A Galáxia da Internet (Fichamento)

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Transcrição:

A Galáxia da Internet (Fichamento) Prof. Marcello Gabbay CASTELLS, Manuel. A galáxia da Internet: reflexões sobre a Internet, os negócios e a sociedade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001. Manuel Castells é um sociólogo espanhol que passou pelas Universidades de Paris, de Barcelona e da Califórnia em Berkeley. Até a década de 1970 seguiu orientação marxista. A partir de 1980, passou a refletir sobre as NTICs e seu papel na nova ordem econômica que então surgia. Entre 1996 e 1998 publicou a trilogia A Era da Informação abordando temas como sociedade em rede no contexto histórico da desregulação dos mercados e da globalização juntos com seus lemas liberdade, mobilidade e tecnologia. Abertura: a rede é a mensagem. Tomando como ponto de partida a analogia ao slogan mcluhaniano, Castells proclama a rede como base tecnológica da nova forma de organização social na chamada Era da Informação. As redes de informação, ou redes de redes, têm na Internet sua fonte de energia e movimento. Essa nova forma organizacional é marcada por alta flexibilidade, descentralização, individualização e globalização da comunicação, segundo o autor, horizontalizada (7-8). O surgimento dessa nova estrutura social data do final do século XX, marcadamente a partir de três grandes acontecimentos: 1. as exigência de uma economia administrativamente mais flexível e globalizada; 2. a supremacia dos valores da liberdade individual e da comunicação aberta; 3. e os avanços tecnológicos em telecomunicações e informática. A sociedade de rede engendra, então, uma nova economia. A influência da Internet nessa nova ordem sócio-econômica está relacionada não só ao acesso à rede, mas à qualidade do uso. De fato, ser excluído dessas redes é sofrer uma das formas mais danosas de exclusão em nossa economia e em nossa cultura (8). A Internet é resultado de um projeto de comunicação livre, é, portanto, uma tecnologia suscetível de ser profundamente alterada por sua prática social (9). Aplicada ao novo mundo dos negócios, é capaz de modificar as direções (não as diretrizes, leis 1

econômicas) e acrescentar novas regras. A nova economia é a economia da indústria da Internet, mas pode ser também uma forma refinada da velha economia, onde a Internet serve ao uso específico das empresas (10). A elasticidade da Internet a torna particularmente suscetível a intensificar as tendências contraditórias presentes em nosso mundo. Nem utopia nem distopia, a Internet é a expressão de nós mesmos através de um código de comunicação específico, que devemos compreender se quisermos mudas nossa realidade (11). A Internet é uma rede de comunicação global, mas seu uso e sua realidade em evolução são produto da ação humana sob as condições específicas da história diferencial (12). História da Internet: 1958-1969: Advanced Research Projects Agency (Departamento de Defesa dos EUA), a Arpanet surgiu para colaborar na corrida tecnológica com a URSS. Em 1969, os primeiros nós da Arpanet estavam na Universidade da Califórnia em L.A. A Arpanet nasceu e seguiu marcada pela filosofia acadêmica mais do que militar., envolvendo estudantes de pósgraduação numa atmosfera totalmente relaxada do ponto de vista da segurança, incluindo uso da Arpanet para conversas pessoais sobre TV, ficção científica e compra de maconha. Porém, a Internet só foi possível graças ao financiamento governamental que tinha, esse sim, interesses militares voltados à corrida tecnológica da Guerra Fria. Por outro lado, o investimento soviético em tecnologia caia na atmosfera do sigilo absoluto e na inflexibilidade da tecnologia para o desempenho (21-23). A Internet, é uma tecnologia financeiramente ousada demais para ter surgido nos mundo dos negócios, nasceu com apoio de Governos e academias, uma dupla associação entre financiamento elástico e liberdade criativa (23-24). 1975-1983: A Arpanet migra para a Defense Communication Agency dos EUA e depois passa a funcionar como Arpa-Internet, projeto que possibilitaria o surgimento da Internet como conhecemos hoje, uma rede de redes, a partir de 1990 (13-15). 2

1984-1991: Surgimento do sistema Unix e da filosofia copyleft, em 1991, um estudante de 22 anos cria o Linux na mesma filosofia aberta. 1990: dezembro, surgimento o programa navegador e editor de rede chamado world wide web, o WWW, a rede mundial. 1994: primeiro navegador comercial, o Netscape, lançado em 15/12/1994 e no ano seguindo liberado gratuitamente na Internet para fins educacionais e U$ 39,00 para uso comercial. 1995: A Microsoft lança o Windows 95 e o Internet Explorer (18-19). A cultura da Internet: Castells parte do noção de que os sistemas tecnológicos são socialmente produzidos e a produção social é estruturada culturalmente, portanto, a cultura dos produtores da Internet moldou o meio. O autor distingue produtores/usuários de consumidores/usuários, sendo os primeiros aqueles cuja prática é reintroduzida no desenvolvimento do sistema tecnológico, e os segundos meros beneficiários apesar de contribuírem indiretamente com base de informação. A ideologia da liberdade seria segundo Castells, a base cultural do funcionamento da Internet, mas não de seu desenvolvimento (34). Castells distingue 4 camadas da cultura da Internet em constante articulação: 1. Tecnoelites: enraizada na academia e na ciência, numa relação de continuidade direta com o Iluminismo e a Modernidade, cujas características principais são a descoberta tecnológica como valor supremo, o constante aperfeiçoamento do artefato tecnológico, a relação simbólica com os pares, e a comunicação aberta para um processo colaborativo de desenvolvimento científico (36-37). 2. Hackers: a ética hacker seria responsável pela característica cultural da sociedade da informação, que preza por uma filosofia de cooperação e livre comunicação. A cultura hacker seria a mediadora entre o conhecimento tecnológico gerado pelas tecnoelites e o os subprodutos empresariais que difundem a Internet na sociedade. Vale ressaltar que hacker diferem de crackers, esses voltados a um uso danoso da conexão. A cultura hacker, ao contrário, vem do conjunto de valores e crenças que emergiu das redes de programadores de 3

computador autônomos e criativos, baseados na fonte aberta, o software livre, a exemplo do Linux (ver pág. 41). A Internet foi originalmente a criação de uma cultura tecnomeritocrática; depois tornou-=se a base para sua própria atualização tecnológica através do input fornecido pela cultura hacker, interagindo na Internet (38). A liberdade é um valor fundamental na cultura hacker, liberdade designa possibilidade criativa e apropriadora de conhecimento, assim como liberdade de replicação colaborativa. Mesmo quando a inovação tecnológica em si ou a satisfação pessoal são os motivadores do hacker, a liberdade ainda guarda um valor central na prática hacker. A economia do dom presente na cultura hacker é como Castells classifica essa prática colaborativa no desenvolvimento tecnológico. Prestígio, reputação e estima social estão ligados à relevância da doação feita à comunidade (42). Há, portanto, na cultura hacker, um tipo de sentimento comunitário baseado nos princípios ordenadores desse grupo social informal que, segundo o autor, resumem-se na crença compartilhada no poder da interconexão de computadores e a determinação de manter esse poder tecnológico como um bem comum pelo menos para a comunidade dos hackers (43, 46). 3. Comunidades virtuais: As comunidades virtuais deram novo rumo aos usos, processos e formas sociais da Internet. Porém, adverte Castells, a cacofonia das comunidades virtuais não representa um sistema relativamente coerente de valores e normas sociais, como é o caso da cultura hacker (48). Esse tipo de comunitarismo virtual confere a Internet o caráter de meio tecnológico para a comunicação horizontal, uma nova forma de livre expressão, além de marcar a autonomia das redes e processos comunicativos como base da nova forma de organização social e a ação coletiva simbólica (49). 4. Empresários: A influência entre Internet e empresas é recíproca. A Internet foi o meio indispensável e a força propulsora na formação da nova economia, erigida em torno de normas e processos novos de produção, administração e cálculo econômico. A inovação empresarial, e não o capital, foi a força propulsora da economia da Internet (49). O mercado por meio da Internet não reside mais apenas na previsão do futuro, mas na formação do mesmo (50). A cultura dos empresários da Internet é, segundo o autor, a mais multiétnica e global de toda a história. Na página 52 ele descreve o perfil do novo empresário, tão alinhado ao turbocapitalismo de aceleração e achatamento espaço-temporal. A cultura da Internet define-se então a partir das 4 camadas assinaladas acima: 4

cultura tecnomeritocrática da excelência científica e tecnológica ; a cultura hacker; as comunidades on-line; e os empresários da Internet. Negócios eletrônicos e a nova economia: Na nova economia a empresa de rede consiste numa agência enxuta de atividade econômica, a rede é a empresa, afirma Castells (58). Apesar de toda estrutura física (mínima), a prática empresarial em si é executada por redes flexíveis às nuanças e rapidez da economia global (59). Essa nova ordem econômica que altera a forma do trabalho e a cultura do trabalhador e da empresa deixa, sem dúvida, lastros de subempregos (exemplo dos faxineiros latinos da Cisco, pág. 62). O consumidor, por seu lado, é parte fundamental no feedback informacional da nova economia. Na pág. 64 Castells descreve uma rede de retroalimentação de dados em tempo real a partir do cadastro de clientes da fabricante de vestuário Zara. No caso das empresas online, o cadastro de clientes e a simples navegação de sites gera um volume de informações de base valioso para as atividades de produção, distribuição e marketing das empresas. Mas se a empresa de rede enquanto modelo de negócios é anterior a Internet em si, o ganho que tiveram com o surgimento da Web reside na escalabilidade, interatividade, administração da flexibilidade, uso de marca e customização num mundo empresarial em rede (65-66). Castells ressalta a importância que teve a mudança dos mercados de capitais no financiamento às atividades de alto risco financeiro por meio da Internet. O novo mercado financeiro global acompanha um novo conjunto de regras e padrões de avaliação (valoração) das ações. A queda das barreiras regulatórias nacionais e a alta flexibilidade dos negócios online favorecem a aceleração dos negócios, que passam a operar em tempo real em escala global (68). O investimento em empresas e tecnologias de risco alto compensa na medida em que o lucro dos sucessos é sensivelmente maior que a perda com investimentos fracassados (69). Porém, adverte Castells, a própria interconexão entre mercados em escala global em alta velocidade resulta em maior interdependência de mercados e em multiplicação das fontes de volatilidade... como uma tendência sistêmica (70-71, 73), provável causa da crise econômica a que assistimos em 2008 e 2009. Porém, ao contrário do que se especulava no final do século XX, o mercado não recuou de investimentos em empresas on-line. O valor 5

nominal da empresa não responde por seu valor de mercado, variáveis intangíveis como facilidade de mudança organizacional, investimento em tecnologia fazem a diferença, marca, imagem corporativa e eficiência administrativa (73). A nova economia traz consigo um novo modelo de trabalho, marcado por profissionais autoprogramáveis capazes de trabalham em hierarquia plana e em equipe, capacitados e equipados para o trabalho em rede. Porém, adverte Castells, autonomia, envolvimento e uma forma diluída de prosperidade cooperativa têm um preço: total comprometimento com o projeto da empresa, muito além do estipulado pelos dispositivos contratuais (ver descrição na pág. 79) (78-79). A superdedicação atingiu também um novo nicho de mão-de-obra em mulheres e imigrantes. A mão-de-obra autoprogramável tem como seu oposto a chamada mão-de-obra genérica formada por trabalhadores sem habilidades especiais e facilmente substituíveis por máquinas ou outros genéricos. Apesar disso a mão-deobra genérica é necessária ao funcionamento do sistema. Os trabalhadores aí enquadrados não têm menor valor humano ou individual, mas carecem de investimento em capital intelectual, afirma o autor (80). Porém, tanto a mão-de-obra genérica como a autoprogramável se em relações de trabalho flexíveis, que levam por terra o antigo modelo de emprego estável de longo prazo, resguardado por leis e contratos trabalhistas (direitos, benefícios, etc) (81). Resumindo: a nova economia é movida pela tecnologia da informação, dependendo de profissionais auto-programáveis capazes de gerar inovação, e organizada em torno de redes de computadores (85). O processo de inovação está imbricado no espírito de cooperação e do livre acesso. Castells enumera os principais aspectos de inovação na nova economia: 1. efeitos de rede (maior quantidade possível de nós/fontes de informação na rede); 2. dependência de caminho (primeiros a adotar uma inovação têm vantagem no caminho do mercado; 3. retornos crescentes (tendência a diminuição dos custos de uma inovação ao longo de sua introdução na economia e no mercado) (85). Lógica da inovação: cooperação e fonte aberta = compradores/produtores na empresa online (cadastros de clientes e usuários que geram valorosas bases de informação para o mercado ver pág. 86). 6

Em seu cerne, a nova economia se funda na cultura: na cultura da inovação, na cultura do risco, na cultura das expectativas [futuras] e, por fim, na cultura da esperança no futuro... No entanto, o conhecimento e a experiência da fragilidade desse processo de criação de riqueza podem gerar uma nova filosofia pessoal no modo como viveremos o segundo estágio da nova economia (94). Comunidades virtuais ou sociedade de rede? Realidade social e virtualidade: Castells acredita que as relações de interação social on-line não têm, aparentemente, efeito direto sobre a configuração da vida cotidiana (100-101). A comunicação mediada por computador se aplica, segundo o autor, às relações com amigos. O fato dos usuários de Internet terem menor contato direto com parentes tem causas no que pesquisas consultadas por Castells apontam como fator de classe (ver pág. 101). Estudos apontam que usuários da Internet tendem a ter redes sociais maiores que não usuários, seria uma afirmação da Internet como extensão da vida social, oposta à noção crítica de alienação e individualização. As pesquisas ainda apontam as classes altas com maior tendência ao uso da Internet na reativação de contatos com amigos distantes. Jovens contactam preferencialmente amigos e pessoas mais velhas, parentes (102-103). Ver caso Netville pág. 103. Comunidades, redes e a transformação da sociabilidade: A primeira noção de comunidade virtual a partir do surgimento massivo da Internet voltava-se para o aparecimento de novos suportes tecnológicos para a sociabilidade. Porém, adverte Castells, o grande equívoco foi a redução da questão ao velho debate (redutor, segundo o autor) entre a comunidade antiga idealizada mas espacialmente limitada, e a nova comunidade das escolhas e da liberdade, mobilidade, proporcionada pela Internet (105). O ponto decisivo foi a passagem da limitação espacial como fonte de sociabilidade para a comunidade espacial como expressão da organização social. As novas formas de interação social levaria, para Castells, uma redefinição de comunidade, com menos ênfase no aspecto cultural e desvinculada de um único suporte material (o território). Comunidades são redes de laços interpessoais que 7

proporcionam sociabilidade, apoio, informação, um senso de integração e identidade social independente do fator espacial ou territorial, afirma Barry Wellman. Em suma, Castells propõe o deslocamento da comunidade para a rede como forma central de organizar a interação (106). A ascensão do individualismo, marca da nossa sociedade contemporânea, e funda um sistema de relações sociais centrado no indivíduo. A partir de Wellman, Castells classifica as relações sociais em: 1. primárias (família, comunidades locais e de afeto); 2. secundárias (associações e órgãos); 3. terciárias, esta findada em redes egocentradas ou comunidades personalizadas, uma forma de privatização da sociabilidade oriunda da nova ordem do capital e do trabalho, própria da empresa de rede, mais centrados no indivíduo (ou seja, não é um atributo psicológico, mas social), além da queda do padrão patriarcalista, desarticulação da família e das antigas mediações simbólicas e socioculturais (comunidades religiosas, territoriais, trabalhistas, etc), forte urbanização da vida, individualização da vida na nova arquitetura das cidades (condomínios, shoppings, deliveries, etc), e a crise de legitimidade política ocasionada pelo afastamento entre cidadãos e Estado, a saída do indivíduo da esfera pública (a esfera pública e a cidadania são condições do coletivo BAUMAN; HABERMAS, etc). Castells nomeia o novo padrão social de individualismo em rede (108). A Internet como suporte material para o individualismo em rede: Castells afirma, a Internet é eficaz na manutenção de laços fracos. Porém, mesmo pouco ou nada duradouras, as conexões estabelecidas pela Internet mantêm o fluxo de interações sociais ativo, que para muitos serve como mais uma prática relacional cotidiana (108). A efemeridade e desarticulação das comunidades on-line com a interação física fazem delas uma forma de rede de sociabilidade nova ou alternativa, cujas características são a geometria variável, a composição cambiante de acordo com os interesses dos atores e da própria rede (109). Segundo o autor, o papel mais importante da Internet na estruturação de relações sociais é sua contribuição para o novo padrão de sociabilidade baseado no individualismo. A nova tecnologia de comunicação on-line veio facilitar, acelerar e sedimentar de vez um processo de socialização em rede que já se manifestava em formas mais rústicas. Agora, as redes sociais são mediadas pelo computador (relações midiatizadas). 8

Assim, não é a Internet que cria um padrão de individualismo em rede, mas seu desenvolvimento que fornece um suporte material apropriado para a difusão do individualismo em rede como uma forma dominante de sociabilidade (109). IMPORTANTE: O individualismo em rede é um padrão social, não um acúmulo de indivíduos isolados (109). São indivíduos que estruturam suas redes conforme interesses diretos e pessoais, valores, afinidades, projetos; redes que são mediados pelo computador (online) ou não (off-line). Assim, as comunidades virtuais, formadas por redes on-line são diferentes em essência da antiga noção de comunidade, mas para Castells não é necessariamente menos eficiente na geração de laços e na mobilização social, uma vez que as novas formas de comunicação se dão entre o lugar físico e o ciber lugar (109-110). As redes de relações on-line, as comunidades virtuais, são muito flexíveis e susceptíveis a constante redefinição de relações e interação social, redundando num nível relativamente baixo de compromisso. Muitos autores receiam que as ciber relações possam banalizar as formas de engajamento cívico e dissolver as instituições sociais como as conhecíamos (110). A política na Internet: O novo modelo econômico redunda em novos modelos de movimento social, que têm na Internet uma forma de expressão ideal, a mídia privilegiada. Se o movimento operário na Era Industrial não pode ser isolado na fábrica industrial como cenário organizacional, o mesmo acontece com a Internet, que ocupa essa posição de cenário e mediadora principal, uma infra-estrutura material de uma determinada forma organizacional: a rede (como era a fábrica) (116-117). 9