ACÓRDÃO Registro: 2016.0000093783 Vistos, relatados e discutidos estes autos de Habeas Corpus nº 2273898-09.2015.8.26.0000, da Comarca de Limeira, em que é paciente HUMBERTO GUITHER DA SILVA MOREIRA e Impetrante DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO. ACORDAM, em 16ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Concederam a ordem, nos termos do v. acórdão. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores GUILHERME DE SOUZA NUCCI (Presidente), LEME GARCIA E OSNI PEREIRA. São Paulo, 23 de fevereiro de 2016. Guilherme de Souza Nucci RELATOR Assinatura Eletrônica
HABEAS CORPUS nº 2273898-09.2015.8.26.0000 Comarca: Limeira Impetrante: Douglas Schauerhuber Nunes Paciente: HUMBERTO GUITHER DA SILVA MOREIRA VOTO Nº. 12.743 Habeas Corpus. Tráfico de entorpecentes. Pleito objetivando a liberdade provisória. Possibilidade. Análise dos requisitos do art. 312, do CPP. Ausentes. Paciente primário e possuidor de bons antecedentes. Fixação de medidas cautelares diversas da prisão. Comparecimento periódico em juízo - recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga CPP 319, I e V. Ordem concedida. Trata-se de Habeas Corpus, com pedido liminar, impetrado em favor de HUMBERTO GUITHER DA SILVA MOREIRA, contra ato do MM. Juiz de Direito, Dr. Guilherme Lopes Alves Lamas, do Plantão Judiciário da Comarca de Limeira, sob a alegação de o paciente sofrer constrangimento ilegal, decorrente da conversão de sua prisão em flagrante em preventiva. Sustenta o impetrante, em apertada síntese, a ilegalidade da decisão coatora, entendendo estarem ausentes os requisitos da custódia cautelar. Menciona, ainda, a primariedade e os bons antecedentes do acusado como elementos favoráveis à liberdade provisória. Habeas Corpus nº 2273898-09.2015.8.26.0000 2
Postula, destarte, a concessão de liminar e a posterior confirmação desta, com a imediata expedição de alvará de soltura em favor do paciente. Subsidiariamente, pugna pela concessão de medidas cautelares alternativas. Indeferiu-se a liminar (fls. 41/43). A autoridade coatora prestou as informações necessárias, esclarecendo que o processo atualmente aguarda a notificação do paciente para apresentação de defesa preliminar (fls. 46/48). Em seu parecer, a Procuradoria Geral de Justiça opinou pela concessão do writ (fls. 50/54). É o relatório. Devidamente processado, é caso de concessão da ordem. Conforme consta dos autos, o paciente foi preso em flagrante, no dia 31 de outubro de 2015, na rua Guidor Ordi, Limeira/SP, junto com o adolescente Aron Cardoso, pela suposta prática de tráfico de entorpecentes, acusado de ter em depósito, para fins de comércio, 82 porções de cocaína (145g aproximadamente), sem autorização e em desacordo com determinação legal e regulamentar. Segundo o apurado, policiais militares avistaram os acusados em atitude suspeita, próximos a um arbusto, momento no qual, ao avistarem a viatura, tentaram evadir-se do local, a bordo de uma bicicleta. Nos arbustos, onde o paciente remexia, foram encontrados os entorpecentes apreendidos. Habeas Corpus nº 2273898-09.2015.8.26.0000 3
Ao analisar o caso, o magistrado a quo determinou a conversão da prisão em flagrante em preventiva, por haver prova da materialidade e indícios suficientes de autoria, bem como para garantia da ordem pública. Nem se olvide que a prisão cautelar é excepcionalidade, devendo, portanto, respaldar-se em elementos concretos, idôneos ao preenchimento dos requisitos previstos no art. 312 do Código de Processo Penal. Ademais, nada obstante a vedação constante do art. 44 da Lei de Drogas, a alteração efetuada pela Lei n 11.464/2007 na redação do art. 2º da Lei de Crimes Hediondos, torna a autorizar a concessão de liberdade provisória, sem fiança, na hipótese do parágrafo único do art. 310, do CPP. É, portanto, necessário que se analise os requisitos do art. 312, do CPP. Desta feita, acompanho entendimento firmado pelos Tribunais Superiores, no sentido de não ser suficiente para o indeferimento da liberdade provisória a mera remissão à vedação legal contida no art. 44 da lei específica. Nesse sentido: PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL. HABEAS CORPUS IMPETRADO CONTRA DECISÃO DE RELATOR DE TRIBUNAL SUPERIOR QUE INDEFERIU PLEITO CAUTELAR EM IDÊNTICA VIA PROCESSUAL. FLAGRANTE Habeas Corpus nº 2273898-09.2015.8.26.0000 4
ILEGALIDADE. SÚMULA 691/STF. SUPERAÇÃO. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. PRISÃO EM FLAGRANTE CONVERTIDA EM PREVENTIVA COM FUNDAMENTO APENAS NA GRAVIDADE EM ABSTRATO DO DELITO. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA E CONVENIÊNCIA DA INSTRUÇÃO CRIMINAL. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE BASE EMPÍRICA IDÔNEA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL CARACTERIZADO. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO POR INADEQUAÇÃO DA VIA PROCESSUAL. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO. 1. A prisão cautelar para garantia da ordem pública e para conveniência da instrução criminal é ilegítima quando fundamentada, como no caso sub examine, tão somente na gravidade in abstracto, ínsita ao crime. Precedentes. [...] a decisão que decretou a prisão cautelar limita-se a tecer considerações sobre o potencial danoso do tráfico de entorpecentes. Não cuidou, assim, de apontar, minimamente, conduta dos pacientes que pudessem colocar em risco a ordem pública, a instrução Habeas Corpus nº 2273898-09.2015.8.26.0000 5
processual ou a aplicação da lei penal. 3. A vedação legal à liberdade provisória ao preso em flagrante por tráfico de entorpecentes, prevista no art. 44 da Lei 11.343/2006, foi julgada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (HC 104.339/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes), devendo, contudo, o magistrado apreciar a existência dos requisitos da prisão preventiva à luz do artigo 312 do Código de Processo Penal. [...] 5. Agravo regimental desprovido, em razão da inadequação da via eleita. Ordem concedida de ofício para assegurar aos pacientes o direito de aguardarem em liberdade o trânsito em julgado de eventual sentença condenatória, salvo se por outro motivo devam permanecer presos e sem prejuízo de nova decretação de prisão preventiva fundamentada ou de uma ou mais das medidas cautelares previstas no art. 319 do Código de Processo Penal, caso seja necessário. (STF. HC 121181 AgR, Primeira Turma, Relator(a): Min. LUIZ FUX, d.j. 22/04/2014, grifamos). Habeas Corpus nº 2273898-09.2015.8.26.0000 6
Além disso, em análise aos requisitos e, após consulta ao sistema informatizado deste E. Tribunal, verificou-se que o paciente é primário e possuidor de bons antecedentes, cuja conduta delitiva sub judice não se demonstra revestida de gravidade exacerbada. Tais fatores sinalizam-se precipuamente favoráveis ao paciente, afastando-o de ímpetos de fuga ou desassossego, evidenciando a possibilidade de aguardar o julgamento da ação em liberdade, sem risco à ordem pública. É preciso cessar o mau vezo de se decretar a prisão cautelar com base em abstrações. Todos os requisitos do art. 312 do CPP precisam ser analisados no plano concreto, apontando-se, nos autos da investigação policial ou do processo-crime, quais elementos justificam a cautela. A propósito, vimos defendendo: A gravidade concreta do delito espelha-se pelo fato e suas circunstâncias e consequências. Um roubo, por exemplo, abstratamente é um delito grave, mas nem sempre o é no caso concreto. Essa busca pela concretude do fato é o dever do juiz, a fim de não banalizar a decretação da prisão cautelar, que é uma exceção, não a regra. 1 Ainda sobre o mesmo tema: 1 NUCCI, Guilherme de Souza. Prisão e Liberdade: as reformas processuais penais introduzidas pela Lei 12.403, de 4 de maio de 2011, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 64. Habeas Corpus nº 2273898-09.2015.8.26.0000 7
(...) devemos conferir à garantia da ordem pública um significado realmente concreto, distante de ilações ou presunções de gravidade abstrata de qualquer infração penal. 2 Por tais razões, tenho por desnecessária a manutenção da custódia cautelar. Com efeito, se por um lado a manutenção da prisão preventiva revela-se descabida, frente aos mandamentos legais, ante a carência dos requisitos previstos no art. 312 do Código de Processo Penal, por outro, a concessão de liberdade provisória culmina em benesse deveras favorável, não correspondendo à casuística sub judice. Diante do panorama, melhor solução resulta na concessão da liberdade provisória mitigada por medida cautelar, consoante hipótese prevista na Lei nº. 12.403/2011, em razão de sua adequabilidade, fator sobre o qual assim vimos entendendo: Esse fator, sem dúvida, concerne ao princípio constitucional da proporcionalidade. Observa-se cada vez mais, a vinculação e a integração entre os princípios constitucionais penais e processuais penais. Neste mesmo 2 NUCCI, Guilherme de Souza. Op. Cit., p. 63. Habeas Corpus nº 2273898-09.2015.8.26.0000 8
prisma, já havíamos apontado a umbilical ligadura entre a proporcionalidade e a individualização da pena, além de indicar a união entre legalidade e prisão cautelar. Agora, nota-se o vínculo entre as medidas cautelares e a proporcionalidade, ou seja, tal como se fosse uma autêntica individualização da pena, deve-se analisar o fato e seu autor, em detalhes, para aplicar a mais adequada medida cautelar restritiva da liberdade. Cuida-se da individualização da medida cautelar, vez que existem várias à disposição do magistrado para a aplicação ao caso concreto 3 Muito embora sejam as condições favoráveis ao paciente, não se olvide estar respondendo à ação penal pelo cometimento de suposto crime de tráfico de drogas, demonstrando-se pertinente o recolhimento domiciliar noturno e nos dias de folga, o qual o acusado deve recolher-se à sua casa todos os dias, o período noturno, bem como nos fins de semana e dias de folga, evitando-se que se mantenha em contato social, quando fora de sua atividade laborativa e o comparecimento mensal em juízo, que visa o acompanhamento da vida do sujeito, durante o inquérito ou processo, constituindo medida positiva; 3 NUCCI, Guilherme de Souza, Prisão e Liberdade, RT, p.27,28. Habeas Corpus nº 2273898-09.2015.8.26.0000 9
afinal, se não cumprir ou se apresentar conduta incompatível com as atividades esperadas de quem responde a processocrime, pode ser preso preventivamente 4 Ante o exposto, pelo meu voto, concedo a ordem impetrada, aplicando ao paciente as medidas cautelares previstas no art. 319, incisos I e V, do Código de Processo Penal. Expeça-se alvará de soltura clausulado. GUILHERME DE SOUZA NUCCI Relator 4 NUCCI, Guilherme de Souza, Prisão e Liberdade, RT, p.82, 84 e 85. Habeas Corpus nº 2273898-09.2015.8.26.0000 10