3 de Abril de 2019 Relatório V_S2019 (36) As consequências das medidas do BP e o reflexo nos mercados ArrowPlus (www.arrowplus.pt) Caro leitor, É inevitável voltar a falar dos mercados, numa altura em que se notam mudanças e em que o INE divulgou alguns dados sobre o último ano. Numa altura em que não consigo ver uma real correcção em Lisboa e Porto, eis que finalmente conseguimos ver os efeitos das regras do BP em Julho do ano passado, nomeadamente no que diz respeito a taxas de esforço, capitais próprios, etc. O ano passado, se bem se recorda, foi de loucos:
Finalmente ficámos a saber que em 2018 transaccionaram-se 24.1 mil milhões de euros em imobiliário, um valor recorde (e por muito) desde 2009! E sempre que falhei em bolha vinham agentes, como abelhas, dizer que era tudo infundado. E alguns dados: - Lisboa ficou com quase 50% deste valor! Humm... - Este valor é quase o dobro de 2009 e quase 20% mais que 2017. Humm... - Foram transaccionados quase 180.000 imóveis. Com um total de 24.1 mil milhões, dá um preço médio de 134 mil euros por imóvel. Humm...
- A média de descida de preço entre o preço de listagem e escritura foi de quase 15,5%. Bolhas? Nem pensar nisso, diziam! E toda a gente acha estes parâmetros sustentáveis? É que se não forem... chamamos a isso bolha. Tirando o pós-crise, nesta recuperação económica, entre 2013 e 2018, o valor do imobiliário em Portugal cresceu 46%. Neste dado em concreto, nada de mais. Mas este dado não se refere a Lisboa e Porto, mas sim ao país inteiro! OK, havia muitos indícios que só não eram conhecidos. E agora, será altura de comprar, então? O mercado está a arrefecer e a olhos vistos, desde 1 de Janeiro:
Pudera, 1) com os preços em vigor e 2) até eu tenho dificuldade em me financiar nos termos do costume. É que agora temos regras diferentes. É claro que não estou a dizer que não consigo obter crédito. Mas simplesmente os processos são muito mais complicados e as condições piores que aquelas que havia no ano passado.
Se por um lado as taxas de juro estão boas e compensa fazer lock (expressão usada para trancar uma dada taxa numa altura boa e permanecer com ela por muito tempo), agora tem sido mais dificil financiar. A APEMIP tem vindo a emitir uma opinião muito ligada à falta de habitações para a classe média. Reconhecendo eu que é um problema nalguns sítios muito específicos de Portugal não acho que seja isso que tem vindo a arrefecer o mercado, mas sim o financiamento muito mais complicado. Mas vamos por partes. A falta de habitação (que só se dão conta pelas rendas altas?) Várias instituições têm vindo a apontar para esta lacuna de habitação e dizem que mais produto resolveria o problema. Olhando de frente e superficialmente está tudo correcto. A grande questão é que os preços pornográficos de rendas, situamse praticamente em 4 pontos no país. Pelo resto do país, as rendas estão em linha com os rendimentos (e em vez de pedirmos rendas mais baixas devemos pedir/trabalhar para ter rendimentos mais altos). Ora olhemos para as rendas em Lisboa:
As rendas mais baixas em Lisboa são o dobro do valor da média do país! E os rendimentos não companham este factor! Ora, mais produto até pode resolver (parte d) o problema, mas convenhamos: não resolve tudo nem é a solução óbvia. Segundo o INE, no segundo semestre do ano passado, os preços das rendas subiram quase 10% (não vejo nenhum sítio do país com metade ou um terço dessa inflacção...). A solução mais óbvia é sim criar condições para que o mercado de arrendamento floresça e que arrendar uma casa seja 20% mais barato que a comprar. Vivemos hoje tempos do não-não, nos grandes centros. Não dá para arrendar, porque os preços estão loucos, alavancados pela recuperação económica recente e pelo AL, essa galinha dos ovos de ouro. Não dá para comprar, porque o financiamento encolhe e complica (e pouca
gente tem o dinheiro para dar de entrada e é isso que se passa nos mercados mais maduros, como o alemão ou americano)... Agora uma dica: ou é de mim ou esta onda louca de casas em Lisboa (deixe-me só colocar esta imagem...) para o AL irá resolver esse problema? O AL não durará para sempre, pelo menos nestes níveis... e quando o AL arrefecer e os imóveis entrarem todos no mercado de arrendamento tradicional? Comprar hoje a Lisboa, com os preços em máximos e o perigo do AL abrandar é... potencialmente loucura? Financiamento O financiamento tem caído a pique, o que reduz muito o número de venda de casas e por conseguinte o preço das mesmas. Óptimo para o mercado corrigir, embora esta seja quase uma medida sintomática e não uma correcção estrutural.
O Banco de Portugal introduziu medidas que eu aplaudi, pelo perigo de grande bolha, tais como: - Análise mais séria da taxa de esforço. Agora os proponentes têm que entregar contas de luz e água e assinar uma declaração a comprovar que aqueles são mesmo as obrigações incorridas. - Financiamento de apenas 80%-90%. Tenho visto uma retracção brutal dos bancos em adicionar operações extra para financiar a 100%. E em Portugal, a maioria das famílias que compra casa com crédito, precisa de se financiar a 100%. - Apensa rendimentos tributáveis são considerados. Tenho igualmente visto os bancos a discartarem todos os rendimentos que não aparecem em sede de IRS. Saiba que certos rendimentos não precisam de lá constar por não serem não tributáveis. Em suma Os valores das casas estão a cair porque o número de transacções tem baixado. Em grande parte, deve-se ao financiamento ser hoje muito mais complicado, em virtude das regras macroprodenciais introduzidas pelo Banco de Portugal no último ano. Embora ajude numa correcção de mercado, não acho que este ajuste deva ignorar o perigo de bolha em Lisboa e Porto ainda estamos longe disso na minha opinião. Como investidor, poderá tirar partido do momento actual por causa da existência de menos compradores, é um facto. Já esperar que os preços nos grandes centros estejam apelativos (pense, como sempre, na rentabilidade final) não é realista.
Ao mesmo tempo, surge agora uma janela interessante para os mercados com maiores yields, visto haverem menos compradores. Quem se consegue financiar e tem algum dinheiro na mão tem um argumento importante. Se for o caso, pode aproveitar. ;-) Um abraço, (*) A reprodução indevida, não autorizada, deste relatório ou de qualquer parte dele sujeitará o infrator a multa de até 3 mil vezes o valor do relatório, à apreensão das cópias ilegais, à responsabilidade reparatória civil e persecução criminal, nos termos dos artigos 102 e seguintes da Lei 9.610/98