GIBITECA: ENSINO, CRIATIVIDADE E INTEGRAÇÃO ESCOLAR



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Transcrição:

GIBITECA: ENSINO, CRIATIVIDADE E INTEGRAÇÃO ESCOLAR NOGUEIRA, Natania A. S. natanianogueira@yahoo.com.br Resumo As histórias em quadrinhos têm conquistado um grande espaço dentro das escolas. Como um instrumento de ensino, elas estão se tornando instrumentos importantes de introdução dos alunos no mundo da leitura e do conhecimento. O Projeto Gibiteca Escolar, desenvolvido na Escola Municiapal Judith Lintz Guedes Machado, Leopoldina (MG), usa deste instrumento lúdico como uma ponte entre o estudante e o mundo das idéias, da criatividade e dos sonhos, abrindo caminho para a formação de pessoas conscientes do seu papel na sociedade. Palavras-chaves: Histórias em Quadrinhos; Leitura; Ensino Introdução Há algum tempo, o papel do professor das séries mais avançadas do ensino fundamental era limitado a desenvolver o conteúdo com o qual trabalhava na sala de aula história, geografia, matemática, ciências, etc., sem se preocupar com algo fundamental: a leitura e a interpretação. Estas eram habilidades que deveriam se desenvolvidas tão somente nas aulas de português e literatura. No entanto, temos hoje uma realidade muito mais complexa: nossas crianças e jovens lêem pouco e geralmente são incapazes de compreender o que estão lendo. Entendemos que a leitura é a chave para o desenvolvimento do aluno na escola. Através da leitura ele aprende a interpretar melhor o mundo em que vive e a despertar a imaginação e a criatividade. Um aluno/leitor compreende melhor os conceitos abstratos com os quais tem que lidar na sala de aula. Esta habilidade deve ser desenvolvida já na Educação Infantil 1 e durante todo o Ensino Fundamental. Tendo em mente usar a leitura como uma ponte para o conhecimento, foi concebido o Projeto Gibiteca Escolar, na Escola Municipal Judith Lintz Guedes Machado, uma escola de periferia da cidade de Leopoldina (MG), que atende alunos oriundos de famílias de baixa renda. 1 Incluímos aqui a educação infantil pois, mesmo não estando alfabetizadas, as crianças fazem uma leitura do mundo através de imagens e da sua oralidade, sendo portanto a leitura à qual nos referimos um conceito bem mais amplo e abrangente.

175 Os objetivos do projeto são: criar um espaço de aprendizagem para professores e alunos; formar leitores críticos e criativos; promover atividades onde os alunos e mesmo os professores - possam descobrir habilidades e desenvolver competências. Na Gibiteca, alunos e professores têm acesso a um acervo diversificado de HQ s (como chamamos as revistas de Histórias em Quadrinhos) e podem usá-lo para leitura durante os horários de funcionamento da escola. O Projeto Gibiteca Escolar também trabalha positivamente a auto-estima de professores e alunos, mostrando que mesmo escolas com poucos recursos podem oferecer grandes oportunidades e estimular todos a sonharem com um futuro promissor. A leitura de gibis é uma atividade prazerosa e que aparentemente está dissociada das tarefas escolares. As HQ s são capazes de promover a interdisciplinaridade entre os diversos conteúdos curriculares, ajudam a promover a prática da leitura e aproximam as crianças de outros tipos de arte, como as artes plásticas, o teatro e a música, além, é claro, de serem importantes no processo de alfabetização. Os alunos aprendem que estudar pode ser divertido e se tornam mais receptivos aos diversos conteúdos. Nas próximas linhas vamos mostrar como uma gibiteca pode mudar a rotina de uma escola, a forma como ela pode integrar alunos, professores e funcionários em torno de atividades lúdicas que estimulam a criatividade e abrem as portas para novos horizontes, novas perspectivas. O papel das HQ s no desenvolvimento da leitura A escola pública nas palavras de GONÇALVES não exclui por incompetência intelectual, mas porque faz parte da sua constituição 2. Nossa escola foi concebida como um instrumento de força, de poder pelas nossas elites. Talvez não possamos nunca romper totalmente com esse paradigma, mas creio que podemos fazer da escola igualmente um espaço de reação, através de um ensino voltado para o desenvolvimento e valorização do indivíduo, do sujeito histórico. É possível transformar, mudar esse quadro de exclusão ou, na pior das hipóteses, tentar minimizá-lo. Citando Cabrini: 2 GONÇALVES, Jussemar Weiss. O campo da história na Escola Pública. In: Qual história? Qual ensino? Qual cidadania? Porto Alegre: ANPUH, Ed. Unisinos, 1997, p. 77

176 Não temos uma fórmula mágica, uma solução pronta sobre o conteúdo a ensinar, mas sim uma proposta de como trabalhá-lo. O conteúdo que você irá desenvolver na sua classe, ou seja, o seu objetivo de estudo, só pode ser determinado por você, em sua atividade profissional concreta, a partir dos dados da realidade da sua escola, seu período letivo, seus alunos[...] 3 O ensino no Brasil não vai bem. É um fato inegável. As novas gerações não estão letradas. Nossos jovens não criaram o hábito da leitura e por isto possuem uma grande dificuldade em fazer associações, em interpretar textos simples, em compreender o que pedem os professores, o que está escrito nos livros. Desta forma a aprendizagem acaba ficando comprometida e o fracasso se não se faz visível nos índices de retenção escolar, aparece claramente nas avaliações globais realizadas pelo Estado, devido à incapacidade no ato de ler. Saber ler e escrever não é simplesmente o ato mecânico de juntar sílabas e emitir sons. A leitura é uma atividade complexa que exige do leitor a capacidade de interpretar o texto; de identificar e compreender o contexto no qual ele está inserido; de identificar idéias e signos nele contidos. Nas palavras de Platão e Fiorin: Nenhum texto é uma peça isolada, nem a manifestação da individualidade de quem o produziu. De uma forma ou de outra, constrói-se um texto para, através dele, marcar uma posição ou participar de um debate de escala mais ampla que está sendo travado na sociedade. Até mesmo uma simples notícia jornalística, sob a aparência de neutralidade, tem sempre uma intenção por trás. 4 As Histórias em Quadrinhos possuem uma linguagem simples e de fácil compreensão para os alunos, que em geral não oferecem resistência a seu uso, uma vez que são relacionadas a uma forma de entretenimento e lazer. Segundo Flávio Calazans, os quadrinhos quando são projetados em sala de aula, como recurso para complementar o ensino de determinado conteúdo, prendem mais a atenção dos alunos do que outros recursos, como o vídeo, por exemplo, porque permitem que ocorra uma leitura simultânea da página, podendo o leitor captar a ação em todos os seus tempos. 5 Alves também tem uma visão positiva a respeito do uso dos quadrinhos nas escolas, com forma de incentivar o gosto pela leitura. Segundo ele: 3 CABRINI, Conceição et. alii. O Ensino de História: revisão urgente.- 5. ed. São Paulo: Brasiliense, 1994, p.32 4 FIORIN, José Luis, SAVIONI, Francisco Platão. Para entender o texto: leitura e redação. 2 a edição São Paulo: Editora Ática, 1991, p. 13. 5 CALAZANS, Flavio Mario de Alcântara. História em quadrinhos na escola. São Paulo: Paulus, 2004. p. 11.

177 A leitura de histórias em quadrinhos pode contribuir para a formação do gosto pela leitura porque ao ler histórias em quadrinhos a criança envolve-se numa atividade solitária e não movimentada por determinado período de tempo, que são características pouco freqüentes nas atividades de crianças pré-escolares ou no início da escolarização. Também porque, estando mais próximas da forma de raciocinar destas crianças, elas podem mais facilmente lê-las, no sentido de retirar delas significados, o que seria menos provável com outros tipos de leitura. Além disso, pode-se esperar que uma criança, para quem a leitura tenha se tornado uma atividade espontânea e divertida, esteja mais motivada a explorar outros tipos de textos (com poucas ilustrações), do que uma outra criança para quem esta atividade tenha sido imposta e se tornado enfadonha. 6 O hábito da leitura de quadrinhos, além de ser saudável, pode estimular o prazer pela leitura. Em geral são os maus leitores que criticam as histórias em quadrinhos. Segundo DJota Carvalho, várias pesquisas sobre a relação entre quadrinhos e educação já foram realizadas Uma delas encomendada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), em 2001, comprovou que: [..]. alunos que lêem gibis têm melhor desempenho escolar do que aqueles que usam apenas o livro didático entre os estudantes da 4ª série da rede pública, a HQ aumenta significativamente a performance do aluno: entre os que acompanham quadrinhos, o percentual das melhores notas nas provas aplicadas foi de 17,1%, contra 9,9% entre os que não lêem. Mais ainda, esta pesquisa mostra que professores que lêem revistas em quadrinhos obtêm melhor rendimento dos alunos, pois conhecem melhor o universo dos estudantes e se aproximam deles usando exemplos deste universo como paradigma para as aulas. A pesquisa mostra, entre outras coisas, que, entre os alunos da 4ª série cujos professores lêem HQs, a proficiência em leitura é mais alta do que entre aqueles cujos professores não têm o hábito de ler gibis. Na rede pública, 36% dos alunos de leitores de gibis têm proficiência média alta e alta, contra 31,5% dos que não lêem. 7 Uma das vantagens de se trabalhar com histórias em quadrinhos é que elas não possuem uma faixa etária exata: há quadrinhos para todas as idades, da educação infantil até a universidade. Na Europa, por exemplo, ensina-se latim usando-se Asterix. Asterix e outras HQ s européias são publicadas em latim com esta finalidade e com uma tiragem relativamente grande. O preconceito que existe com relação aos quadrinhos é construído em cima da idéia de que eles são coisa de criança ou, em alguns casos, coisa de menino. Há HQ s de todos os gêneros e para todos os gostos. Algumas são adaptações de clássicos da literatura, outras possuem um argumento tão complexo que são indicadas para adultos com um certo grau de conhecimento literário. 6 ALVES, José Moysés. Histórias em quadrinhos e educação infantil. Psicol.cienc. prof. Brasília, vol..21, num.3, set. 2001. Disponível em: < http://scielo.bvs-psi.org.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=s1414-32001000300002&lng=pt&nrm=is>. Capturado em: 05/02/2006. 7 CARVALHO, DJota. A educação está no gibi. Campinas, SP: Papirus, 2006. p. 38-39.

178 As histórias em quadrinhos são, portanto, uma excelente fonte de trabalho e pesquisa para todos os educadores. Começando pela educação infantil, as HQ s abrem novos horizontes de aprendizagem para as crianças, pois elas descobrem que, mesmo sem saber ler, podem entender a história através dos desenhos. É bom lembrar que, embora as HQ s tenham elementos característicos, eles não precisam estar todos presentes ao mesmo tempo. HQ s que possuem apenas imagens cumprem seu papel se são capazes de passar a mensagem de seu autor. Reproduzindo contextos e valores culturais, as histórias em quadrinhos oferecem oportunidades para as crianças ampliarem seus conhecimentos sobre o mundo social. Porém, seja pelos assuntos veiculados, seja pela forma como os temas são tratados, as histórias em quadrinhos foram alvo de muitas críticas e, lê-las dentro das escolas, foi por muito tempo considerada uma atividade clandestina e sujeita a punições. 8 Como professora de História, tenho feito algumas experiências com o uso de HQ s com meus alunos, tanto no Ensino Fundamental, quanto no Ensino Médio. O estudante deve aprender a trabalhar as informações que adquire através da leitura. Uso os quadrinhos como uma forma de expressão do aluno que, desafiado a exercitar sua capacidade criativa, acaba por criar seu próprio conhecimento. As HQ s ajudam os estudantes a compreender melhor o conteúdo estudado em sala de aula. Testes psicológicos aplicados em crianças demonstram que a informação quando transformada em História em quadrinhos é compreendida num tempo assustadoramente pequeno. Prova disso está nos próprios livros escolares de hoje que não passam de verdadeiros gibis didáticos, tal o número de ilustrações que possuem. 9 Os bons resultados obtidos com meus alunos foram a motivação para que um projeto ainda mais ambicioso fosse então concebido: a criação de uma gibiteca 10. Não apenas um espaço dentro de uma biblioteca, mas um espaço exclusivo para armazenar e manusear HQ s. Propus, então, à diretoria da escola Municipal Judith Lintz Guedes Machado e aos colegas professores da Educação Infantil e do Ensino Fundamental que aderissem ao projeto. Por 8 ALVES, José Moysés.Op. Cit., 2001. 9 SILVA, Diamantino da. Quadrinhos para Quadrados. Porto Alegre; Bels, 1979. p. 106 10 Grosso modo, a gibiteca é um espaço destinado ao armazenamento e divulgação de Histórias em Quadrinhos, que pode ser público ou não. Nas gibitecas os leitores têm acesso a uma enorme variedade de quadrinhos (terror, ficção científica, humor, aventura, etc.) e nelas este tipo de material literário pode receber um tratamento apropriado, que inclui a conservação de exemplares, de publicação recente, ou aqueles considerados raros. A primeira gibiteca inaugurada no Brasil foi a Gibiteca de Curitiba, em 1982. A maior gibiteca do Brasil é mantida por um organismo do Estado: a Gibiteca Henfil. Órgão do Departamento de Bibliotecas Infanto-Juvenis da Secretaria de Cultura do município de São Paulo, ela foi inaugurada em 1991 e conta com o maior acervo do país, 100.000 exemplares.

179 meio da gibiteca, desenvolveríamos atividades em todas as áreas, incentivando a leitura, a produção de textos e arte por parte dos alunos. A idéia foi bem aceita e assim nasceu a Gibiteca Escolar. A Gibiteca como forma de integração escolar Criar a Gibiteca foi, antes de mais nada, um exercício de integração. Toda a escola se envolveu no projeto. Alunos, professores, direção, funcionários da limpeza, especialistas e funcionários técnico-administrativos. O processo de instalação da gibiteca durou cerca de um ano. Primeiro conseguimos o espaço físico, depois começamos a pedir e receber doações de HQ s. As doações foram feitas por colecionadores particulares, professores, alunos, gibitecas 11 e editoras. Por época da inauguração, em 11 de maio de 2007, tínhamos um acervo aproximado de 1600 exemplares, em vários formatos e gêneros. Mas não basta simplesmente criar o espaço na escola, é preciso também mostrar que ele é funcional e que pode ajudar no trabalho de todos os professores. Por esta razão organizamos o I Seminário sobre Quadrinhos, Leitura e Ensino 12. O Seminário foi organizado pela escola com o apoio da Secretaria Municipal de Educação, tendo como público-alvo professores da educação infantil e do ensino fundamental. O objetivo era demonstrar que o uso das histórias em quadrinhos podia ser um caminho para o processo de ensino/aprendizagem e que elas poderiam ser usadas em todos os conteúdos, não sendo apenas prerrogativa das séries iniciais. O seminário atendeu a 230 professores das redes municipal de ensino de Leopoldina, pública e privada de Leopoldina. A Gibiteca é um apoio para o professor que deseja diversificar as suas aulas. Ela não garante por si só o êxito do aluno, mas ela fornece a ele a possibilidade de ampliar seus horizontes e de desenvolver sua capacidade de ler. Por outro lado, ela também age diretamente na auto-estima dos professores. Eles passam a dar mais valor ao seu trabalho e a se sentirem também valorizados. O professor redescobre o prazer da leitura e, também, o prazer de ser um profissional do ensino, um educador. O acervo diversificado permite que a gibiteca seja um grande laboratório de ensino/pesquisa. Possui HQ s de vários gêneros (humor, suspense, históricas, ficção fantástica, etc.) e até raridades como o Gibi n. 01 e diversas HQ s da EBAL, publicadas na 11 A Gibiteca da USP, através do professor Waldomiro Vergueiro fez importantes doações para a Gibiteca Escolar, ainda no ano de 2006. 12 O I Seminário sobre Quadrinhos, Leitura e Ensino foi realizado no dia 18 de maio de 2007 e teve a participação dos professores: Waldomiro Vergueiro (USP), Octavio Aragão (UFES), Arthur Soffiat (UFF) e Valéria Fernandes (Colégio Militar de Brasília).

180 década de 1970. Os alunos, principalmente as crianças dos anos iniciais, sentem-se atraídos pelo ambiente despojado e alegre da gibiteca, onde eles podem desenhar, deitar no tapete em meio a almofadas e transformar a leitura numa forma prazerosa de lazer. Para os adolescentes, ela se torna igualmente um lugar de descontração, principalmente para meninos e meninas que gostam de desenhar e usam o desenho como uma forma de expressão de seus sentimentos e suas idéias. As HQ s estimulam esta habilidade e acabam transformando o desenhista em leitor. A gibiteca age como um canalizador de sonhos. Ela transporta os leitores a um mundo de fantasia do qual ele estava até então alienado. Muitas de nossas crianças nunca tiveram em sua casa uma HQ. Entre os adultos que estudam no EJA (Educação para Jovens e Adultos) poder ler uma história em quadrinho na escola é muitas vezes vivenciar uma atividade da qual foram excluídos durante sua infância, seja por motivos econômicos, seja pela cultura familiar ou simplesmente por não saberem ler e escrever. Em um artigo intitulado Educar é fazer sonhar 13 Francisco CARUSO e Maria Cristina Silveira de FREITAS afirmam que educar depende da capacidade de fazer o aluno sonhar e afirmam que despertar nele a criatividade é a melhor forma de prepará-lo para os desafios da vida, pois no mundo moderno ela é necessária para a sobrevivência. Atrevo-me a acrescentar que, além de fazer o aluno sonhar, é preciso fazer o professor sonhar junto com ele. As Primeiras Experiências Há na gibiteca um espaço reservado para o professor, onde ele pode dispor de periódicos e livros que versam sobre o uso das HQ s na sala de aula e, também, relatos de experiências que já foram realizadas na escola. Além de material impresso, contamos com textos digitalizados, produzidos por educadores e pesquisadores de todas as partes do país, centenas de tirinhas e HQ s digitalizadas. Os professores são estimulados a conhecerem cada vez mais o universo dos quadrinhos para que, desta forma, eles possam compreender melhor o próprio universo dos seus alunos leitores e, ao mesmo tempo, ter mais segurança para usar este material na sala de aula. Alguns destes recursos estão sendo ainda timidamente utilizados, pois os professores, em sua esmagadora maioria, ainda estão participando de um lento processo de inclusão digital. Entretanto, o simples fato da Gibiteca estar oferecendo meios ao professor de 13 CARUSO, Francisco, FREITAS, Maria Silveira de. Educar é fazer sonhar. Princípios, São Paulo, Vol. 83, p., 2006.

181 ingressar no mundo da informática já é um grande estímulo para o trabalho. Além disto, neste primeiro momento os professores também estão sendo apresentados aos quadrinhos. Para trabalhar com este recurso é preciso entender como ele é produzido. Desta forma preparamos para os professores da Educação Infantil e dos anos iniciais do Ensino Fundamental oficinas de quadrinhos. Nestas oficinas que também foram preparadas para alunos entre 11 e 15 anos -, eles aprendem o processo de elaboração de uma HQ e a decifrar e usar os elementos que a compõe, tais como balões, metáforas visuais, recordatórios, etc. Segundo Nágila Caporlingua GIESTA, da Fundação Universidade Federal do Rio Grande - FURG, que trabalha HQ s e educação ambiental, vivemos em uma sociedade cada vez mais escrita, onde a leitura é uma atividade de integração. Sendo assim, as HQ s são um recurso a mais na inserção das crianças no mundo das letras, dependendo do professor encontrar o caminho para introduzir o aluno neste universo. Citando Giesta: As possibilidades das histórias em quadrinhos, como recurso no currículo escolar, são inúmeras, dependendo do conhecimento e da habilidade profissional do professor para diversificar, questionar e provocar a busca da informação destacada pelo leitor. 14 Aos poucos estão surgindo experiências que vão apresentando bons resultados no uso dos quadrinhos na sala de aula, através da Gibiteca Escolar da Escola Municipal Judith Lintz Guedes Machado. Vamos destacar, neste primeiro momento, três iniciativas. A primeira é a da professora de série inicial Maria de Fátima Alves que desenvolveu uma pequena oficina de HQ s com alunos da escola, em diversos estágios de aprendizagem, que freqüentam dos anos iniciais do Ensino Fundamental, para os quais ministra aulas de reforço. São meninos e meninas de idades variadas com quem ela resolveu fazer um trabalho motivador: estudar sobre folclore produzindo uma HQ. Os alunos receberam todas as informações sobre o tema, necessárias para compor um roteiro razoavelmente coerente e depois receberam noções básicas de como fazer uma HQ. A professora participou de uma das oficinas que tivemos na escola, para professores, e resolveu exercitar suas recém-adquiridas habilidades com estes alunos. Ela avaliou o trabalho levando em conta o conteúdo e o uso correto de elementos que compõem uma HQ (como balões, metáforas visuais, etc). Segundo a professora, o trabalho de produção de HQ s foi estimulante pois incentivou-os a usar da criatividade, transformando um trabalho escolar em uma atividade lúdica, prazerosa. 14 GIESTA, Nágila Caporlíngua. Histórias em quadrinhos: recurso no ensino e na investigação educacional In: XIII Encontro Nacional de Didática e Prática de Ensino, Recife/PE. Anais do XIII ENDIPE, 2006.

182 Numa segunda experiência, a professora Roseane Peres Rocha decidiu tornar as avaliações de matemática uma gostosa brincadeira para os alunos da 5ª série do Ensino Fundamental. Ela está utilizando tirinhas da Turma da Mônica para montar problemas matemáticos e desafiando os alunos a fazerem o mesmo. Esta experiência foi colocada em prática nos meses de junho e julho e a professora dará continuidade ao trabalho durante o resto do ano letivo, uma vez que os resultados têm sido positivos. Segundo a professora, os alunos prestam muito mais atenção aos problemas quando eles são apresentados nas tirinhas. Ela ainda destaca a preocupação dos alunos com pequenos detalhes quando preenchem os balões: "Eles colocam a fala errada do Cebolinha e sublinham as palavras que estão erradas. Roseane dá uma dica: ela usa os quadrinhos com balões em branco que ela retira do site http://www.4shared.com/. Ela vai em shearch files e digita a palavra quadrinhos. Lá ela encontra diversos documentos em word e pdf sobre o assunto e seleciona o material que usa em suas aulas. A própria professora se sente estimulada a montar suas atividades. O desafio serve como estímulo para o trabalho. A terceira experiência que iremos descrever é da professora de língua portuguesa, Mary Ângela Carraro Dibo que, preocupada com os péssimos resultados que estava obtendo com alunos da 6ª série, nas primeiras avaliações do 2º bimestre (muitos erros de ortografia, interpretação, etc) resolveu mudar a rotina das suas aulas. Uma vez por semana divide os alunos em dois grupos. Uma metade fica na biblioteca e a outra é encaminhada à gibiteca, sendo que em cada semana os grupos se alternam. Lá os alunos fazem uma aula de leitura livre. A experiência teve início em junho/2007 e também deve se estender até o final do ano letivo. Os resultados estão sendo claramente visíveis. Além dos alunos terem melhorado seu desempenho nas aulas e nas avaliações, até a disciplina da turma - que tem dado muitos problemas desde o início do ano - está aos poucos melhorando. A professora destaca que os alunos preferem as aulas na gibiteca pelo ambiente agradável e despojado, diferente da biblioteca, onde eles ficam sentados em cadeiras e mesas. A professora observa que na biblioteca os alunos folheiam livros e muitas vezes não os lêem. Já na gibiteca a atenção com a leitura é bem maior. Ela assinala que o apelo visual das HQ s é um fator importante, pois o desenho prende a atenção e mesmo que o aluno "pule" algumas falas, ele consegue entender a história graças à leitura das imagens. O interesse deles pela leitura está levando-os, também, a ter novas perspectivas e arriscar novas experiências de ensino. Na oficina de quadrinhos que foi realizada na escola no dia 21 de junho de 2007, cerca de metade dos alunos presentes eram desta turma. Meninos e meninas que normalmente não

183 se sentem muito motivados a freqüentarem a escola vieram fora do seu turno de aula e fizeram aproximadamente três horas de oficina de quadrinhos. Uma grande vitória para o projeto, para os alunos e, principalmente, para a professora, que está apostando na leitura para formar estudantes mais interessados e cidadãos mais informados. A professora já trabalhava com quadrinhos em suas aulas, na forma de atividades. Usando tirinhas do Snoopy (personagem de Charles Schulz) ela propõe exercícios que misturam desde questões gramaticais (identificar locuções verbais, vocativos e onomatopéias) até interpretação. Segundo Flávio Calazans 15 o limite do uso dos quadrinhos está no limite da criatividade do professor. É ele que sabe avaliar a melhor forma de utilizar as HQ s com seus alunos. Alguns autores sugerem que os quadrinhos podem ser trabalhados de três formas básicas: a) através da análise critica da história; b) incentivando a criação de histórias em quadrinhos pelos próprios alunos; c) utilizando os quadrinhos como um meio de expressão e conscientização política. As parcerias Faz parte deste projeto a busca de parcerias com membros da comunidade e com organizações governamentais e não-governamentais. O Projeto Gibiteca tem sido divulgado por meio eletrônico através de um blog 16. Nele são registradas as experiências realizadas pelos professores, as atividades promovidas pela gibiteca e disponibilizados textos sobre HQ s. Recebemos a colaboração de profissionais ligados à área, através de pequenos artigos e, é claro, os comentários deixados pelos leitores e os resultados das enquetes que realizamos ocasionalmente. Alguns grupos já fizeram contatos conosco através do site e nos ofereceram, além de doações, apoio para nossas atividades. Entre estas pessoas e instituições temos educadores, ilustradores, editoras, quadrinistas, escritores, colecionadores, enfim, pessoas que se interessam pela divulgação das HQ s nas salas de aula e que acreditam na sua função educativa. O uso da internet tem sido uma estratégia importante, seja como forma de divulgar o trabalho realizado na Gibiteca, seja como canal de comunicação com outros profissionais, possibilitando a troca de experiências e informações. 15 CALAZANS, Op. Cit. p. 17 16 www.gibitecacom.blogspot.com

184 Em âmbito local, estamos firmando parcerias importantes com o Comitê de Democratização da Informática (CDI) e com o Centro Federal de Educação Tecnológica (CEFET/Uned-Leopoldina), para um trabalho de inclusão digital de nossos alunos e professores. Conseguimos, através de uma campanha, a doação de diversos computadores usados para a Gibiteca. Nestes aparelhos os alunos aprendem a usar os recursos básicos de informática, podem ler HQ s e participar de oficinas de quadrinhos através do uso do programa HagaQuê 17. Este pequeno laboratório ainda está em fase de instalação e seu uso ainda é limitado. O CEFET e o CDI nos fornecem auxilio técnico através de estagiários e ainda ajudam na manutenção dos aparelhos. Além destas parcerias, temos também o apoio da Secretaria de Estado de Educação de Minas Gerais (SEE/MG) através da 19ª Superintendência Regional de Ensino de Leopoldina e da Secretaria Municipal de Educação, que são nossas parceiras na realização de eventos voltados para professores. Para 2008 já estamos organizando o II Seminário sobre Quadrinhos, Leitura e Ensino ainda sem data prevista -, focado no ensino de ciências e matemática através dos quadrinhos. Conclusão Para muitas pessoas que tomam conhecimento do projeto, usar as HQ s nas escolas, como instrumento de ensino pode parecer uma novidade. Mas não é bem assim. Já existem no Brasil e mesmo no exterior várias iniciativas de aproximar o leitor jovem ou adulto das histórias em quadrinhos. 18 No Brasil há gibitecas espalhadas por várias cidades do país, mas ainda são em número reduzido. Embora as HQ s sejam uma mídia popular, ainda há quem restrinja o espaço que elas ocupam como forma de leitura, ensino e comunicação. Com o projeto Gibiteca Escolar estamos também combatendo este preconceito e mostrando, na prática, que o ato de ler é livre, só pode fazer bem e que o leitor não tem idade. Se à primeira vista o projeto parece um tanto ambicioso, posso afirmar com toda a segurança 17 HagáQuê é um software, um editor de histórias em quadrinhos com fins pedagógicos desenvolvido na Unicamp. O HagáQuê foi desenvolvido de modo a facilitar o processo de criação de uma história em quadrinhos por uma criança ainda inexperiente no uso do computador, mas com recursos suficientes para não limitar sua imaginação. E, como resultado do crescente uso por pessoas com necessidades especiais, o software vem passando por um processo de redesign visando melhorar sua acessibilidade. Para mais informações acesse o site http://www.nied.unicamp.br/~hagaque/ 18. Em Portugal, por exemplo, temos a Bededeteca de Lisboa (lá as HQ s são chamadas de banda desenhada, nos países de língua francesa elas são as bande dessinées), na França há no Museu de Angoulème a Fanzinothèque de Pottiers Criada em 1989 por iniciativa do Conseil Communal des Jeunes de Poitiers, a Fanzinoteca desenvolve suas atividades em duas direções: a documentação e o patrimônio de um lado e organização de eventos de outra. Ela funciona como uma grande empresa e classifica e arquiva toda produção amadora (música, HQ s, literatura, etc.) Ela possui a disposição do público um fundo de mais de 50.000 documentos e publicações. São organizadas de 2 a 3 exposições anuais deste material. E é a única fanzinoteca do mundo que mantém atividades constantes.

185 que ele não está além da capacidade de qualquer educador verdadeiramente comprometido com seu trabalho. Grandes projetos começam com pequenos passos. Se a escola não possui uma sala para que se monte uma gibiteca, ela pode ocupar um pequeno espaço na biblioteca ou mesmo num armário dentro da sala de aula. O acervo pode ser formado pelos próprios alunos, que podem ler as HQ s em sistema de rodízio. O professor pode dar aos alunos a responsabilidade de reformar e conservar as HQ s do grupo e apoiar, por exemplo, a produção de fanzines 19. Com o tempo, os envolvidos no trabalho percebem que as aulas se tornaram diferentes. Os alunos se sentem responsáveis e ganham mais confiança. Os professores sentem-se motivados a trabalhar mesmo quando as condições não são boas, quando faltam recursos e o salário é baixo. Encontram prazer em educar porque voltam a sonhar. Eles começam a notar o interesse dos alunos, mesmo daqueles mais rebeldes em participar das aulas. Pode parecer que o uso de HQ s e a criação de gibitecas nas escolas esteja aqui sendo apresentado como um remédio milagroso para o ensino. Não é esta a nossa intenção. Colocar uma gibiteca ou promover pequenos projetos e adaptar o uso dos quadrinhos nas salas de aula é uma das várias propostas que a escola pode acolher a fim de valorizar o ensino, seus alunos e seus professores. Esta é a experiência que tenho vivenciado com o projeto Gibiteca Escolar. Em pouco tempo de funcionamento, ela tem despertado na escola o desejo de ser melhor, de ir ao encontro de novos desafios e a ser cada vez mais autônoma. Nossos alunos são criados em comunidades carentes onde a realidade é dura. Muitos vão à escola porque lá eles encontram um prato de comida e um copo de leite. Agora eles estão encontrando também um espaço para sonhar, para expressar suas idéias e para desenvolverem habilidades que nem mesmo sabiam que existiam. Nossas expectativas são as melhores possíveis, dado o interesse dos professores e a ansiedade demonstrada pelos nossos alunos, dos mais jovens aos mais velhos. Mas sabemos que existem muitos obstáculos que deverão ser vencidos. Estamos promovendo pequenos cursos e eventos envolvendo toda a comunidade escolar e colegas de outras escolas tentando divulgar a leitura e o uso das HQ s nas salas de aula, assim como os benefícios de se ter uma gibiteca. Sabemos que há resistências entre professores e que há vícios e tabus a serem superados, mas acredito que com o tempo e com esforço em equipe, estaremos mudando 19 Fanzines são HQ s amadoras, produzidas muitas vezes de forma artesanal e que são vendidas ou distribuídas diretamente por seus autores.

186 muito mais do que a forma de aprender, mas também de se relacionar com colegas e alunos na escola. Mais do que um instrumento de ensino, a gibiteca é um instrumento de união, agrupando em torno de si um corpo docente que pode crescer não apenas profissionalmente, mas também em sua auto-estima, o que contribui para a qualidade do ensino e do ambiente escolar. REFERÊNCIAS ALVES, José Moysés. Histórias em quadrinhos e educação infantil. Psicol.cienc. prof. Brasília, vol..21, num.3, set. 2001. Disponível em: < http://scielo.bvspsi.org.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=s1414-32001000300002&lng=pt&nrm=is>. Acesso em: 05/02/2006. CABRINI, Conceição et. alii. O Ensino de História: revisão urgente.- 5. ed. São Paulo: Brasiliense, 1994. CALAZANS, Flavio Mario de Alcântara. História em quadrinhos na escola. São Paulo: Paulus, 2004. CARVALHO, DJota. A educação está no gibi. Campinas: Papirus, 2006. CARUSO, Francisco; FREITAS, Maria Silveira de. Educar é fazer sonhar. Princípios, São Paulo, Vol. 83, p., 2006. FIORIN, José Luis; SAVIONI, Francisco Platão. Para entender o texto: leitura e redação. 2. ed. São Paulo: Ática, 1991. GIESTA, Nágila Caporlíngua. Histórias em quadrinhos: recurso no ensino e na investigação educacional In: XIII Encontro Nacional de Didática e Prática de Ensino, Recife/PE. Anais do XIII ENDIPE, 2006 GONÇALVES, Jussemar Weiss. O campo da história na Escola Pública. In: Qual história? Qual ensino? Qual cidadania? Porto Alegre: ANPUH, Ed. Unisinos, 1997. SILVA, Diamantino da. Quadrinhos para Quadrados. Porto Alegre: Bels, 1979.