A GESTÃO COMPARTILHADA EM ORGANIZAÇÕES ESTUDANTIS: O CASO DA REPÚBLICA AQUARIUS DE OURO PRETO.



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Transcrição:

II Congresso Internacional sobre Desenvolvimento Social. Faculdade Fama, Iturama-MG, 2013. A GESTÃO COMPARTILHADA EM ORGANIZAÇÕES ESTUDANTIS: O CASO DA REPÚBLICA AQUARIUS DE OURO PRETO. Machado, Otavio Luiz. Cita: Machado, Otavio Luiz (November, 2013). A GESTÃO COMPARTILHADA EM ORGANIZAÇÕES ESTUDANTIS: O CASO DA REPÚBLICA AQUARIUS DE OURO PRETO. II Congresso Internacional sobre Desenvolvimento Social. Faculdade Fama, Iturama-MG. Dirección estable: http://www.aacademica.org/otavioluizmachado/4 Acta Académica es un proyecto académico sin fines de lucro enmarcado en la iniciativa de acceso abierto. Acta Académica fue creado para facilitar a investigadores de todo el mundo el compartir su producción académica. Para crear un perfil gratuitamente o acceder a otros trabajos visite: http://www.aacademica.org.

A GESTÃO COMPARTILHADA EM ORGANIZAÇÕES ESTUDANTIS: O CASO DA REPÚBLICA AQUARIUS DE OURO PRETO Otávio Luiz Machado Faculdade Frutal (FAF) otaviomachado3@yahoo.com.br O trabalho é resultado de pesquisas desenvolvidas pelo autor envolvendo a compreensão do funcionamento, da organização e da gestão de repúblicas estudantis pertencentes ao patrimônio da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP). O estudo de uma república em particular a República Aquarius foi uma escolha aleatória, embora considerando se tratar da maior república estudantil conhecida em todo o País, com existência de 44 anos, com a composição de membros de cerca de 30 estudantes dos mais diversos cursos da instituição e oriundos de várias regiões do Brasil, inclusive com a condição sócio-econômica dos seus membros englobando várias faixas e categorias. Para cumprir o objetivo de analisar a gestão compartilhada de todos os assuntos relacionados à manutenção dessa organização utilizamos a metodologia de história oral, construindo um painel com vários elementos que marcam a gestão da organização, o que nos levou a perceber que foram satisfatórios ao êxito do empreendimento a autonomia dos membros dentro da organização, a autogestão e o cumprimento de uma estrutura nãohierarquizada que resolve de forma colegiada todos os assuntos pertinentes ao cotidiano da organização. Palavras-chave: Organização; autogestão; repúblicas estudantis. Introdução Em Ouro Preto a predominância de repúblicas estudantis é superior a outras modalidades de moradias estudantis. As repúblicas adotam um modelo de gestão autogerido, autônomo e que leva muito em consideração a reprodução de um sistema de gestão compartilhada, democrática e sustentável. No caso da moradia conhecida como alojamento o nível de interferência da estrutura burocrática da universidade é muito mais ativo e permanente, o que não permite que os próprios moradores tomem decisões que vão interferir na própria rotina deles, como a escolha de quem irá morar com eles no mesmo espaço. Ainda se tem as pensões, que são moradias em que o estudante fica sob a tutela e as regras do proprietário do imóvel, o que afeta essencialmente a privacidade do morador. Todos os três modelos de moradias apresentados aqui existem em Ouro Preto e em qualquer local onde

exista uma universidade. A diferença é que só em Ouro Preto percebemos a existência de um sistema de repúblicas estudantis tão bem organizado, integrado e consolidado, que possui toda uma experiência acumulada e envolve ex-alunos, atuais moradores, comadres numa profícua relação com a cidade e a universidade. Objetivo A pesquisa busca entender a organização, o funcionamento e as relações existentes nesse sistema de repúblicas a partir da análise da maior república estudantil brasileira, sendo assim acreditamos assim poder compreender aspectos de uma gestão compartilhada, que vai estar focada nos seguintes aspectos: - Gestão e organização da república; - Patrimônio da República; - Seleção de novos membros. Metodologia Os dados analisados estão presentes no dossiê da República Aquarius encaminhado à REFOP (Associação das Repúblicas Federais de Ouro Preto) em 2008. O dossiê geral da REFOP traz o conjunto de dados sobre todas as repúblicas estudantis públicas (pertencentes à UFOP) atualizado até 2008, o que é uma fonte importantíssima para o presente trabalho. O Documento traz depoimentos de 15 ex-alunos, que se formaram entre 1973 e 2008, sendo uma fonte importantíssima para entender aspectos de empreendedorismo, organizações e gestão. Resultados

O Documento analisado é iniciado com a apresentação da organização administrativa da República Aquarius, que traça dos princípios de atendimento do estudante universitário no sentido de sua permanência na UFOP e o sistema democrático que vai reger o funcionamento da estrutura, que basicamente é tocado por dois únicos cargos: o presidente e o responsável pela caixinha. A presidência é definida assim: é responsável pela administração dos recursos destinados aos gastos comuns a todos os moradores, tais como energia, internet e comadre. Ao presidente cabe estipular o gasto total do mês seguinte de modo que se possa dividir igualitariamente para todos os moradores da república este custo, da mesma forma reunir os recursos, pagar as contas, marcar e presidir reuniões (estão são compostas de pautas estabelecidas previamente pelos moradores e tratam dos temas diversos que precisam ser decididos coletivamente) etc. É importante ressaltar que a república é regida por um estatuto constituído e aprovado em reunião por todos os moradores tendo como base o estatuto das repúblicas federais estabelecidos pela Universidade Federal de Ouro Preto, que é tomado como paradigma para as ações dos moradores. É sabido que o prédio histórico da República Aquarius é tombado como patrimônio mundial pela Unesco, que deve estar adequado à diretrizes do IPHAN. Quanto ao outro cargo, que é o do responsável pela caixinha, é o administrador da conta bancária da república, que vem de recursos doados por ex-alunos e sobras de festas, principalmente. Os moradores entendem que os recursos da caixinha não são voltados para os assuntos domésticos (a presidência toma conta deste assunto), mas para questões estruturais, tendo como foco a manutenção do prédio da república, a aquisição de novos móveis e equipamentos a servir os moradores. Na história do empreendorismo dos moradores da República Aquarius ao longo do tempo mereceu uma questão: você se lembra das reformas/manutenções implementadas na casa durante sua geração?

Tudo que foi adquirido e incorporado ao patrimônio da casa esteve de alguma forma registrado pelos ex-moradores, sem contar aspectos da manutenção, reformas e ampliações do imóvel. O aspecto do patrimônio da República é importante de ser observado ao longo do tempo, pois não se trata simplesmente de uma evolução patrimonial qualquer, mas do atendimento das necessidades humanas de acordo com a conjuntura e os avanços da sociedade, sem desperdício e sem exaltações. Como disse um ex-morador dos anos 1990, as prioridades eram estabelecidas sempre em reunião, o que quer dizer que as decisões sobre o que comprar e fazer em prol da casa deveria ser aprovado pela maioria. No seu tempo de estudante, além das pinturas e reformas de telhado pela qual pelo menos era feita de tempos em tempos por todos os períodos de existência da república, o depoente demonstra que a república tentou ir se atualizando de acordo com o que as novidades apareciam, como aquisição de vídeo cassete, tv por assinatura, etc. No quesito de reformas e ampliações, é bom que se diga que a construção de uma área com churrasqueira e a ampliação da área da boite foram feitas nessa década. Os primeiros moradores dos anos 1970 apontam que as reformas não foram necessárias ao imóvel da república por se tratar de um imóvel novo, mas ampliações ou modificações foram feitas, como a adequação de uma sala de televisão e a construção de duas grandes alas na parte inferior do imóvel para novos quartos. Um dos depoentes dos anos 1990 relatou a parceria existente entre a UFOP e a república Aquarius (algo que acontecia também com as outras repúblicas) no tocante à fabricação dos móveis para a república, quando a república comprava os materiais e a marcenaria da UFOP finalizava a fabricação e a devida entrega. No quesito da seleção de novos membros, quando os ex-moradores entrevistados foram questionados sobre como era a escolha dos calouros para se morar nas repúblicas, a unanimidade se posicionou em relação aos valores que devem ser repassados aos membros que serão escolhidos é um dado a ser analisado, pois para os depoentes a capacidade de zelar pela casa precisa

estar associado ao grau de integração que eles teriam com os demais moradores. Um morador dos anos 1990 disse acreditar que o processo de escolha do novo morador ainda seja o mesmo atualmente. Esse mesmo depoente definiu no que consiste o período conhecido como batalha da qual é um momento na vida de todo calouro que vai procuraras repúblicas: A batalha é o período pelo qual deve todo calouro passar para que ele possa entender o significado de morar em república e que deve ter responsabilidade e deveres com os demais colegas e principalmente com o cuidado com a casa. Um depoente que morou na república nos anos 1980 define o núcleo de qualidades que diferencia quem será escolhido ou não pelos moradores enquanto o calouro batalha sua vaga na república: fui escolhido devido a afinidade com moradores da época. Ao serem questionados sobre o que pensava o atual sistema de batalha de vaga (e não mais como era na sua época de estudantes), o grau de coerência entre o que haviam vivido e que continuava foi 100%. Um ex-morador dos anos 1970 relatou o seguinte: este é o único sistema que funciona para a convivência pacífica dos seres humanos, o que é corroborado por um ex-morador dos anos 1980 ao dizer que é o que melhor funciona, indo além: prova disto é o baixo índice de pessoas que trocam de república durante a vida acadêmica. Um ex-morador dos anos 1990 avaliou que no processo de avaliação [batalha de vagas pelos calouros] os moradores têm a oportunidade de conhecer o calouro, o que é essencial na seleção de pessoas que poderão fornecer seu contributo ao coletivo. A análise sobre o sistema de repúblicas é muito instigante sobre a avaliação geral da gestão compartilhada das repúblicas. A questão a que os depoentes deveriam se ater era a seguinte: O que você acha do sistema de repúblicas? E ainda foi pedida a complementação da resposta com comentários sobre os prós e os contras.

Um ex-aluno dos anos 1970 faz um importante relato de como o sistema bem gerido irá refletir na vida profissional ao estudante após se formar (e ressaltando que é um aspecto a favor das repúblicas): Acho que é um sistema importante e se bem conduzido o resultado é muito bom. O sistema permite ao aluno praticar os princípios do relacionamento humano. É o início do aprendizado de como lidar com pessoas. Durante a vida profissional o engenheiro vai exercer esta atividade com muita intensidade No quesito dos aspectos contra as repúblicas, o trote exagerado foi considerado um item importante a ser considerado, assim como a quebra da autonomia das repúblicas por entes externos, pois segundo o morador dos anos 2000, a liberdade nesse sistema é essencial. A questão que trataria do desafio de se morar em repúblicas é a seguinte: qual a importância da passagem pela república/ouro Preto em sua vida? A unanimidade quanto à importância da mudança em suas vidas após o encontro com a vida republicana não é novidade para quem viveu ou conviveu com as repúblicas estudantis. Um ex-morador dos anos 1970 relatou o seguinte: por morar numa república aprendi a ser mais humano, mais paciente e me treinei na arte da coerência. Quem não é coerente não tem vida fácil quando se mora em repúblicas. Um ex-morador dos anos 1990 ressaltou que o crescimento pessoal é algo significativo para quem mora em repúblicas, o que um ex-morador dos anos 1970 chamou de escola de vida.

Considerações finais No estudo da vida universitária em repúblicas que apresentamos acima, além de mostrar uma visão do fenômeno através da ótica da administração, foi algo relevante para mostrar que noções da área administrativa, educativa e assistencial presentes nas repúblicas estão interligadas nessas organizações. Como uma organização, a república também produz uma cultura das organizações, sendo uma construção social em movimento e em transformação. Tal como foi tratado em Bernardes e Marcondes (2009), quando os autores analisavam a questão dos grupos sociais, a vida nos grupos é constituída a partir do interesse de todos de alcançar objetivos, o que para isso necessita de receber insumos do ambiente e retribuir-lhe de alguma maneira. Nos depoimentos analisados, os ex-moradores puderam explicitar bastante sobre como era a administração da república, inclusive deixando claro que a casa sempre foi administrada pelos próprios moradores, o que ressalta o caráter autogerido e autônomo das repúblicas estudantis cujos prédios são do patrimônio público da UFOP. Mesmo com a figura do gestor da presidência e da caixinha, também foi citado um dado importante num dos depoimentos, que é sobre a colaboração voluntária de outros moradores para ajudar o presidente na sua tarefa. O que temos é um caso típico de gestão compartilhada que, como acontece em qualquer organização, o atingimento de metas se faz presente a cada momento da vida das pessoas ali dentro. A grande diferença nessa organização, que é raro de se encontrar em qualquer outro local, é a humanização existente no ambiente, o que marca a vida pessoal das pessoas e será sempre uma referência em sua vida profissional, pois a base de tudo está ali.

Referências Bibliográficas BERNARDES, Cyro & MARCONDES, Reynaldo C. Sociologia Aplicada à Administração. 7ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009. Machado, Otávio Luiz. Aquarius: A Maior República Estudantil das Américas. Ouro Preto, Minas Gerais, Brasil (seu contexto dentro da história das moradias universitárias brasileiras) Frutal: Prospectiva, 2013.