Palavras-chave: Design de Calçados, Inclusão Sociocultural, Deficiente físico, Imagem Pessoal



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Ms. Mariana Rachel Roncoletta FAU/USP Resumo O presente artigo discute os desejos das usuárias portadoras de deficiência física do aparelho locomotor com relação ao design de calçados. Combinou-se os estudos fenomenológico e de caso seguindo o Código de Ética de Pesquisa da CONEP Resolução 196/96 para realizar entrevistas semi-estruturadas que apresentou imagens e produtos. As usuárias revelaram os desejos por calçados que remetam à sensualidade e à feminilidade como diretrizes fundamentais do projeto em design de calçados. Concluí-se que a adoção destas diretrizes conceituais no desenvolvimento de calçados podem aprimorar a qualidade de vida das usuárias com relação ao bem estar social e promover efetiva inclusão sociocultural. Palavras-chave: Design de Calçados, Inclusão Sociocultural, Deficiente físico, Imagem Pessoal Introdução: O desejo por calçados O desejo, na área do design, é compreendido como ato de querer do sujeito desejante nos níveis consciente ou inconscientes. Segundo Portinari in Coelho (2008, p. 70), o desejo é um hiato, condicionado à possibilidade de simbolização da falta, depende da ordem da linguagem, ou seja, o ato de desejar está relacionado diretamente a querer aquilo que nos falta como indivíduos socioculturais. Fry (2009, p. 80-82) aprofunda a discussão ao dizer que o desejo gera a diferença, não se pode reduzi-lo a uma única caracterização ou leque de qualidades. O autor elabora sua argumentação a partir de conceitos filosóficos sobre o desejo, para Aristóteles o desejo/apetite e o intelecto/mente são vistos como elementos de uma única coisa. O desejo que nos é apresentado normalmente, como uma paixão, sob a ótica de Fry, é essencial para a nossa existência. É o desejo que nos movimenta no mundo, acrescentamos, que nos tira do confortável sofá da sala, parafraseando Preciosa (2004). Sob este viés, como poderíamos proceder para investigar as necessidades e desejos de nossas usuárias com relação ao design de calçados? Fry, nos oferece uma perspectiva ao comentar sobre desejos específicos que exigem uma localização, um corpo pelo o qual as necessidades sejam expressas ou projetadas como coisa

desejada. Neste sentido, podemos compreender o calçado como artefato corpóreo que simbolize desejos e necessidades das usuárias. Este estudo investiga seus desejos como diretrizes conceituais no desenvolvimento de projeto em design de calçados para portadoras de deficiência física 1 do aparelho locomotor que possam promover efetiva inclusão sociocultural. Os calçados são ferramentas protéticas poderosas no sentido de ampliar os valores simbólicos de nossos corpos, reforçam identidades pessoais ou coletivas. Argumento reforçado por Castilho e Martins (2005) ao comentar que a moda é um sistema de linguagem, um discurso de ideias transformadas em produtos, e que estes, por sua vez, refletem os valores e preocupações socioculturais pela interpretação subjetiva de seu criador. Podemos compreender, portanto, que os objetos para as satisfazerem devem proporcionar prazer por intermédio da experiência de adquiri-los, usá-los e demonstrá-los na esfera social. Segundo Jordan (2000) o prazer, um construto abstrato, encontra-se na relação entre o usuário, os produtos e o ambiente onde tais produtos são usados. Os objetos podem ser vistos como objetos vivos com os quais o ser humano se relaciona, podem nos deixar alegres, tristes, seguros, ansiosos, etc. São quatro tipos de prazer: físico, social, psicológico e ideológico. O físico é derivado da relação do objeto com os órgãos sensoriais. O prazer social é a interação entre várias pessoas proporcionada por um objeto. Já o psicológico está associado às reações emocionais e cognitivas das pessoas em relação ao produto. Refere-se ao prazer da mente em realizar tarefas relacionadas à usabilidade e compatibilidade dos produtos considerados amigáveis. O prazer ideológico está associado aos valores estéticos e éticos de uma determinada cultura, geração ou indivíduo. Encontram-se aqui os valores ecos-sustentáveis, responsabilidade social, política e moral. Materiais e métodos Estudo fenomenológico combinado com pesquisa de campo. Utilizamos imagens, produtos (fig. 1 a 8) e entrevistas semi-estruturadas com foco nos aspectos subjetivos estéticos e simbólicos do design de calçado com o objetivo de identificar os valores, desejos e anseios das usuárias em potencial. Realizamos as entrevistas nas casas das usuárias 2, para que assim pudéssemos conhecer alguns valores subjetivos. Foram selecionadas participantes que possuíssem diferença de 2

membros inferiores entre 2 a 5 cm, independente de suas patologias, uma vez que, precisavam de compensações nos calçados para equilibrar a diferença entre seus membros inferiores. Solicitamos que as entrevistadas assinassem o Termo de Consentimento Informado, conforme a Resolução 196/96 do Código de Ética em Pesquisa com Seres Humanos do Conselho Nacional de Ética de Pesquisa - CONEP. Todos os sujeitos da pesquisa obtiveram um retorno da pesquisadora para que aprovassem a publicação do material e também para que conhecessem os resultados desta pesquisa. Fig. 1: Sheila s Heels desenvolvido em 2005 por uma seguradora de carros inglesa, possui variação de 2 alturas, é comercializado na Inglaterra. Custo aproximado de 300 libras o par. Fonte: site Sheila Insurece. Fig. 2: Footloose patente de Marte den Hollander, estudante de Design Industrial em Delf Holanda, desenvolvido em 2006. Ainda não foi comercializado. Fonte: site Virtual Shoes Museum. Fig. 3: 38degrees desenvolvido em 2004 pelo estudante de pós-graduação Wei-Chieh Tus,do Brooklyn Institute, varia em 6 alturas de salto apertando o botão cinza. Não está à venda. Fonte: site NY Times Fig. 4: Sophie Cox trabalho de graduação em design de produtos da australiana em 2004. Fonte: blog GizMag. Fig. 5: Hilo Shoes - projeto iniciado em 2000, comandado pela designer de moda Rosemary Wallin, recebeu recentemente 500.000 libras para o desenvolvimento industrial do produto. Fonte: site Britsh Council. Fig. 6: Camileon - desenvolvidos por Donna e David Handel, existem em vários modelos e são comercializados desde 2004 nos EUA. Custam de US$ 210, 00 a 350,00. Fonte: site Camileon Heels. 3

Fig. 7: A vista frontal dos sapatos adaptados simulando o movimento da macha. Fonte: Roncoletta (2009). Fig. 8: Calçado construído pela autora de couro macio, com salto de madeira e solado antiderrapante; possui a diferença de altura de 3cm, sendo 1cm na planta e 2cm de salto. Fonte: Roncoletta (2009). Vale ressaltar que, devido às diferenças de tamanho nas numerações de pés e de membros inferiores, as entrevistadas não puderam usar os calçados: esta é uma limitação do método de nossa pesquisa. Os aspectos levantados nesta pesquisa com relação às funções de uso do objeto vieram de depoimentos relacionados às suas próprias experiências com calçados anteriores 3. Discussão: O desejo no design de calçados As nossas usuárias identificaram que os sapatos devem ser fáceis de calçar e descalçar, e fáceis de limpar; confeccionados em materiais macios, que permitam a transpiração, e que suas costuras não as machuquem. Devem também proporcionar segurança, isto é, os calçados devem estar firmes em seus pés, bem presos pelo cabedal 4, seus saltos devem proporcionar estabilidade ao marchar com sola antiderrapante, não provocando a sensação que podem virar o pé, e, por último, seria agradável poder sentir o chão, acrescentam. As características de sensual e feminino atribuídas aos calçados, foram extraídas dos depoimentos de nossas entrevistadas. A sensualidade se encontra no poder de seduzir o outro e de nos auto seduzir através da excitação dos sentidos. O visual e o tátil são os mais utilizados na área do design de moda. Materiais macios e suaves, como o couro de ovelha, literalmente acariciam a sensibilidade tátil de nossos corpos. O calçado com características sensuais e femininas é aquele que faz com que a usuária se sinta confiante, incluída em relação ao meio social, isto é, que lhe proporcione benefícios emocionais, prazer social e psicológico, conforme o contexto da situação. No dia-a-dia, nossas usuárias estão razoavelmente satisfeitas com os modelos de tênis, sapatilhas e anabelas, se os mesmos permitirem a construção da sua imagem pessoal. Vale relembrar que estes calçados devem ser adaptados aos seus corpos. Já em ocasiões especiais, pressionadas, 4

muitas vezes pela indústria cultural, os calçados tipo escarpin ou sandália de salto alto (mais de 6 cm) ou médio (aproximadamente 4 cm), foram apontados por nossas usuárias como modelos capazes de transmitir esta confiança, relacionada diretamente ao poder de sedução feminino. São nestes momentos especiais que elas querem encantar e fascinar o outro. São estes instantes de estrelas da passarela da vida que as preocupam. Satisfazer suas necessidades básicas não basta; se fosse assim, ficariam com as botas ortopédicas. O calçado é um objeto de design de moda que precisa ser variável conforme os sonhos, vontades e desejos do indivíduo que o utiliza em situações diversificadas. O design de moda, representado aqui pelo design de calçados, é uma das ferramentas que permite construir imagens sociais. A composição de seus looks pode transformá-las na princesa romântica, essencial para Jacque, ou na rainha do baile, indispensável para Nelly, ou ainda na empresária poderosa, ressaltada por Karin. Os calçados fazem parte destas transições de personagens dos quais vivemos. A falta de artigos, combinada com a dificuldade de encontrá-los ou adaptá-los, é a negação desta possibilidade de se construir personagens; é abrir portas para a depressão, como Nelly relatou. Conclusão Concluímos que as funções estético-simbólicas dos calçados podem aprimorar a qualidade de vida de nossas usuárias. Qualidade de vida significa mais do que ser saudável no aspecto físico, mas, também, no sentido de se sentir bem. O bem estar está relacionado com a possibilidade de se construir imagens pessoais de acordo com suas vontades, influenciadas também pela indústria cultural. Poder, sedução e feminilidade são os principais valores simbólicos atribuídos por nossas entrevistadas aos calçados. Encontrar um equilíbrio entre sedução, como melhoria de qualidade de vida social e recomendações ergonômicas, como melhoria de qualidade de vida através da saúde, é projetar calçados seguros e sensuais baseado no prazer físico, social, psicológico e intelectual. Oferecer uma gama de produtos as usuárias deficientes físicas que possa ser utilizada para comunicar seus desejos e não suas restrições físicas nos parece, sim, fazer design de moda com responsabilidade que possa proporcionar efetiva inclusão sociocultural. Referências bibliográficas: 5

CASTILHO, Kathia e MARTINS, Marcelo. Discursos da moda: semiótica, design e corpo. Cap. 1: A comunicação de moda por meio do design. São Paulo: Editora Anhembi Morumbi, 2005. FRY, Tony. Reconstruções: ecologia, design, filosofia. Trad.: Gilson Cesar Cardoso de Souza. São Paulo: Edusp, 2009. IBTeC. Cartilha do Calçado, edição 01 ano 2006/2007. Novo Hamburgo, IBTeC, 2007. JORDAN, Patrick W. Designing pleausurable products. Londres: Taylor & Francis, 2000. PORTINARE in COELHO, Luiz Antonio. Conceitos chave em design. Rio de Janeiro: Editora PUC RIO, 2008. OMS apud PINTO, Ana Claudia Alves e DISCHINGER, Marta. Definindo diretrizes para maximizar as capacidades de indivíduos que sofrem de restrições Anais 7º Ergodesign, Camboriu, 2007. CD-ROM. PRECIOSA, Rosane. Produção Estética notas sobre roupas, sujeitos e modos de vida. São Paulo: Editora Anhembi Morumbi, 2004. RONCOLETTA, Mariana Rachel. Calçados sensuais para mulheres excepcionais: uma reflexão sobre design de calçados para mulheres portadoras de restrições físicas. São Paulo, 2009. Dissertação (Mestrado em Design) Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu Mestrado em Design da Universidade Anhembi Morumbi UAM. STELLE in RIELLO, Giorgio e McNELL, Peter. Shoes a history from sandals to sneakers. Nova York: Berg, 2006. Notas: 1 São utilizados pela OMS os termos: portador de necessidades especiais (PNE), portador de restrição física e portador de deficiência física. Conforme a OMS Organização Mundial de Saúde: A palavra restrição está ligada a fatores externos à pessoa, pois um ambiente pode trazer restrições a uma pessoa, já a palavra deficiência se relaciona aos fatores fisiológicos do indivíduo que o colocam em desvantagem em relação ao outro. OMS (WHO - ICF 2001) apud Pinto e Dischinger (2007, p. 02). Apesar da OMS sugerir uma alteração de terminologia na tentativa de minimizar o estigma da palavra deficiente, nossas entrevistadas a preferem, portanto, a utilizaremos. 2 Entrevistas realizadas em outubro de 2008. As usuárias foram indicadas por profissionais da saúde do Instituto do Pé do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, da Clínica de Ortopedia e Fisioterapia, ambas na cidade de São Paulo, e da Clínica Nivaldo Baldo - especialista em fisioterapia para atletas, da cidade de Campinas. 3 As questões relacionadas à segurança e à diversificação corporal forma trabalhadas na abrangência desta pesquisa. Durante nossas entrevistas, verificamos que o contexto do portador de deficiência física está muito aquém dos universos do design ou da moda. Encontramos ainda muito preconceito social. As vozes das usuárias 6

relataram diferentes preocupações que as rodeiam constantemente, são elas: inserção sociocultural, inclusão no mercado de trabalho, preconceito, mobilidade, possibilidade de educação, acesso e falta de informação. Para saber mais sobre o assunto ver: RONCOLETTA, Mariana Rachel. Calçados sensuais para mulheres excepcionais: uma reflexão sobre design de calçados para mulheres portadoras de restrições físicas. São Paulo, 2009. Dissertação (Mestrado em Design) Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu Mestrado em Design da Universidade Anhembi Morumbi UAM. 4 O sapato possui duas grandes partes distintas: o cabedal é a parte superior do calçado e o solado compõe a parte inferior. Cada uma delas possui diferentes elementos. Fonte: IBTeC (2007). Currículo: Ms. Mariana Rachel Roncoletta Fashion stylist, jornalista e designer. Doutoranda em Design e Arquitetura pela FAU/USP. Mestre em Design pela Universidade Anhembi Morumbi (UAM). Pós-Graduada em Jornalismo e especialista em Comunicação pela mesma instituição. Graduada em Desenho de Moda pela Faculdade Santa Marcelina. Docente nos bacharelados em Negócios e Design de Moda da UAM e na pós-graduação em Criação de Imagens e Styling de Moda do SENAC. Pesquisa design de moda inclusiva e design para a saúde. É consultora no desenvolvimento de projetos de imagens de moda. 7