X Seminário de Pesquisa da Pós-Graduação em Psicologia da UEM 03 a 06 de Abril de 2017 Universidade Estadual de Maringá ISSN

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O PERCURSO DA ESQUIZOFRENIA: DO DESENVOLVIMENTO HUMANO AO ADOECIMENTO PSÍQUICO Vanessa de Oliveira Beghetto Penteado, Universidade Estadual de Maringá, Programa de Pós- Graduação em Psicologia, Linha de Desenvolvimento Humano e Processos Educativos, Maringá-PR, Brasil; Silvana Calvo Tuleski, Universidade Estadual de Maringá, Programa de Pós-Graduação em Psicologia, Linha de Desenvolvimento Humano e Processos Educativos, Maringá-PR, Brasil. RESUMO contato: vanessabeghetto@gmail.com O presente trabalho, de natureza teórico-conceitual, tem por objetivo apresentar a sistematização inicial de uma pesquisa de dissertação que visa discutir as determinações da esquizofrenia e seu percurso do desenvolvimento humano ao adoecimento psíquico. Primeiramente realizaremos uma revisão bibliográfica que contemple o que os estudos atuais dizem a respeito da patologia. Para isso, utilizaremos os artigos da base de dados do Scielo, com o material que se relacione à temática dos últimos 10 anos. Para classificação deste conteúdo, subdividiremos em três tópicos, a fim de analisar as sínteses e divergências a respeito da temática, sendo elas: 1) conceituação e etiologia; 2) sintomatologia e métodos para diagnóstico; e 3) possibilidades de tratamento e cuidados oferecidos aos adoecidos. Em seguida, apresentaremos os pressupostos teóricos da Psicologia Histórico-Cultural, fundamentada na discussão a respeito da compreensão do desenvolvimento do psiquismo normal e anormal. Pretende-se ao longo da pesquisa alcançar diretrizes que embasem uma atuação profissional com o sujeito esquizofrênico, atenta às múltiplas determinações do processo de adoecimento humano e que supere explicações naturalizantes no campo da saúde mental. PALAVRAS-CHAVE: Psicologia Histórico-cultural; esquizofrenia; desenvolvimento do psiquismo. INTRODUÇÃO Pretendemos neste trabalho, compreender o processo da esquizofrenia por meio da perspectiva teórica da Psicologia Histórico-Cultural, assim como as consequências das alterações patológicas das funções psicológicas. O interesse pelo tema surge de significativos índices de adoecimento presentes na sociedade, aliado a prática

vivenciada nos estágios supervisionados nos últimos anos do curso de graduação em Psicologia na Universidade Federal do Paraná. Estas experiências ocorreram em dois Centros de Atenção Psicossocial CAPS 1, um voltado às questões de transtornos mentais e outro às de álcool e outras drogas. Desta prática surgiu a motivação para o projeto de conclusão de curso A atuação do psicólogo no contexto dos Centros de Atenção Psicossocial: reflexões à luz da Psicologia Histórico-Cultural. Somou-se ao interesse pelo objeto de estudo, as contribuições, ainda iniciais, no campo da saúde mental embasadas nesta perspectiva; tais como Moraes (2011); Schuhli (2008) e Silva (2014). A realização de estudos que contribuam para melhor entender as determinações dos transtornos mentais da atualidade, possibilitam a produção de políticas públicas e sociais que impactem seus indicadores. Pretendemos contribuir nesse processo de elaboração de uma análise aprofundada a respeito dos transtornos mentais, em especial sobre a formação dos transtornos esquizofrênicos. A temática do sofrimento psíquico e saúde mental torna-se central nos estudos científicos em decorrência dos altos índices de indivíduos adoecidos e incapacitados socialmente. Conforme análise da Organização Mundial de Saúde (OMS) a esquizofrenia está entre as dez principais causas de incapacitação, ao lado de outras patologias, como a depressão, sendo diagnosticada em cerca de 1% da população mundial. De acordo com o DSM-5 2, o indivíduo esquizofrênico deve apresentar ao menos dois dos seguintes aspectos durante o período de ao menos um mês: delírio, alucinação, discurso desorganizado, comportamento grosseiramente desorganizado ou catatônico, 1 O CAPS surge como uma estratégia de saúde oposta à lógica da hospitalização, à lógica manicomial. 2 Manual de Diagnóstico e Estatística dos Transtornos Mentais 5.ª edição.

sintomas negativos; sendo que um dos aspetos deve corresponder a um dos três primeiros sintomas apresentados. Tratada centralmente pela psiquiatria, o DSM-5 também categoriza a esquizofrenia como uma psicose, que acarreta grave sofrimento psíquico; comumente identificada na adolescência/inicio da vida adulta, a maior parte dos indivíduos torna-se incapaz de reestabelecer relações laborais e interpessoais, devido a alterações na percepção da realidade. No Brasil, segundo o INSS (2008), os transtornos mentais são a terceira maior causa de afastamentos do trabalho por mais de quinze dias e das aposentadorias por invalidez. METODOLOGIA Visando compreender o percurso do desenvolvimento humano e as determinações do processo de adoecimento da esquizofrenia, apresentamos a seguir alguns pressupostos que embasam a escolha pela referida temática. Primeiramente destacamos as contribuições fornecidas pela Psicologia Histórico-Cultural, abordagem que norteará o percurso metodológico do trabalho em questão. Considerando que a partir de cada concepção teórica surgem diferentes práticas (e suas consequências sociais), a Psicologia Histórico-Cultural, fundamentada no método materialista histórico dialético, se opõe ao idealismo e se orienta pela relação dialética entre o meio social e o psicológico. Esta vertente, conforme aponta Tuleski (2002), se desenvolve como resposta às condições sociais decorrentes do contexto da Revolução Russa, onde surgem as bases necessárias para a formulação de uma nova psicologia - perspectiva que reestrutura o

campo científico em busca do papel de um novo homem em uma nova sociedade. Esta nova psicologia destaca tendências objetivas e históricas, visando eliminar as dicotomias idealistas e materialistas vulgares, que compreendem o biológico dissociado do social, o indivíduo separado da sociedade. As principais contribuições que possibilitaram essa psicologia comprometida com a unidade dialética dos fenômenos são dos soviéticos: Lev Semenovitch Vigotski (1896-1934), Alexis Nikolaevich Leontiev (1903-1979) e Alexander Romanovich Luria (1902-1977). Para tanto, realizaremos primeiramente uma revisão bibliográfica visando contemplar o que os estudos atuais dizem a respeito da esquizofrenia. Através dos artigos da base de dados do Scielo, com a palavra chave esquizofrenia recolhemos o material relacionado com a temática dos últimos 10 anos. Para classificação deste conteúdo, subdividiremos em três tópicos, a fim de analisar as sínteses e divergências a respeito da temática, sendo elas: 1) conceituação e etiologia; 2) sintomatologia e métodos para diagnóstico; e 3) possibilidades de tratamento e cuidados oferecidos aos adoecidos. Em seguida, utilizaremos os pressupostos teóricos da Psicologia Histórico- Cultural, fundamentada na discussão a respeito da compreensão do desenvolvimento do psiquismo normal e anormal. Neste percurso bibliográfico percorrei os estudos sobre afasias realizado por A. R. Luria; as contribuições sobre a formação da personalidade e as patologias mentais em A. N. Leontiev; assim como o material de L. S. Vigotski a respeito da constituição do psiquismo e a desagregação que ocorre na esquizofrenia. Após a retomada dos autores clássicos da Psicologia Histórico-Cultural, traremos estudos de continuadores da teoria que versem sobre o tema, como a psicóloga Bluma Zeigarnik, e demais estudos atuais que se fundamentem na vertente. Buscaremos, por

fim, trabalhar com as implicações deste referencial teórico para a prática do psicólogo nas intervenções com o sujeito esquizofrênico. RESULTADOS PARCIAIS Primeiramente ressaltamos que tais resultados compõem parte de uma pesquisa ainda em desenvolvimento, logo o texto que segue possui um conteúdo que posteriormente será ampliado para abarcar os objetivos acima elencados. Desta forma, apresentamos como resultados parciais dados referentes ao levantamento de artigos realizado e o início da sistematização teórica a respeito do percurso normal do desenvolvimento humano, assim como os aspectos metodológicos essenciais que norteiam a análise do trabalho. Para a seleção das pesquisas atuais que versam a respeito da temática em questão, utilizamos, conforme afirmado anteriormente, a base de dados do Scielo. Através da palavra esquizofrenia, e com recorte temporal dos últimos 10 anos (de 2006 a 2016), obtivemos como resultado 174 artigos. Destes, excluímos em um primeiro momento somente aqueles artigos que fugiam ao tema, não tratando do conceito de esquizofrenia como uma patologia mental, além de ocorrências de trabalhos repetidos, totalizando 24 artigos. Dos 150 que inicialmente nos propusemos a analisar, 40 versam com centralidade sobre a etiologia e conceituação da esquizofrenia; 31 tratam sintomatologia e métodos diagnósticos; 58 voltados para o tratamento e atenção dos enfermos; e 21 artigos não se encaixam em nenhuma das classificações préestabelecidas. Além disto, notamos ao longo da pesquisa, que pela grande quantidade de

artigos selecionados, haveria a necessidade de novos critérios de exclusão, para que a análise tanto quantitativa quanto qualitativa, possa ser realizada com maior profundidade. Neste trabalho, apresentaremos algumas das consequências da leitura e compreensão de cinco destes materiais selecionados, que versam a respeito da etiologia da esquizofrenia. Por tanto, partiremos dos aspectos essenciais que fundamentam a Teoria Histórico-cultural, possibilitando avançar na temática apresentada. Vigotski (2004) discorre a respeito do significado histórico da crise da psicologia, destacando que É através da análise da realidade científica e não por meio de raciocínios abstratos que pretendemos obter uma ideia clara da essência da psicologia individual e social como aspectos de uma mesma ciência e do destino histórico de ambas. (Vigotski, 2004, p. 210). Assim, notamos o esforço pela construção de uma psicologia geral, que superasse por incorporação as produções das psicologias existentes. Martins (2008) reforça esta compreensão ao caracterizar a psicologia como uma ciência multifacetada, que reflete a hegemonia lógico-formal através de dualismos inflexíveis, como normal/patológico, social/individual. Para trabalhar sobre as mudanças patológicas da personalidade, conforme indicado acima, traremos aspectos da Psicologia Histórico-Cultural que fundamentam a concepção de ser humano a que nos referimos. Posteriormente retornaremos às especificidades da esquizofrenia e a dificuldade de compreender os limites entre o social e biológico. Conforme Leontiev (1978), o psiquismo humano se constitui na intrínseca relação da atividade do homem em seu meio social, sendo o homem, a síntese de múltiplas relações sociais. O autor demonstra o predomínio do trabalho, como atividade vital humana, na constituição da consciência. O trabalho é o processo em que o homem

medeia, regula e controla a natureza, apropriando-se dela e modificando-a, e ao fazê-lo aperfeiçoa características do gênero humano. O processo de humanização é fundamental para gerar desenvolvimento humano de atributos genéricos, e difere do processo de hominização, na medida em que implica em transformações das funções psicológicas elementares aquelas que têm por característica serem determinadas pelas peculiaridades biológicas do psiquismo. As funções psicológicas elementares adquirem outras propriedades psicofísicas, denominadas de funções psicológicas superiores, resultante do desenvolvimento histórico-social do homem. Vigotski (2012) salienta que tais funções não se desenvolvem isoladamente, mas em articulação umas com as outras, formando o sistema interfuncional da consciência. A transição entre os níveis elementares e superiores é o salto entre o biologicamente dado e o culturalmente aprendido. Para que esta transformação ocorra, é necessário que haja a internalização das atividades sociais desenvolvidas historicamente. Assim, as funções psicológicas superiores aparecem duas vezes no desenvolvimento da criança, o que ocorria primeiramente no plano interpessoal passa a ocorrer no plano intrapessoal (Vigotski, 1988). Destacamos que para tratar do adoecimento psíquico na esquizofrenia, a compreensão da constituição do psiquismo humano por uma vertente materialista e dialética, é o ponto do qual partimos para o desenvolvimento do objeto de estudo. Sob a ótica da Psicologia Histórico-Cultural, as visões hegemônicas que tratam tanto da etiologia, quanto dos sintomas e tratamento referentes à esquizofrenia desvinculam o individual do social, e realizam suas analises descoladas da base material

que os condiciona. Esta afirmação é fruto do inicio da análise (ainda em andamento) dos artigos anteriormente mencionados que nos debruçamos nesta pesquisa, tais como: Oliveira (2015); Machado, Passini & Rosa (2014); Steiner, Bernstein, Bogerts & Gonçalves (2013); Rahmoune, Harris, Guest & Bahn (2013); e Gottschalk, Sarnyai, Guest, Harris & Bahn (2013). Tais estudos tratam especificamente do eixo de etiologia da esquizofrenia, e neles observamos a recorrência de enfoques quantitativos e qualitativos, que tratam a patologia através de compreensões multicausais. Compreendemos que tais artigos trazem uma importante contribuição a respeito de possibilidades para compreender o agente desencadeador da patologia, porém estes se atêm a aspectos quantitativos e de tendências mecanicistas, na medida em que realizam análises dicotômicas, isolando o indivíduo de seu meio social e cultural. Em tentativas de obter uma suposta neutralidade científica, incorrem em erros, tais como o apresentado no trecho: (...) negar o caráter político e humano da ciência age justamente para ocultar o envolvimento da atividade científica na defesa dos interesses de determinados grupos dentro da sociedade, em detrimento dos interesses da sociedade como um todo (Tomanik, 2004, p. 98). Tuleski (2007) destaca que para compreender a relação dialética entre mente e corpo que sintetiza o processo de humanização e desenvolvimento do indivíduo é necessário que ocorra a superação do biológico pelo cultural. Compreendendo os processos patológicos como uma forma de desenvolvimento diferenciado, identificamos nos estudos atuais possibilidades de compreender as patologias determinadas pelo comprometimento biológico, pautado por determinações sociais. Isto porque ao desconsiderar o homem na totalidade concreta em que está inserido, a psicologia hegemonicamente dicotomiza o mundo subjetivo e o mundo objetivo, negando a

personalidade como um processo resultante do desenvolvimento cultural e histórico. A personalidade não é uma unidade existente dentro do homem, inata, e sim um conceito social que remete ao plano singular, onde os indivíduos constroem sua forma de vivenciar e agir em sociedade (Tuleski, 2007). O estudo das patologias nos leva ainda a refletir sobre as complexas relações do processo de desenvolvimento e de desintegração que ocorre nas mudanças patológicas. Vigotski (2004) mostra que a questão do que deve ser tomado como regra/padrão, como o normal ou patológico não é consensual na psicologia. O processo mais desenvolvido é a chave para a compreensão do menos desenvolvido: O desenvolvimento é a chave para entender os processos patológicos, os processos de dissociação das sínteses, das unidades superiores e a patologia é a chave para entender a história do desenvolvimento e estruturação dessas funções sintéticas superiores (Vigotski, 2012, p.168). Apontamos a necessidade de compreender o desenvolvimento em seu curso normal, com o processo mais desenvolvido de atributos genéricos do ser humano, que em comparação com a patologia, carrega maiores possibilidades de desenvolvimento das potencialidades do gênero humano. Através dessa compreensão do processo de adoecimento, buscaremos construir no plano concreto a relação que se estabelece entre o desenvolvimento humano e as contribuições das variáveis patológicas da esquizofrenia. Para tanto, partiremos das contribuições dos estudos de Vigotski (2012) a respeito da periodização do desenvolvimento, observando a transição para a adolescência. Neste período é que ocorrem as trocas responsáveis pela formação da hierarquia de interesses, formação de conceitos, e desenvolvimento das funções psicológicas superiores, que permitem o desenvolvimento e a compreensão da dinâmica e estrutura da personalidade do

adolescente. Considerando que na análise da desagregação na esquizofrenia realizada por Vigotski (2012), ocorre o percurso contrário do desenvolvimento da formação de conceitos e das funções psicológicas superiores. Ressaltamos ainda a centralidade de lidar com o objeto em sua singularidade e universalidade. A esquizofrenia, vista hegemonicamente enquanto um diagnóstico clínico - aspecto universal - se expressa em indivíduos singulares que tem seu desenvolvimento humano alterado patologicamente. Na síntese das contribuições feitas por Vigotski (2004) e Zeigarnik (1979) 3, encontramos diversas vezes a defesa de que as determinações sociais comprometem em diversos níveis o sistema interfuncional dos indivíduos diagnosticados, ainda que possa haver uma causa orgânica. Destacamos assim, que por mais que a patologia se manifeste na singularidade do indivíduo, a esquizofrenia contem aspectos universais, que são mediados pela particularidade de como este universal se manifesta no singular. Com este embasamento notamos que as relações sociais e o lugar que a pessoa ocupará nelas são determinantes para a constituição da consciência e para a superação de fatores causadores de adoecimento psíquico. Apontamos ainda a necessidade de trabalhar com formas de tratamento, que proponham mudanças nas atividades desempenhadas em seu contexto social, gerando transformações na estrutura da atividade, nas relações sociais estabelecidas e consequente vivência do indivíduo. Com base na experiência prática de estágio, indico que a atuação profissional dos trabalhadores de saúde caminha na contramão dessas necessidades e do que indicam 3 Silva (2014), ao estudar aspectos do contexto social revolucionário e pós revolucionário da URSS, frisa a relação entre as precárias condições materiais e os altos índices de adoecimento psíquico da população russa. O diagnóstico da esquizofrenia era amplamente utilizado como método de controle, o que justifica a prioridade dada aos estudos da esquizofrenia pelos autores da época, patologia que já despertava questionamentos e consequências sociais.

as diretrizes da política pública em saúde mental 4. Observação que se soma às fortes debilidades decorrentes do sistema econômico social vigente em nossa sociedade, que produz adoecimento psíquico ao aprofundar relações sociais de exploração, e que culpabilizam o indivíduo em sofrimento, levando-o a uma vivência solitária e medicalizada. Pretendemos assim, contribuir nas análises e com ferramentas de intervenção que tenham como perspectiva o desenvolvimento de autonomia e a emancipação humana em indivíduos adoecidos pela esquizofrenia. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS INSS. Instituto Nacional de Seguridade Social (2008). Anuário Estatístico da Previdência Social/Ministério da Previdência. Recuperado: 25 abr. 2015. Disponível em: http://www.previdenciasocial.gov.br/arquivos/office/3_091028-191015-957.pdf Leontiev, A. N. (1978) O desenvolvimento do psiquismo. Lisboa: Livros Horizonte. Lopes, V. M. V., Banzato, C. E. M., & Dantas, C. R. (2011). Formas deficitária e não deficitária da esquizofrenia não diferem quanto à sazonalidade de nascimentos nas regiões Sul e Sudeste do Brasil. Jornal Brasileiro de Psiquiatria, 60(4), 337-340. Recuperado: 31 mai. 2016. Disponível: https://dx.doi.org/10.1590/s0047-20852011000400016 4 Como exemplo, a lei 3.657/89, sancionada em 2001 dispõe sobre os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais, redirecionando os modelos de tratamento.

Machado, L. C., Passini J. R., & Rosa, I. R. M. (2014). Prematuridade tardia: uma revisão sistemática. Jornal de Pediatria, 90(3), 221-231. Recuperado: 31 mai. 2016. Disponível: https://dx.doi.org/10.1016/j.jped.2013.08.012 Martins, L. M. (2008) (Org.) Sociedade, Educação e Subjetividade: Reflexões Temáticas à Luz da Psicologia Sócio-Histórica. São Paulo: Unesp. Oliveira, S. M. (2015). Modelos reducionista e multinível na esquizofrenia: alcances e limites. Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental, 18(4), 743-757. Recuperado: 31 mai. 2016. Disponível: https://dx.doi.org/10.1590/1415-4714.2015v18n4p743.10 Rahmoune, H., Harris, W., Guest, P. C. & Bahn, S. (2013). Explorando o componente inflamatório da esquizofrenia.archives of Clinical Psychiatry (São Paulo), 40(1), 28-34. Epub December 11, 2012. Retrieved September 05, 2016. Recuperado: 31 mai. 2016. Disponível: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=s0101-60832013000100006&lng=en&tlng=pt. Schuhli, V. M. (2008) Cronicidade e Reabilitação na Reforma Psiquiátrica Brasileira. Monografia (Especialização em Saúde Mental, Psicopatologia e Psicanálise) - Centro de Ciências Biologicas e da Saúde, Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Curitiba. Silva, M. A. S. (2014) Compreensão do adoecimento psíquico: de L. S. Vigotski à Patopsicologia Experimental de Bluma V. Zeigarnik. Dissertação de Mestrado, Programa de Pós Graduação em Psicologia, Universidade Estadual de Maringá, Maringá-PR. Steiner, J., Bernstein, H. G., Bogerts, B. & Gonçalves, C. A. (2013). Os possíveis papéis da S100B na esquizofrenia. Archives of Clinical Psychiatry (São Paulo), 40(1), 35-

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