúrgico inicial 3. 119

Rodrigues AC, Custódio AS, Saleiro S, Lemos S, Frutuoso C, Freire-de-Oliveira C Os factores de prognóstico e preditivos da evolução da doença podem ser divididos em clínicos (classificação TNM, localização tumoral, estado hormonal e idade da doente), anátomopatológicos (tipo histológico, extensão do componente in situ, margens de segurança, tamanho histológico, grau histológico, status dos gânglios linfáticos axilares e invasão vascular) e biológicos (receptores hormonais e Herb-2). O objectivo deste trabalho foi comparar as características clínicas e anátomo-patológicas dos tumores da mama que sofreram recorrência em função da duração do intervalo livre de doença. O conhecimento dos factores que influenciam o intervalo livre de doença é muito importante, uma vez que pode levar ao estabelecimento de novas estratégicas terapêuticas e de um programa de seguimento apropriado. Material e métodos O presente trabalho avaliou retrospectivamente 121 casos de doentes com carcinoma da mama que receberam tratamento no Serviço de Ginecologia dos Hospitais da Universidade de Coimbra entre 1 de Janeiro de 1992 e 31 de Dezembro de 2002. Os critérios de selecção foram: género feminino, carcinomas da mama unilaterais, não-metastáticos ao diagnóstico e que vieram a sofrer recorrência após um período livre de doença, com um follow-up mínimo de 5 anos e informação sobre a recorrência e ocorrência de morte. As doentes incluídas foram submetidas a tratamento de acordo com o protocolo do Serviço standard à data do diagnóstico. O tumor primário foi tratado com mastectomia em 108 casos e com cirurgia conservadora em 13 casos. Cento e doze realizaram esvaziamento axilar. A quimioterapia foi usada como tratamento neoadjuvante em 59 e como adjuvante em 96. Nove doentes receberam radioterapia pré-operatória e 51 radioterapia pós-operatória. Foi usada hormonoterapia em 71 mulheres. O follow-up incluiu consultas trimestrais nos primeiros dois anos, semestrais até o 5º ano e a partir daí anuais. O intervalo livre de doença foi definido como o intervalo de tempo entre o final do tratamento do tumor primário e o diagnóstico da recorrência mais precoce. Foi considerada como recorrência quer a recorrência loco-regional quer a metastização à distância. O diagnóstico de recorrência foi estabelecido por imagiologia (óssea, torácica, abdominal, pélvica, cerebral) e/ ou por biopsia. As doentes integradas foram distribuídas por três grupos: Grupo A recorrência nos primeiros 24 meses; Grupo B recorrência entre os 24 e 60 meses; Grupo C recorrência após os 60 meses. As seguintes variáveis foram avaliadas e comparadas entre os três grupos: idade à data do diagnóstico, estado hormonal, localização do tumor primário, estádio clínico, tipo histológico, grau de diferenciação, presença de componente in situ, multifocalidade, receptores de estrogénio (RE), Her-2, tratamento e localização das recorrências. As recorrências foram divididas em loco-regionais e à distância e estas últimas em ósseas e viscerais. A análise estatística dos dados foi efectuada através do programa Statistical Packages for Social Sciences-14, usando o teste de Mann Whitney para as variáveis qualitativas e o teste t-student para as variáveis quantitativas. Foram ainda obtidas curvas de sobrevivência global e após recorrência para os três grupos pelo método de Kaplan-Meier e comparadas usando o teste de log-rank. Um valor de p inferior a 0.05 foi considerado estatisticamente significativo. Resultados Dos casos incluídos, 54 (44.6%) foram incluídos no grupo A, 41 (33.9%) no grupo B e 26 (21.5%) no grupo C. O intervalo livre de doença médio foi de 36.4 meses, variando entre 4 e 139 meses. A idade média à data do diagnóstico foi de 54.2 anos no grupo A, de 54.9 anos no grupo B e de 53.4 anos no grupo C (p=n.s.). A maioria dos tumores, nos três grupos, foi diagnosticada em mulheres pós-menopáusicas (A-64.8%, B-68.3%, C-69.2%, p=n.s.). A mama esquerda foi a localização do tumor primário em 66.7% das mulheres no grupo A, 63.4% no grupo B e 61.5% no grupo C (p=n.s.). 120

Acta Obstet Ginecol Port 2010;4(3):119-125 Tabela I Características do tumor primário 121

Rodrigues AC, Custódio AS, Saleiro S, Lemos S, Frutuoso C, Freire-de-Oliveira C Os tumores com recorrência após os 60 meses foram diagnosticados num estádio inicial mais precoce em relação aos do grupo A e do grupo B (I A-20.4%, B-19.5%, C-42.3%; IIa A-29.6%, B-21.95%, C-30.8%; IIb A-22.2%, B-21.95%, C-11.5%; IIIa A-7.4%, B-9.76%, C-0%; IIIb A- 20.4%, B-26.8%, C-15.4%). A percentagem de formas histológicas raras de bom prognóstico foi mais elevada no grupo C comparativamente ao grupo A (A-1.85% vs. C-11.5%, p=0.021). O grau de diferenciação não mostrou diferenças com significado estatístico entre os três grupos. Sete doentes do grupo A, 3 do grupo B e 5 do grupo C apresentavam tumores com componente in situ extenso (A-13.0%, B-7.3%, C-19.2%, p=n.s.) A multifocalidade foi diagnosticada em 4 mulheres do Tabela II Tratamento do tumor primário Tabela III Características das recorrências 122

Acta Obstet Ginecol Port 2010;4(3):119-125 grupo A, 7 do grupo B e duas do grupo C (A-7.4%, B-17.1%, C-7.7%, p=n.s.). Os tumores RE-negativos foram significativamente mais frequentes no grupo A (A-55.6%, B- 19.5%, C-19.2%). Não foram identificados tumores com positividade para o Herb-2 no grupo C. Considerando o subgrupo de tumores grau 2/3, RE negativos e N+, a maioria das mulheres sofreu recorrência antes dos 2 anos (A-38.9%, B-9.8%, C-7.7%). As características dos tumores primários estão resumidas na Tabela I. A mastectomia radical modificada foi o procedimento cirúrgico mais comum nos três grupos (A-83.3%, B-82.9%, C-84.6%, p=n.s.). Foi realizada quimioterapia em 92.6%, 80.5% e 88.5% das doentes incluídas, respectivamente, nos grupos A, B e C (p=n.s.). Trinta doentes do grupo A, 19 do grupo B e 13 do grupo C foram submetidas a radioterapia (A-55.6%, B-46.3%, C50.0%, p=n.s.). A hormonoterapia foi menos utilizada como terapêutica adjuvante no grupo A (A-40.7%, B-70.7%, C-79.9%). Metade das doentes do grupo C que foram submetidas a hormonoterapia, recidivaram após a suspensão da terapêutica (Tabela II). Nos três grupos, as recorrências apresentaram-se maioritariamente sobre a forma de metastização à distância (A-79.6%, B-78.0%, C-57.7%), não se tendo verificado diferenças com significado estatístico quando se considerou a ocorrência de metastização óssea versus visceral (Tabela III). As sobrevivências globais médias foram de A-32.2 meses, B-57.9 meses e C-102.4 meses (p <0.001). Após recorrência tumoral, a sobrevivência foi significativamente maior no grupo C (A- 20.2 meses, B-16.9 meses, C-21.9 meses, p=0.003). Figura 1. Curva de sobrevivência global (p<0.001) 123

Rodrigues AC, Custódio AS, Saleiro S, Lemos S, Frutuoso C, Freire-de-Oliveira C Figura 2. Curva de sobrevivência após recorrência (p=0.003) Discussão As recorrências do cancro da mama podem surgir, desde poucos meses a muitas décadas, após o tratamento inicial, em função das características clínicas e anátomo-patológicas dos tumores primários. Nesta amostra, tal como na maioria das séries publicadas, as recorrências prevalecem nos primeiros cinco anos, no entanto cerca de 20% podem ter lugar após os 60 meses 3,4. As mulheres jovens e pré-menopáusicas têm maior taxa de recorrência tumoral. No entanto, Nishimura et al concluíram que o intervalo de tempo até aparecimento da recorrência foi independente da idade4. Quanto à influência do estado hormonal no intervalo livre de doença, Yin et al constataram que o pico de recorrência foi aos 1,5 anos após o tratamento inicial nas mulheres pré-menopáusicas e aos 2,5 anos nas mulheres pós-menopáusicas 5. Na população estudada não foram encontradas diferenças com significado estatístico entre os três grupos quer para a idade quer para o estado hormonal. Em relação do estadiamento clínico, os resultados do presente estudo corroboram Yin et al e Brackstone et al, que nas suas publicações advogaram que os tumores em estádios mais avançados ao diagnóstico tendem a recorrer mais precocemente, enquanto que os tumores pequenos e sem evidência de metastização ganglionar recorrem mais frequentemente após os 5 anos 5,6. Já Nishimura et al concluíram que o tempo de recorrência não está dependente do status ganglionar 6. Mais de 80% dos carcinomas da mama são do tipo ductal invasivo 7. Também nos três grupos estudados, 124

Acta Obstet Ginecol Port 2010;4(3):119-125 este foi o tipo histológico mais comum. No entanto, no grupo das recorrências após os 60 meses verificou-se um maior número de formas histológicas raras (11.5%) que se caracterizam por progressão mais lenta e melhor prognóstico 7. Baixa actividade proliferativa e alta diferenciação tumoral foram identificados por Nishimura et al como factores preditivos de recorrência local tardia 4. Na presente população, a maior percentagem de tumores nos três grupos era grau 2. Nishiumura et al concluíram que o tempo de recorrência não foi influenciado pela presença de componente in situ extenso ou multifocalidade, o que está em concordância com os nossos resultados 4. Contudo, estes factores foram associados a maior recorrência local após cirurgia conservadora 8. Comparativamente aos tumores RE-negativos, os tumores RE-positivos tendem a recorrer mais tardiamente 4. No presente estudo, verificou-se uma maior percentagem de tumores RE-negativos no grupo dos tumores com recorrência nos primeiros 24 meses. O uso de tamoxifeno ou de inibidores da aromatase é universalmente aceite por um período de cinco anos nos tumores RE-positivos. Nestes tumores, a maioria das mulheres sofre recorrência após os 5 anos de hormonoterapia, com taxas anuais de recorrência de 2% e 4% para os tumores N0 e N+, respectivamente 9. Na presente população, metade das mulheres do grupo C tratadas com hormonoterapia, apresentaram recorrência após o seu término. Deste modo e como demonstrado pelo estudo MA-17, algumas mulheres podem beneficiar de tratamentos com hormonoterapia mais longos. O uso letrozole após 5 anos de tamoxifeno provou diminuir significativamente o risco de recorrência em 42% no caso de tumores iniciais em mulheres pósmenopáusicas 10. Outro factor de prognóstico que parece influenciar o intervalo livre de doença é o protooncogene Her-2. Segundo Yin et al, os tumores Her-2 positivos têm recorrências mais frequentes e precoces relativamente aos Her-2 negativos 5. A introdução do transtuzumab permitiu reduzir as recorrências nos tumores Her-2 positivos 11. No presente estudo, uma vez que na maioria dos casos não havia sido determinado, não fizemos a análise estatística para este factor, no entanto considerando apenas os tumores em que foi analisado, nenhum apresentava positividade para o Herb-2 no grupo C. Os dados obtidos também permitiram concluir que o tempo livre de doença influenciou a sobrevivência global e após recorrência, corroborando Nishimura et al 4. Uma limitação deste trabalho resulta da dificuldade em distinguir entre verdadeiras recorrências e tumores primários de novo. Nishimura et al 4 constatou que o intervalo de tempo para o aparecimento de verdadeiras recorrências tende a ser mais curta (37 meses para as verdadeiras recorrências e 55 meses para os tumores de novo). Neste estudo, o intervalo livre de doença médio foi de 36.4 meses. Referências bibliográficas 1. Jemal A, Siegel R, Ward E. Cancer Statistics. CA Cancer J Clin 2007; 57: 43-66. 2. Demicheli R, Abbattista A, Miceli R, Valagussa P, Bonadonna G. Time distribution of the recurrence risk for breast cancer patients undergoing mastectomy. Further support about the concept of tumour dormancy. Breast Cancer Res Treat 1996; 41: 177-85. 3. Crowel JP, Gordon NH, Antunez AR, Shenk RR, Hubay CA, Shuck JM. Local-regional breast cancer recurrence following mastectomy. Arch Surg 1991; 126: 429-32. 4. Nishimura R, Akizuki M, Tashima R, Ootao R. Investigation of factors related to ipsilateral breast tumor recurrence after breast-conserving surgery and measures for preventing recurrence in early breast cancer. Breast Cancer 2006; 13: 152-8. 5. Yin W, Di G, Zhou L, Lu J, Liu G, Wu J et al. Time-varying pattern of recurrence risk for Chinese breast cancer patients. Breast Cancer Res Treat 2009; 114(3): 527-35. 6. Brackstone M, Townson JL, Chambers AF. Tumour dormancy in breast cancer: an update. Breast Cancer 2007; 9: 208 7. Travassoli FA, Devilee (eds). World Health Organization Classification of tumors, Pathology and Genetics of Tumors of the Breast and Female Genital Organs. IARC press 2003, Lyon 8. Touboul E, Buffet L, Belkacémi Y, Lefranc JP, Uzan S, Lhuillier P et al. Local recurrences and distant metastases after breast conserving surgery and radiation therapy for early breast cancer. Int J Radiation Oncol Biol Phys 1999; 43: 25-38. 9. Early Breast Cancer Trialists Collaborative Group (EBCTCG): Effects of chemotherapy and hormonal therapy for early breast cancer on recurrence and 15-year survival: An overview of the randomised trials. Lancet 2005; 365: 1687-1717. 10. Goss PE, Ingle JN, Martino S, Robert NJ, Muss HB, Piccart MJ et al. 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Conde P, Grilo I, Martins A, Martins P, Moniz A Artigo Original/Original Article Cirurgia obliterativa do prolapso dos órgãos pélvicos uma opção ainda válida? Obliterative surgery for pelvic organ prolapse - an option that remains valid? Pedro Conde*, Isabel Grilo*, Amália Martins**, Pedro Martins**, Andrade Moniz*** Maternidade Alfredo da Costa Abstract Objective: To investigate the results of vaginal obliterate surgery in elderly women with pelvic organ prolapse. Design: observational retrospective study. Material and Methods: a total of 69 women with the diagnosis of pelvic prolapse were submitted to obliterative surgery in the urogynecology unit of a tertiary care hospital centre over the course of 8 years (2001 to 2008). The following data were collected from their clinical records: age, number of vaginal births, body mass index (BMI), hormone therapy, other existing diseases, type of prolapse and stage, anaesthetic risk score, duration of surgery, length of hospital stay, and short-term complications. Results: Of the 69 women studied, 31 were submitted to colpocleisis and the remaining 38 were managed by the LeFort technique. Mean age was 74.8 years with a standard deviation (sd) of 7.14 years. Average BMI was 26.2 (sd =3.76). Vaginal births were recorded in all patients. Only three patients were taking hormone therapy at the time of surgery. Sixty-three women were classified as having and anesthetic risk of II or III and 55 underwent local-regional anesthesia. Complications were reported in five cases, four of which in the first days after surgery. Nearly all were mild and resolved within the first 6 weeks. Conclusion: Complication rates appear to be low after obliterative surgery for pelvic organ prolapse in elderly women. Keywords: Pelvic organ prolapse; obliterative surgery; colpocleisis; LeFort Introdução * Interno do Internato Complementar de Ginecologia e Obstetricia ** Assistente Graduado de Ginecologia e Obstetricia *** Chefe de Serviço de Ginecologia e Obstetricia O prolapso dos órgãos pélvicos (POP) já se encontra descrito na literatura médica, desde tempos ancestrais. Contudo, só nos últimos 125-150 anos é que começaram a ser desenvolvidas técnicas cirúrgicas para o corrigir de um modo seguro e eficaz 1. A primeira referência à colpoclese é atribuída a Geradin, que em 1823 sugeriu o desnudamento de porções da parede anterior e posterior da vagina ao nível do intróito e a sua respectiva sutura 1. A evolução das técnicas actuais da cirurgia obliterativa, tiveram origem em Neugebauer em 1867, que foi o primeiro a realizar uma colpoclese e em Le Fort em 1877 com a 126

Acta Obstet Ginecol Port 2010;4(3):126-131 primeira publicação da técnica 1,2,3. A abordagem inovadora de LeFort baseava-se no facto deste acreditar que a disfunção do pavimento pélvico resultante do parto, conduzia ao afundamento da parede vaginal anterior, que por arrastamento condicionaria o mesmo efeito à restante vagina 1. Por isto, considerou que a prevenção do prolapso uterino seria possível, se mantivermos a aposição das paredes da vagina. Admitiu ainda, que o hiato vaginal amplo, poderia contribuir para o insucesso cirúrgico. A primeira técnica cirúrgica de Le Fort consistia em dois passos: colpoclese e oito dias depois a perineorrafia 1. O prolapso dos órgãos pélvicos tem sido constantemente associado à paridade. O efeito do tratamento hormonal no suporte do pavimento pélvico em mulheres na pós-menopausa ainda não é completamente compreendido 4. O número de anos decorridos desde a menopausa ou a administração do tratamento hormonal, parece não influenciar o desenvolvimento do POP 4,5. Dados estatísticos recentes, apontam para um envelhecimento crescente da população, com aumento significativo do número de mulheres com idade mais avançada. As projecções da população residente em Portugal, no horizonte 2000-2050, revelam um envelhecimento continuado da população. Nos próximos 50 anos, Portugal poderá continuar com cerca de 10 milhões de residentes, mas manter-se-á a tendência de envelhecimento demográfico, projectando-se que em 2060 residam no território nacional cerca de 3 idosos por cada jovem, consequência do previsível aumento da esperança de vida bem como da manutenção dos níveis de fecundidade abaixo do limiar de substituição das gerações 6,7. Tal situação, está inevitavelmente associada a um maior número de prolapsos dos órgãos pélvicos. A presença de POP faz diminuir a qualidade de vida das mulheres idosas 8,9 e por isso, existe um aumento da procura de soluções terapêuticas eficazes e duradoras 1. A selecção do tipo de correcção cirúrgica depende de diversos factores, nomeadamente, da idade, sintomas urinários e/ou rectais associados, desejo ou não de preservar a função vaginal, da co-morbilidade, que interfere com o risco cirúrgico e/ou anestésico e dos defeitos presentes no pavimento pélvico 10. Durante algumas décadas a colpectomia e a colpoclese foram consideradas obsoletas e associadas a uma elevada incidência de incontinência urinária de esforço (IUE) de novo 3,11. Contudo, nos últimos anos estas cirurgias como que foram redescobertas e estão a ser recomendadas em certas unidades uroginecológicas. Os autores ao realizarem este trabalho têm como objectivo principal avaliar as cirurgias obliterativas (colpoclese e Le Fort) efectuadas na sua unidade de uroginecologia. Simultaneamente, com base na experiência do seu centro e nos resultados descritos na literatura procuram responder à seguinte questão - A cirurgia obliterativa do prolapso dos órgãos pélvicos ainda terá indicação? Material e Métodos Foram incluídas as mulheres vigiadas na Consulta de Uroginecologia dum centro hospitalar terciário, que entre 2001 e 2008, tiveram indicação para cirurgia obliterativa subjacentes a POP. Procedeu-se à avaliação retrospectiva de 69 processos clínicos, tendo em conta as seguintes variáveis: idade, índice de massa corporal (IMC), número de partos vaginais, utilização de tratamento hormonal na periou pós-menopausa, doenças associadas, tipo, grau de prolapso (utilizada a classificação de Baden 12 ), tipo de anestesia, a classificação do risco anestésico, segundo a American Society of Anesthesiologists (ASA Quadro V 13 ), tipo de cirurgia, tempo cirúrgico, duração do internamento no pós-operatório, complicações e vigilância. No conjunto de 8 anos a cirurgia obliterativa representou cerca de 10% do numero total de cirurgias em que a indicação foi o POP n = 672. Todas as cirurgias com objectivo de avaliação, foram realizadas por médico especialista em ginecologia e diferenciação em uroginecologia. Quadro I Dados clínico-demográficos (n=69) 127

Conde P, Grilo I, Martins A, Martins P, Moniz A Quadro II Tipo e Grau de prolapso (n=69) Quadro III Tipo Cirurgia Quadro IV - Distribuição da co-morbilidade Quadro V - American Society of Anesthesiologists ASA) physical status classification 13 Nalguns casos foi necessário associar a realização de cirurgia anti-incontinência sling suburetral, uma vez que as doentes concomitantemente apresentavam IUE. O estudo urodinâmico foi realizado para documentação da existência ou não de IU, nomeadamente oculta. Os resultados deste estudo urodinâmico, não influenciaram a decisão de optar pela cirurgia obliterativa, apenas permitiram decidir se no mesmo tempo operatório era realizada ou não cirurgia anti-incontinência. A avaliação no pós-operatório, contempla o período de internamento para averiguar a ocorrência de complicações cirúrgicas imediatas e a consulta de revisão após a intervenção. Esta consulta foi realizada em média, 4 a 6 semanas após a cirurgia, com o objectivo de detectar complicações tardias, tais como existência de POP ou de sintomatologia ou patologia de novo relacionadas com o pavimento pélvico (exemplo, incontinência urinária). Neste estudo, não foi programada nenhuma avaliação a longo prazo. Resultados Foram utilizadas duas técnicas cirúrgicas: 1. Colpoclese total, que foi realizada em mulheres com prolapso da cúpula vaginal e que consistiu na remoção da maior parte do epitelio vaginal desde o anel himeneal (ponto cirúrgico de referência posterior), até a 2-4 centímetros do meato uretral (ponto cirúrgico de referência anterior). 2. Operação de Lefort, que foi realizada nas doentes que tinham prolapso uterino. Este técnica foi executada com a remoção parcial do epitélio vaginal (parede anterior e posterior), preservando lateralmente a mucosa de modo a formar duas vias de drenagem para eventuais secreções uterinas. Foram efectuadas, 69 cirurgias vaginais obliterativas, em doentes que não tinham vida sexual activa e/ou que não apresentaram desejo de preservar a integridade vaginal. A distribuição das técnicas cirúrgicas foi a seguinte: operação Le Fort, em 38 casos e colpoclese em 31 casos. Nos casos de operação Le Fort, 2 casos associados à correcção cirúrgica da incontinência urinária (sling suburetral por via transobturadora inside out) e 3 casos na colpoclese para correção de incontinência urinária concomitante (técnica similar). Os resultados clínico-demográficos estão representados no Quadro I. Em relação ao número de partos vaginais, a média foi de 2,3±1,87, com o valor mínimo de zero e o máximo de 11 partos. Verificou-se que 5 doentes eram nulíparas, 15 primíparas, 41 multíparas e 8 grandes multíparas. 128

Acta Obstet Ginecol Port 2010;4(3):126-131 Quanto à presença de co-morbilidade que poderá aumentar o risco anestésico e/ou cirúrgico, foram detectadas 3 ou mais patologias em 15 doentes. A maioria referia uma a duas doenças. A distribuição da comorbilidade está representada no quadro IV. No que diz respeito à utilização de tratamento hormonal na pós-menopausa, foi detectada em apenas 3 doentes. Relativamente ao risco anestésico, 33 mulheres foram classificadas como ASA II, 30 como ASA III e 6 como ASA III/IV. Quanto ao método de administração da anestesia/analgesia, 55 mulheres foram submetidas a analgesia loco-regional, 8 a anestesia geral, 4 a local e 2 a sedação (as mulheres submetidas a anestesia local e a sedação apresentavam um risco anestésico muito elevado (classificadas como ASA III/IV). No que se refere à classificação do POP, foi utilizado o método de Baden grau 1,2,3 e 4. Em 47 mulheres identificou-se prolapso grau 3 e prolapso total em 17 Tabela 2. Nas mulheres submetidas a cirurgia prévia por POP foram identificados 10 casos: estes casos, haviam sido submetidos a histerectomia vaginal com colporrafia. Nas restantes mulheres, as principais indicações foram, miomatose uterina e irregularidades menstruais (menometrorragias). O estudo urodinâmico foi realizado em 60/69 casos. Não foram registados dados considerados suficientes para interpretação, em 9 casos. A cirurgia anti-incontinência sling suburetral por via transobturadora inside-out foi realizada em 3 doentes submetidas a colpoclese (N=31) e em 2 doentes submetidas á técnica de LeFort (N=38) por apresentarem concomitantemente IUE Tabela III. Figura 1 Figura 2 Figura 3 A duração do tempo de cirurgia foi a seguinte: 1. Colpoclse isolada: 58±22,7 com valor máximo de 110 e mínimo de 20; 2. Operação Le Fort isolado: 49±13,5 com valor máximo de 85 e mínimo de 24. Quanto ao internamento pós-operat rio, os resultados mostram uma duração de: 1. Colpoclese: 2,6±1,16 com valor máximo de 7 e mínimo de 2; 2. Operação Le Fort: 2,7±0,98 com valor máximo de 5 e mínimo de 2. As complicações cirúrgicas imediatas, foram anotadas em 4 casos - 4/69: 1. Colpoclese: 1 caso de infecção da sutura vaginal e 1 caso de hematoma retrovesical com necessidade de re-intervenção; 2. Operação Le Fort: 1 caso de retenção urinária e 1 caso de infecção da sutura vaginal. Foi detectado 1 caso de complicação médica com paragem cardio-respiratória no 1º dia do pós-operatório. 129

Conde P, Grilo I, Martins A, Martins P, Moniz A A reavaliação ás 4-6 semanas após cirurgia, revelou que a maior parte dos doentes desta amostra populacional, (49/69) teve alta assintomática. Foram diagnosticados 4 casos de persistência da incontinência urinária de urgência e um caso de incontinência urinária de esforço de novo. As restantes doentes acabaram por ter alta em média passados 6 meses. Dicussão Nos EUA, a probabilidade de realizar uma cirurgia para correcção de alterações do pavimento pélvico, em mulheres com 80 anos, está estimada em 11% e poderá haver necessidade de reintervenção em 29% dos casos 14. A cirurgia obliterativa apresenta como vantagem comparativa à colporrafia, sobretudo no caso da colpoclese total, uma taxa de sucesso independente do tamanho do prolapso e do defeito anatómico 10,15. Mesmo quando comparada com a sacrocolpopexia e a suspensão ao ligamento sacroespinhoso, a colpoclese total tem como vantagem, ser altamente improvável a ocorrência de lesões noutros órgãos 2. Mais ainda, respeitando à incontinência urinária, aquela técnica obliterativa não está associada ao risco de incontinência urinária de novo, quando correctamente executada tendo o cuidado de não envolver a área imediatamente inferior à uretra e junção uretrovesical 11. Existem estudos clínicos que avaliam de acordo com determinados objectivos, a efectividade da utilização da cirurgia obliterativa: 1. Estudo com 92 casos submetidos a colpoclese total, com vigilância, que consistiu num exame físico e entrevista telefónica, a cura objectiva foi definida como ausência de prolapso até ao hímen, descreve uma taxa de sucesso de 98% (no seguimento que variou entre 0 e 64 meses, em média 12 meses, apenas uma doente necessitou de reintervenção) 16 ; 2. Estudo com 41 doentes submetidas a colpoclese total com perineorrafia, não foi observada qualquer recidiva de prolapso (embora a cura objectiva não tenha sido definida), quando as doentes foram observadas em média aos 28,7 meses, pelo que, descreve uma taxa de sucesso de 100% 17 ; 3. Estudo de qualidade de vida após a cirurgia, com 94 doentes submetidas a colpoclese. Os resultados relativos à recuperação da anatomia vaginal (n=40), auto-imagem (n=32) e ausência de sensação de pressão na vagina (n=39) foram obtidos mediante a aplicação do Incontinence Impact Questionnaire e Urogenital Distress Inventory e items de satisfação e arrependimento. Foi demonstrada satisfação ou muita satisfação, em 38, 31 e 39 dos casos, respectivamente 18. Existem resultados similares em estudos posteriores 19 ; 4. Estudo com 118 mulheres submetidas à intervenção de Le Fort com vigilância muito variável (1 a 15 anos), mostra bons resultados anatómicos no pós opératório em 90,7% dos casos, com uma recidiva total do prolapso apenas numa doente 20 ; 5. Estudo com 33 casos de colpoclese total para tratamento do prolapso da cúpula, com vigilância aos 18 meses de pós-cirurgia, baseada no exame clínico e questionário aplicado em média aos 34 meses pós-operatório (entrevista telefónica estruturada, onde era questionado a existência de incontinência, complicações que atribuíssem ao procedimento, arrependimento e satisfação), embora a cura objectiva não tenha sido definida, descreve uma taxa de sucesso de 97% (apenas 1 doente teve recidiva do prolapso um ano após a intervenção) 21 ; Na nossa instituição a maioria das doentes com prolapso uterino, são submetidas a histerectomia vaginal, com culdoplastia de MCcall e colporrafia ou cirurgia com aplicação de prótese, principalmente nas recidivas de prolapso. As mulheres com prolapso da cúpula são submetidas a sacrocolpopexia, ou a suspensão ao sacroespinhoso. Contudo, existe um número reduzido de mulheres, com idade avançada e com co-morbilidade, que acarretam maior risco anestésico e cirúrgico e como tal não suportam as técnicas cirurgicas referidas. Nestes casos, a cirurgia obliterativa pode ser uma alternativa com menor risco e tempo cirúrgico associado, como constatamos neste estudo. Este trabalho, à semelhança do descrito na literatura demonstrou a baixa taxa de morbilidade destas técnicas, a par da sua eficácia, no tratamento do POP numa população bem seleccionada. A morbilidade foi reduzida, com necessidade de reintervenção apenas 130

Acta Obstet Ginecol Port 2010;4(3):126-131 num dos casos, por complicação com hematoma retrovesical. A lesão de órgãos adjacentes, como a bexiga, ureter, intestino, vasos ou nervos pélvicos é menos provável de ocorrer na cirurgia obliterativa, uma vez que o plano de dissecção é superficial 15,21. A cirurgia obliterativa, está associada à incontinência urinária de esforço, que pode surgir na tentativa de correção do kinking uretral 15. Neste estudo, apenas 1 caso apresentou incontinência urinária de esforço como diagnóstico de novo. Os casos de incontinência de urgência já existiam antes da cirurgia e mantiveram o diagnóstico na pós-cirurgia. A correcção da incontinência urinária de esforço pode ser realizada com a técnica de sling suburetral, no mesmo tempo operatório da colpoclese, com manobras minimamente invasivas 22. Concluímos que a cirurgia obliterativa vaginal, conforme revela a experiência na literatura e a nossa revisão dos casos clínicos em 8 anos, é uma intervenção segura, facilmente reprodutível, com efectividade e morbilidade reduzida, quando utilizada numa população idosa meticulosamente seleccionada, com sintomatologia associada ao POP e em que se verifica insucesso do tratamento conservador. É de enfatizar que, a recomendação da cirurgia obliterativa é ponderada em mulheres com elevado risco cirúrgico e anestésico, sem vida sexual ou que não desejam preservar a integridade da vagina. A grande limitação deste estudo reside em determinar se houve de facto cura a longo prazo (pelo menos a 12 meses). Bibliografia 1. FitzGerald MP, Richter HE, Siddique S et tal. Colpocleisis: a review. Int Urogynecology J 2006; 17(3): 261-271. 2. Deval, B. Hysterocolpectomy with colpocleisis for massive genital prolapse in women aged over 70 years. European J Obstet Gynecol and Reprod Biology 2005; 123: 249-253. 3. Mary PF, Linda B. Colpocleisis and urinary incontinence. Am J Obstet Gynecol 2003;189:1241-4. 4. Nygaard I, Bradley C, Brandt D. Pelvic Organ Prolapse in Older Women: Prevalence and Risk Factors. Obstetrics & Gynecology 2004;104(3):489-497. 5. Hendrix SL, Clark A, Nygaard I, et al. Pelvic organ prolapse in the Women s health Initiative: Gravity and gravidity. Am J Obstet Gynecol 2002;186:1160-6. 6. Projecções de População Residente em Portugal 2000-2050. Instituto Nacional de estatística 2003. www.ine.pt 7. Projecções de população residente em Portugal - 2008-2060. Instituto Nacional de estatística 2003. Disponível em www.ine.pt e consulta realizada na data 3 de Dezembro de 2009. 8. Barber MD, Amundsen CL, Paraiso MF et al. Quality of life after surgery for genital prolapse in elderly women: obliterative and reconstructive surgery. Int Urogynecol J Pelvic Floor Dysfunct 2007; 18(7): 799-806. 9. Jelovsek J, Barber MD. Women seeking treatment for advanced pelvic organ prolapse have decreased body image and quality of life. Am Journal Obstet Gynecol 2006 May;194(5):1455-61. 10. Maher C, Baessler K, Glazener CM, Adams EJ, Hagen S. Surgical management of pelvic organ prolapse in women. Cochrane Database Syst Rev 2007; 18(3):CD004014. 11. Glavind K, Kempf L. Colpectomy or Le Fort colpocleisis a good option in selected elderly patients. Int Urogynecological J Pelvic Floor Dysfunct 2005; 16(1): 48-51. 12. Baden WF, Walker TA, Lindsay HJ. The vaginal profile. Tex Med J 1968;64:56 58. 13. American Society of Anesthesiologists. New classification of physical status. Anesthesiology 1963; 24:111. 14. Olsen AL. Epidemiology of surgically managed pelvic organ prolapse and urinary incontinence. Obstet Gynecol 1997; 89:501-506. 15. Grody MHT, Merchia V, Nyirjesy P, et al. Total colpocleisis: A prospective study. J pelvic Surg 2001; 7:71-78. 16. Von Pechmann W, Mutone M, Fyffe J et al. Total colpocleisis with high levator plication for the treatment of advanced pelvic organ prolapse. Am J Obstet Gynecol 2003.189: 121-126. 17. Harmanli O. Total colpocleisis Total colpocleisis for severe pelvic organ prolapse. J Reprod Med 2003; 48: 703-706. 18. Hullfish KL, Bovbjerg, Steers WD. Colpocleisis for pelvic organ prolapse: patient goals, quality of life, and satisfaction. Obstet Gynecol 2007; 110(2 Pt 1):341-5. 19. Fitzgerald MP. Pelvic support, pelvic symptoms, and patient satisfaction after colpocleisis. Int Urogynecol J Pelvic Floor Dysfunc. 2008;19(12):1603-9. 20. Goldman J, Ovadia J, Feldberg D. The Neugebauer-LeFort operation: a review of 118 partial colpocleisis. Eur J Obstet Gynecol Reprod biol 1981;12:31-35. 21. DeLancey e Morley. Total colpocleisis for vaginal eversion. Am J Obstet Gynecol 1997; 176:1228-1235. 22. Moore RD, Miklos JR. Colpocleisis and tension-free vaginal tape sling for severe uterine and vaginal prolapse and stress urinary incontinence under local anesthesia. J Am Assoc Gynecol Laparosc. 2003;10(2):276-80. 131