Um estudo de caso de estruturação de um processo de desenvolvimento de produtos e a inserção de um método de suporte



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Transcrição:

Um estudo de caso de estruturação de um processo de desenvolvimento de produtos e a inserção de um método de suporte Andreza Celi Sassi (UNIMEP) ancsassi@unimep.br Paulo Augusto Cauchick Miguel (UNIMEP) pamiguel@unimep.br Resumo Este trabalho apresenta um estudo de caso de estruturação de um processo de desenvolvimento de novos produtos e utilização do Desdobramento da Função Qualidade como método selecionado para operacionalizar o desenvolvimento. A empresa estudada utiliza um processo de desenvolvimento baseado na estrutura de stages-gates. O trabalho descreve o papel do QFD neste processo, descreve alguns aspectos antes e após a implementação, bem como enfatiza os benefícios decorrentes da aplicação do método. Palavras chave: Desenvolvimento de Produto, Desdobramento da Função Qualidade, QFD. 1. Introdução No ambiente competitivo atual, as empresas que apresentam como estratégia desenvolver novos produtos visando metas de qualidade, custo e produtividade, devem estruturar seu processo de desenvolvimento de tal forma a fornecer suporte necessário para alcançar tais metas. Um processo de desenvolvimento de produtos consiste em uma estrutura pela qual uma empresa transforma as oportunidades de mercado e possibilidades técnicas em dados para fabricação de um produto (CLARK & FUJIMOTO, 1991). Os produtos são desenvolvidos e disponibilizados aos clientes essencialmente para satisfazer suas necessidades. No entanto, somente ter um processo de desenvolvimento estruturado não garante a qualidade dos produtos. É também necessário a aplicação de outros métodos que fazem parte e complementam o processo de desenvolvimento. Um dos métodos utilizados nesse intento é o QFD (Quality Function Deployment ou Desdobramento da Função Qualidade). O QFD busca identificar o que os clientes realmente necessitam para criar produtos que atendam às essas exigências. Assim, o QFD tem como objetivo principal contribuir para o gerenciamento do processo de desenvolvimento mantendo foco voltado para o atendimento das necessidades dos clientes (CHENG et al., 1995). Apesar das atividades associadas ao QFD estarem bem definidas na literatura sobre o método, existem algumas lacunas de como o método deve-se inserir no processo de desenvolvimento (estágios do desenvolvimento em que o método deve ser empregado e com que intensidade, quais as matrizes adequadas a cada estágio, uso dos resultados da aplicação do QFD como critério nos gates, etc.). Assim, um projeto de pesquisa para estudar a utilização do QFD em um processo de desenvolvimento foi iniciada há cerca de dois anos. Nesse sentido, o objetivo desse artigo é apresentar os resultados dessa pesquisa sobre a inserção do QFD no processo de desenvolvimento de produto, por meio da realização de um estudo de caso (ver YIN, 2001). Este trabalho vem sendo realizado em uma empresa que produz filmes flexíveis para embalagens de alimentos e produtos de consumo, rótulos e etiquetas. A empresa já vem utilizando o QFD e também um novo processo de desenvolvimento de produtos, baseado na estrutura de stage-gates. Os resultados desse artigo busca um melhor entendimento de como as atividades do QFD estão distribuídas nesse processo, a intensidade de sua utilização em cada estágio desse processo, além de realizar uma análise sobre antes e depois da reestruturação do processo de desenvolvimento na empresa. ENEGEP 2004 ABEPRO 2869

2. Métodos e Técnicas de Pesquisa O estudo de caso foi realizado em uma empresa de filmes flexíveis de BOPP para embalagens. O BOPP (polipropileno biaxialmente orientado) é um tipo de filme que possui propriedades de barreiras, rigidez e resistência mecânica muito superior as de um filme de polipropileno não orientado com espessura equivalente devido à orientação das cadeias de polipropileno (MORTARA, 2000). A empresa fabrica filmes para embalagens para alimentos, filmes para cigarros, fitas adesivas, rótulos, etiquetas e gráfico. Este estudo descreve cada estágio realizado no desenvolvimento de produtos na empresa do setor de embalagens, focando o método do QFD. A estratégia de pesquisa adotada nesse trabalho é o estudo de caso. Segundo Godoy (1995), o estudo de caso tem se tornado a estratégia preferida quando pesquisadores procuram responder às questões como e por quê certos fenômenos ocorrem. A Tabela 1 mostra uma comparação do estudo de caso com outras estratégias de pesquisa utilizadas na Engenharia de Produção. Tipo Ênfase da Investigação controle sobre os eventos Contemporaneidade Análise documental Quem, o que *, onde, Não sim/não quanto Estudo de Caso Como, porquê Não sim Experimento Como, porquê Sim sim Histórica Como, porquê Não não Survey Quem, o que *, onde, Não sim quanto * As questões do tipo o que, quando utilizadas como parte de um estudo exploratório, podem estar em qualquer dos cinco tipos de estratégias mostrados Tabela 1. Diferentes tipos de estratégias de pesquisa (YIN, 1989). O estudo de caso é uma pesquisa que apresenta forte cunho descritivo, sendo que o pesquisador não tem intenção de intervir no assunto estudado e sim entender como essa determinada situação surge. Portanto, o trabalho realizado é de caráter descritivo quanto à natureza do relacionamento entre as variáveis, pois busca o entendimento do fenômeno como um todo, na sua complexidade. Quanto à natureza das variáveis pesquisadas, a pesquisa caracteriza-se como qualitativa, uma vez que os estudo de casos se baseiam em evidências qualitativas. Isso ocorre pois esse tipo de pesquisa envolve a obtenção de dados descritivos sobre determinados lugares, pessoas ou processos interativos, por meio do contato direto do pesquisador com a situação estudada, procurando compreender os fenômenos segundo a perspectiva dos sujeitos (GODOY, 1995). Para coletar esses dados, vários métodos e técnicas de pesquisa foram empregados, destacando-se: entrevistas, análise documental, participação direta (em reuniões na empresa) e observação, buscando uma grande variedade de fontes de evidência para construção do estudo de caso. As entrevistas realizadas para o desenvolvimento desta pesquisa ocorreram em data e local previamente agendados (duas entrevistas como mostra a Tabela 2). Para realização das entrevistas, seguiu-se um roteiro previamente elaborado, onde foram direcionadas perguntas específicas procurando focar a inserção do QFD o desenvolvimento de produtos da empresa. As entrevistas foram registradas com o uso de um gravador e, posteriormente, transcritas e analisadas. Esse tipo de entrevista pode ser considerado como semi-estruturada (MARCONI & LAKATOS, 1996), uma vez que segue um roteiro pré-estabelecido, mas o pesquisado tem liberdade para complementar com questões e sanar dúvidas. A técnica de observação direta ENEGEP 2004 ABEPRO 2870

também foi utilizada durante a realização das entrevistas, a fim de verificar as reações dos entrevistados nas entrevistas e também durante o acompanhamento das reuniões de projeto. A participação nas reuniões de projeto teve como objetivo servir como outra fonte de evidências para o estudo de caso, dando oportunidade para obtenção de dados relevantes e significativos que não se encontravam em fontes documentais. Sob a ótica do estudo observacional, também foram analisados documentos da empresa (análise documental), incluindo: manuais da empresa e apresentações internas, além da participação de treinamentos realizados na empresa o que possibilitou um enriquecimento na aquisição dos dados. A Tabela 2 mostra os instrumentos utilizados na coleta dos dados necessários para condução do trabalho. Instrumento Realização Modo de Condução Entrevista 1ª) Novembro de 2002 Roteiros previamente elaborados 2ª) Abril de 2003 Análise Documental Agosto e setembro de 2003 Análise de manuais da empresa e apresentações internas Observação direta Maio a dezembro de 2003 Análise das reações dos entrevistados nas entrevistas Participação em reuniões de Maio a dezembro de 2003 Observação para obtenção de dados projetos Participação em treinamento Outubro e novembro de 2003 Participação como espectadora Tabela 2 - Instrumentos de coleta de dados utilizados em diferentes momentos da pesquisa. 3. Processo de desenvolvimento antes da reestruturação A empresa possui certificação do seu sistema da qualidade pela norma ISO 9001, desde 1994, tendo há algum tempo uma estrutura para desenvolver novos produtos centrado na área de P&D. A empresa desenvolvia produtos antes da reestruturação seguindo os requisitos da norma dentro do requisito "4.4 Controle de Projeto na ISO 9001, versão de 1994. Sendo assim, de certa forma, a empresa já tinha o ambiente necessário para implementar o método do QFD no seu processo de desenvolvimento de produtos. A empresa seguia um fluxograma que determinava a seqüência de etapas de desenvolvimento. Iniciando o processo, eram determinadas as necessidades de mercado, de produção e de P&D. Em seguida, o projeto do produto preliminar tinha como objetivo traduzir as necessidades do cliente/mercado em um conjunto de especificações preliminares, servindo de base para o desenvolvimento do projeto em sua versão final. A seguir, a etapa de viabilidade avaliava aspectos técnico-econômicos disponíveis na empresa. A produção experimental visava obter o filme e avaliar o resultado (produto experimental) em relação aos dados de entrada. Em seguida, acompanhava-se os testes nos clientes válidos para mercado de teste. A fase de consolidação experimental no mercado tinha como objetivo o acompanhamento do filme no mercado, para avaliar alguns aspectos (por exemplo aumento de escala). Na fase de validação do projeto, ocorria a análise crítica final dos resultados do período de consolidação do filme experimental, para, finalmente, obter-se a homologação do produto. O modelo de desenvolvimento de produtos apresentava algumas dificuldades na execução dos projetos. Um dos problemas principais era com relação aos dados de entrada. Geralmente, esses dados eram dispersos e, em algumas ocasiões, identificava-se requisitos adicionais quando o projeto encontrava-se em fase avançada. Para solucionar este e outros problemas houve uma reestruturação na empresa, visando também atender a estratégia de busca da liderança do mercado de embalagens desse tipo (BOPP) na América Latina. ENEGEP 2004 ABEPRO 2871

4. Processo de desenvolvimento após a reestruturação A empresa vêm passando por uma reestruturação do seu processo de desenvolvimento de produtos, a partir de três iniciativas: gestão de portfolio, onde os projetos a serem desenvolvidos pela empresa são escolhidos por prioridades e condições do mercado e de recursos da empresa; introdução de um novo processo de desenvolvimento dos filmes, e implantação de um método para dar apoio no desenvolvimento de novos filmes A Figura 1 ilustra as três iniciativas citadas. Portfolio Processo de Desenvolvimento Banco de idéias Projetos Estudo funcional P&D Projeto SA Proposta Básica Planeja/to Projeto Fase Teste 1 Fase Teste 2 G1 G2 G3 G4 Homologação E1 E2 E3 E4 E5 em espera ativos Legenda: QE - qualidade exigida CQ - características da qualidade MC - modelo conceitual MP - metas do projeto MPCP - matrizes de controle do processo MQ - matriz da qualidade QE e CQ definição das MP MC e MQ revisão das MP MCP validação matrizes 1 validação matrizes 2 Comercialização Figura 1 Gestão de portfolio, processo de desenvolvimento de produtos e QFD. A Figura 1 mostra na parte superior esquerda uma ilustração da gestão de portfolio, onde pode ser visto um banco de idéias candidatas a tornarem-se projetos. Se a idéia não está suficientemente desenvolvida, pode ser necessário um estudo via projeto funcional (de P&D) para verificar a viabilidade técnica de tornar-se um projeto. Em ambos os casos (a partir do banco de idéias ou decorrente do estudo funcional), tem-se uma lista de projetos em espera (não priorizados para serem desenvolvidos de imediato) e uma lista de projetos ativos, ou seja, a carteira de desenvolvimento propriamente dita. Na seqüência, a figura ilustra um dos projetos ( SA ) entrando no processo de desenvolvimento, que ilustra cinco estágios e respectivos gates. É interessante notar que a comercialização do produto (em um mercado de teste, ou seja, em empresas selecionadas para participar do desenvolvimento), inicia-se no estágio 4, ou seja, antes da completa conclusão dos estágios do processo de desenvolvimento. Na parte inferior do processo de desenvolvimento, a figura mostra as diversas atividades do QFD em cada processo de desenvolvimentos. Essa inserção é apresentada mais adiante nesse trabalho. Segundo Cheng (2000), a gestão de portfolio possui três objetivos: alinhamento estratégico dos projetos de desenvolvimento com a estratégia do negócio; maximização do valor do portfolio levando em consideração os recursos disponíveis e balanceamento entre projetos sob critérios diversos. Com relação ao modelo de processo de desenvolvimento, a empresa adotou o stage-gates (ver COOPER, 1993). De acordo com o autor, os stages são as diversas fases do desenvolvimento ENEGEP 2004 ABEPRO 2872

e os gates os pontos de decisão, que funcionam como uma espécie de filtro, que operam como mecanismo de verificação se as atividades previstas para aquela fase foram cumpridas, atuando como pontos críticos para análise do projeto. Uma descrição sobre o conceito e aplicação dos gates pode ser encontrado em Valeri et al. (2001). A empresa optou pela utilização de algumas das ferramentas e métodos para a estruturação da gestão de desenvolvimento de produtos, a qual abrange várias áreas da empresa em um mesmo projeto. Como já citado anteriormente, o QFD é um método de desenvolvimento de produtos, que tem como objetivo definir a garantia da qualidade na fase de projeto, além de identificar e traduzir as exigências dos clientes em características técnicas do produto para atender a essas exigências (AKAO, 1996; OHFUJI, et al., 1997) e esse foi o método adotado. A importância do processo de desenvolvimento de produtos aumentou consideravelmente, tornando o mercado cada vez mais competitivo, lançando produtos com maior rapidez, qualidade e menores custos (VALERI et al., 2000). Nesse sentido, uma importante contribuição para alcançar esses objetivos pode ser obtida por meio da implementação do QFD no modelo de stage-gates. Nesse contexto, a inserção das atividades do QFD no processo de desenvolvimento deve ser investigada mais profundamente, a fim de contribuir para o entendimento de como as atividades do QFD devem estar atribuídas nesse processo e com que intensidade ocorrem em cada estágio do processo. Sendo assim, a seqüência metodológica na utilização do QFD nos projetos deve ser combinada e integrada às atividades de cada estágio de desenvolvimento do produto. 4.1. Modelo do processo de desenvolvimento Como citado anteriormente, a empresa estudada adotou o modelo de stage-gate no seu processo de desenvolvimento de produtos, desde o estabelecimento da idéia até o lançamento no mercado. O modelo consiste em estágios e gates, denominados filtros na empresa, que servem para validar as atividades decorrentes de cada estágio de desenvolvimento do projeto. Essa validação é conduzida por um Comitê de Gestão de Projetos formado por gerentes funcionais (marketing, P&D, comercial, qualidade e produção) e pelo diretor geral da empresa, como tentativa de robustecer o desenvolvimento de produtos na empresa (MIGUEL & TELFSER, 2003). O comitê também teve a preocupação em estabelecer padrões para projetos individuais e possibilitar a priorização dos projetos a serem desenvolvidos, visto que a empresa possui um portfolio com vários projetos a serem desenvolvidos ao mesmo tempo. Visando estabelecer um padrão geral para condução dos projetos e um método para auxiliar na gestão do processo de desenvolvimento de produtos, a empresa identificou o QFD para atingir esses objetivos. A empresa implantou o QFD seguindo o modelo de QFD das Quatro Ênfases (qualidade, confiabilidade, tecnologia, custos), criado por Akao (1996) e divulgado no Brasil por Cheng et al. (1995). O QFD é aplicado de forma mais ampla, utilizando várias matrizes ao longo do processo desse desenvolvimento, a fim de operaciona-lo. A Figura 2 apresenta a inserção do QFD no processo de desenvolvimento de filmes flexíveis na empresa onde o estudo foi realizado. A seguir, os estágios mostrados na figura são descritos. Inicialmente, a primeira atividade no processo de desenvolvimento é a idealização que compreende a existência de um sistema de geração de idéias, que podem ser advindas do mercado ou através de pesquisas baseadas na ciência e tecnologia, que podem resultar em descobertas como inovações, projetos de ruptura ou encomendas e problemas de clientes. Em seguida, ocorre o desenvolvimento de uma proposta básica, com objetivo de apresentar uma idéia de um novo produto para a empresa, onde são fornecidas informações iniciais sobre a qualidade exigida e características da qualidade. O grupo escolhido para os novos projetos de filmes na empresa tem a partir desse ponto um gerente de projeto, ou seja, um líder de projeto ENEGEP 2004 ABEPRO 2873

encarregado pelas responsabilidades de cada um do grupo de projeto e tendo prazos para dar respostas ao Comitê de Gestão de Projetos. O projeto passa então pelo filtro 1, após a análise e aprovação da proposta básica pelo Comitê de Gestão de Projetos, seguindo, caso aprovado, para o estágio de planejamento do projeto. Neste estágio são definidos: os integrantes da equipe que tenham disponibilidade para projeto em questão, metas a serem cumpridas, clientes já identificados e potenciais, estudo de mercado, cronograma, desenho do modelo conceitual do QFD (conjunto de matrizes a serem desenvolvidas) e a 1ª matriz do QFD em uma versão preliminar. Em seguida, o projeto passa pelo filtro 2 para verificar sua continuidade, levantando-se em conta informações técnicas de mercado, disponibilidade de recursos da empresa, retorno financeiro, entre outros. O estágio seguinte, é a primeira fase do desenvolvimento, ou seja é o desenvolvimento do produto e do processo propriamente dito, pela execução do projeto, determinando as especificações necessárias para o produto e processo de fabricação. Nessa fase, são estudadas as diversas alternativas para as especificações. No caso do uso do QFD nesse estágio, ocorre a revisão do modelo conceitual. Nesse estágio, deve ser finalizada a 1ª matriz do QFD, definido o mercado teste, produção do filme, validade dos testes e clientes, realizados testes de laboratórios e de clientes, cumprimento e/ou revisão do cronograma, e finalmente, escolha da alternativa do filme. O filtro 3 corresponde à análise dos resultados da produção desta fase, feita pelo Comitê de Gestão de Projetos. A fase subsequente do desenvolvimento é realizada com a finalidade de promover pequenos ajustes no produto e no processo produtivo após a escolha da melhor alternativa advinda do estágio anterior. Esse estágio compreende o aumento de escala de produção, realização da validação/refinamento das matrizes do QFD, definição final da especificação do produto em relação ao contato com os alimentos, entrada de dados para um data sheet, execução do plano de controle no sistema de informação da empresa, e definição da formulação correta do filme. Em seguida dessa fase, o projeto passa pelo filtro 4 que consiste na análise dos resultados da produção experimental, feita pelo Comitê de Gestão de Projetos. Finalmente, tem-se o último estágio, o de homologação do produto, que é o encerramento da documentação e atualização do banco de dados (listas técnicas, planos de controle, etc). Processo de desenvolvimento QFD Estágios Estágio 1 Estágio 2 Estágio 3 Estágio 4 Estágio 5 Proposta Básica Informações iniciais sobre QE e CQ Filtro 1 Planeja/o do Projeto 1ª versão da Matriz da qualidade e modelo conceitual Filtro 2 Fase Teste 1 Fase Teste 2 Conclusão do Projeto Validação do Modelo e novas versões das Matrizes Filtro 3 Refinamento Filtro 4 Validação e homologação Figura 2 - Inserção do QFD no Desenvolvimento de produtos na empresa (Stage-gate). 4.2. Comparação entre antes e depois da reestruturação Realizou-se uma comparação inicial entre "antes" e "depois" da reestruturação do desenvolvimento de produtos na empresa, sintetizada na ver Tabela 3. ENEGEP 2004 ABEPRO 2874

Antes Depois Estrutura Organizacional para Funcional Matricial Desenvolvimento Equipe de desenvolvimento P&D Multifuncional Métodos utilizados para auxiliar o Nenhum QFD desenvolvimento de produtos (ISO 9001) Gestão de Portfolio Projetos escolhidos de acordo com as prioridades estabelecidas pela gerência Pessoas específicas para avaliar: estratégia, facilidade tecnológica, retorno financeiro Tabela 3 - Comparação entre antes e depois da reestruturação do processo de desenvolvimento de produtos. O sistema de trabalho, relativo ao desenvolvimento, passou de funcional a matricial na gestão de projetos. Essa estrutura matricial permite realizar diversos projetos simultaneamente, aplicando com eficiência as competências das pessoas e os recursos da empresa, baseando-se na formação de equipes temporárias, incluindo áreas diferentes que estejam envolvidas com o projeto. A equipe é formada dependendo das necessidades de cada projeto. Uma pessoa pode participar de uma ou mais equipe ao mesmo tempo. Essas equipes possuem um gerente definido responsável pelo projeto. O método escolhido deveria dar suporte ao processo de desenvolvimento de produtos de forma que as informações fossem direcionadas e a tomada de decisão fosse baseada numa quantificação, dando mais subsídios para escolher a melhor opção de projeto de filme. Para contribuir nessa atividade foi escolhido o QFD. Alguns benefícios alcançados foram alcançados com a reestruturação do processo de desenvolvimento de produtos na empresa e introdução do QFD. Para isso, foram analisadas as listas de benefícios de relatórios internos e artigos publicados (e.g. MIGUEL et al., 2001). A partir dessas informações, foram extraídos os benefícios mais significativos e estes foram apresentados em um treinamento de QFD realizado na empresa em outubro de 2003. O número de participantes desse treinamento foi de 15 pessoas, englobando diferentes áreas da empresa, incluindo: P&D, comercial, produção e laboratório. Os participantes indicaram três principais benefícios alcançados pela empresa considerados mais importantes da lista apresentada com a implantação do QFD. Os benefícios apontados com maior freqüência foram: integração das visões de mercado/produto/processo/mp; nivelamento do conhecimento entre as pessoas do projeto na empresa, melhoramento da qualidade e o limite das especificações, sistematização do processo de desenvolvimento, alcançar maior comprometimento das outras áreas de desenvolvimento e melhorar a comunicação entre as áreas funcionais. Nota-se que, apesar dos benefícios serem inerentes ao uso do QFD, boa parte deles está relacionada ao processo de desenvolvimento da empresa. 5. Considerações Finais A reestruturação do processo de desenvolvimento de produtos, juntamente com a gestão de portfolio e o método QFD encontra-se ainda em andamento. A empresa vem aplicando o QFD há três anos e meio no desenvolvimento de novos produtos no modelo de stage-gate, trazendo, até o momento, resultados positivos e motivação em trabalhar com o método, uma vez que os resultados gerados com sua aplicação são bastante satisfatórios. A evolução do método é visível, mas alguns problemas foram detectados na aplicação do método nos projetos desenvolvidos na empresa. Houve um investimento financeiro pela empresa em relação à adoção do método a fim de melhorar o processo de desenvolvimento de produtos, como por exemplo a contratação de consultoria para disseminar o método do QFD na empresa. ENEGEP 2004 ABEPRO 2875

A introdução do QFD nas fases iniciais do desenvolvimento de produtos busca reduzir o risco de se alcançar conclusões erradas, permitindo que o time do QFD retorne a estágios anteriores pra realizar uma análise; também ajuda a empresa a focar os requisitos dos clientes de maior importância através da priorização. Com relação ao processo de desenvolvimento de novos produtos, a implementação encontra-se quase concluída. Os benefícios alcançados após a reestruturação do processo de desenvolvimento de produtos têm contribuído para desenvolver produtos com maior qualidade atendendo as necessidades específicas dos clientes. Agradecimentos Os autores agradecem o apoio recebido da CAPES pelo apoio para condução da pesquisa. A empresa também merece os agradecimentos pela possibilidade de realização desse estudo, em especial, Aldo Mortara, Mônica Telfser, Roni C. Parri de Campos e José Camilo Luis Neto. Referências AKAO, Y. (1996) - Introdução ao Desdobramento da Qualidade. Belo Horizonte. Fundação Christiano Ottoni. AKAO, Y.; OHFUJI, T.; TOMOYOSHI, N. (1987) - Surveys and reviews on Quality Function Deployment in Japan. Proceedings of the International Conference for Quality Control, Tokyo. p.171 176. CHENG, L. C. (2000) - Caracterização da Gestão de desenvolvimento do produto: Delineando o seu contorno e dimensões básicas. CD ROM do 2º Congresso Brasileiro de Gestão de Desenvolvimento de Produto, São Carlos. CHENG, L.C. et al. (1995) - QFD Planejamento da Qualidade. Editora Líttera Maciel Ltda, Belo Horizonte. CLARK, K.B.; FUJIMOTO, T. (1991) - Product Development performance: strategy, organization and management in the world auto industry. Boston: Havard Business School Press. COOPER, R.G. (1993) - Winning at New Products: Accelerating the Process from Idea to Launch. Reading: Addilson-Weesley Publishing. GODOY, A.S. (1995) - Pesquisa Qualitativa: Tipos Fundamentais. Revista de Administração de Empresas, v. 35, n. 3, p. 25-35. MIGUEL, P.A.C. (2003) - The state-of-the-art of the Brazilian QFD applications at the top 500 companies. International Journal of Quality & Reliability Management, v.20, n.1, p. 74-89. MIGUEL, P.A.C. et al. (2001) - Projeto Piloto de Implantação do QFD para Desenvolvimento de Filmes Flexíveis de BOPP. CD ROM do 3º Congresso Bras. de Gestão de Desenvolvimento de Produtos, Florianópolis. MIGUEL, P.A.C., TELFSER, M. (2003) - Iniciativas em Gestão de Portfolio, Estruturação do Processo de Desenvolvimento e Uso do QFD em uma Empresa de Embalagens. CD ROM do 4º Congresso Brasileiro de Gestão de Desenvolvimento de Produtos, Gramado. MORTARA, A. (2000) - Filmes de Polipropileno Biaxialmente Orientados Evolução e Flexibilidade sem limites. Informação Técnica Votocel, Votorantim. OHFUJI, T.; ONO, M.; AKAO, Y. (1997) - Métodos de desdobramento da qualidade. Belo Horizonte: Fundação Christiano Ottoni. VALERI, S.G. et al. (2000) - Análise da implementação de um gate system em uma indústria fornecedora do setor automotivo. CD ROM do 2º Congresso Brasileiro de Gestão de Desenvolvimento de Produtos, São Carlos. YIN, R.K. (1989) - Case Study Research Design and Methods. Londres: Sage Publications. ENEGEP 2004 ABEPRO 2876