Mutação L955V no exon 12 do gene KCNH2 em paciente com síndrome do QT longo
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1 Mutação L955V no exon 12 do gene KCNH2 em paciente com síndrome do QT longo L955V mutation in the exon 12 of KCNH2 gene in a patient with Long QT Syndrome Pacheco, A B., MD, Garcia, L A., MD, Scopin, L G., MD, Coelho, N T., MD, Penalva, R A., MD, Hirata, M H., MD, PhD, Brion, M., MD, Moreira, D A R., MD, Armaganijan, L., MD. Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia São Paulo, Brasil Resumo: A síndrome do QT longo é uma doença genética de caráter autossômico, caracterizada por atraso na repolarização ventricular e predisposição a arritmias ventriculares malignas. Apresenta notável variabilidade fenotípica, podendo as manifestações clínicas variar desde a ausência completa dos sintomas até a morte súbita em jovens. Descrevemos o caso de uma paciente feminina de 42 anos com intervalo QT de 560ms, relatos de síncopes, história familiar materna significativa de morte súbita e seqüenciamento exômico com demonstração de rara mutação do gene KNCH2. Abstract: The long QT syndrome is a genetic disease characterized by delayed ventricular repolarization and malignant arrhythmias. The phenotypic variability is remarkable, and clinical presentation may vary from complete absence of symptoms to sudden death in Correspondência: Luciana Armaganijan. Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia (IDPC). Rua Dante Pazzanese, 500, CEP: São Paulo SP, Brasil. Fone: Luciana_va@hotmail.com young. We describe a case of 42 years-old lady with QT interval of 560ms, recurrent syncope, significant family history of sudden death, and a rare KNCH2 gene mutation. Descritores: Síndrome do QT longo; Mutação; L955V; Morte Súbita Descriptors: Long QT syndrome; Mutation; L955V; Sudden death INTRODUÇÃO A síndrome do QT longo (SQTL) é uma doença genética de caráter autossômico caracterizada por atraso na repolarização ventricular, prolongamento do intervalo QT e predisposição ao desenvolvimento de arritmias ventriculares malignas e morte súbita (MS) 1-4. Freqüentemente, as arritmias cardíacas são desencadeadas por estresse físico ou emocional, mas também podem ocorrer em repouso, ou ainda durante o sono 5-6. O intervalo QT corrigido (QTc ) superior a 500ms constitui importante fator de risco para a ocorrência de síncope e MS secundários a arritmia cardíaca Mar 13 Vol. 4 No. 1
2 Embora a maior parte dos portadores apresente prolongamento do intervalo QT, aproximadamente 40% têm eletrocardiograma (ECG) normal. A despeito disso, apresentam um risco de 10% de eventos cardíacos maiores quando não tratados 8. Familiares de primeiro grau de portadores da SQTL carregam mesmo gene em até 50% dos casos 9. Dois padrões de herança autossômica foram descritos na SQTL: a forma recessiva, associada à surdez (Síndrome Jervell-Lange- Nielsen) e a forma dominante, característica da Síndrome de Romano-Ward. Diversas mutações foram descritas em genes que codificam diferentes subunidades de canais iônicos que regulam a troca de íons através da membrana celular. Aproximadamente 75% dos casos são decorrentes de mutações associadas às subunidades de codificação de canais iônicos K+, Na+ e Ca+ ou de proteínas reguladoras desses canais. Cerca de 90% envolvem mutações dos genes KCNQ1, KCNH2, SCN5A, KCNE1 e KCNE 10. A SQTL é caracterizada por notável variabilidade fenotípica, podendo apresentarse desde a ausência completa de sintomas até a MS em jovens. Estudos clínicos têm fornecido informações úteis na predição de risco, entretanto, com limitações significativas, especialmente em decorrência de sua variabilidade ao longo do tempo. Definir critérios genéticos que possam auxiliar na estratificação de risco de MS é de extrema importância nestes casos. RELATO DO CASO Paciente feminina, 42 anos, com intervalo QTc de 560ms e relatos de síncopes foi encaminhada para avaliação genética. Apresentava história familiar materna significativa de morte súbita em idade precoce: tia aos 42 anos de idade e dois tios aos 32 e 40 anos de idade. Irmão de 45 anos e filho de 18 anos eram portadores assintomáticos de SQTL. Dois filhos apresentavam prolongamento do intervalo QT associado a eventos cardíacos: filho com antecedente de episódios múltiplos de parada cardiorrespiratória secundária a taquicardia ventricular aos 11 meses de idade e filha de 16 anos com história de síncopes de repetição, portadora de cardiodesfibrilador implantável. Holter de 24horas evidenciou intervalo QTc de 560ms ( figuras 1 e 2) e extrassístoles supraventriculares e ventriculares isoladas raras. A cintilografia miocárdica com estresse físico e o ecocardiograma não demonstraram anormalidades O estudo eletrofisiológico não resultou em indução de arritmias ventriculares sustentadas. O seqüenciamento exômico direcionado aos três genes mais freqüentemente acometidos na SQTL (KCN1Q, KCNH2 e SCN5A) detectou a presença da mutação da L955V, uma variante missense de lisina para valina, localizada na região C-terminal do gene KCNH2, no exon 12, além da presença de dois polimorfismos no exon 11: K897T e Y652Y. No gene SCN5A, foram encontrados polimorfismos nos exons 10, 12 e 17 nas regiões IVS9-3 (C-A), H558R e E1061E, respectivamente. O gene KCNQ1 não apresentava mutações ou polimorfismos. Optado por tratamento empírico com betabloqueador devido ao prolongamento significativo do intervalo QT. DISCUSSÃO O diagnóstico de SQTL é usualmente feito com base na apresentação clínica e análise eletrocardiográfica. Testes genéticos são geralmente indicados para a identificação de carreadores assintomáticos que, a despeito de ECG normal, podem apresentar MS como primeira manifestação clínica. A estratificação de risco de eventos arrítmicos deve ser individualizada. Estudos mostram que não só o gene comprometido, mas também a localização da mutação exerce impacto sobre 17 Mar 13 Vol. 4 No. 1
3 a apresentação clínica. Descrevemos um caso raro de mutação da L955V, encontrado em um único relato de Biliczki e cols em uma paciente de cinco anos de idade com antecedentes de síncopes recorrentes, intervalo QTc de 460ms e dispersão de QT de 330ms. Devido à ausência de sintomas, foi optado inicialmente por acompanhamento clínico. Entretanto, a demonstração de severo Figura 1. Holter de 24h evidenciando intervalo QTc prolongado ( 560ms, figura A). Note que o intervalo QT absoluto não prolonga durante o exercício (figura B). defeito na formação e transporte de proteínas relacionadas ao gene KCNH2 e redução significativa do potencial de membrana resultaram no tratamento com betabloqueador 7. Neste caso por nós descrito, iniciamos a terapia empírica com bloqueador betadrenérgico devido ao prolongamento significativo do intervalo QTc. Adicionais treze membros da mesma família tiveram suas 18 Mar 13 Vol. 4 No. 1
4 amostras sanguíneas obtidas e aguardam resultado do seqüenciamento genético. Este relato ilustra a importância da caracterização genotípica de pacientes e familiares portadores de SQTL e indica um estudo populacional mais aprofundado no cenário brasileiro. O diagnóstico molecular das doenças relacionadas à MS pode, inclusive, colaborar na decisão de implante de dispositivos de alto custo à saúde publica, particularmente em portadores de mutações de alto risco. Figura 2. ECG de base 19 Mar 13 Vol. 4 No. 1
5 Referências bibliográficas 1. Schwartz PJ, Periti M, Malliani A. The long Q-T syndrome. Am Heart J 1975; 89: Moss AJ, Schwartz PJ, Crampton RS, Tzivoni D, Locati EH, MacCluer J, et al. The long QT syndrome. Prospective longitudinal study of 328 families. Circulation 1991; 84: Roden DM. Mechanisms and management of proarrhythmia. Am J Cardiol 1998; 82:49I 57I. 4. Vincent GM. The molecular genetics of the long QT syndrome: genes causing fainting and sudden death. Annu Rev Med 1998; 49: Schwartz PJ, Priori SG, Spazzolini C, Moss AJ, Vincent GM, Napolitano C, et al. Genotype-phenotype correlation in thelong- QT syndrome: gene-specific triggers for lifethreatening arrhythmias. Circulation 2001, 103(1): Wilde AA, Jongbloed RJ, Doevendans PA, Duren DR, Hauer RN, van Langen IM, et al. Auditory stimuli as a trigger for arrhythmicevents differentiate HERGrelated (LQTS2) patients from KVLQT1- related patients (LQTS1). J Am Coll Cardiol1999, 33(2): Biliczki P, et al. Cellular properties of C-terminal KCNH2 long QT syndrome mutations: description and divergence from clinical phenotypes. Heart Rhythm Aug; 5(8): Priori SG, Schwartz PJ, Napolitano C, Bloise R, Ronchetti E, Grillo M, et al Mar 13 Vol. 4 No. 1
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