MINICURSO: JOGOS TEATRAIS E O BULLYING ESCOLAR



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Transcrição:

MINICURSO: JOGOS TEATRAIS E O BULLYING ESCOLAR Prof. Ddo. Paulo César Antonini de Souza SEE/SP SPQMH PPGE/UFSCar Prof. Conrado Marques da Silva de Checchi Oficina Cultural Lélia Abramo Resumo: Considerando a presença do bullying nas relações humanas e, de forma destacada, no ambiente escolar, a ação discente frente ao fenômeno tem relevância fundamental no que tange à sua minimização, considerando para isso o recurso de intervenções que busquem o conscientizar-se de que somos por nossa experiência com outras pessoas no mundo, e que nossa vivência tem a possibilidade de se realizar afetivamente, sem disputas de poder que antagonizem os seres humanos. Neste minicurso, intencionamos apresentar a linguagem teatral utilizando a improvisação (Augusto Boal; Viola Spolin) por meio da qual as intervenções se constituam em uma relação dialogada na busca por um convívio mais humanizado e distante de situações/condições que tornem as pessoas opressoras e/ou oprimidas no ambiente escolar. Palavras-chave: Bullying, Jogos teatrais, Conscientização. Introdução [...] só há uma coisa que pode seduzir nossa vontade criadora e atrai-la para nós. E isto é um alvo atraente, um objetivo criador. O objetivo é o aguçador da criatividade, sua força motriz. Em cena, como fora de cena, a vida consiste numa série ininterrupta de objetivos e sua realização. (STANISLAVSKI, 1989, p. 57) Utilizado como diversão ou como meio de informação e formação ao longo da História da Humanidade, a linguagem teatral passou por transformações que envolveram a ampliação e desenvolvimento de técnicas corporais e/ou mecânicas para interpretação, utilizadas ou não, de acordo com o contexto em que se realizam, para experiências de ensino/aprendizagem. Nesse processo, as necessidades ou interesses das pessoas ou grupos que detiveram e detém o controle de sua realização quando em uma manifestação pública, se ordenaram a fim de estimular os sentidos humanos ao despertar nos espectadores uma aproximação emocionalmente significativa, como nos lembra Boal (1991): O teatro, de um modo particular, é determinado pela sociedade muito mais severamente que as demais artes, dado o seu contato imediato com a platéia, e o seu maior poder de convencimento. Essa determinação atinge tanto a apresentação exterior do espetáculo, quanto o próprio conteúdo da idéia do texto escrito. (p.100) O caráter essencialmente coletivo do teatro e sua corporeidade latente, uma vez que não se pensa nessa manifestação artística sem sua associação imediata aos homens e às 103

mulheres que a tornam visível, são elementos significativos tanto para o entendimento de sua força como instrumento socioeducativo, quanto para a relevância do teatro nos sentidos próprios de sua poética, cujas diretrizes buscam por meio da sensibilidade, formas de aproximação entre as pessoas. Assim, a seleção de temáticas para o desenvolvimento da linguagem teatral se torna um facilitador para a realização do diálogo. Mesmo ao encarar essa forma de experiência teatral como uma instrumentalização da arte, sua estética e movimento criador asseguram a legitimidade da manifestação como meio sensível de nossa presença no mundo. Bullying e a linguagem do teatro Sendo seres humanos condicionados a nos situarmos em posições de autoridade e submissão, por conta do modo em que se constroem as relações sociais no mundo atual, onde o machismo, a economia, a heterossexualidade, e a hegemonia cultural e de raças tem fator significativo para que se estruture quem ocupa qual espaço entre os grupos, acreditamos ser necessário que os professores e as professoras se encontrem realmente dispostos/as a ultrapassar essas limitações a fim de que a relação entre estes/as e os/as discentes se realize de maneira dialógica. No sentido dessa reflexão: [...] a significação das práticas educativas constitui-se a partir do sentido que os processos de ensino e aprendizagem tem para as pessoas envolvidas com seu desenvolvimento [...] (SOUZA; LEMOS; CARMO, 2010, p.4). No ambiente escolar, tendo em vista as dificuldades materiais e espaciais, assim como a delimitação do tempo para as vivências educativas, considerando-se a diversidade de componentes curriculares e a abordagem que cada professor ou professora utiliza para desenvolvimento de sua prática, a linguagem teatral, por meio dos jogos de interpretação podem se revelar uma forma ativa de sensibilização na abordagem de variadas temáticas. Para que seja possível existir essa aproximação entre conteúdo e temática, no entanto, se faz necessária uma relação de respeito, interesse e diálogo entre docentes e discentes, a fim de que, por meio desse acercamento, as barreiras sejam aos poucos derrubadas favorecendo a constituição de um projeto de ensino-aprendizagem coerente à perspectiva existencial de todo o grupo. Quando as relações escolares podem contar com projetos que visam participação discente ativa desde a seleção dos objetivos até a escolha da temática e das técnicas, os processos educativos tendem a surgir em experiências que são prazerosas para todas as pessoas envolvidas, tendo a possibilidade de, por exemplo, ultrapassar ou minimamente questionar, comportamentos que muitas vezes são responsáveis por afastar-nos uns dos 104

outros, orientados por olhares consumistas ideologicamente adquiridos. O consumismo ao qual nos referimos, vai além da aquisição de bens ou serviços, sendo principalmente orientado pela aquisição de comportamentos e ideais de corpo, em um processo capaz de nos fazer negar a própria imagem e também das pessoas com quem convivemos. A vida do cotidiano escolar encontra-se permeada de intersubjetividades, advindas das relações entre o corpo estudantil, suas famílias, o corpo administrativo e o corpo pedagógico, cujos encontros compõem grande parte dos ambientes de ensino e aprendizagem. Estamos no mundo, imersos em tudo e, de certa forma, em todas as pessoas com as quais nos relacionamos. Inundados da realidade do mundo, temos a nosso favor a criatividade que nos permite transcender a existência e re-criar nossa presença no e com o mundo e com as pessoas no mundo: É necessário ser parte do mundo que nos circunda e torna-lo real tocando, vendo, sentindo o seu sabor, e o seu aroma o que procuramos é o contato direto com o ambiente. Ele deve ser investigado, questionado, aceito ou rejeitado. A liberdade pessoal para fazer isso leva-nos a experimentar e adquirir autoconsciência (auto identidade) e auto-expressão (SPOLIN, 1992, p.6). No contexto da reflexão apontada por esta autora, com a qual concordamos, devemos considerar um dos elementos mais prejudiciais no caso discente, para o alcance da experiência da liberdade: o bullying 1. Esse fenômeno ainda se mostra um obstáculo a ser vencido dentro das escolas, pois apesar de campanhas de prevenção desenvolvidas por professores e professoras e da abordagem que o assunto recebe por meio de projetos governamentais ou por matérias televisivas, sua continuidade ainda é observada, pois A verdadeira liberdade pessoal e a auto-expressão só podem florescer numa atmosfera onde as atitudes permitam igualdade entre o aluno e o professor, e as dependências do aluno pelo professor e do professor pelo aluno sejam eliminadas (SPOLIN, 1992, p.8). Não é possível vivenciar a experiência da liberdade quando algo afeta de maneira nociva, as pessoas que compartilham um mesmo espaço social e histórico, tendo nessas relações, experiências que desconstroem a fé em si mesmo ou em outrem. Como alternativas possíveis para a prevenção do bullying, tendo por suporte as linguagens da arte musical, visual, cênica/teatro e corporal/dança, vários projetos (SOUZA, 2007; SANTOS, 2009; 1 Bullying sem tradução para a língua portuguesa é o termo que designa um fenômeno identificado inicialmente entre os anos de 1970/80, pelo pesquisador e professor norueguês Dan Olweus, caracterizado por comportamentos velados, repetitivos e intencionalmente agressivos, de ordem física ou psicológica, entre alunos. 105

SOUZA, 2009; MEDEIROS, 2010; AYALA; VASCONCELOS, 2011) indicaram resultados bastante positivos quando postos em prática. A utilização das linguagens artísticas, abarcando os sentidos humanos em sua realização e tendo como facilitadora a diversidade de técnicas expressivas que sustenta, revela-se um meio dinâmico de nos aproximarmos de temáticas que dizem respeito aos interesses discentes. Para Lowenfeld e Brittain (1977): Somente através dos sentidos a aprendizagem pode processar-se. Talvez isto pareça um enunciado óbvio; entretanto, suas implicações parecem ser ignoradas em nosso sistema educacional. É possível que a educação reflita, meramente, as mudanças em nossa sociedade, pois o homem parece estar cada vez confiando menos no contato sensorial, concreto, real, com seu meio. Está-se convertendo num espectador passivo da sua cultura, em vez de seu construtor ativo (p. 23). É no contexto das reflexões apresentadas neste texto, que também encontram similaridade nas recomendações presentes na proposta curricular do Estado de São Paulo (SÃO PAULO, 2008), que apontamos a relevância dos jogos teatrais, elaborados em conjunto por docentes e discentes, para a prevenção das práticas do bullying dentro da escola. A contextualização das propostas educativas são significativas para todo o grupo quando existe prazer na prática desenvolvida. O jogo teatral O artista capta e expressa um mundo que é físico. Transcende o objeto mais do que informação e observação acuradas, mais do que o objeto físico em si. Mais do que seus olhos podem ver (SPOLIN, 1992, p.14). Procurando a partir da noção de experiência, estabelecer o que será trabalhado, os Jogos Teatrais são atividades que nascem da realização para se objetivar enquanto atividade, ainda que composta, necessariamente, tão só por atuantes ou aliados à plateia, estes não se encontram em postura passiva, mas recompõem ação por ação daqueles que se apresentam ressignificando ato por ato apresentado. Entretanto, mesmo com o potencial educativo, e considerando sua versatilidade junto a outros componentes curriculares além da Arte, o jogo teatral ainda hoje ocupa um espaço de pouco destaque nas escolas pelo estranhamento que práticas envolvendo manifestações artísticas oferecem à maioria das pessoas, como observa Santos (2009): A perspectiva de teatro como conhecimento aliado ao processo de desenvolvimento do sujeito tem significado oposição veemente às concepções positivistas, mas nem por isso o teatro garante o seu espaço como disciplina no meio escolar (p.12). 106

Assim, no contexto de nossa experiência com o teatro, as pesquisas de Viola Spolin revelam-se as mais indicadas, tanto pela coerência da autora em relação à sua prática quanto à forma utilizada para o desenvolvimento das técnicas teatrais, que consideram a espontaneidade e a improvisação pontos fundamentais no que diz respeito à experiências das pessoas envolvidas nos processos de criação teatral. Para a autora: Aprendemos através da experiência, e ninguém ensina nada a ninguém. [...] Se o ambiente permitir, pode-se aprender qualquer coisa, e se o indivíduo permitir, o ambiente lhe ensinará tudo o que ele tem para ensinar. Talento ou falta de talento tem muito pouco a ver com isso. Devemos reconsiderar o que significa talento. É muito possível que o que é chamado comportamento talentoso seja simplesmente uma maior capacidade individual para experienciar. [...] Experienciar é penetrar no ambiente, é envolver-se total e organicamente com ele (SPOLIN, 1992, p. 3) Os jogos teatrais, como recurso pedagógico, propõem possibilidades distintas das metodologias educativas tradicionais, que geralmente mantém os/as discentes fixos em suas carteiras enquanto os/as docentes discursam ou utilizam a lousa na apresentação dos conteúdos. Por meio dos jogos teatrais, a vivência escolar na sala de aula ou fora dela, desenvolve-se em comportamentos voluntários e espontâneos que tem na coletividade seus significados. A participação discente nos jogos teatrais, deve ser concordada e assumida pelo grupo em seu caráter voluntário e integrador, de maneira que se abra a possibilidade de que mesmo as pessoas que estejam assistindo ou tenham optado por assistir à prática em desenvolvimento, também são parte ativa de todo o movimento teatral, pois sua observação pode resultar em análises pessoais, capazes de também recriar em aulas ou fora do ambiente escolar os movimentos encenados. Mantendo uma relação de cumplicidade, parceria e diálogo durante a elaboração dos jogos teatrais, alcançamos o entendimento de que a finalidade das atividades não tem a intenção do palco ou a valorização do ato cênico, mas sim da cooperação, na qual as práticas se valem da corporeidade na atuação do grupo participante. Spolin (1992) chama a atenção ao destacar que muitas pessoas não são capazes de se expressar livremente por meio da linguagem teatral, muitas vezes por experiências nesse campo onde a aprovação e comentários reforçando ou direcionando movimentos se fazia presente. Para a autora, em uma reflexão cujo sentido se estende para práticas sociais além das dinâmicas do jogo teatral: numa cultura onde a aprovação/desaprovação tornou-se o regulador predominantes dos esforços e da posição, e frequentemente o substituto do amor, nossas liberdades pessoais são dissipadas (p.6). 107

Nesse sentido é que compreendemos o quanto é significativa a consideração do grupo espectador nos jogos teatrais. Quando sua relevância é indicada desde o momento em que se iniciam as experiências nesse campo, e o diálogo se desenvolve desde a seleção dos temas até as conversas de avaliação envolvendo a prática, a sensação de liberdade e de parceria entre o grupo se fortalece. Encontrar o tema apresentado no jogo teatral como Foco por Spolin (2007) é o ponto fundamental para a participação prazerosa das pessoas envolvidas com a atividade. Frequentemente apresentado a partir de uma experiência vivida pelas pessoas reunidas em torno da criação do jogo, ele será o promotor da energia participativa, pois é sob um foco específico que se delimitará um objetivo resolver ou compreender o problema, a ser alcançado pelo grupo. Para a manutenção da prática e como forma de manter ativa a inserção dos e das participantes ao foco, incluindo as pessoas que estão na assistência da encenação, apresenta-se outra base fundamental para o desenvolvimento dos jogos teatrais: a instrução. Esta deve ser realizada durante o jogo, nunca dirigida especificamente a uma pessoa apenas, mas ao coletivo, estimulando assim o processo de criação das atividades em busca de respostas livres e espontâneas. A instrução é a própria motivação em busca das atenções necessárias ao foco selecionado pelo grupo. Sua realização busca principalmente a percepção da corporeidade do grupo, que deve ser priorizada incentivando que os e as participantes demonstrem o que estão jogando ao invés de contar. Como princípio para a demonstração cabe ao/à docente, evitar o uso ou orientação de imagens que façam alusão ou que representem um modo pré-estabelecido ou estereotipado de encenação, de maneira a permitir espaço à criatividade, valorizando a contribuição de cada participante ao protagonizar suas e outras experiências em busca da compreensão ou de soluções para o objetivo daquele jogo teatral. Assim, como função essencial de expansão se coloca a avaliação da atividade, tanto para análise dos procedimentos quanto para concepção de diferentes objetivos provenientes da realização dos jogos teatrais, levando a partir de um crescente aumento da necessidade de cooperação, que se fortalece pela identificação entre os membro do grupo e o foco pelo qual se uniram, à vivência do respeito, da afetividade, da confiança e, consequentemente, da liberdade. Sobre tal aspecto O jogo teatral oferece possibilidades para o fortalecimento da autoconfiança de seus participantes e de credibilidade nas relações entre seus pares, que podem em conjunto encontrar a liberdade necessária para um convívio fraterno. Essa 108

aproximação nos abre ao mundo e às pessoas no mundo, ampliando nossa compreensão e nos permitindo estar conectados aos problemas do grupo ao qual pertencemos como uma experiência significativa. Para Spolin (1992): Ao tentarmos nos salvaguardar de ataques, construímos uma fortaleza poderosa e nos tornamos tímidos, ou então lutamos cada vez que nos aventuramos sair de nós mesmos (p.7). Consideramos que a utilização das técnicas e da experiência dos jogos teatrais em sala de aula, apresenta-se como um meio consciente de buscar compreensões para as relações escolares, considerando também sua potencialidade para a prevenção e controle das ações de bullying. A vivência do jogo teatral tem essa característica por oferecer caminhos distintos para nosso estar-no-mundo, no qual outras relações e formas de se relacionar desvelam-se por meio de movimentos que aproximam as pessoas em parcerias proporcionadas pela autonomia necessária à sua realização e pela incerteza dos resultados. Referências AYALA, Rita M.; VASCONCELOS, Valéria O. O teatro na escola e o bullying como tema gerador: contribuições da educação popular e da pesquisa-ação. In: 6º Encontro de Pesquisa em Educação (UNIUBE), Educação Popular, diversidade cultural e construção de saberes, 2011, Uberaba/MG. Anais... Uberaba, 2011. Disponível em: <http://revistas.uniube.br/index.php/anais/article/view/446>. Acesso em 23 ago. 2012. BOAL, Augusto. Teatro do oprimido e outras poéticas políticas. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1991. LOWENFELD, Viktor; BRITTAIN, W. Lambert. Desenvolvimento da capacidade criadora. 5ª ed. São Paulo: Mestre Jou, 1977. MEDEIROS, Marinês. Experiência de teatro: uma possibilidade de transformação na educação. Gravataí: UFRGS/Departamento de Licenciatura em Pedagogia, 2010. 37 fl. Trabalho de conclusão de curso. SANTOS, Ana Paula T. A presença do bullying na mídia cinematográfica como contribuição para a educação. 2009. 107 f. Dissertação (Mestrado em Comunicação, Mídia e Cultura) Fa- culdade de Comunicação e Educação, Universidade de Marília, Marília, 2009. SANTOS, Vera Lúcia B. Sobre o sentido das práticas do teatro no meio escolar. In: 30ª Reunião Anual da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPED): ANPED: 30 anos de pesquisa e compromisso social, 2009, Caxambu/MG. Anais... Caxambu, ANPED, 2009. Disponível em: < http://www.anped.org.br/reunioes/30ra/grupo_estudos/ge01-3486--int.pdf >. Acesso em: 24 ago. 2012. SÃO PAULO. Proposta curricular do estado de São Paulo: arte. Coord. Maria Inês Fini. São Paulo: SEE, 2008. SOUZA, Paulo C. A. Bullying escolar: ação e reflexão discentes face ao fenômeno. EFDeportes.com: revista digital, Buenos Aires, ano 14, nº 136, set. 2009. Disponível em: < 109

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