QUALIDADE DE VIDA NO TRABALHO: O QUE NOS DIZ A INVESTIGAÇÃO EM PSICOLOGIA? Quality of Work Life: What does psychology research tell us?

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Transcrição:

QUALIDADE DE VIDA NO TRABALHO: O QUE NOS DIZ A INVESTIGAÇÃO EM PSICOLOGIA? Quality of Work Life: What does psychology research tell us?. Manuel Rafael Faculdade de Psicologia, Universidade de Lisboa mrafael@fp.ul.pt Resumo A atenção ao capital humano nas organizações e ao tema da Qualidade da Vida no Trabalho (QVT) é um tópico essencial na agenda da gestão dos recursos humanos. Neste artigo apresentam-se dados de vários estudos integrados num projecto de investigação sobre QVT. Descrevem-se as relações obtidas com outras variáveis, a saber: empenhamento organizacional, satisfação profissional, stress profissional, intenção de turnover e práticas de gestão de recursos humanos. Analisa-se também o papel da variável sexo na QVT. É discutida a utilidade dos dados para a promoção da QVT nas organizações no âmbito de uma tradição humanista. Palavras-chave: Qualidade de Vida no Trabalho, Satisfação profissional; Empenhamento organizacional afectivo; Stress profissional; Práticas de gestão de recursos humanos. Abstract Attention to human capital within organizations and to Quality of Work Life (QWL) is an essential topic in the agenda of human resource management. This article describes several studies of a Portuguese QWL research. Main results are presented, namely the relationship with other psychological dimensions, such as affective organizational commitment, work satisfaction, turnover intention and job stress. Effects of the variable sex are also analysed. Usefulness of findings for promoting QWL within an humanistic tradition are discussed. Keywords: Quality of Work Life; Work satisfaction, Affective organizational commitment; Turnover intention; Job stress; Human resources management practices. 1.Introdução A Qualidade de Vida no Trabalho (QVT) é, na nossa opinião, uma temática extremamente importante no domínio da Psicologia dos Recursos Humanos se adoptarmos uma perspectiva centrada na importância do capital humano enquanto recurso essencial nas organizações. Salientar essa importância é uma tarefa fundamental, em especial, num momento histórico em que se vivem dificuldades de natureza financeira e económica. Concordamos plenamente com a afirmação de Conte [1] ao considerar que o que mais desejamos na vida é felicidade, busca antiga do Homem. Porém, para ser feliz, é necessário ter saúde, satisfação consigo próprio e com o seu trabalho, e tudo isso compreende qualidade de vida. Concordamos também com a opinião de Vasconcelos que refere se é nas organizações que passamos a maior parte de nossas vidas, natural seria que as transformássemos em lugares

mais aprazíveis e saudáveis para a execução do nosso trabalho. Locais onde pudéssemos, de facto, passar algumas horas vivendo, criando e realizando plenamente com qualidade de vida, satisfação e alegria [2]. Num domínio mais científico e de gestão de recursos humanos, a QVT não é um termo/expressão novo, embora a sua origem não seja consensual. Para alguns autores a sua origem situa-se na década de 50 do século XX em que se devem destacar o movimento da Escola das Relações Humanas, e os estudos de Elton Mayo na Western Electric e de Eric Trist no Tavistock Institute of Human Relations em Londres; para outros, apenas se pode efectivamente falar em QVT já na década de 70 [3]. Embora não sejam também consensuais as definições de QVT, parece haver um certo consenso que a QVT é um constructo que lida com o bem-estar do indivíduo em relação ao seu trabalho, na medida em que as suas experiências de trabalho são gratificantes e satisfatórias. Um conjunto de aspectos fundamentais para a QVT do indivíduo incluem as tarefas que desempenha, o ambiente físico e social, o sistema de carreiras e a relação entre a vida de trabalho e a vida em geral. Parece também ser um conceito que se pode distinguir do de satisfação profissional [4,5]. A importância da QVT é patenteada na investigação que tem mostrado que a QVT pode ter um impacto significativo nos comportamentos, como sejam, a identificação com a organização, a satisfação profissional, o empenhamento organizacional, o esforço efectuado no trabalho, o desempenho no trabalho, e a intenção de deixar o emprego. Assinalável é, também, a literatura sobre saúde e bem-estar no trabalho que evidencia as consequências de baixos níveis de saúde e bemestar; nessas consequências, incluem-se o absentismo, a baixa produtividade e eficiência, redução na qualidade dos produtos e serviços, elevadas compensações por indemnizações, custos acrescidos em gastos de saúde e despesas médicas directas [6,7]. Para Pereira e Bernhardt [8] a QVT é condição essencial para o êxito de uma empresa ou de um empreendimento já que se considera fundamental a motivação dos trabalhadores, que se sustenta no facto de que trabalhadores desmotivados produzem menos, cometem mais erros e estão mais propensos a acidentes de trabalho, situações de absentismo e doenças profissionais; assim, quanto menor a QVT, maior o risco que a organização corre de insucesso. Diversas conceptualizações sobre a QVT têm marcado a evolução do conceito. Embora seja um modelo surgido na década de 70 do século XX pode destacar-se, no conjunto de modelos, a proposta de Walton. Esse modelo integra as seguintes dimensões: Compensação justa e adequada; Condições de trabalho (segurança e saúde); Oportunidades de utilizar e desenvolver capacidades; Oportunidades de crescimento, avanço e desenvolvimento na carreira; Integração social na empresa; Constitucionalismo; Relevância Social; e Equilíbrio entre o trabalho e o espaço total de vida [9]. Mais recentemente, são de assinalar, no domínio da investigação da QVT, temas como o equilíbrio família e trabalho, o equilíbrio trabalho e vida em geral, o stress profissional e as emoções no trabalho [3,10]. O presente artigo apresenta alguns dados de um projecto de investigação que, em contexto português, pretende estudar a temática da QVT. 2.Método 2.1. Amostras 2.1.1.Estudo 1 871 adultos empregados (337 homens, 534 mulheres), 19 aos 66 anos de idade. 2.1.2.Estudo 2 259 adultos empregados (95 homens, 164 mulheres), 20 aos 63 anos. 2.1.3.Estudo 3 310 adultos empregados (122 homens, 188 mulheres), 19 aos 66 anos. 2.2 Instrumentos 2.2.1 Qualidade de Vida no Trabalho O instrumento utilizado, designado Inventário sobre a Qualidade de Vida no Trabalho [11] é

constituído por 60 itens que abrangem acontecimentos referentes ao trabalho, organizados nas seguintes seis dimensões: 1.Características do trabalho/emprego, e formação e desenvolvimento de competências pessoais e profissionais; 2. Carreira: Promoção, reconhecimento e componente económica; 3.Relações sociais e justiça no trabalho; 4.Equilíbro Trabalho/Família; 5.Trabalho e Lazer; 6.Condições de Trabalho. O instrumento avalia e distingue Importância e Frequência de ocorrência da QVT. Assim, existem duas escalas: uma relativa à Importância e outra à Frequência. Para cada afirmação (item) é solicitado aos participantes que indiquem o grau de importância para a sua QVT (numa escala de seis alternativas de resposta de Nada a Muito Importante), mas também a frequência com que os indivíduos verificam esses acontecimentos no seu local de trabalho (tendo em conta uma escala de seis alternativas de resposta de Nada a Muito frequente). 2.2.2 Stress profissional Utilizou-se a versão portuguesa do Inventário sobre o Stress Profissional, que é uma medida genérica do stress profissional. Constituído por 60 itens, diferencia a Severidade (intensidade percebida) da Frequência de ocorrência das condições de trabalho que podem afectar adversamente o bem-estar psicológico dos trabalhadores que a elas são expostos [12,13]. 2.2.3 Satisfação profissional Efectuou-se uma avaliação de indicadores de satisfação através da inclusão de sete questões. Solicitou-se aos participantes que indicassem, numa escala em quatro pontos (muito satisfeito, satisfeito, algo insatisfeito e insatisfeito) o grau de satisfação face às seguintes situações: o seu emprego actual ; o progresso global da sua carreira até agora ; as perspectivas futuras da sua carreira ; as relações no trabalho ; a relação do trabalho com a sua vida familiar ; a relação do trabalho com actividades de lazer; e as condições de trabalho. O indicador utilizado neste artigo é a média das referidas questões. 2.2.4 Empenhamento organizacional afectivo O Empenhamento Organizacional Afectivo foi avaliado com base em seis itens da sub-escala de Empenhamento Afectivo do Questionário de Empenhamento Organizacional [14]. 2.2.5 Intenção de turnover A intenção de turnover foi medida através dos indicadores utilizados por Huang, Lawler e Lei [6]. 2.2.6 Práticas de Gestão de Recursos Humanos As práticas de gestão de recursos humanos foram medidas com base no Questionário sobre Práticas de Gestão de Recursos Humanos [15], composto por um total de 31 itens, que avalia as seguintes práticas de gestão de recursos humanos: Segurança de emprego, Avaliação de desempenho, Práticas de remuneração, Oportunidades de carreira, Oportunidades de formação, Oportunidades de participação, Acesso à informação. 3. Resultados 3.1.1 Estudo 1 No Quadro 1, apresentam-se as médias, desvios padrão e coeficientes de precisão (alfa de Cronbach) para cada uma das dimensões consideradas do Inventário sobre a Qualidade de Vida no Trabalho. A análise permite constatar uma diferença nítida entre as médias da QVT na Importância e na Frequência, sendo todavia, em ambos os casos, mais elevadas na dimensão Relações sociais e justiça no trabalho. Merece também algum destaque a média relativamente mais baixa na Frequência que se refere à dimensão Carreira: Promoção, reconhecimento e componente económica.

Dimensões de QVT 1. Quadro 1 Médias, Desvios padrão, e Coeficientes alfa de Cronbach do Inventário sobre a Qualidade de Vida no Trabalho M DP M DP 5.27.58 91 3.87.94 93 2. 5.27.64 90 3.42 1.07 92 3. 5.44.57 88 4.23 0.90 87 4. 5.40.66 91 4.00 1.05 88 5. 5.34.73 88 3.72 1.23 91 6. 5.34.64 92 3.83 1.05 89 Total 5.33.49.96 3.83.77 96 Legenda. 1.Características do trabalho/emprego, e formação e desenvolvimento de competências pessoais e profissionais; 2.Carreira: Promoção, reconhecimento e componente económica; 3.Relações sociais e justiça no trabalho; 4.Equilíbro Trabalho/Família; 5.Trabalho e Lazer; 6.Condições de Trabalho. No Quadro 2 apresentam-se as correlações entre os resultados totais de QVT com as variáveis Empenhamento Organizacional Afectivo, Intenção de turnover, Satisfação Profissional, Stress Severidade e Stress Frequência. Quadro 2 Correlações entre QVT (Importância e Frequência) e Empenhamento Organizacional Afectivo, Intenção de turnover, Satisfação profissional e Stress Profissional (severidade e frequência) QVT EA IT SP SS SF Importância 08-03 -02 21** 12* Frequência 49** -37** 63** -07-23** Legenda. EA: Empenhamento organizacional afectivo; IT: Intenção de turnover; SP: Satisfação profissional; SS-Stress Severidade; SP-Stress Frequência. Destacam-se as correlações superiores a.30. p <.05; p <.01 As correlações entre a QVT Importância e as restantes variáveis são, em geral, bastante baixas. Bastante diferente é o que se verifica em relação à QVT Frequência. Efectivamente, observam-se correlações positivas e elevadas com a satisfação profissional (.63), o empenhamento organizacional afectivo (.49) e negativas com a intenção de turnover (-.37) e o stress profissional frequência (-.23). Uma análise mais específica (não indicada no quadro) sobre as dimensões consideradas permite constatar que a Satisfação Profissional tem relações significativas com todas as dimensões da QVT Frequência. Note-se também que as dimensões Características do trabalho/emprego, e formação e desenvolvimento de competências pessoais e profissionais e Carreira: Promoção, reconhecimento e componente económica apresentam correlações, em valor absoluto, superiores a.30 com as variáveis Empenhamento Afectivo (correlações positivas), intenção de turnover (correlações negativas) e satisfação profissional (correlações positivas). 3.1.2 Estudo 2 Destacam-se as relações positivas, significativas e relativamente elevadas entre todas as Práticas de Gestão de Recursos Humanos e a QVT Frequência, sendo as mais elevadas as relativas a

Oportunidades de Formação (.58), Oportunidades de Participação (.57), Oportunidades de Carreira (.56) e Acesso à Informação (.52). As relações entre as Práticas de Gestão de Recursos Humanos e a Satisfação são também todas positivas e significativas, destacando-se como as mais elevadas as Oportunidades de Participação, as Oportunidades de carreira e a Avaliação de desempenho. Pelo contrário, não existem relações significativas entre as práticas de gestão de recursos humanos e a QVT Importância. 3.1.3 Estudo 3 Existem diferenças significativas entre os sexos em 13 dos 60 itens da Importância da QVT, todas favoráveis ao sexo feminino. Destaca-se que a maioria das diferenças se situam em itens relacionados com o equilíbrio trabalho/família (6 itens). Encontram-se ainda diferenças em itens relacionados com características do trabalho/emprego, e formação e desenvolvimento de competências pessoais e profissionais (3 itens, com relações sociais e justiça no trabalho (1 item), Trabalho e Lazer (1 item) e Condições de Trabalho (1 item). Existem diferenças significativas entre os sexos em 9 dos 60 itens da Frequência da QVT, todas favoráveis ao sexo masculino. Essas diferenças, verificam-se nos itens que se relacionam com aspectos como as oportunidades de desenvolvimento pessoal (2 itens) e profissional (6 itens) e as condições de trabalho (1 item). 4. Conclusões Defendemos quer neste trabalho quer em anteriores [16, 17, 18] que a QVT é um tema central na gestão dos recursos humanos, e que é incontestável a necessidade de articular o indivíduo e a organização. Também defendemos que as intervenções devem apoiar-se em dados de investigação da realidade portuguesa, os quais são relativamente escassos. Merecem um destaque particular, as relações significativas encontradas entre a Frequência de ocorrência de QVT e outras variáveis, relações essas que são indicadoras de que quanto maior for a frequência de ocorrência de QVT maior é a satisfação profissional e o empenhamento organizacional e menor a intenção de turnover. Confirma-se também a importância das Práticas de Gestão de Recursos Humanos no que respeita ao seu impacto em comportamentos positivos dos trabalhadores, em particular, na satisfação profissional e na qualidade de vida no trabalho. Na maioria dos itens, quer da Importância quer da Frequência da QVT, não existem diferenças entre sexos. As diferenças existentes relativamente à Importância da QVT são todas favoráveis ao sexo feminino. Destaca-se, em particular, o facto das mulheres atribuírem maior importância a aspectos da QVT relacionados com o equilíbrio trabalho e família. Quanto à frequência de QVT, as diferenças encontradas são todas favoráveis ao sexo masculino. Estes resultados estão de acordo com os estudos realizados pela Fundação Europeia para a melhoria das condições de trabalho e de vida [19], Autoridade para as Condições de Trabalho [20] e o Observatório do QREN [21] que salientam a existência de uma desigualdade entre sexos em aspectos como a remuneração, a progressão na carreira, estabilidade no emprego e condições de saúde e higiene. Não obstante a necessidade de se efectuarem estudos complementares, pode afirmar-se, por um lado, que os resultados vão no mesmo sentido de investigações realizadas noutros países e, por outro, vêm destacar importantes implicações para o desenvolvimento de estratégias de intervenção em recursos humanos e de práticas de desenvolvimento e de gestão de carreira para promover a QVT nas organizações Importa identificar, em cada contexto organizacional específico, quais as tendências observadas quer nas dimensões de QVT quer em acontecimentos particulares (itens) no sentido de desenvolver estratégias que permitam, ao promover a QVT, promover também a satisfação profissional, o empenhamento organizacional e diminuir a intenção de turnover e o stress professional. No domínio da investigação impõem-se estudos adicionais sobre o instrumento de avaliação da QVT (designadamente características psicométricas), sobre as dimensões específicas de QVT (designadamente a confirmação das dimensões referidas neste estudo para a Importância da QVT mas também uma análise similar ao nível da Frequência de ocorrência) e sobre variáveis diferenciais e/ou demográficas como sejam, entre outras, a idade, a actividade profissional, o tipo de contrato, o número de anos de experiência profissional, ou ainda o tipo de organização.

Finalmente, sabendo-se das implicações retratadas na literatura da QVT aos níveis individual e organizacional conclui-se pela imperiosa necessidade de promover a QVT, em especial, num momento em que factores de competitividade nos mercados poderão tender a colocar em segundo plano factores humanos. Trata-se, em síntese, de destacar a QVT como condição essencial para o sucesso das pessoas e das organizações. Referências [1] Conte, A. L. (2003). Qualidade de vida no trabalho. Revista FaeBusiness, 7, 32-34. [2] Vasconcelos, A. F. (2001). Qualidade de vida no trabalho: Origem, evolução e perspectivas, Caderno de Pesquisas em Administração, 8 (1), 24-35. [3] Saklani, D. R. (2004). Quality of work life in the Indian context: An empirical investigation. Decision, 31 (2), 101-132. [4] Roan, A. M., & Diamond, C. (2003). Starting out: the quality of working life of young workers in the retail and hospitality industries in Australia. International Journal of Employment Studies, 11 (2), 91-119. [5] Rose, R. C, Beh, L., Uli, J., & Idris, K. (2006). An analysis of quality of work life (QWL) and career-related variables. American Journal of Applied Sciences, 3 (12), 2151-2159. [6] Huang, T-C, Lawler, J., & Lei, C-Y (2007). The effects of quality of work life on commitment and turnover intention, Social Behavior and Personality, 35 (6), 735-750. [7] Sirgy, M. J., Efraty, D., Siegel, P., & Lee, D. (2001). A new measure of quality of work life (QWL) based on need satisfaction and spillover theories. Social Indicators Research, 55, 241 302. [8] Pereira, R. N. & Bernhardt, A. (2004). A importância da qualidade de vida no trabalho para a empresa do século XXI. Revista de Divulgação Técnico-científica do ICPG, 2 (6), 51-55. [9] Walton, R. (1975). Criteria for quality of work life. In L. E. Davis & R. L Cherns (Eds.), The Quality of Working Life: Problems, prospects, and the state of the art Vol. 1 (pp. 91-104). New York: Free Press. [10] Schouteten, R. L. J., & Witte, M. C. (2005). Research report Home-situation-related differences in the quality of working life in the Netherlands. Community, Work and Family, 8 (4), 379-387. [11] Rafael, M., & Lima, M. R. (2008). Inventário sobre a Qualidade de Vida no Trabalho (IQVT-I/F).Versão experimental para investigação. Lisboa: Faculdade de Psicologia. [12]Rafael, M. (2001). O modelo desenvolvimentista de avaliação e aconselhamento de carreira. Preocupações de carreira, crenças de carreira e stress profissional em adultos empregados. Dissertação de doutoramento, Lisboa: Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação. [13] Spielberger, C. D., & Vagg, P. R. (1999). Job Stress Survey. Professional Manual. Odessa: Psychological Assessment Resources. [14] Meyer, J. P., Allen, N. J., & Smith, C. (1993). Commitment to organizations and occupations: Extension and test of a three-component conceptualization. Journal of Applied Psychology, 78, 538-551. [15] Esteves, M. T. (2008). Práticas de gestão de recursos humanos e atitudes e comportamentos de trabalho: Estudo de caso no sector bancário português. Lisboa: Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa. [16] Rafael, M., & Lima, M. R.(2007, Setembro). Bringing again Quality of Work Life to the agenda of career and management development. Preliminary data of a Portuguese study IAEVG International Conference Guidance and Diversity: Research and Applications, University of Padova, Italy. [17] Rafael, M. & Lima, M. R. (2008b). Qualidade de Vida no Trabalho: um estudo preliminar com adultos trabalhadores. Actas da IV Conferência Desenvolvimento Vocacional/I Virtual: Investigação e Ensino. Braga: Universidade do Minho. [18] Rafael, M., & Lima, M. R.(2008c). Quality of Work Life: findings from a Portuguese study. In Proceedings XXIX International Congress of Psychology, Germany, Berlin (CD-Rom). [19] Fundação Europeia para a Melhoria das Condições de Vida e de Trabalho (2000). Dez anos de trabalho na união europeia. Acedido a partir de http://www.eurofound.europa.eu/pubdocs/2000/128/pt/1/ ef00128pt.p [20] Autoridade para as Condições de Trabalho (2008). Notícias. Acedido a partir de http://www.act.gov.pt/noticias.aspx?id=40. [21] Observatório do QREN (2009). A igualdade entre homens e mulheres e o desenvolvimento sócio económico. Acedido a partir de http://www.observatorio.pt/item1.php?lang=0&id_chann el=16&id_page=190.