ASSOCIAÇÃO ENTRE COLANGIOCARCINOMA E RETOCOLITE ULCERATIVA: RELATO DE CASO

Documentos relacionados
GASTRORECIFE 2019 MAR HOTEL 15 A 17 DE AGOSTO DE 2019

Neoplasias de vias biliares e doenças inflamatórias intestinais: qual a relação?

Profª. Thais de A. Almeida

Complicações na Doença Inflamatória Intestinal

ENFERMAGEM DOENÇAS HEPÁTICAS. Profª. Tatiane da Silva Campos

Imagem da Semana: Ressonância nuclear magnética

Carcinoma hepatocelular. Departamento de Cirurgia Hospital das Clínicas FMUSP. Prof. Dr. Marcel Autran C. Machado

Imagem da Semana: Colangioressonância

Concurso Público UERJ 2012

Caso Clínico. Paciente do sexo masculino, 41 anos. Clínica: Dor em FID e região lombar direita. HPP: Nefrolitíase. Solicitado TC de abdome.

ENFERMAGEM DOENÇAS GASTROINTESTINAIS. Parte 2. Profª. Tatiane da Silva Campos

Concurso Público UERJ 2012 Prova discursiva Médico Ccirurgião Geral

Hemangiomas: Quando operar e quando observar Orlando Jorge M.Torres Nucleo de Estudos do Fígado F - UFMA

Relato de Caso. Gabriela Azevedo Foinquinos

Módulo: Câncer de Rim Metastático

RASTREAMENTO E DIAGNÓSTICO PRECOCE DE CÂNCER COLORRETAL

Imagem da Semana: Ressonância magnética (RM)

SUS A causa mais comum de estenose benigna do colédoco e:

Doença de Crohn. Grupo: Bruno Melo Eduarda Melo Jéssica Roberta Juliana Jordão Luan França Luiz Bonner Pedro Henrique

Mulher jovem, 29 anos, nulípara, com quadro de sangramento retal, sem outras queixas, submetida a colonoscopia para investigação.

Hemangioma hepático: Diagnóstico e conduta. Orlando Jorge Martins Torres Professor Livre-Docente UFMA Núcleo de Estudos do Fígado

I Data: 03/05/05. II Grupo de Estudo: Dra. Silvana M. Bruschi Kelles Dra. Lélia de Almeida Carvalho Dra. Marta Alice Campos Dr. Adolfo Orsi Parenzi

Métodos de imagem. Radiologia do fígado. Radiologia do fígado 12/03/2012

Diagnóstico e tratamento da Colangite IgG4. Claudia Alves Couto HC- UFMG

ENTENDENDO A Doença Inflamatória Intestinal

COLANGITE ESCLEROSANTE PRIMÁRIA: RELATO DE CASO E REVISÃO DA LITERATURA

Confira se os dados contidos na parte inferior desta capa estão corretos e, em seguida, assine no espaço reservado para isso.

Paciente de 80 anos, sexo feminino, com dor abdominal, icterícia progressiva e perda de peso não quantificada há 08 meses.

Análise Clínica No Data de Coleta: 22/04/2019 Prop...: ADRIANA RODRIGUES DOS SANTOS

Tumores renais. 17/08/ Dra. Marcela Noronha.

Introdução: Relato de Caso de Trombose Venosa Cerebral secundária a doença Inflamatória Intestinal em Hospital Universitário

CONSULTA EM GASTROENTEROLOGIA CÓDIGO SIA/SUS:

Complicações da pancreatite crônica cursando com dor abdominal manejo endoscópico - agosto 2016

TRATAMENTO DA COLANGITE ESCLEROSANTE PRIMÁRIA

PROPEDÊUTICA CONTEXTUALIZADA IV CLINICA CIRÚRGICA (MED076)

Ingestão de cáusticos - avaliação de factores preditivos de gravidade. Ver PDF

06 A 08 DE NOVEMBRO DE 2014 PROGRAMA

Colangiocarcinomas. 2ª Jornada Piauiense do CBCD Capítulo do Piauí Teresina, de Junho de Orlando J. M. Torres

PROCESSO SELETIVO PARA INGRESSO NO PROGRAMA DE RESIDÊNCIA MÉDICA 2015 EDITAL N. 001/2014 CRITÉRIOS DA AVALIAÇÃO DE HABILIDADES E COMPETÊNCIAS

Ultrassonografia abdominal. Análise de Imagens

QUINTA-FEIRA 22/08/19 (TARDE) ABERTURA 10 minutos CONFERÊNCIA DA SGB

Artigo Original TUMORES DO PALATO DURO: ANÁLISE DE 130 CASOS HARD PALATE TUMORS: ANALISYS OF 130 CASES ANTONIO AZOUBEL ANTUNES 2

HEPATOCARCINOMA RENATA D ALPINO PEIXOTO JULIANA FLORINDA DE M. RÊGO RACHEL P. RIECHELMANN

Terapia conservadora da mama em casos multifocais/multicêntricos

DIRETRIZES DE UTILIZAÇÃO DO PET CT ONCOLÓGICO NO PLANSERV.

DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO DA HEPATITE AUTO- IMUNE

GAMEDII HISTÓRIA EQUIPE GAMEDII AGRADECIMENTOS:

VISÕES GERAIS DO HEPATOBLASTOMA PEDIÁTRICO

A IMPORTÂNCIA DO TRATAMENTO NUTRICIONAL NAS DOENÇAS INFLAMATÓRIAS INTESTINAIS.

Planilha do Internato em Cirurgia - 1º / 2014

ADENOCARCINOMA DE JEJUNO OCASIONANDO VÔMITOS RECORRENTES: um relato de caso

Algoritmo de condutas para tratamento de câncer de pâncreas

COLECISTITE AGUDA TCBC-SP

PÂNCREAS ENDÓCRINO. Felipe Santos Passos 2011

QUESTÕES PROVA DISCURSIVA TEMA 2018

Dr. Bruno Pinto Ribeiro Residente em Cirurgia de Cabeça e Pescoço Hospital Universitário Walter Cantídio

INSUFICIÊNCIA HEPÁTICA CRÔNICA EM GATOS

Imagem da Semana: Tomografia computadorizada (TC)

Bárbara Ximenes Braz

Oncologia. Caderno de Questões Prova Discursiva

RELATO DE CASO Identificação: Motivo da consulta: História da Doença atual: História ocupacional: História patológica pregressa: História familiar:

Orlando Jorge M Torres Núcleo de Estudos do Fígado - UFMA. Câncer da vesícula biliar: É necessário ressecar o hepatocolédoco?

APENDICITE AGUDA O QUE É APÊNCIDE CECAL? O QUE É APENDICITE E PORQUE OCORRE

RECTUM CANCER MANEGEMENT MANEJO DO CÂNCER DE RETO

20º CONGRESSO BRASILEIRO DE MASTOLOGIA PROGRAMA PRELIMINAR

Hospital de São João, E.P.E. Grupo Oncológico Hepato-Bilio-Pancreático INDICAÇÕES: Carcinoma Hepatocelular. Colangiocarcinoma

XVI Reunião Clínico - Radiológica. Dr. RosalinoDalasen.

ESTADO ATUAL DO TRATAMENTO DA MUCOCELE DE APÊNDICE CECAL

FEOCROMOCITOMA EM CRIANÇAS Aspectos clínicos e de imagem

TABELA DE PROCEDIMENTOS SUS

Os tumores neuroendócrinos retais expressam marcadores como cromogranina e sinaptofisina, embora nem sempre sejam positivo.

XVII Reunião Clínico - Radiológica Dr. RosalinoDalasen.

9º Imagem da Semana: Radiografia Tórax

Seminário Grandes Síndromes

Perfil Hepático FÍGADO. Indicações. Alguns termos importantes

Metástase hepática

UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE MEDICINA DA BAHIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA SAÚDE

Residência Médica Seleção 2014 Prova Cirurgia do Aparelho Digestivo, Videolaparoscopia e Urologia Expectativa de Respostas

ENFERMAGEM. Doenças Infecciosas e Parasitárias. Hepatites Aula 1. Profª. Tatiane da Silva Campos

15 perguntas e respostas frequentes sobre Doenças Inflamatórias Intestinais

TGO, TGP, GAMA GT E BILIRRUBINAS

A PREVENÇÃO faz a diferença

Cuidados no Tratamento Cirúrgico da Colecistite Aguda

Transplante de Fígado em Tumores

CURSO DE GRADUAÇÃO EM MEDICINA PLANO DE ENSINO

Questões das aulas teóricas de Propedêutica Cirúrgica II

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO JOÃO DEL-REI CAMPUS CENTRO OESTE Planilha de aulas - Internato em Cirurgia 1º semestre de 2015

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO JOÃO DEL-REI CAMPUS CENTRO OESTE Planilha de aulas - Internato em Cirurgia 1º semestre de 2015

HUMIRA (ADALIMUMABE) PARA DOENÇA INFLAMATÓRIA INTESTINAL

DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL DA ICTERÍCIA OBSTRUTIVA NA EMERGÊNCIA

Plano de Ensino-Aprendizagem Roteiro de Atividades Curso: Medicina

Merkel Cell Carcinoma Tratamento imunológico

O DESAFIO DIAGNÓSTICO DO CÂNCER DE MAMA ASSOCIADO A GESTAÇÃO: ENSAIO PICTÓRICO

Diagnóstico e Tratamento da Doença Inflamatória Intestinal

Caracterização de lesões Nódulos Hepá8cos. Aula Prá8ca Abdome 2

Características endoscópicas dos tumores neuroendócrinos retais podem prever metástases linfonodais? - julho 2016

e38 CAPÍTULO Atlas de Biópsias Hepáticas CAPÍTULO e38 Atlas de Biópsias Hepáticas Jules L. Dienstag Atul K. Bhan 38-1

42º Congresso Bras. de Medicina Veterinária e 1º Congresso Sul-Brasileiro da ANCLIVEPA - 31/10 a 02/11 de Curitiba - PR

Caso do mês Março de

Leia estas instruções:

Transcrição:

UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA - UFPB CENTRO DE CIENCIAS MÉDICAS - CCM TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO ASSOCIAÇÃO ENTRE COLANGIOCARCINOMA E RETOCOLITE ULCERATIVA: RELATO DE CASO ORIENTADOR: Dr. MARCELO GONÇALVES SOUSA ORIENTANDA: GABRIELLA AQUINO GOUVEIA CAGLIARI JOÃO PESSOA, PB 2017

ASSOCIAÇÃO ENTRE COLANGIOCARCINOMA E RETOCOLITE ULCERATIVA: RELATO DE CASO Relato de caso sobre paciente portador de retocolite ulcerativa que evoluiu com colangiocarcinoma GABRIELLA AQUINO GOUVEIA CAGLIARI. Acadêmica do Curso de Graduação em Medicina da Universidade Federal da Paraíba. Rua Ubirajara Boto Targino, 101, Manaíra. João Pessoa PB/Brasil. CEP:58038-030. Tel: (83)99969-5424. E-mail: gabriellacagliari@gmail.com MARCELO GONÇALVES SOUSA. Cirurgião do Aparelho Digestivo pela UNIFESP. Mestrado e Doutorado em Gastroenterologia Cirúrgica pela UNIFESP. Professor adjunto do Departamento de Cirurgia da Universidade Federal da Paraíba. Palavras-chave: Via biliar. Retocolite ulcerativa. Colangiocarcinoma. Cirurgia. Neoplasias intestinais.

RESUMO Justificativa e objetivo: A retocolite ulcerativa (RCU) é doença inflamatória intestinal (DII), crônica e de caráter auto imune, que não possui etiologia bem definida. É doença da mucosa, que acomete habitualmente o reto e estende-se aproximadamente até atingir parte do cólon ou sua totalidade. Existe uma grande prevalência de manifestações extra intestinais em portadores de DII, dentre elas estão as hepatobiliares. Este relato tem como objetivo correlacionar o manejo terapêutico aplicado em um paciente com RCU e colangiocarcinoma com a literatura. Relato de caso: O relato de caso descreve um paciente do sexo masculino, de 24 anos, portador de RCU que se manteve com controle dos sintomas durante 11 anos, quando apresentou sintomas de obstrução de via biliar e presença de tumoração em exames de imagem com confirmação de colangiocarcinoma, manifestação extraintestinal rara em nosso meio. Discussão: Na literatura, é descrita a associação entre RCU e colangite esclerosante primária numa taxa que varia de 2,4 a 7,5%, sendo a mesma considerada fator de risco para o desenvolvimento de colangiocarcinoma. O quadro clínico de pacientes com colangiocarcinoma que são portadores de RCU inclui sintomas inespecíficos e é de difícil diagnóstico. O tratamento depende do grau de malignização, se há outras doenças hepáticas conhecidas e o nível de acometimento vascular. Conclusão: Conforme bem descrito na literatura, o colangiocarcinoma geralmente se encontra em estágio avançado no momento do diagnóstico. A ressecção do tumor, que se fosse possível, representaria a maior chance de cura da patologia, não foi realizada durante a laparotomia exploradora devido ao encontro de focos metastáticos na cavidade abdominal do paciente.

ABSTRACT Justification and objective: The ulcerative colitis is an intestinal inflamatory disease, cronic and with auto imune nature, which has etiology not well defined. It is a disease of the intestinal mucosa, which attack usually the rectum and extend nearly to the colon or your totallity. There is a high prevalence of clinical extra intestinal manifestations in carriers of inflamatory diseases, among them we find the hepatobiliary. This report has the purpose to correlate the terapeutical management applied in a pacient with proctocolitis and cholangiocarcinoma with the literature. Case report: The case report describes a 24 years old male pacient with ulcerative colitis, that kept the control of symptoms for 11 years when exhibited symptoms of bile duct obstruction and presence of tumor in imaging scans with confirmation of cholangiocarcinoma, a rare extraintestinal manifestation in our midst. Discussion: There is a high prevalence of clinical extra intestinal manifestations in carriers of inflamatory diseases, among them we find the hepatobiliary. In literature, is described the association between ulcerative colitis and sclerosing cholangitis in a tax that varies from 2,4 to 7,5%, as the same being considered a risk fator for the develpment of cholangiocarcinoma. The clinical presentation of pacients with cholangiocarcinoma which are carriers of proctocolitis includes unespecifics symptoms and it has a difficult diagnosis. The treatment depends on the malignization level, if there is others known hepatic diseases and the level of vascular involvement. Conclusions: As well described in literature, the cholangiocarcinoma is usually find in advanced stages in the moment of diagnosis. The tumor surgical removal, if was possible, would be the best chance of cure,but it was not performed during the exploratory laparotomy because of the finding of metastatics lesions in the abdominal cavity of the patient. Key words: Bile ducts. Proctocolitis. Cholangiocarcionoma. Surgery. Intestinal Neoplasms.

INTRODUÇÃO A doença inflamatória intestinal (DII) é uma afecção intestinal crônica de caráter imune. Fatores genéticos e ambientais podem estar relacionados. A retocolite ulcerativa (RCU) e a doença de Crohn (DC) representam os dois tipos principais de DII. Acomete ambos os sexos e em qualquer faixa etária, porém tem maior prevalência entre os 20 e 40 anos. Vem apresentando aumento de sua incidência em países em desenvolvimento, como o Brasil, fato que vem alterando a epidemiologia da doença. Na RCU, a inflamação é limitada à mucosa e submucosa, apresentando classicamente um padrão de distribuição ascendente e contínuo, envolvendo parte ou a totalidade do cólon, podendo ser classificada em proctite, colite esquerda e colite extensa (pancolite). Os sintomas são de diarreia mucopurulenta e sanguinolenta além de dor abdominal. Manifestações extraintestinais ocorrem em certa de 30% dos indivíduos portadores, envolvendo órgãos como pele, olhos, fígado e região articular. Tais complicações podem preceder as manifestações digestivas, o que pode retardar o diagnóstico. O desenvolvimento de colangite esclerosante primária (CEP) nos portadores de RCU tem sido reportado e é relatada taxa de prevalência variando entre 2.4% a 7.5%. A CEP está correlacionada com 10 a 15% dos pacientes que desenvolvem colangiocarcinoma, neoplasia maligna rara das vias biliares intra e extra-hepáticas. O colangiocarcinoma corresponde à segunda neoplasia hepática primária mais comum, porém configura-se num tumor maligno de difícil diagnóstico, o que é feito muitas vezes em fases avançadas. O tratamento varia entre cirurgia, quimioterapia ou condutas paliativas a depender do grau de malignização. RELATO DE CASO Paciente do sexo masculino, 24 anos de idade, em acompanhamento clínico periódico há 11 anos após diagnóstico de retocolite ulcerativa, inicialmente com acometimento de reto a ceco (pancolite), em uso regular de mesalazina, negava qualquer complicação ao longo do curso da doença. Encontrava-se assintomático no exame de rotina, quando realizou exames laboratoriais e foram encontradas elevações discretas das transaminases, fosfatase

alcalina e gama glutamil transpeptidase, realizada ultrassonografia de abdome total sem achados patológicos. Seguiu acompanhamento, e após 7 meses, ainda assintomático, com persistência da elevação das transaminases (TGO: 245 U/L e TGP: 283 U/L), da fosfatase alcalina (583 U/L), e gama glutamil transpeptidase (1004 mg/dl), realizou nova ultrassonografia de abdome total, evidenciando nódulo hepático de contornos lobulados e ecogenicidade heterogênea, medindo cerca de 5,6 por 4,3 cm próximo ao hilo. Prosseguiu investigação através de ressonância magnética do abdome superior com estudo colangiográfico, observando-se a presença de formação expansiva, de aspecto infiltrativo, contornos mal definidos, acometendo lobo direito hepático, com predomínio nos segmentos VIII, VII, V e VI e extensão ao hilo hepático, medindo cerca de 5,9 por 5,5 cm, ocasionando dilatação de vias biliares intra-hepáticas, também foi relatada presença de vesícula biliar hidrópica e presença de linfonodos para-aórticos. Foi encaminhado para realização de laparotomia e possível hepatectomia à direita, durante a cirurgia foi encontrado hilo hepático comprometido por lesões carcinomatosas e implantes em epíplon, bexiga e cólon direito, realizando-se biópsia de ligamento falciforme. O diagnóstico histopatológico revelou a presença de tecido conjuntivo infiltrado por adenocarcinoma pouco diferenciado. A confirmação diagnóstica foi realizada por meio de análise imunohistoquímica que revelou positividade para os marcadores CDX2, CK7, CK19 que indicaram o sítio primário em trato biliopancreático, permitindo o diagnóstico de colangiocarcinoma. O paciente iniciou então um ciclo de quimioterapia com cisplatina e gencitabina. Evoluiu com icterícia súbita por obstrução tumoral, no qual foi necessária desobstrução da via biliar por punção de via biliar transtumoral, com normatização dos níveis de bilirrubina. Foi então realizado segundo ciclo de quimioterapia com 5-fluorouracilo, leucovorina e oxaliplatina, no qual o paciente evoluiu anictérico, porém apresentando hiporexia e intensa perda de peso.

I. Colonoscopia (11/02/2015): II. Ressonância Magnética de abdome superior com estudo colangiográfico (18/12/2015):

III. RNM de abdome superior (18/12/2015): IV. Vesícula biliar hidrópica (18/12/2015):

DISCUSSÃO As doenças intestinais inflamatórias vêm sendo alvo de atenção da comunidade científica por sua ascensão e variadas manifestações no trato digestivo. São doenças mais frequentes em países desenvolvidos, e apresentam distribuição variável no mundo, porém tem-se notado um aumento crescente de sua incidência nos países em desenvolvimento. 1,7 A incidência na América do Norte varia entre 2,2 e 14,3 casos por 100.000 habitantes-ano e a prevalência varia de 37 a 246 casos por 100.000 habitantes para RCU. No Brasil, apesar da escassez de estudos epidemiológicos, tem-se notado aumento da incidência dessa afecção, um estudo realizado em 2009 na cidade de Botocatu em São Paulo, as prevalências atingiram os valores de 14,81 casos/100.000 habitantes para a retocolite e considerando todas as doenças inflamatórias a prevalência atingiu o valor de 22,61 casos/100.000 habitantes. 2 A retocolite ulcerativa é uma doença da mucosa, que acomete habitualmente o reto e estende-se aproximadamente até atingir parte do cólon ou sua totalidade. Possui etiologia não totalmente entendida, e se manifesta preferencialmente em pessoas jovens, sem distinção de gênero. O curso clínico, cujas manifestações principais são diarreia, dor abdominal e sangramento retal, caracteriza-se por períodos de remissão e exacerbação, e apresenta complicações diversas. Associam-se, com certa frequência, manifestações extra intestinais tais como articulares, cutâneas, oculares, hepatobiliares e vasculares, que podem preceder, acompanhar ou suceder a doença intestinal. 1 Existe uma grande prevalência de manifestações extra intestinais em portadores de DII. Dentre elas estão descritas associações dermatológicas, reumatológicas, oftalmológicas, urológicas, distúrbios ósseos metabólicos, distúrbios tromboembólicos. Além de manifestações cardiopulmonares e hepatobiliares. Os fatores de risco relacionados ao desenvolvimento dessas manifestações são história familiar positiva e presença de doença ativa. 3,4 As alterações hepatobiliares comumente associadas às doenças inflamatórias intestinais são: infiltração gordurosa, pericolangite, cirrose, hepatite crônica ativa, abscessos, colangite esclerosante primária, colangiocarcinoma, colelitíase, trombose de veia porta e de veias hepáticas. 2

O colangiocarcinoma configura a segunda neoplasia hepática primária mais comum, com uma incidência de 1% ao ano. Esta neoplasia é comumente diagnosticada 1 a 3 anos após o diagnóstico de colangite esclerosante primária. Os pacientes com CEP e DII apresentam um risco de 5 a 10% de desenvolverem colangiocarcinoma durante a vida, um risco 160 vezes maior que o da população. 5 O quadro clínico de pacientes com colangiocarcinoma que são portadores de RCU inclui sintomas inespecíficos como febre, perda de peso, sudorese noturna, dor em região de quadrante superior direito do abdômen, além da presença de uma massa hepática expansiva que pode levar à sintomas obstrutivos, incluindo icterícia. 2 O colangiocarcinoma é de difícil diagnóstico, havendo necessidade de múltiplos exames séricos e imaginológicos. Com os métodos atuais, a maioria dos diagnósticos é feito num estágio avançado, quando a maioria dos tumores já é inoperável. 5 A tomografia computadorizada e a ressonância nuclear magnética são utilizadas no diagnóstico de pacientes que apresentam icterícia e exame de triagem, como uma ultrassonografia, que demonstre imagem tumoral no parênquima hepático ou dilatação da via biliar. A RNM permite ainda a avaliação não invasiva da via biliar. Contudo, tais método captam as lesões em estágios avançados, o que os torna pouco eficientes para um diagnóstico precoce. Uma alternativa promissora seria a tomografia com emissão de pósitrons. 6 A escolha do tratamento adequado irá variar de acordo com o grau de malignização, se há outras doenças hepáticas conhecidas e o nível de acometimento vascular.8 Poderá ser realizado além do tratamento sintomático, ressecção tumoral e quimioterapia adjuvante. O tratamento cirúrgico ressecção ampla em tumores restritos, sem comprometimento linfonodal - é o que atualmente oferece melhores chances de cura, porém pouco realizada devido ao estágio avançado da maior parte dos casos. Para graus avançados pode-se lançar mão de tratamentos como quimioterapia, radiofrequência e quimioembolização. Para alívio da obstrução biliar em paciente com contraindicação à cirurgia, a utilização de próteses biliares está bem documentada. 3,6 A quimioterapia visa destruir as células tumorais, impedindo o crescimento e aliviando sintomas causados por crescimento tumoral. Recentemente, estudos que avaliaram a atuação de fármacos como a gencitabina em monoterapia ou combinada

com outros citostáticos como cisplatina, oxaliplatina, docetaxel, mitamicina C e o 5- fluorouracilo/leucovorina tem mostrado taxas de resposta que superam 60%. Já a radioterapia pode ser utilizada em terapia adjuvante, neoadjuvante ou como tratamento principal em casos inoperáveis (também apresenta aplicabilidade em regime de quimioradioterapia, em geral associada ao 5-fluoruracilo ou papecitabina), porém apresenta mais efeitos colaterais do que a radioterapia exclusivamente. 9,10 A situação de óbito ocorre normalmente por condições de caquexia devido ao desenvolvimento tumoral, falência hepática e sepse recorrente por obstrução biliar. 10 CONCLUSÃO No caso apresentado, temos um paciente portador de RCU há mais de uma década, com controle adequado da sintomatologia com tratamento com droga antiinflamatória (mesalazina) quando apresentou alterações laboratoriais e radiológicas sugestivas de neoplasia. Conforme bem descrito na literatura, o colangiocarcinoma geralmente se encontra em estágio avançado no momento do diagnóstico. A ressecção do tumor, que se fosse possível, representaria a maior chance de cura da patologia, não foi realizada durante a laparotomia exploradora devido ao encontro de focos metastáticos na cavidade abdominal. O seguimento do tratamento foi feito drogas citostáticas de primeira linha como a cisplatina e a gencitabina, onde estudos referem boa resposta em mais de metade dos casos. O paciente evoluiu com icterícia súbita por obstrução tumoral sendo então realizado o implante de uma prótese biliar como instrumento paliativo de redução dos sintomas. Uma segunda linha de tratamento foi realizada com as drogas 5-fluorouracilo, leucovorina e oxaliplatina, utilizadas no tratamento de tumores periampulares, mas que apresentam resposta satisfatória em colangiocarcinomas. REFERÊNCIAS 1. Mota, ES et al. Manifestações extra-intestinais em doença de Crohn e retocolite ulcerativa: prevalência e correlação com o diagnóstico, extensão, atividade,

tempo de evolução da doença. Rev bras. colo-proctol., Rio de Janeiro, v. 27, n. 4, p. 349-363, Dec. 2007 2. Souza MHLP, Troncon LEA, Rodrigues CM, Viana CFG, Onofre PHC, Monteiro, RA. Evolução da ocorrência (1980-1999) da doença de Crohn e da retocolite ulcerativa idiopática e análise das suas características clínicas em um hospital universitário do sudeste do Brasil. Arq. Gastroenterol, 39(2):98-105, 2002. 3. Torres Neto JRT, Santiago RR, Prudente ACL, Mariano DR, Ramos FM, Torres FAP et al. Colangiocarcinoma associado a Retocolite Ulcerativa: relato de caso e revisão de literatura. Rev bras. colo-proctol. 2010. 4. Vavricka SR. Frequency and Risk Factors for Extraintestinal manifestations in the Swiss Inflammatory Bowel Disease Cohort. Am J Gastroenterol. 2011;106:110-9. 5. Pinto RDT. Neoplasias malignas relacionadas com a doença inflamatória intestinal. 2014. 6. Medeiros-Filho JEM. "Rastreamento e Manejo do Colangiocarcinoma." Gazeta Médica da Bahia 76.2. 2008. 7. Azevedo, MFC, et al. "Doença inflamatória intestinal." RBM rev. bras. med 71.12. 2014. 8. Razumilava N, Gores G. Classification, Diagnosis, and Management of Cholangiocarcinoma. Clinical Gastroenterology and Hepatology. 11(1): p. 13 21. 2013. 9. Charbel H, Al-Kawas F. Cholangiocarcinoma treatment. Current Gastroenterology Reports. 14(6): p. 528 33. 2012. 10. Mosconi S, Beretta G, Labianca R, Zampino M, Gatta G, Heinemann V. Cholangiocarcinoma. Critical Reviews in Oncology/Hematology. 69: p. 259 70. 2009..