CULTURA HISTÓRICA E ENSINO DE HISTÓRIA: UMA REFLEXÃO SOBRE AS HISTÓRIAS EM QUADRINHOS Doi: /8cih.pphuem.3589

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Transcrição:

CULTURA HISTÓRICA E ENSINO DE HISTÓRIA: UMA REFLEXÃO SOBRE AS HISTÓRIAS EM QUADRINHOS Doi: 10.4025/8cih.pphuem.3589 Giovana Maria Carvalho Martins, UEL Resumo Palavras Chave: Ensino de História; Cultura Histórica; Histórias em Quadrinhos. Financiamento: CAPES. Este trabalho faz parte das discussões que estão sendo desenvolvidas no Mestrado em Educação na Universidade Estadual de Londrina, com financiamento da CAPES e sob orientação da professora Dra. Marlene Rosa Cainelli, e intenciona discorrer sobre o uso de linguagens culturais em aulas de História, sobretudo com relação às histórias em quadrinhos, também chamadas de HQs. O objetivo é refletir sobre a transformação deste tipo de linguagem em fonte para o ensino de História e como estas discussões podem contribuir para seu uso em sala de aula. A metodologia consiste em uma revisão bibliográfica, baseando-nos nas discussões de Rüsen (2014; 2007) sobre a cultura histórica, Fronza (2007; 2012) e Lima (2017) sobre HQs e ensino de História, Eisner (1989) sobre quadrinhos e arte sequencial e Correia (2012) sobre o uso de fontes em sala de aula. Entendemos que os quadrinhos podem ser usados como fontes pelos professores no ensino de História e o fato de serem elementos culturais, presentes no cotidiano dos estudantes, os transforma em suportes cujo formato pode ser explorado para o ensino, sendo uma linguagem com a qual os estudantes têm empatia por conhecerem e lerem HQs costumeiramente, de acordo com as pesquisas que vem sendo realizadas (FRONZA, 2009). Ponderamos que é importante incorporar elementos culturais na sala de aula, entendendo que eles não estão dissociados do cotidiano dos alunos, e podem ser ferramentas úteis para a aprendizagem.

Introdução As discussões apresentadas neste texto compõem a pesquisa que está sendo desenvolvida no Mestrado em Educação na Universidade Estadual de Londrina, cujo tema é o uso de Histórias em Quadrinhos (também chamadas de HQs) para o ensino de história no âmbito das discussões do campo de investigação da Educação Histórica. Buscaremos, então, verificar de que maneira o uso de uma HQ com temática histórica pode contribuir para o desenvolvimento da aprendizagem histórica de alunos do ensino fundamental II a partir do caso concreto de uma história em quadrinhos baseada no romance clássico Os Miseráveis, de Victor Hugo. Faz-se necessário pontuar que a obra escolhida, publicada originalmente em 1862, tem como tema principal a miséria e desigualdade vividas na França do século XIX, e sua narrativa traz a história de diversos personagens que, de diversas maneiras, viveram a miséria no conturbado cenário político e econômico da França pós-revolução Francesa. Aqui, o foco é apresentar reflexões referentes à cultura histórica, aos quadrinhos e ao ensino de história, entendendo que são elementos importantes para o encaminhamento da pesquisa como um todo. Assim, o campo de Educação Histórica, no qual a investigação se insere, discorre sobre o ensino de História e seu foco são pesquisas que analisam as ideias históricas e a consciência histórica dos sujeitos (SCHMIDT, 2016). Isabel Barca (2001, p.15) coloca que o ensino de História se constitui como um campo fértil de investigação, sendo objeto de investigação [...] sob diversos ângulos que integram que perspectivas diacrónicas, quer a análise de problemáticas actuais do ensino específico, e é dentro desta segunda perspectiva que se desenvolve a investigação sobre ensino e cognição de História denominada Educação Histórica. Esta autora ainda acrescenta que Nestes estudos, os investigadores têm centrado a sua atenção nos princípios, fontes, tipologias e estratégias de aprendizagem em História, sob o pressuposto de que a intervenção na qualidade das aprendizagens exige um conhecimento sistemático das ideias históricas dos alunos, por parte de quem ensina (e exige também um conhecimento das ideias históricas destes últimos). (BARCA, 2001, p. 15). Além disto, ainda na esteira do pensamento de Barca (2001), entende-se que a análise de tais ideias supõe um enquadramento teórico que vá ao encontro da natureza do saber histórico, e é necessário que reflita na aula de História, no processo de construção do conhecimento em sala de aula. Justificativa A opção pelo uso de histórias em quadrinhos na pesquisa deu-se considerando que estas são fontes históricas relevantes ligadas ao âmbito da cultura juvenil, (SOBANSKI et al, 2009, p. 46) de maneira que permitem que os estudantes construam ideias históricas. Sobre o apelo que as histórias em quadrinhos têm com o público, Marcelo Fronza (2007), citando Eisner (1995, p. 125-136), coloca que a empatia é fundamental para que as HQs sejam um artefato mediador entre o público e o narrador. Desta forma, ao produzir uma HQ, é necessário que o autor considere suas próprias experiências culturais e as do leitor, utilizando-as para que exista um contato emocional entre eles. Ao mesmo tempo que o narrador deseja que sua mensagem ao público seja compreendida, o público espera receber uma mensagem compreensível, e é desta forma que surgem as histórias a serem narradas. As histórias em quadrinhos, segundo Will Eisner (1989), possuem uma 2883

estética singular (da Arte Sequencial) e são [...] uma forma artística e literária que lida com a disposição de figuras ou imagens e palavras para narrar uma história ou dramatizar uma ideia. Tratam-se de uma forma artística que tem sua difusão sobretudo a partir do século XX, de maneira que alcançaram posição de inegável destaque na cultura popular deste século, (EISNER, 1989, p. 05) e continuam tendo relevância também no corrente século. Os quadrinhos, de acordo com Lima (2017) enfrentaram resistências e críticas ao longo do século XX, mas gradativamente deixaram de ser vistos como leitura voltada para crianças e passaram a ser entendidos como forma de entretenimento de diversos públicos. Além disto, No que concerne ao campo da educação, o movimento de aceitação e incorporação dos quadrinhos foi ainda mais significativo, concentrando-se, em especial, em finais do século XX. De acordo com Waldomiro Vergueiro, tal processo acentuou-se durante a década de 1970 com publicações de quadrinhos com fins educativos, os quais ajudaram a firmar o entendimento de que as HQs podiam ser utilizadas para transmissão de conteúdos escolares (Vergueiro, 2014, p.19). (LIMA, 2017, p.148) Assim, Lima (2017) afirma que o uso de HQs em aulas de História tem se afirmado de forma lenta nas últimas décadas, especialmente graças ao [...]movimento historiográfico de ampliação da noção de fontes e pela abertura do espaço escolar para a utilização de novas linguagens (Rocha, 2015), de maneira que a problematização sobre o uso das HQs no ensino de História no Brasil não constitui novidade, podendo ser encontrada em artigos, dissertações e trabalhos de conclusão de curso (LIMA, 2017, p.153). Fronza (2009), em seus estudos utilizando-se de HQs, concluiu que valorizar a empatia que os quadrinhos causam nos jovens em relação ao conhecimento histórico é fundamental. Independente da temática específica de cada quadrinho, defendemos que seu uso enquanto fonte em sala de aula pode e deve ser explorado pelo professor, baseando-se justamente no fato de que esta simpatia dos alunos por eles pode levar a um maior interesse, de maneira que os estudantes [...] relacionam os quadrinhos com uma aprendizagem divertida e com a facilidade de leitura, que permitem uma melhor memorização dos conteúdos (FRONZA, 2009, p. 218). Outro fator relevante a ser considerado nas pesquisas realizadas em sala de aula no âmbito da Educação Histórica é a questão dos conhecimentos prévios, da bagagem prévia que os alunos carregam consigo. Sobre isto, Éder de Souza (2014) coloca que Levando em consideração a presença da História como fator de orientação, compreende-se também a existência de configurações históricas prévias, de concepções e ideias históricas que orientam o agir a partir de uma cultura histórica com a qual os sujeitos se relacionam. A presença dessa orientação objetiva da memória histórica não organizada desempenha um papel importante no equilíbrio mental de um indivíduo. Essas chamadas protonarrativas ou ideias prévias sobre a história, fazem parte do repertório intelectual e cultural dos indivíduos [...]. (SOUZA, 2014, p. 120) Sendo estas ideias prévias parte do repertório intelectual e cultural dos indivíduos, entendemos que valorizálas é de suma importância para um bom trabalho em sala de aula. A cultura é um elemento destacado também por Jörn Rüsen (2014, p. 13) ao colocar que o [...] contorno da vida cultura em que a formação humana de sentido se apresenta 2884

como um todo[...] é composto pela [...] multiplicidade, divergência, permanente mudança e, ao mesmo tempo, unido pela necessidade vital, comum a todos os seres humanos, de produzir sua própria natureza em forma de cultura. Para este autor, é apenas no espelho desta cultura que se pode entender e diferenciar o que é ser humano, como é existir enquanto tal. Objetivos Desta maneira, o objetivo deste trabalho é abordar sobre alguns dos conceitos que serão usados no decorrer da pesquisa, e um deles é o de cultura histórica. As HQs fazem parte da cultura histórica na qual eles os estudantes estão inseridos, e tal cultura trata-se da [...] articulação prática da consciência histórica em uma determinada sociedade. A rede desta articulação se estende desde o ensino de história a nível escolar até aos rituais comemorativos oficiais, dos manuais didáticos até os museus e monumentos e muitos outros lugares da memória coletiva. Entendido desta maneira, a cultura histórica integra funções de lembrar como o ensino, a diversão, a crítica, a ilustração e outras funções que incluem tantos os elementos cognitivos como os imaginários, emocionais (GARCIA, 1998, p. 291 apud ZAMBONI, 2005, p. 20), Esta cultura que nos cerca também se encarrega de fornecer conhecimentos prévios aos alunos, que podem ou não ser carregados de preconceitos. O professor deve então trabalhar neste limiar e entender que a bagagem cultural e histórica que seus alunos carregam influência e muito em suas aulas. Em outras palavras, a cultura histórica engloba os enraizamentos do pensar historicamente que estão fora da historiografia, ou seja, a convergência entre a história científica (que é feita através da historiografia, tratando-se de um saber adquirido profissionalmente) e a história sem historiadores, que é feita, apropriada e difundida por intelectuais, autores, cineastas, documentaristas, ativistas, artistas e etc., que tornam disponível um saber histórico que se difunde através de diversos suportes, como impressos, audiovisuais e oral (FLORES, 2007 apud ALVES, 2009, pp. 86-87). Para complementar a definição de cultura histórica, trazemos as reflexões do historiador e filósofo alemão que desenvolveu trabalhos ligados à metodologia do ensino de História Jörn Rüsen (2007, p. 121), afirmando que esta cultura é o campo em que os potenciais de racionalidade do pensamento histórico atuam na vida prática, de maneira que aquilo que é histórico tem um lugar próprio no quadro cultural em que estamos inseridos em nossa vida prática. Ela é, ainda, mais do que a ciência da história, abarcando outros aspectos além da historiografia. Portanto, nada mais é [...] do que o campo da interpretação do mundo e de si mesmo, pelo ser humano, no qual devem efetivar-se as operações de constituição do sentido da experiência do tempo [...]. Assim, o ser humano está envolvido pela cultura histórica e faz parte dela, salientando que esta não é apenas a cultura contida dentro dos livros historiográficos ou das universidades, mas sim estes combinados com as informações e conhecimentos que entramos em contato a cada dia. Rüsen (1994, p. 02-03, tradução nossa) também coloca que a cultura histórica é o resumo da universidade, do museu, da escola e das instituições culturais como conjunto de lugares da memória coletiva, [...] e integra as funções do ensino, do entretenimento, da legitimação, da crítica, da distração, da ilustração e de outras maneiras de memoras, na unidade global da memória histórica. 2885

Resultados Os resultados obtidos até aqui são parciais, frutos da revisão bibliográfica realizada desde o início da pesquisa no Mestrado, no ano letivo de 2017. O seguimento da pesquisa contará com aprofundamento de revisão bibliográfica sobre os conceitos pertinentes, bem com o desenvolvimento de uma aula-oficina utilizando-se a fonte escolhida, que é Os Miseráveis em quadrinhos. Entendendo que a pesquisa pauta- se no uso de fontes em sala de aula, espera-se que os alunos desenvolvam uma análise crítica a partir da fonte escolhida e da metodologia de aula proposta. Neste ínterim, cabe salientar que é essencial levar em consideração que os documentos não falam por si mesmos é necessário então fazer-lhes perguntas. Correia (2012) aborda sobre o trabalho com fontes literárias, mas suas observações são pertinentes também para o trabalho com fontes gráficas, como as HQs, entendendo que estas também possuem um enredo, um autor, um público, um contexto. Esta autora afirma que o trabalho com fontes literárias requer a realização de perguntas imprescindíveis, como: Quem é o autor? Qual o seu público? A quem se destina a obra? Em que momento histórico foi criado? Qual a importância desta obra nos dias atuais?, de maneira que os documentos só permitem acessos a dados mais densos à medida em que são questionados (CORREIA, 2012, pp. 192-193). Outra questão observada a partir da revisão bibliográfica, de acordo com Fronza (2009, p. 221) é o fato de que as HQs não podem ser trabalhadas sozinhas com o objetivo de produzir conhecimento histórico [...] pois a estrutura narrativa de seus enredos não segue todos os elementos necessários a uma narrativa histórica científica, tais como a fundamentação em métodos que busquem evidências relativas à realidade do passado. Considerações Finais Consideramos, a partir do que já foi abordado, que a incorporação de elementos culturais em sala de aula (sobretudo nas aulas de História) é importante, já que estes são muito presentes no cotidiano dos alunos e podem se constituir enquanto ferramentas úteis para a aprendizagem. Abordamos o caso específico das histórias em quadrinhos, entendendo que sua forma pode contribuir para as aulas. A sobreposição de textos e imagens nos quadrinhos faz de sua leitura um ato de percepção estética e de esforço intelectual (EISNER, 1989, p.08), trabalhando com habilidades necessárias não apenas às aulas de História, mas à sua formação de maneira geral. As HQs [...] comunicam numa linguagem que se vale da experiência visual comum ao criador e ao público. Pode-se esperar dos leitores modernos uma compreensão fácil da mistura imagem-palavra e da tradicional decodificação do texto. A história em quadrinhos pode ser chamada de leitura num sentido mais amplo que o comumente aplicado ao termo (EISNER, 1989, p. 07). Desta maneira, consideramos que o trabalho com histórias em quadrinhos em sala de aula é viável e pode contribuir para a construção do conhecimento histórico. Concordamos com Fronza (2012, p. 136) que pondera que a cultura histórica no âmbito da disciplina de História é baseada no princípio da narrativa, e pode ordenar temporalmente os procedimentos da cultura escolar a partir da experiência que os jovens têm com o conhecimento. Este autor ainda coloca que é necessário que se busquem os valores ligados à cultura juvenil e à [...] cultura histórica elaborada na abordagem das histórias em quadrinhos com temas históricos, pois isso permite a construção de uma Educação Histórica que forme uma juventude [...] que possa 2886

combater as estruturas do mundo que ainda contém muita desigualdade, exclusão, pobreza (FRONZA, 2012, p. 112-113). O objetivo é levar os alunos, através do trabalho com uma obra que trata justamente da miséria e das desigualdades, como Os Miseráveis, a ponderar, através da reflexão sobre uma obra escrita há dois séculos, sobre as desigualdades e misérias do próprio contexto em que eles, no século XXI, estão inseridos). Referências ALVES, Fabricio Gomes. Entre a Cultura Histórica e a Cultura Historiográfica: implicações, problemas e desafios para a historiografia. AEDOS. Num. 5, vol. 2, Julho-Dezembro 2009. BARCA, Isabel. Educação llislórica: Uma nova área de investigação. In. ARIAS, José Miguel. (org). Dez Anos de pesquisas em ensino de História. Londrina: AtritoArt, 2005. CORREIA, Janaína dos Santos. O uso da fonte literária no ensino de história: diálogo com o romance Úrsula (final do século XIX). Revista História & Ensino, Londrina, v. 18, n. 2, p. 179-201, jul./dez. 2012. Disponível em: <https://moodle.ufsc.br/mod/resource/view.ph p?id=456839>. Acesso: 30 set. 2017. EISNER, Will. Quadrinhos e arte seqüencial. São Paulo: Martins Fontes, 1989 FRONZA, M. O significado das histórias em quadrinhos na Educação Histórica dos jovens que estudam no Ensino Médio. 170 p. Dissertação (Mestrado em Educação) Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2007. Aprendendo história com as histórias em quadrinhos. In: SCHIMDT, Maria Auxiliadora; BARCA, I. Aprender história: perspectivas da educação histórica. Ijuí: Editora Unijuí, 2009. p. 197-224. A intersubjetividade e a verdade na aprendizagem histórica de jovens estudantes a partir das histórias em quadrinhos. 465 p. Tese (Doutorado em Educação) Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2012. LIMA, Douglas Mota Xavier de. Histórias em quadrinhos e ensino de História. Revista História Hoje, v. 6, nº11, 2017, p. 147-171. RÜSEN, Jörn. Que es la cultura historica?: reflexiones sobre uma nueva manera de abordar la historia. Tradução de: SÁNCHEZ COSTA, F.; SCHUMACHER, Ib. Original In: FÜSSMANN, K.; GRÜTTER, H. T.; RÜSEN, J. (Eds.). Historische faszination. geschichtskultur heute, 1994.. História Viva: teoria da história III: formas e funções do conhecimento histórico. Tradução de Estevão de Rezende Martins. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2007.. Cultura faz sentido: orientações entre o ontem e o amanhã. Tradução de Nélio Schneider. Petrópolis: Vozes, 2014. SCHMIDT, Maria Auxiliadora. Jovens brasileiros, consciência histórica e vida prática. Revista História Hoje, v. 5, nº 9, p. 31-48, 2016. SOBANSKI, A. de Q.; CHAVES, E. A.; BERTOLINI, J. L. da S.; FRONZA, M. Ensinar e aprender História: histórias em quadrinhos e canções. Curitiba: Base Editorial, 2009 SOUZA, Éder Cristiano de. Cinema e educação histórica: Jovens e sua relação com a história em filmes. 358 p. Tese (Doutorado em Educação) Programa de Pós Graduação em Educação, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2014. ZAMBONI, Ernesta. Digressões sobre a educação e o ensino de história no século XXI. HISTÓRIA & ENSINO, Londrina, v. 11, jul. 2005b. 2887